Daimon

Daimon. 1. A crença em espíritos sobrenaturais um pouco menos antropomorfizados do que os Olímpicos é uma característica muito recuada da religião popular grega; um certo daimon está ligado a uma pessoa ao nascer e determina, para o bem ou para o mal, o seu destino (confrontar a palavra grega para felicidade, eudaimonia, que tem um bom daimon). Heráclito protestou contra esta crença, mas sem grande feito. Na concepção xamanística da psyche, daimon é um outro nome para a alma, refletindo provavelmente as suas origens divinas e poderes extraordinários. Sócrates está, pelo menos parcialmente, dentro da tradição religiosa arcaica quando fala do seu "algo divino" (daimonion ti) que o aconselha a evitar certas ações; a sua operação é consideravelmente mais vasta no relato de Xenofonte nas Mem. I, 1,4; notável é o uso constante que Sócrates faz da forma impessoal da palavra ou do sinônimo "sinal divino", talvez a ligeira correção do racionalista daquilo que era uma crença popular contemporânea na adivinhação, mensagens de sonhos divinos, profecias etc., uma crença que Sócrates compartilhava. É provavelmente um erro pensar que Sócrates ou os seus contemporâneos distinguissem com muito cuidado daimon de theion, visto que a defesa socrática contra o ateísmo no Apol. 27d, assenta num argumento de que acreditar nos daimones é acreditar nos deuses.

2. A ideia do daimon como uma espécie de "anjo da guarda" ainda é visível em Platão (Rep. 620d), embora uma tentativa de fuga ao fatalismo implícito na crença popular pelo fato das almas individuais escolherem já o seu próprio daimon (Rep. 617e). Se este daimon individual está ou não dentro de nós foi muito discutido na filosofia posterior.

3. Mas uma outra noção, a do daimon como uma figura intermédia entre os Olímpicos e os mortais, está também presente em Platão. Os verdadeiros deuses habitavam o aither enquanto os daimones menores habitavam o aer inferior e exerciam uma providência direta sobre as ações dos homens.

4. Plutarco tem uma demonologia altamente desenvolvida, e com o seu típico conservantismo religioso ele delineia o culto desses intermediários recuando até às fontes oriental e grega primitiva. (1)

(1) PETERS, F. E. Termos Filosóficos Gregos: Um Léxico Histórico. Tradução Beatriz Rodrigues Barbosa. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouse Gulbenkian, 1983.