Era uma vez um Pooka chamado Leão. Naqueles dias, os nomes realmente significavam algo e os Pooka diziam a verdade como todos os outros Kiths. Certa manhã, Leão acordou com uma centena de vozes diferentes do lado de fora de sua toca. Ele ouviu enquanto discutiam sobre quem deveria bater à sua porta. Finalmente, para poupar-lhes o trabalho, ele se desvencilhou dos membros de seu bando, pulou sobre um patamar e apertou os olhos para observar a multidão reunida. Ele percebeu que todos os seus companheiros Pooka haviam vindo fazer uma visita.
—O que diabos vocês estão fazendo aqui? Perguntou Leão, sua cauda balançando com irritação. Ele se agachou para examiná-los mais de perto.
Cervo deu um passo à frente e baixou a cabeça cheia de chifres para olhar Leão nos olhos.
—Você não ouviu? Ele bufou. Vai haver um concurso entre as Fadas. Aqueles Que São Eternos ofereceram um prêmio para o Kith vencedor.
—Certo e daí? Respondeu Leão com um bocejo cheio de presas e um longo espreguiçar. Isso ainda não responde a minha pergunta.
Porco-espinho se adiantou, ansioso, impaciente, irritado e anunciou: —Sim, é por isso, que queremos que você nos represente.
Leão fechou um dos olhos para observar melhor Porco-espinho. —Você quer que eu faça o quê?
Tordo desceu dos céus e cantou: —Que nos represente! Por favor, nos represente!
Leão rugiu em forma de um riso. —Vocês estão brincando. Não. Agora vão embora, que eu vou voltar para minha cama aconchegante. Ele se levantou, com a intenção de voltar à sua toca e deitar-se junto com os outros de seu bando.
Os outros Pooka gritaram em uma só voz: —Espere!
Urso adiantou-se e disse: —Você é o mais corajoso entre nós, Leão. Aqueles Que São Eternos chamaram pelo mais corajoso.
Leão fez uma pausa e olhou para trás com um suspiro. Ele não podia deixar um elogio passar em branco. —Vá você, Urso. Você é quase tão corajoso quanto eu.
Urso sacudiu a cabeça tristemente, e Elefante proclamou: —Você é o mais forte entre nós, Leão. Aqueles Que São Eternos chamaram pelo mais forte.
Leão olhou para cima, para o alto, para o topo, para Elefante e ergueu uma sobrancelha. —Vá você, Elefante. Você é quase tão forte quanto eu.
Elefante balançou a cabeça, para frente e para trás, para trás e para a frente, e a voz suave de Gazela partiu da multidão: —Você é o mais rápido entre nós, Leão. Aqueles Que São Eternos chamaram pelo mais rápido.
—Vá você, Gazela. Você é quase tão rápida quanto eu. Leão sentou-se e roeu uma das unhas. Ele assistiu aos Pooka se moverem sem rumo, lentamente, confusos, como uma manada de animais. Ouviu seus murmúrios sobre a relva.
Finalmente, Borboleta deslizou para a frente e ajoelhou-se à frente de Leão. Suas asas tremeram de emoção e lágrimas correram pelo seu rosto, deixando manchas em suas bochechas. —Você é o mais sábio entre nós, Leão. Aqueles Que São Eternos chamaram pelo mais sábio.
Leão moveu seu olhar áureo para a gloriosa criatura e suspirou. —Não chore, ele entoou, oferecendo a ponta da cauda para enxugar as lágrimas. Ele detestava ver alguém chorar. —Muito bem, disse ele a contragosto. Vou fazer isso, mas com uma condição.
Os outros Pooka ficaram completamente imóveis, uma façanha para eles. Após vários minutos, Tordo baixa a cabeça e perguntou com sua voz profunda e atemporal: —Qual é a sua condição?.
Com uma palmadinha em Borboleta, Leão ficou de pé e tomou uma posição régia. Ele disse: —Se eu ganhar este concurso, vocês farão de mim o Rei de Todas as Feras.
Todos os Pooka prenderam a respiração. Olharam uns para os outros. Lobo foi o primeiro a levantar a voz. Ele uivou de acordo. Os outros animais seguiram até que o ar da manhã reverberou com grunhidos e grasnados, rosnados e roncos, latidos e berros, gargalhadas e gritos. Os Pooka concordaram por unanimidade. Se Leão vencesse o concurso, eles fariam dele o seu rei.
Finalmente, chegou o dia em que todas as fadas se reuniram em um vale para ouvir as regras da competição. Pavão fez um lindo manto para Leão com as penas de sua cauda. Pardal juntou cardos e trançou-os na juba dourada de Leão. Castor presenteou Leão com um bastão de carvalho que havia esculpido com seus próprios dentes, e Ovelha deu para Leão uma sacola fiada e tecida de sua lã. Assim equipado, Leão viajou para a clareira numa carruagem de madeira decorada com teias de aranha e violetas, e puxada por Alce. Sentado numa almofada de dente de leão e com todos os outros Pooka o escoltando. Ele já se sentia como um rei.
Aqueles Que São Eternos não vieram. Eles enviaram um mensageiro, Unicórnio, para retransmitir suas regras. Unicórnio pisou no centro da clareira, seus cascos ressoando na plataforma de pedra onde estava. Seus olhos brilhavam com a luz silvestre e seu chifre refletiu os raios de sol em milhões de partes de um arco-íris que dançava sobre a pele e cabelos dos que ali se aglomeravam. Toda esta ansiedade gerou uma onda de excitação no ambiente.
Em sua voz melodiosa e solene, Unicórnio anunciou: —Hoje são nove os que embarcarão em uma jornada. Esta jornada vai conduzi-los a todos os cantos do mundo. O olhar atento de Unicórnio na floresta percorreu os concorrentes, parando por último no Leão. O Pooka se prostrou orgulhoso e corajosamente de pé, encontrando os olhos de Unicórnio. Unicórnio sorriu, e continuou. —Sua tarefa — disse ele lentamente, baixando a voz para que todos os presentes tivessem que ouvir atentamente e chegar mais perto para ouvi-lo — é resgatar o verdadeiro Coração Maravilhoso de sua prisão.
Um grande “oh” foi proferido pela multidão. Embora ninguém soubesse o que era o Coração Maravilhoso, parecia impressionante. Unicórnio disse sobre o barulho da multidão —Aquele que fizer isto... ele parou até que o silêncio tivesse voltado... receberá uma grande honra para o seu Kith. Vão agora e torne os seus Kiths orgulhosos. Unicórnio saiu sem mais uma palavra sequer.
Troll colocou sua fé no Dán e foi para norte. Nocker partiu em sua engenhoca na forma de uma carruagem fumegante, barulhenta e sufocante em direção contrária. Sátiro partiu rumo a floresta com um grupo de ménades em seu encalço. Sluagh desapareceu. Redcap fez uma reviravolta brusca, e saiu rasgando a estrada com os cabelos voando ao vento. Sidhe subiu novamente em seu cavalo, e, com seus criados à tiracolo, foi para o sul. Exu jogou sua pequena mochila sobre o ombro e rumou em direção ao leste. Boggan pôs sua mula à andar com um “heeyah”, a pobre besta carregada com todos os pertences materiais de Boggan.
Leão sentou-se na pedra onde Unicórnio havia estado. —Oh, pela minhas pulgas! Ele rugiu. Como vou encontrar este Coração Maravilhoso quando nem sequer sei o que é ou onde está?
Ele baixou a cabeça. Muitos dos outros Pooka olharam para o desespero de Leão com repulsa, mas não Ratinha. Sendo pequena e entendendo quão grande o mundo pode parecer às vezes, Ratinha rastejou para o colo de Leão.
—Não se preocupe, encorajou Ratinha, seu coração cheio de amor por Leão, embora ele ainda não o soubesse. —Viajarei contigo e, se nada der certo, pelo menos teremos uma grande aventura.
Leão aceitou a oferta de Ratinha e os dois partiram para encontrar o Coração Maravilhoso. Suas viagens os levaram pela floresta e pelo campo, sobre montanhas e rios. Finalmente, eles encontraram uma manada de cervos na beira do deserto. À medida que se aproximavam, passavam por carcaças e esqueletos, apodrecendo e secando ao longo da estrada. O sol ardente, queimava lentamente tudo até se desfazer em pó. Só restava uma árvore para abrigar os animais. Além de alguns arbustos rachados, nenhuma planta crescia lá e nenhum outro animal percorria a terra.
—Procuramos o Coração Maravilhoso, disse o Leão ao rebanho. Será que vocês sabem onde ele está?
Um cervo doente olhou para o Leão e Ratinha com os olhos enraivecidos. —Já ouvi falar disso, respondeu ele. Eu posso lhe dizer o que é, mas não onde está. Mas! Só lhe direi se me prometer uma coisa. Estamos morrendo de fome e sede. O rio deixou de correr. Se prometer descobrir o porquê, eu lhe contarei sobre o Coração Maravilhoso.
Leão aceitou prontamente a oferta do cervo e ouviu atentamente como o animal descreveu uma bela gema, um rubi, lapidado com tantas facetas que levaria um ano e um dia para contá-las. Leão e Ratinha agradeceram aos cervos, renovaram a promessa de descobrir a origem dos males do rebanho, e depois continuaram o seu caminho.
Leão e Ratinha andaram e andaram. E então eles chegaram até a costa. Caminharam pela praia, deixando suas pegadas na areia. Leão e Ratinha também viram rastros de cavalos e de uma mula, rastros de uma engenhoca e de um Troll, rastros de Exu, Sátiro, Sluagh e Redcap. Isto os deixou preocupados, porque significava que todos os outros concorrentes estavam à sua frente.
Apressando-se, os dois viajantes ouviram uma voz gritando: —Socorro! Socorro! Leão e Ratinha procuraram a origem dos gritos. Um peixe estava se contorcendo na rede de um pescador. O seu dorso sangrava no local onde um grande anzol o havia perfurado, sua pele lisa tinha perdido o brilho. O peixe olhou para Leão e Ratinha, gritando: —Por favor, oh por favor, salvem-me. Senão certamente vou morrer e isso não é nenhuma mentira. Sem hesitar, Leão libertou a pobre criatura.
—Pronto, acalmou o Leão. Vá para casa e tome cuidado quando se aventurar perto dos homens.
—Obrigado, obrigado, disse o peixe aos prantos. Eu não vou me esquecer de você, Leão. O peixe nadou para casa.
Algum tempo depois, Leão e Ratinha se encontraram em uma bela floresta. As árvores se estendiam até tocar o céu. Flores gigantescas enchiam o ar de aromas inebriantes e cogumelos coloridos decoravam o chão coberto de musgo. Leão e Ratinha viram pássaros com plumagem de arco-íris, grandes gatos com a plumagem cheia de bolinhas como um “petit-poá” e sapos esculpidos de pedras preciosas. E ainda assim, todas as criaturas fantásticas que lá viviam pareciam tristes. A certa altura, Leão e Ratinha pararam uma macaquinha para perguntar:
—Procuramos o Coração Maravilhoso. Você saberia onde ele está?
A macaca olhou para os viajantes com olhos tristes.
— Já ouvi falar disso, disse ela. Eu posso lhe dizer onde está, mas não qual o caminho a seguir. Mas! Só te direi se me prometer uma coisa. Nossa querida floresta está encolhendo. A cada dia ela fica menor até que um dia não existirá mais. Se prometer descobrir o porquê, eu lhe contarei sobre o Coração Maravilhoso.
Leão prontamente aceitou a oferta da primata e ouviu atentamente enquanto o animal explicava que a gema estava no centro do mundo. Ela passou a descrever como o objeto havia sido envolto em uma névoa vil e espessa que acabara por engoli-lo completamente. Por fim, ela avisou aos Pooka para nunca tocarem na névoa, pois isso certamente derreteria sua carne. Leão e Ratinha agradeceram à macaca, renovaram sua promessa de descobrir a origem dos males da floresta e, em seguida, seguiram seu caminho.
Após algum tempo, Leão e Ratinha encontraram uma horta cuidada por um fazendeiro de cara mesquinha. Eles evitaram o homem, contornando para o oeste. Ao longo do caminho, eles ouviram uma voz chamando: “Socorro! Socorro!" Leão e Ratinha procuraram até encontrar a origem dos gritos. Uma pequena toupeira prendeu o pé em uma armadilha de aço armada pelo fazendeiro. Seu rostinho negro estava molhado de lágrimas e ela olhou para Leão e Ratinha, soluçando: “Por favor, oh, por favor, me salve. Caso contrário, certamente morrerei e isso não é mentira." Sem hesitar, Leão libertou a pobre criatura.
—Pronto, acalmou o Leão. Vá para casa e tome cuidado quando se aventurar perto dos homens.
—Obrigado, obrigado, disse a toupeira aos prantos. Eu não vou me esquecer de você, Leão. A toupeira cavou para casa.
Leão e Ratinha viajaram e os anos se passaram. Cruzando uma colina, eles sentiram o mau cheiro de um lago muito antes de alcançá-lo. Queimou seus narizes e os fez engasgar. Ao se aproximarem, viram por que o cheiro era tão ruim. A superfície da água oleosa estava coberta de peixes mortos flutuantes e inchados. Um velho sapo lamentava sentado à beira do lago. Leão e Ratinha se aproximaram dele e perguntaram: —Buscamos o Coração Maravilhoso. Você saberia onde está?
O sapo tossiu - um som horrível e torturante - depois olhou para os viajantes com olhos tristes. —Já ouvi falar, disse ele. —Eu posso dizer qual caminho seguir, mas não como libertá-lo. Mas! Eu só vou te dizer se você prometer uma coisa. Nosso lago está morrendo. A cada dia fica cada vez mais doente, até que um dia não haverá mais. Se você prometer descobrir o motivo, contarei a você sobre o Coração Maravilhoso.
Leão prontamente aceitou a oferta do sapo e ouviu atentamente quando o animal apontou para o leste com um dedo torto e descreveu um vale onde o sol nascia simultaneamente no leste e se punha no oeste.
—Lá, disse ele, você verá uma caverna. Siga a caverna até o centro da terra e você eventualmente encontrará o que procura. Leão e Ratinha agradeceram ao sapo, renovaram sua promessa de descobrir a origem dos problemas do lago e, em seguida, continuaram seu caminho.
Viajando em direção à Manhã, Leão e Ratinha finalmente encontraram um vasto oceano. Eles olharam através de sua extensão cintilante e se perguntaram como poderiam cruzá-lo.
—Pelas minhas pulgas! Leão sibilou. Agora o que vamos fazer? Não temos barco. O Vale do Amanhecer e do Pôr do Sol fica do outro lado do oceano e aqui estamos, sem meios para atravessá-lo. Ele baixou a cabeça em pesar, certo de que tudo estava perdido.
—Não se preocupe, respondeu Ratinha. Ela acariciou a crina macia de Leão. —Alguma coisa vai acontecer. E, vejam só, naquele momento, um jorro de água saltou da superfície do oceano e uma baleia apareceu. Ele ergueu um olho para fora da água para espiar Leão e Ratinha.
—Eu ouvi seus problemas, disse a baleia, sua voz profunda ecoando em seu corpo. Entrem na água e eu vou levá-lo nas minhas costas através do oceano.
Leão olhou para cima e viu então que aquele era o peixe que eles haviam resgatado do pescador tantos anos atrás. Ele havia crescido. Então ele e Ratinha começaram a nadar e a baleia apareceu embaixo deles. Eles viajaram em grande estilo pelo oceano. Assim que a baleia os devolveu à terra, eles acenaram e agradeceram.
Uma boa ação merece outra, jorrou a baleia. Ela piscou seu olho enorme e molhado, então nadou para fazer o que quer que seja que as baleias fazem.
Sentindo-se bastante satisfeitos consigo mesmos, Leão e Ratinha se dirigiram para as colinas, caminhando de mãos dadas. Eles pararam para descansar em um amplo campo entre dois cumes rochosos. Enquanto comiam o queijo e o pão e bebiam o vinho, o sol pintava o céu com redemoinhos de vermelhos, laranjas e roxos.
—Veja! gritou Ratinha.
Leão olhou. Nuvens cintilavam com as cores do fogo e uma aura de chamas iluminava ambos os cumes. Na verdade, o sol estava nascendo e se pondo ao mesmo tempo. Os dois companheiros procuraram rapidamente pela caverna e a encontraram atrás de um fluxo de ipomeias e trepadeiras. Espiando lá dentro, Leão comentou: —Está escuro.
Juntos, Leão e Ratinha adentraram a caverna sentindo seu abraço frio. Para baixo, para baixo - sempre para baixo, eles viajavam na escuridão total. Passaram dias, semanas, meses, anos até. Eles tinham apenas a voz e os toques um do outro para evitar que enlouquecessem. Uma vez ou outra, Leão agradeceu à Ratinha por acompanhá-lo. Ele sabia que nunca poderia tê-lo feito sozinho. E assim, eles continuaram a descer, nunca sabendo se estavam perdidos ou não. Então, assim quando haviam perdido toda a esperança e se preparavam para deitar-se para morrer, notaram um brilho vermelho à frente. Eles tinham encontrado o centro da terra.
A caverna se abriu em uma grande sala com paredes úmidas e um chão escorregadio e lamacento. No centro de tudo, Leão e Ratinha viram a origem do brilho vermelho. Uma espessa nuvem de névoa pairava ao redor do Coração Maravilhoso. O rubi pulsava com uma luz interna que era filtrada pela névoa. Ratinha correu para a frente, animada.
—Tome cuidado... avisou Leão... você pode escorregar e cair na névoa. Mas ele falou tarde demais. Os pés de Ratinha escorregaram e ela escorregou direto para a névoa ácida. Leão observou com horror enquanto a névoa drenava toda a cor dela até que nada restasse além de uma concha vazia e monótona. Rapidamente, Leão rastejou para a frente, agarrou um pedaço da saia de Ratinha com a garra e puxou-a para fora. Ela estava em seus braços, seus olhos outrora esmeralda agora eram um cinza opaco.
—Oh, como eu fui tola, sussurrou ela. Você deve terminar a busca, Leão. Para mim. Leão a acalmou o melhor que pôde, mas não conseguiu salvá-la. Ratinha fechou os olhos e caiu em um sono profundo. Suas últimas palavras vieram tão suavemente, que foram pouco mais do que um pensamento: —Eu te amo. E então Leão chorou.
—Oh, Ratinha, gritou Leão. —Agora o que eu vou fazer? Eu não consigo libertar o Coração Maravilhoso. Você se foi. A missão foi perdida e eu não tenho mais nada. Ele baixou a cabeça em pesar, certo de que tudo estava perdido.
Ratinha não respondeu. Naquele momento, porém, um canto do chão se sacudiu e sacudiu. Momentaneamente, uma pequena toupeira colocou a cabeça para fora. Ela sacudiu a sujeira do cabelo e olhou para Leão e Ratinha.
—Eu ouvi seus problemas, disse a toupeira, sua voz suave e triste. —Vou pegar a pedra para você. Posso cavar e subir por baixo dela, para não ter que tocar na névoa.
Leão ergueu os olhos em meio às lágrimas e viu então que essa era a toupeira que eles haviam resgatado do fazendeiro há tantos anos. Ele acenou com a cabeça e a toupeira desapareceu de volta em seu buraco. Leão esperou. Em pouco tempo, o brilho vermelho desapareceu de dentro da névoa. Leão assistiu. O solo estava sendo iluminado por baixo pela gema, uma aura escarlate aparecendo na superfície enquanto a toupeira carregava o Coração Maravilhoso de volta ao longo de seu túnel. Leão prendeu a respiração. Finalmente, a gema rolou para fora do buraco da toupeira e um pequeno rosto preto apareceu logo depois dela. Leão respirou fundo. A toupeira sorriu. Assim que o Leão teve o Coração Maravilhoso em suas mãos, ele acenou e agradeceu a toupeira.
—Uma boa ação merece outra, sorriu a toupeira. Ela apertou os olhos e franziu o nariz, então desapareceu de volta em seu buraco para fazer o que quer que seja que as toupeiras façam.
—Você libertou o Coração Maravilhoso. Uma voz atrás de Leão o fez se lembrar de onde estava e sua missão e ele se virou surpreso com a mulher. Ela sorriu gentilmente e Leão relaxou. A mulher ficou parada, com os pés separados, os braços embalando um bebê invisível. Seu cabelo caía até os pés, algas verdes e trepadeiras. Ela não usava roupas e sua pele estava enrugada e rachada, como a casca de uma árvore antiga. Seios caídos pareciam ter amamentado todas as crianças do mundo e seus quadris tinham uma largura projetada para a gravidez. Em seus olhos sem nenhum branco, estrelas brilhavam contra o azul da meia-noite. Havia algo atemporal na velha, e Leão sabia sem dúvida que havia encontrado um ser nobre e eterno. Leão curvou-se profundamente. Ele olhou para a gema em sua mão e a estendeu para a velha.
—Tsk, ela suspirou, balançando a cabeça até que as folhas de seu cabelo sussurrassem umas contra as outras. —Você deve voltar com ele. Embora, como você o libertou, vou conceder-lhe três perguntas. A estas responderei e minhas respostas serão verdadeiras. Lentamente, seu olhar se voltou para Ratinha e a ternura brilhou em sua própria alma.
Leão segurou o Coração Maravilhoso com ambas as mãos trêmulas, incapaz de tirar seus olhos dourados da antiga fada. Ele limpou a garganta, considerando as perguntas que faria. Ele se lembrou de todos os dias e noites que se passaram em sua busca. Ratinha estava em todas as memórias. Leão encontrou imagens dela chorando pelos cervos, pela floresta e pelos peixes. De repente, ele sabia que perguntas fazer.
—Diga-me então, Mãe Sábia,Leão arriscou suavemente, por que o rio parou de correr fazendo os animais e as plantas morrerem por causa disso.
—Essa é a sua primeira pergunta, reconheceu a velha. Ela se ajoelhou, mantendo a criança invisível embalada em um braço e usando um dedo para desenhar uma longa linha na terra. Ela o cruzou com uma mais curta, com um terço do comprimento. —Uma barragem mantém a água presa no norte. Nela, há uma pedra fraca. A pedra deve ser empurrada para fora. Em três dias, depois disso, a barragem irá ruir e o rio ficará livre novamente.
Leão guardou a resposta da velha na memória.
—Diga-me então, Mãe Sábia, perguntou o Leão, por que a floresta encolhe fazendo os animais e as plantas morrerem por causa disso.
—Essa é a sua segunda pergunta, respondeu a velha, ainda ajoelhada. Seu dedo traçou um arco na terra, preso em seu ápice até a parte inferior da primeira linha. —Monstros montados em dragões amarelos gigantes devoram a floresta. Os dragões devem ser mortos. Depois deles terem respirado pela última vez, os monstros irão embora, pois precisam de seus dragões para sobreviver. Então, a floresta crescerá novamente.
Leão guardou a resposta da velha na memória.
—Diga-me então, Mãe Sábia, perguntou o Leão, por que o lago está entupido de sujeira fazendo os animais e as plantas morrerem por causa disso.
—Essa é a sua pergunta final, a velha mulher murmurou enquanto desenhava um grande círculo no topo da primeira linha. —Uma criatura horrível está agachada à beira do lago, lançando seus excrementos vis na água. O orifício deve ser tapado. Assim que for, a criatura se encherá de seus próprios venenos e morrerá. Só então o lago será capaz de se curar e prosperar novamente.
Com alguns gemidos e estalos, a velha se levantou. Ela arrastou o pé com as unhas grossas e amareladas no glifo que havia traçado na terra, apagando-o.
—Agora, vou lhe fazer um outro favor”, disse ela, erguendo os olhos do céu noturno de volta para Leão. —Vou mandar você para onde quiser e você vai viajar para lá em um piscar de olhos. Você pode voltar para casa, se quiser. Dê um nome ao lugar.
Leão não queria testar a paciência da velha, então ele rapidamente enfiou o Coração Maravilhoso no bolso e se ajoelhou para pegar o corpo de Ratinha.
—Eu gostaria de voltar, disse ele, ao lago onde encontrei o sapo. Eu tenho uma promessa para cumprir.
E assim foi feito.
Leão contou ao sapo o que ele havia aprendido. O sapo agradeceu profusamente. Em seguida, Leão viajou de volta para a floresta. Ele carregou Ratinha por todo o caminho. Na floresta, Leão contou à macaca o que havia aprendido. A macaca tagarelou de gratidão. Então, Leão viajou de volta para a borda do deserto, onde contou ao cervo o que havia aprendido. O cervo curvou-se diante de Leão e toda a manada o aplaudiu. Finalmente, Leão voltou seus passos em direção à casa.
Nunca houve um Pooka mais feliz em ver seu lar.
—Se ao menos ... Leão disse a Ratinha, ... você estivesse aqui comigo neste momento.
Todos os outros Pooka vieram cumprimentar Leão, felizes em vê-lo, mas profundamente tristes quando viram seu fardo. Eles tiraram Ratinha dele e a colocaram em um altar de pedra no meio da clareira. Eles decoraram seus cabelos com hibiscos e madressilvas e a vestiram com um vestido branco tecido de seda. Ela quase parecia ter recuperado sua beleza de novo, apesar da palidez de sua alma adormecida. Leão sentou-se ao lado da pedra e baixou a cabeça.
Todas as fadas estavam esperando por Leão. Ele foi o último a retornar da missão. Na manhã seguinte, o Unicórnio chegou. Aqueles Que São Eternos não vieram, como era o esperado. Troll deu um passo à frente. Nocker estremeceu no meio da multidão. Sátiro caminhou para a frente. Sluagh apareceu. Redcap berrou para que todos saíssem do seu caminho. Sidhe manteve sua nobre cabeça erguida enquanto deslizava para a frente. Exu avançou e ocupou seu lugar. Boggan cambaleou para a frente. E Leão veio por último, sua satisfação no momento prejudicada pela ausência de Ratinha.
Unicórnio deu um passo para o centro da clareira. Ele ficou ao lado do corpo de Ratinha, olhando para ela com seus olhos cintilantes e silvestres. O arco-íris de seu chifre refletia a luz do sol que dançava em sua forma imóvel. Finalmente, ele ergueu a cabeça e falou para a multidão. Com sua voz calmante e cantante, Unicórnio anunciou:
—Hoje há nove que voltaram de uma missão. Essa busca os levou a todos os cantos do mundo.
O olhar da floresta do Unicórnio examinou os competidores, parando por último em Leão. O Pooka, entretanto, estava olhando para Ratinha. Unicórnio sorriu e continuou.
—Sua tarefa, disse ele lentamente, baixando a voz para que todos os presentes tivessem que ouvir atentamente e se inclinar para ouvi-lo, era resgatar o verdadeiro Coração Maravilhoso de sua prisão. A multidão mudou e se agitou com impaciência e entusiasmo. O Unicórnio falou acima do barulho da multidão, —Aquele que fez isso ..., ele fez uma pausa até que o silêncio retornasse, ... receberá uma grande honra para todos do seu Kith.
—Mostre o Coração Maravilhoso, ordenou o Unicórnio, sua voz vibrando com profecia e importância.
Leão enfiou a mão no bolso e tirou a joia brilhante. Ele o segurou no alto. Boggan olhou para Leão, então removeu outro Coração Maravilhoso de sua mochila. Ele o segurou no alto. Exu abriu sua camisa para revelar o Coração Maravilhoso pendurado em seu pescoço. Sidhe abriu a palma da mão para mostrar a todos o Coração Maravilhoso ali. Redcap ergueu o capuz e puxou o Coração Maravilhoso. Sluagh fez aparecer o Coração Maravilhoso de algum lugar. Sátiro tirou o Coração Maravilhoso de uma bolsa dentro de sua tanga. Nocker apertou um botão na caixa que segurava; uma tampa se abriu para revelar o Coração Maravilhoso. Troll tirou o Coração Maravilhoso de sua bainha. Todos se entreolharam em silêncio, chocados.
Todos eles voltaram com o Coração Maravilhoso. Unicórnio estudou os rostos dos competidores. Ele arriscou uma risada baixa e sádica, depois pigarreou e disse:
—Parece que temos um conflito.
A multidão explodiu em uma tempestade de gritos, ameaças e resmungos. As fadas na clareira acusavam umas às outras de trapaça. Rostos avermelhados de raiva e dentes expostos em torno de grunhidos de indignação. Antes que eles pudessem entrar em conflito, no entanto, o Unicórnio gritou:
—Ninguém trapaceou! Todas as fadas pararam no meio da acusação e se viraram para encarar o Unicórnio.
Unicórnio explicou suavemente, fazendo com que todos se acomodassem para ouvir: —Todos vocês têm potencial para encontrar seus próprios Corações Maravilhosos. Não existe um único Coração Maravilhoso batendo no centro do mundo.
—Mas e o concurso?! Alguém disse do meio da multidão, provavelmente um Redcap.
Unicórnio sentou-se, concentrando-se nos competidores. —A missão afirmava especificamente que aquele que encontrasse o verdadeiro Coração Maravilhoso venceria. Vou ouvir as histórias de suas viagens. Fale agora.
Sidhe foi primeiro e os outros o seguiram. Cada um contou uma história diferente, embora cada um deles tivesse feito promessas e lutado batalhas no decorrer de suas aventuras. Os contos continham glória e honra, romance e perda. Cada um deles conheceu a velha depois de libertar o Coração Maravilhoso. Suas histórias divertiriam os infantes até o fim dos tempos.
Finalmente, Unicórnio voltou seu olhar cintilante para Leão.
—E você? Qual é a sua história? Leão segurou o Coração Maravilhoso em suas mãos. Ele pulsava como se possuísse um batimento interno. Ele falou do cervo e do rio, do macaco e da floresta. Ele descreveu a toupeira e a baleia e explicou sobre o sapo e o lago. Sua voz tremia enquanto ele compartilhava a longa jornada através da escuridão da caverna, e caiu em um sussurro enquanto ele falava sobre a queda de Ratinha na névoa. Ele encontrou o olhar do Unicórnio enquanto falava da velha e da jornada para casa. Finalmente, quando terminou, ele baixou os olhos para Ratinha e suspirou.
Unicórnio inclinou a cabeça e perguntou a todos os competidores: —Vocês voltaram para manter suas promessas?
—Minha honra não permitiria que eu me desviasse de minha busca, resmungou Troll. Mas pretendo voltar.
—Eu estava com pressa, fungou Sidhe.
—Ssssssssss, sibilou Sluagh.
—Meu caminho não me trouxe de volta dessa forma, explicou Exu.
—Porra, é claro que não, resmungou Redcap.
—Tenho muitas responsabilidades para ter que limpar as casas dos outros, lamentou Boggan.
—Sobrevivência do mais forte, sabe? Nocker grasnou.
—Hummm... devo ter esquecido, murmurou Sátiro.
—Sim, respondeu Leão com suavidade, triste, certo de que tudo estava perdido. O prêmio iria, sem dúvida, para Troll ou Sidhe ou um dos outros. Ele sabia que havia buscado e perdido Ratinha por nada. Ele havia desapontado sua amiga. O ar no vale estalou repentinamente com eletricidade.
Unicórnio se levantou e deu um passo para o lado enquanto a criatura mais requintada que alguém já tinha visto apareceu na clareira. Com orelhas longas e elegantes e rosto perfeito em forma de coração, ela se assemelhava aos Sidhe, mas sua beleza superava em muito a deles. Seu cabelo flutuava com vida ao seu redor, sua elegância de fios de ouro tão suave e leve como a seda. Graça fluía através de todos os seus movimentos e sua voz, quando ela falava, continha a mais doce canção de um pássaro, a brisa mais suave, os sinos de prata mais claros e o sol mais quente, todos juntos. E seus olhos, aqueles olhos antigos - eles eram inteiramente azul-negros sem brancos, pequenos pedaços de céu noturno em que as estrelas brilhavam desde a eternidade. Sem hesitar, todos no vale caíram de joelhos, baixaram a cabeça e baixaram os olhos.
Ela, que é eterna, parou para beijar Ratinha com ternura. Lábios de prímula devolveram a cor sobre a boca da fada adormecida. Um leve rubor espalhou-se lentamente pelas bochechas de Ratinha, empurrando para trás a palidez monocromática. Então, Aquela Que É Eterna moveu-se para ficar diante de Leão.
—Levante-se, Pooka, ela cantou. —Levante-se e aceite seu prêmio, pois você é aquele que tem o verdadeiro Coração Maravilhoso.
Bem, ninguém ficou mais surpreso do que o próprio Leão, embora ninguém ousasse sequer suspirar ou sussurrar. Ele tropeçou em seus pés, piscando para a fada antiga com seus olhos dourados extasiados.
Sorrindo para Leão, Aquela Que É Eterna estendeu a mão para ele.
—Só você manteve suas promessas, apesar da perda de seu amor e de sua crença de que havia perdido o concurso. Só você. Ela guiou o Leão para ficar diante de todos os reunidos. —Olhem para esta fada, todos, pois ele tem o coração mais verdadeiro e puro entre vocês. Mil olhos se ergueram para contemplar com admiração Leão. Leão piscou de volta para eles. Ele não entenderia até mais tarde o que exatamente aconteceu.
Lentamente, Aquela Que É Eterna se inclinou para frente e deu um beijo em uma das bochechas de Leão.
—Como seu prêmio, eu concedo a seus amigos a permanência de seus corações animais. Embora isso não signifique nada para você agora, algum dia significará e, quando esse dia chegar, será útil para você . Com um suspiro tão doce quanto mel, Aquela Que É Eterna então se inclinou para beijar a outra bochecha de Leão. —Eu também coloco sobre você e seu Kith um geas mais solene, porque você tem a pureza de coração para carregá-lo como nenhum outro poderia. Em nome da Maravilha e do Temor, você e seus amigos serão os campeões do questionamento, da incerteza e do desconhecido. Você lutará na batalha que se aproxima, quebrando as crenças geladas e inflexíveis que ameaçarão o mundo. Você carregará esse fardo nos dias sombrios que virão, com o conhecimento de que o faz por uma boa causa. Uma onda de música como batimentos do coração encheu a clareira com cor e luz, fluindo de Aquela Que É Eterna e dançando em torno de todos os Pooka reunidos. Ela se infiltrou neles e os ligou ao geas.
E então, Aquela que é Eterna deu um beijo gentil nos lábios de Leão. Ela piscou e sussurrou, apenas para os ouvidos dele: —Esse foi porque eu quis.
Assim que Aquela que é Eterna terminou sua proclamação, ela saiu tão abruptamente quanto havia chegado. Unicórnio escapuliu para a floresta e um murmúrio silencioso se espalhou pela multidão. Ratinha se sentou e Leão quase explodiu de alegria. Ele se aproximou dela, com medo de tocá-la. Lágrimas escorreram pelo seu rosto e as primeiras palavras de sua boca foram:
—Eu sabia que você iria acordar. E embora tenha sido a primeira mentira contada por um Pooka, Ratinha sorriu e abraçou Leão com todas as suas forças.