Virtude

Virtude. Do latim, vir, virtus. A noção exprime em primeiro lugar o poder e mais geralmente a força de vontade (Alain observa que não existe virtude fraca). A virtude designa igualmente e por extensão, a eficácia ou aptidão real para agir que pertence propriamente a um objeto: a virtude de um medicamento, por exemplo. A virtude moral é uma disposição adquirida ou inata habitual para realizar o bem, segundo Aristóteles. Inimiga do excesso prejudicial ela situa-se no meio-termo. (1)

Potência, Poder: "A virtude de todo ímã não é doutra natureza que a cada uma de suas partes". Em termos morais, força moral, disposição permanente para fazer o bem ou, especialmente, para praticar certos deveres. (2)

Virtudes Cardeais. As quatro virtudes de que fala Platão em República e que estão entre as que Aristóteles chamava de virtudes morais ou éticas, a saber: prudência, justiça, temperança e fortaleza. 

S. Tomás procurou mostrar a oportunidade desse qualificativo, demonstrando que só as virtudes morais podem ser chamadas de Cardeais, ou principais, pois só elas exigem a disciplina dos desejos (rectitudo appetitus), na qual consiste a virtude perfeita; por isso, devem ser assim denominadas as virtudes morais às quais todas as outras se reduzem, isto é, as quatro acima referidas. (S. Th., II, 1, q. 51) (3) 

Virtudes teologais. Foram assim chamadas na Idade Média a fé, a esperança e a caridade, virtudes que dependiam de dons divinos e que visaram obter a bem-aventurança a que o homem não pode chegar só com as forças da sua natureza. Por esse caráter sobrenatural, as virtudes teologais distinguem-se das éticas e dianótica (v. dianoia). (3) 

Virtude. Chamam-se virtudes todos os hábitos constantes que levam o homem para o bem, quer como indivíduo, quer como espécie, quer pessoalmente, quer coletivamente. É esse o conceito de virtude (de vir, homem). É a potência racional que inclina o homem à prática de operações honestas, tendentes para o bem. Pode-se assim falar de virtudes morais e virtudes intelectuais. As que tendem para o bem honesto são morais, as que tendem para a verdade são as intelectuais. A caridade é uma virtude moral. As virtudes intelectuais, também chamadas especulativas, são a sabedoria, a ciência, etc. Vide Cardeais (Virtudes). (4)

Virtudes teologais. Assim como há as virtudes cardeais, adquiridas pelo hábito constante, há outras que nos parecem espontâneas, que não são produtos de um hábito humano, como a fé, a esperança e a caridade. Na ética religiosa são chamadas de teologais, porque não são produtos de um hábito, pois o homem não as adquire através do seu próprio esforço.

A fé é o assentimento do intelecto que crê, com constância e certeza, em alguma coisa. A prudência podemos adquiri-la, a pouco e pouco, como a fortaleza e alcançar, pelo nosso esforço, a justiça e a moderação. Mas para crer com constância e certeza em alguma coisa, não basta o nosso querer, é preciso que esse assentimento do nosso intelecto se dê espontaneamente. Ou com ela nascemos, ou subitamente ela aflora em nós, sem necessidade de termos dirigido para ela, conscientemente, qualquer de nossos esforços.

A esperança é a expectação de algo de superior e perfeito. Tem esperança aquele que aguarda algo de maior, de melhor, de mais perfeito, que venha a suceder. Ela não é o produto de nossa vontade, mas de uma espontaneidade, cujas raízes nos escapam, porque não é genuinamente uma manifestação do homem, mas algo que se manifesta pelo homem, porque não encontramos na estrutura da nossa vida biológica, nem da nossa vida intelectual, uma razão que a explique.

A caridade é a mãe de todas as virtudes, é a raiz de todas as virtudes, porque é a bondade suprema para consigo mesmo, para com os outros, para com o Ser Infinito. Supera a nossa natureza, porque graças a ela o homem avança além de si mesmo, além das suas exigências biológicas. É essa a razão porque na religião essas três virtudes, que Cristo nos apontou, são consideradas como vindas de uma raiz mais longínqua.

A palavra de Cristo é clara. A fé, a esperança e a caridade são as virtudes pelas quais o homem supera a si mesmo, e atinge a suprema perfeição. Todas as tentativas de explicar essas virtudes, com origem nos fatores emergentes e predisponentes, malograram. Elas não são o produto de uma prática, porque pode o homem praticar a caridade, sem tê-la no coração; pode exibir uma crença firme, sem alentá-la no seu âmago; e tentar revelar aos outros que é animado pela esperança. Assim podem praticar-se atos de fé, de esperança e de caridade, e estar-se ainda muito distante dessas três virtudes. Não basta desejar adquiri-las; é preciso tê-las. A ciência é um hábito, como o são também as outras virtudes, mas sem a presença dessas três, aquelas se apagam. O homem religioso e virtuoso afana-se em adquirir as virtudes cardeais, mas humildemente espera que nele se fortaleçam as teologais. (4)


(1) DUROZOI, G. e ROUSSEL, A. Dicionário de Filosofia. Tradução de Marina Appenzeller. Campinas, SP: Papirus, 1993.

(2) CUVILLIER, A. Pequeno Vocabulário da Língua Filosófica. São Paulo: Nacional, 1961. 

(3) ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Mestre Jou, 1970.

(4) SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed. São Paulo: Matese, 1965.