Classificação das Ciências

Classificação das Ciências. A unidade da ciência funda-se na unidade de seu objeto. Devemos distinguir um objeto material de um objeto formal. O primeiro é aquele objeto concreto para o qual se dirigem as ciências. O segundo é o aspecto particular em que é considerado o primeiro. É precisamente este objeto que caracteriza a ciência, visto que o material pode ser comum a várias. A variedade do objeto formal permitiu a especialização científica, como também a classificação das ciências.

Dividiam os antigos filósofos a ciência em teorética ou especulativa e ciência prática. A primeira corresponde propriamente à filosofia especulativa e a segunda à atividade humana, que era dividida em meramente ativa e a factiva, que se dedicava às realizações práxicas. Mas além dessa classificação que visualizava apenas o fim da ciência, havia a divisão segundo o objeto material da mesma, que era distinguido em objeto intencional, cuja disciplina é a lógica, e objeto real, à qual pertencem a física, como ciência fundada no primeiro grau da abstração (vide), a matemática, fundada nas abstrações de segundo grau e, finalmente, a metafísica, fundada nas abstrações de terceiro grau. Nessa classificação incluíam-se, ainda, as ciências subordinadas a essas três.

Para Comte a ciência abstrata ou geral tem por objeto as leis que regem certa classe de fenômenos; a ciência concreta, geralmente chamada de natural que consiste na aplicação dessas leis à história efetiva de diferentes seres existentes. Vê-se que Comte tem um sentido muito particular do que seja abstrato e concreto.

Spencer chama de ciências abstratas a lógica e a matemática, que têm por objeto as relações abstratas, sob as quais se nos apresentam os fenômenos, as formas vazias, com ajuda das quais os concebemos; e ciências concretas, as que têm por objeto os próprios fenômenos. E distingue: ciências abstrato-concretas, como a mecânica, a física, a química; e ciências completamente concretas: a astronomia, a geologia, a biologia, a psicologia, a sociologia, etc.

Numerosas são as divergências entre os filósofos ante a classificação das ciências. As de Dilthey e Windelband revelam uma outra fase da ciência. Esta, depois de estar unida à filosofia, separou-se dela para tornar novamente em certos pontos a confundir-se com ela. Sinteticamente, partindo do objeto da ciência, podem ser classificadas como: a) ciências de objeto real: ciências da natureza e as do espírito; b) ciências de objeto ideal- por exemplo as matemáticas. Críticas se poderiam fazer a essas classificações. É preciso distinguir bem as relações entre essas ciências e a filosofia. O critério dos objetos não é o único, pois é preciso considerar também a finalidade das ciências, o problema das chamadas ciências normativas, se, por exemplo, a técnica é um fazer e não um saber, e se ela pode ser eliminada da estrutura do saber científico (o que não admitimos) e, a fundamentação filosófica do saber teórico, o que vincula uma ciência particular com as outras e com o geral. Desta forma inúmeros problemas ficam propostos, os quais a filosofia terá de discutir e dar-lhes soluções.

Todo pensamento é pensamento de algo, e este algo é o objeto do pensamento, que jamais se identifica com ele. Penso: "este livro está em cima da mesa". O objeto do pensamento é estar este livro em cima da mesa. É uma situação especial deste livro, que poderia estar em outro lugar, na estante, como estará amanhã, certamente. Esta situação não é algo material nem está no espaço, mas o livro e a mesa estão. Assim o estuda a lógica formal, para a qual o objeto tem uma vasta extensão. Tudo o que é capaz de admitir um predicado qualquer, tudo o que pode ser sujeito de um juízo é objeto. É a noção da lógica. O livro é alguma coisa de que temos consciência por uma experiência sensível, por percepção externa. É um objeto físico. Todos esses objetos são temporais; estão imersos no que se chama o curso do tempo. Mas esse livro está além do tempo, no espaço também. Os objetos psíquicos estão no tempo, não no espaço. Uma representação, uma emoção não ocupam espaço. Isso não quer dizer que os objetos psíquicos não tenham uma referência espacial indireta; pois todo fato de consciência pertence a um sujeito consciente, que embora não seja espacial, está adscrito a um corpo.

Mas há objetos que não estão nem no tempo nem no espaço; são os objetos ideais, por exemplo, os números, as figuras geométricas, as relações, os conceitos e os pensamentos em geral (não o pensar, como ato psicológico, que está no tempo). Temos os objetos chamados de objetos metafísicos, como a coisa-em-si de Kant, a substância, que são conhecidos através do raciocínio segundo alguns filósofos, ou por atos imediatos, como a intuição intelectual de Schelling, ou pela intuição não-racional de Bergson, ou pela intuição mística, etc. Temos os valores que são qualidades de uma ordem muito especial.

Fundando-nos no objeto podemos chegar a uma classificação da ciência: Ciências da natureza, cujo objeto é a natureza como conjunto de todos os seres tempo-espaciais, a realidade corporal, tanto inorgânica como orgânica, enquanto não é produto da ação humana. O corpo homem é um objeto natural.

 Ciências do espírito (culturais) que estuda o âmbito propriamente humano da realidade, o homem em sua peculiaridade e como criador, do mundo da cultura e da própria cultura. Enfim, todo o objeto cultural; tudo quando ele cria ou modifica.

Modernamente as classificações da ciência dão a esta um âmbito muito maior, fundindo-se novamente em alguns aspectos com a filosofia, que permanece sendo o saber do geral, com o todo como objeto, enquanto as ciências têm por objeto o particular ônticamente considerado. O ontológico permanece sendo objeto da filosofia, e a ciência permanece no terreno do ôntico, sem transcendê-lo. Entretanto veremos que tal é impossível, porque a ciência penetra no terreno da filosofia, como está penetra no terreno da ciência. (1)

(1) SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed. São Paulo: Matese, 1965.