Determinismo

Determinismo. 1. Como princípio segundo o qual os fenômenos da natureza são regidos por leis, o determinismo é a condição de possibilidade da ciência: “A definição do determinismo pela previsão rigorosa dos fenômenos parece a única que a física pode aceitar, por ser a única realmente verificável (Louis de Broglie)

2. Doutrina filosófica que implica a negação do livre-arbítrio e segundo a qual tudo, no universo, inclusive a vontade humana, está submetido à necessidade. Com Descartes, a natureza é matemática em sua essência: uma natureza que não fosse matemática contradiria a ideia de perfeição divina. Para Spinoza, “não há na alma nenhuma vontade absoluta ou livre”. Em Kant, o determinismo deixa de ser metafísico para fazer parte da legislação que o espírito impõe às coisas para conhecê-las. Não há oposição entre determinismo e a liberdade, porque ele pertence à ordem dos fenômenos, enquanto a liberdade pertence à ordem numenal.  (1)

Determinismo. Todos os eventos e as ações são determinados no final das contas por causas alheias à vontade. (2)

Determinismo. A visão de que nada pode acontecer exceto o que realmente acontece, porque todo evento é o resultado necessário das causas que precedem - e elas próprias foram o resultado necessário das causas que as precederam. (cf. indeterminismo) (3)

Determinismo. a) A doutrina ontológica de que tudo ocorre segundo leis ou por desígnio. O determinismo tradicional admitia apenas determinação causa, teleológica (dirigida para meta), e divina. O determinismo científico contemporâneo é em alguns aspectos mais amplo e, em outros, mas estreito: é idêntico ao princípio da legalidade, juntamente com o princípio ex nihilo nihil fit. b) Determinismo causal - Todo evento tem uma causa. Isto é somente em parte verdade, porque há processos espontâneos, como a desintegração radioativa espontânea e a descarga neurônica, bem como as leis probabilísticas. c) Determinismo genético - Nós somos o que os nossos genomas prescrevem. Isto é apenas parcialmente verdade, porque os fatores ambientais são tão importantes quanto os dons genéticos e porque a criatividade (criação) é inegável. (4)

Princípio de legalidade (legitimidade). A hipótese de que todos os fatos estão sob a égide de leis e, portanto, são legítimos. Esta hipótese ontológica corrobora a pesquisa científica. (4)

Ex nihilo nihil fit. Do nada nada vem e no nada nada entra. Este princípio, devido a Epicuro e Lucrécio, é a mais antiga e a mais geral enunciação do princípio de conservação da matéria. (4)

Ex falso sequitur quodlibet - Da falsidade segue-se qualquer coisa. Princípio da explosão. Prova: se p ==> q for verdade, e p for falso, então o arbitrário q será verdadeiro  porque p ==> q = df p v q. Moral: A falsidade não é apenas má em si mesma, mas também porque gera arbitrariamente muitas proposições, verdadeiras ou falsas, pertinentes ou irrelevantes. (4)

Determinismo. a) Doutrina que se opõe ao indeterminismo. Doutrinariamente considerado, afirma que todos os fatos do universo são guiados inteiramente por  determinantes, segundo certas leis. Assim, no atomismo de Demócrito, os átomos são determinados por causas mecânicas.

b) O determinismo em geral, no campo psicológico, afirma que todas as direções da nossa vontade estão determinadas de modo unívoco por um conjunto de motivos atuantes. A doutrina indeterminista, levada aos seus exageros, defendeu a liberdade da vontade como uma força dirigida a um querer sem causa nem motivo e provocou a reação da doutrina determinista. O determinismo invoca sempre a lei da causalidade, sem contudo exigir para essa uma causa suficiente.  (Vide Causalidade e Princípio).

Para essa concepção, todo fato está univocamente predeterminado em sua causa. Para as concepções deterministas na psicologia, a consciência da liberdade é apenas uma ilusão, por desconhecer as tendências determinantes, os móveis inconscientes. Entretanto, esquecem que os defensores da liberdade da vontade não negam tais processos inconscientes, nem tampouco afirmam um querer sem causa nem motivo. Os deterministas dizem que, no estudo mais aprofundado que o homem possa fazer de sua vida psíquica, encontraria ele uma regularidade, que revelaria as leis que operam em seus atos. Entretanto, os defensores da liberdade sabem que não há nenhum querer sem motivo. São deterministas o materialismo, o panteísmo, o positivismo, o pragmatismo, o racionalismo, o biologismo, etc. Vide Arbítrio, livre.  

Análise: Não exporemos a longa polêmica entre os deterministas e os livre-arbitristas. Esse problema se desloca desde o momento que compreendamos que o determinismo é um conceito da razão, e a ideia da liberdade nos é dada pela intuição, pela intuição direta, que cada um de nós tem de sua própria experiência.

Para Goblot: "Doutrina segundo a qual todo fenômeno é determinado pelas circunstâncias nas quais ele se produz, de forma que, dado um estado de coisas, o estado de coisas que lhe segue, dele resulta necessariamente."

A fórmula do determinismo é causa aequat effectum, causa = efeito, ou efeito = causa, ou ainda: a soma dos antecedentes = consequente, ou consequente = soma dos antecedentes. Mas a causa e efeito sucedem no tempo, e eis aqui um elemento importante que modifica tudo: causa + tempo = efeito; ou soma dos antecedentes + tempo = consequente.

Já não podemos reverter a fórmula porque o tempo é irreversível, porque o tempo não é um elemento estático, transportável. Deste modo, não há semelhança qualitativa entre causa e efeito, mas apenas uma semelhança quantitativa. Ora, como a razão dos racionalistas prefere sempre a quantidade, e quer reduzir tudo a esta, julga que pode reduzir o efeito à causa, igualizando-as. Mas essa igualização é apenas abstrata porque, se examinarmos bem, também não procede, porque há mutação qualitativa.

Se dizemos: H2 + O = H2O (água), realmente parece estar no segundo termo tudo quanto continha o primeiro. Tudo que tinha no antecendente está no consequente, mas sucede que o consequente é qualitativamente diferente. Dois átomos de hidrogênio com um de oxigênio, formam uma molécula de água. Mas a água é especificamente diferente. O efeito é igual à causa apenas quantitativamente.

No axioma de Clausius: "O calor passa de um corpo quente a um corpo frio e não em sentido inverso". Toda a natureza nos mostra a irreversibilidade dos fenômenos. A mudança se faz num única direção. Não podemos reverter a história, e esse é o sentido que hoje toma toda a ciência e todo o saber: o reconhecimento da historicidade de tudo quanto sucede.

A noção de causa e efeito é dada pela experiência, mas a sua ligação necessária é dada pela razão, através do princípio de razão suficiente que domina no mundo lógico. O princípio de identidade, aplicado ao tempo, gerou o princípio de causalidade. (5)


(1) JAPIASSÚ, Hilton e MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. 5.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.

(2) LEVENE, Lesley. Penso, Logo Existo: Tudo o que Você Precisa Saber sobre Filosofia. Tradução de Debora Fleck. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013.

(3) VÁRIOS COLABORADORES. O Livro da Filosofia. Tradução de Rosemarie Ziegelmaier. São Paulo: Globo, 2011.

(4) BUNGE, M. Dicionário de Filosofia. Tradução de Gita K. Guinsburg. São Paulo: Perspectivas, 2002. (Coleção Big Bang)

(5) SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed. São Paulo: Matese, 1965.