Razão

Razão. Em seu sentido original, parece ser aquele que a velha expressão “livro da razão sugere, e que significa registro discursivo de todo o movimento de uma casa: despesas, receitas, reformas, óbitos, nascimentos etc. Liga-se a ratus, particípio de reor (crer, pensar), e parece ter sobretudo como significado cálculo e relação, antes da época clássica.

Enquanto faculdade, diz-se da faculdade "de bem julgar", de raciocinar discursivamente: conhecimento natural enquanto oposto ao conhecimento revelado, objeto da fé.(1) 

Razão Preguiçosa. Raciocínio ou argumento que convence à inércia. Já Platão chamava de preguiçoso o argumento sofista de que é inútil procurar saber por que não se pode procurar saber nem aquilo que se sabe (uma vez que já se sabe) nem aquilo que não se sabe, uma vez que não se sabe o que procurar (Men., 86 b). Mas com o nome de razão preguiçosa chegou até nós especialmente um argumento de provável origem megárica, exposto pelo estoico Crisipo (Plutarco, Morália, II, p. 574 e; cf. Stoicorum fragmenta, II, p. 277), que Cícero assim relatou: "Se for teu destino curar-te dessa doença, vais curar-te recorrendo ou não a um médico. Assim também, se for teu destino não te curares dessa doença, não vais curar-te recorrendo ou não a um médico. Ora, teu destino é uma dessas duas coisas; portanto, de nada te adianta recorrer ao médico" (De Fato, 12, 28). Leibniz faz alusão a esse velho argumento megárico ou estoico (Teod., I, 55). Mais genericamente, Kant chama de razão preguiçosa "todo princípio que leve a considerar como absolutamente cumprida a investigação, de tal modo que a razão se tranquiliza, ao dar por cumprida a sua tarefa" (Crít. R. Pura). É neste sentido mais geral que essa expressão costuma ser usada até nossos dias. (2)

Razão, Idade da. Termo geralmente aplicado ao século 18, quando foi aceito com otimismo que todo o conhecimento, abrangendo a totalidade do universo, era possível de uma descoberta, explicação e compreensão racionais. A ideia medieval de que o conhecimento era revelado de forma divina enfraqueceu durante os séculos 16 e 17, através da criação dos métodos empíricos, que levaram à revolução científica na astronomia, física, medicina e matemática. Como a fé na revelação divina esmoreceu ante o racionalismo e a lógica do século 18, convicções religiosas, até então inquestionáveis, também cederam lugar à investigação e à procura de provas específicas. Os racionalistas julgavam a religião desnecessária, desencadeando a fúria do clero e do Estado.

A crença no poder ilimitado do intelecto humano possibilitou o aumento da autoconfiança, o que levou o indivíduo a privilegiar a busca da felicidade neste mundo, em detrimento da preparação do paraíso após a morte. Estas ideias encontraram expressão no trabalho dos filósofos, em sua grande maioria franceses, e entre os quais os enciclopedistas eram os mais influentes. Seu impacto político é encontrado no Iluminismo. Os assim chamados “déspotas esclarecidos” incluíam Frederico, o Grande,da Prússia, Catarina I, da Rússia, José II, imperador do Sacro Império Romano que, conscientes do Iluminismo, frequentemente estabeleceram com alguns filósofos, como Voltaire e Diderot. Os “déspotas esclarecidos” tentavam incutir algumas ideias iluministas dentro de seus Estados, de forma autoritária. (3)

Razões/Causas. Quando agimos por uma razão ela é uma causa de nossa ação? A explicação de uma ação, através da indicação da razão pela qual esta foi realizada é um tipo de explicação causal? A concepção que nega isso aponta a existência de uma relação lógica entre uma ação e sua razão: afirma-se que uma ação não o seria se não adquirisse sua identidade a partir do seu lugar no plano intencional do agente (seria apenas um exemplo de um comportamento, inexplicável por quaisquer razões). Razões e ações não são os acontecimentos "soltos e separados" entre os quais se registram relações causais. Na concepção contrária, apresentada por Davidson no seu influente artigo "Actions, reasons, and causes" (1963), sustenta-se que a existência de uma razão é um acontecimento mental e, a não ser que esse acontecimento esteja causalmente conectado com a ação, não podemos dizer que essa seja a razão pela qual a ação foi realizada. As ações podem ser realizadas por uma razão e não por outra, e a razão que as explica é aquela que foi causalmente eficaz, suscitando a ação. (4)

(1) LALANDE, A. Vocabulário Técnico e Crítico de Filosofia. Tradução por Fátima Sá Correia et al. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

(2) ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Mestre Jou, 1970.

(3) NOVA ENCICLOPÉDIA ILUSTRADA FOLHA. São Paulo: Folha, 1996.

(4) BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia. Consultoria da edição brasileira, Danilo Marcondes. Tradução de Desidério Murcho ... et al. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.