Explicação

Explicação. Do latim explicatio. 1. Segundo a tradição empirista, a explicação consiste no conhecimento das leis de coexistência ou de sucessão dos fenômenos, de seu "como": se uma descrição diz o que é um objeto, uma explicação mostra como ele é assim. Um fato particular é explicado quando fornecemos a lei da qual sua produção constitui um caso. 

2. Para os racionalistas (v. racionalismo), ao contrário, a explicação consiste na determinação das causas dos fenômenos, de seu "por quê", ou seja, em descobrir o consequente pré-formado em seus antecedentes, em deduzir os fatos à sua causa, a única causalidade causalidade inteligível sendo a adequação da causa ao efeito.

3. O trabalho da explicação, tipicamente uma atividade da ciência, reduz a explicação à descoberta das leis capazes de dar conta dos fenômenos. (1)

Explicação (explication). O fato de explicar, isto é, de dar a causa, o sentido ou a razão. O princípio de razão e o princípio de causalidade acarretam que todo fato, qualquer que seja, tem uma explicação: o inexplicável não existe. Note-se que essa explicação não tem, em si, nenhuma pretensão normativa, portanto não poderia valer como aprovação ou como justificação. O fato de ser possível explicar uma doença não a torna menos patológica ou menos grave. O fato de ser possível explicar o nazismo não o torna menos ignóbil, nem menos prenhe de consequências. Li várias vezes que a Shoah era, por natureza, inexplicável, que se devia declará-la assim, que só seria possível tentar explicá-la, sem nenhum proveito aliás, com a condição de negar primeiramente sua irredutível e atroz singularidade. É dar razão ao irracionalismo nazista e à noite contra as Luzes. Por que o nazismo seria inexplicável? E há algo mais explicável do que o racismo se tornar assassino, quando atinge esse grau de fanatismo e de ódio? Racismo de massa: crime de massa. É melhor tentar compreendê-lo, para combatê-lo. Mas quando se compreende, dirão, já não se pode julgar! É um equívoco. Não é a cancerologia que nos diz que o câncer é um mal; mas ele nos ajuda a combatê-lo. A explicação nunca faz as vezes de juízo de valor; nem juízo de valor de explicação. (2)

Explicar é desdobrar. Plica em latim significa dobra. Ex-plicare significa desdobrar, ou seja, abrir as dobras. Toda explicação nada mais é do que o desdobramento de alguma coisa; é o encadeamento das ideias no discurso falado ou escrito. A árvore veio da semente; muitos animais vieram do ovo. Disto resulta que na semente ou no ovo está contido todo o desenvolver daquela espécie de árvore ou de animal. Dar uma explicação das coisas é reconstituir todo esse processo de desdobramento. Nesse mister, uma explicação mais profunda, denominada filosófica, exige uma explicação desde o começo: explicatio ab ovo (explicação desde o primeiro ovo). (3) 

Explicação. Mais precisamente, explica-se um objeto de conhecimento mostrando que pode ser deduzido de verdades já admitidas ou de princípios evidentes. Se ativermo-nos a essa conduta dedutiva, chegaremos mais ou menos a longo prazo ao “inexplicado”, na medida em que a regressão no pensamento depara com princípios primeiros admitidos sem demonstração. Um exemplo dessa dificuldade é fornecido pelas provas clássicas de Deus: “explica-se” o mundo pela criação divina, mas a última é inexplicável, de certa forma por definição, e tem de ser admitida como “mistério”. Segundo alguns autores (Dilthey, Weber, Jaspers), a explicação seria o método próprio às ciências da natureza, por oposição à compreensão, que caracteriza as ciências humanas.(4)

Explicação. Dado que grande parte de nossa vida, tanto na atividade intelectual como fora dela, está relacionada à procura de explicações, seria desejável possuir um conceito do que deve ser entendido como uma boa explicação e do que distingue esta de uma má explicação. Sob a influência de perspectivas da estrutura da ciência na linha do positivismo lógico, admitiu-se que esse critério deveria ser encontrado numa certa relação lógica entre o explanans (o que dá a explicação) e o explanandum (o que está sendo explicado). Essa perspectiva culminou no modelo da cobertura por leis, segundo o qual um acontecimento é explicado quando está subordinado a uma lei da natureza, ou seja, sua ocorrência é dedutível dessa lei e de um conjunto de condições iniciais. As próprias leis seriam explicadas por serem deduzidas de leis de ordem mais elevada ou mais geral, da mesma maneira que as leis de Kepler do movimento dos planetas são dedutíveis das leis de Newton do movimento. O modelo da lei geral pode ser adaptado para dar conta do conceito de explicação nos casos em que se mostra que algo é provável dada uma lei estatística. Os problemas acerca das leis gerais incluem a questão de saber se as leis são necessárias para a explicação (todos os dias explicamos acontecimentos sem citar de forma explícita qualquer lei); se são suficientes (afirmar que é um exemplo de um tipo de coisa que acontece sempre pode não bastar para explicar um acontecimento); e se uma relação exclusivamente lógica é adequada para captar o que exigimos de uma explicação. Essa exigência pode incluir, por exemplo, que seja possível "intuir" o que está acontecendo, que a explicação se baseie em coisas que nos sejam familiares ou que não nos surpreendam. ou que possamos fornecer um modelo do que está se passando; mas nenhuma dessas noções é captada em termos de uma abordagem exclusivamente lógica. Por conseguinte, a investigação recente tem destacado a importância dos elementos contextuais e pragmáticos numa explicação, de tal forma que o que que pode ser tomado como uma boa explicação num certo conjunto de circunstâncias, pode não ser tomado como tal em outras. 

O argumento a favor da melhor explicação é o ponto de vista segundo o qual, desde que possamos selecionar a melhor explicação de um acontecimento a partir de um conjunto de explicações alternativas, existe legitimidade para aceitar essa explicação, ou mesmo para acreditar nela. Esse princípio precisa ser ajustado porque às vezes não é sensato ignorar a improbabilidade antecedente de uma hipótese que explique os dados melhor do que outras hipóteses concorrentes: e.g., no caso de uma moeda, a melhor explicação para ter saído cara 530 vezes em mil lançamentos pode ser a de que ela estava viciada de modo que a probabilidade de sair cara fosse 0,53, mas pode ser mais sensato supor que não estava viciada, ou que é melhor suspender o juízo. (5)

Explicação Funcional. Explicação de um fenômeno que utiliza como exemplo as propriedades funcionais dos elementos que o constituem, em vez de seus papeis físicos e mecânicos. Uma explicação do comportamento de um computador que cite o suporte lógico (software) que está sendo utilizado é uma explicação funcional. (5)

Explicar. (do lat. ex-plicare, de plica, prega, ex-plicare  é pois  des-pregar, desembrulhar,  revelar o que estava oculto). É tornar intelegível e claro o que se apresenta obscuro. Emprega-se assim o termo no sentido não só do que clareia, como do que expõe, do que desenvolve, do que explana. Nesse sentido apresenta variantes que incluem o sentido do que clareia, do que torna inteligível ou mais inteligível alguma coisa. Permite assim seu emprego uma escalaridade intensista, desde o mais simples ao mais complexo, desde o desvendar da verdade até o simples esclarecimento, o simples apontar. Na filosofia devemos sempre ter o cuidado de precisar em que grau intensista o usa o autor. (6)

(1) JAPIASSÚ, Hilton e MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. 5.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. 

(2) COMTE-SPONVILLE, André. Dicionário Filosófico. Tradução de Eduardo Brandão. 2. ed., São Paulo: Martins Fontes, 2011. 

(3) CIRNE-LIMA, C. Dialética para Principiantes. 2.ed., Porto Alegre: Edipucrs, 1979.

(4) DUROZOI, G. e ROUSSEL, A. Dicionário de Filosofia. Tradução de Marina Appenzeller. Campinas, SP: Papirus, 1993. 

(5) BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia. Consultoria da edição brasileira, Danilo Marcondes. Tradução de Desidério Murcho ... et al. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.

(6) SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed. São Paulo: Matese, 1965.