ARTIGOS DIVERSOS

Conversão: passar de dono a servo 


Ir. Timótea Kronschnabl, OSB (Argentina)

fevereiro de 2021

Quaresma é tempo de conversão. Um aspecto básico da conversão é passar da nossa tendência de querer ser dono de tudo, para assumir nossa verdadeira condição e vocação: ser servo. Em Gn 2,15 lemos: “Javé Deus tomou o homem e o colocou no jardim de Éden, para que o cultivasse e guardasse.” (cultivar e guardar significam servir). 


O dono é autônomo, determina e decide tudo por si. O servo segue ordens e se subordina a regulamentos. Ele guarda e cuida em nome do dono. Ser servo significa, muitas vezes, ser escolhido para executar uma decisão. Não somos donos, somos servos, administradores, colaboradores, encarregados que devem responder por sua tarefa. 


Ser servo é muito diferente de ser escravo. O escravo é um ser aprisionado, comprado e vendido como uma mercadoria. Nossos impulsos negativos nos levam a dependências e nos escravizam. Somente a graça redentora, que Deus derrama por Jesus Cristo sobre nós, e o humilde reconhecimento de nossas faltas podem libertar-nos da escravidão do pecado. O servo bom caracteriza-se por seu amor, sua doação, sua entrega. 


Ser Servo – uma honra 


Justamente por isso, “ser servo” é um título de honra na Bíblia. Os patriarcas Abraão, Isaac e Jacó são chamados de “meu servo”. De Moisés lemos em Nm 12,7: “Não acontece assim com meu servo Moisés, que é homem de confiança em toda a minha casa, com ele eu falo face a face.” Os profetas são servos. Elias reza: “…eu sou teu servo e foi por tua ordem que fiz estas coisas.” (1Rs 18,36) 


Todo o povo de Israel foi eleito para ser servo de Deus, mas não foi um servo fiel. Assim Deus busca um novo servo, em quem põe seu espírito. É uma pessoa mansa, modesta, perseverante, justa e pacienciosa; sempre atento às necessidades do próximo. Sua missão é ser luz e libertação para todas as nações. (cf. 1º cântico: Is 42,1-9) 


Este servo se sabe chamado desde o seio materno e é fiel. É preparado com uma língua como espada e protegido pela mão de Javé. Deve ser luz para as nações, para que a salvação de Deus chegue aos confins da terra. (cf.2º cântico: Is 49,1-13) 


Servo - discípulo 


Este servo também é um discípulo fiel, que tem os ouvidos abertos para escutar a palavra e não faz resistência e nem recua. Tem a capacidade de falar como discípulo e sabe assim ajudar os desanimados com uma palavra de coragem, sabe consolar aos tristes e ensinar aos que necessitam de luz. (cf. 3ºcântico: Is 50,4-11) 


Servo sofredor 


Depois de falar dos lados positivos de ser servo, os Cânticos 3 e 4 apresentam o sofrimento do servo. Julgado injustamente, ele enfrenta hostilidades e agressão física, apresenta as costas e oferece o queixo para arrancarem-lhe a barba; sofre insultos e escarros, perdendo a aparência humana e a beleza. Como cordeiro é levado ao matadouro. Oprimido e humilhado, o servo não abre a boca. São imagens da humilde entrega deste servo. (cf. Is 50,4-11; 52,13-53,12) 


Servo que expia a culpa dos outros 


Apesar do tratamento injusto, o servo sofre em silêncio. Ele é castigado por causa da revolta de outros, mas não pede vingança. Entrega sua vida como expiação e suas feridas curam a multidão. (cf. Is 53,10-11) 



Jesus, servo por excelência 



Este servo descrito pelo profeta Isaías é Jesus, o servo por excelência. Ele é o verdadeiro dono, como lemos no início do Evangelho de São João: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus… Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi feito.” (Jn 1,1ss) Por seu amor imenso ele, na sua encarnação, se fez um de nós com todas as consequências. “Ele tinha a condição divina, mas não se apegou a sua igualdade com Deus. Pelo contrário, esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de servo… humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte e morte de cruz.” (Fil 2,6-8) Jesus é o mestre manso e humilde de coração (Mt 11,19) que anuncia a salvação para os pobres (Lc 4,18s) e está em meio de seus discípulos como alguém que serve. Ama até ao extremo (Jo 13,1). Morre como um criminoso (Lc 22,37) 


A Idade Média cultivou uma veneração mística: Cristo como pisador no lagar, baseada em Is 63,3: “Pisei sozinho no lagar.” Era representado com as vestes embebidas do sumo das uvas e com seu sangue. 



Convite para servir 


Meditemos as palavras da última homilia de Oscar Romero, proferido 10 segundos antes de ser assassinado: “Aquele que se entrega por amor de Cristo ao serviço dos outros, viverá como um grão de trigo, que morre, mas morre aparentemente. Se não morrer, fica sozinho. A colheita acontece, porque morre, porque se deixa imolar… Que este corpo imolado e este sangue sacrificado nos encorajem também para dar nosso corpo e nosso sangue ao sofrimento e à dor, como Cristo, não para si, mas pela justiça e pela paz do nosso povo…” 


Maria, a serva que se entrega 


“Eis a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra.” Estas palavras de Maria possibilitaram a encarnação do Verbo. São até hoje o grande convite para pedir a Maria que nos tome pela mão no nosso caminho da conversão. Fiquemos com Maria ao pé da cruz para pedir a graça de entender melhor a nobre missão de servir. 



Para a reflexão 


Is 42,1-9;     49,1-13;    50,4-11;   

52,12-53,12;      Fil 2,3-11 



O QUARTO EVANGELHO

por Dom Henrique Soares da Costa   Da Igreja de Maceió

“A flor de toda a Sagrada Escritura é o evangelho, e a flor do evangelho é o evangelho que nos foi transmitido por João, cujo sentido profundo e oculto ninguém conseguirá compreender em toda a plenitude”.

“Ninguém pode captar o sentido do evangelho de João se não reclina a cabeça sobre o peito de Jesus e não recebe de Jesus Maria por Mãe”.

(Orígenes)

I. Observações preliminares 

O Quarto Evangelho é um evangelho diferente dos sinóticos. Será mesmo um evangelho ou antes uma meditação especulativa, meio hermética e até gnóstica, sobre o Cristo? Será histórico, o chamado Evangelho segundo João?

Trata-se de uma obra diversa dos demais evangelhos: ignora vocábulos caros aos sinóticos (por exemplo: não há as palavras apóstolos, evangelho, batismo, publicano, anunciar, conversão, escriba, etc). O texto contém extravagâncias: duas conclusões (cf. 20,30s e 21,24s); em 14,31 Jesus levanta-se da ceia... e depois o seu discurso continua; o modo de falar de Jesus é totalmente diverso dos sinóticos: longos discursos, numa forma monótona, repetitiva e ondulada; os temas tratados por Jesus são bem diversos: o Senhor não prega o Reino, mas a si próprio (basta pensar na abundância da expressão “EU SOU”); faltam também alguns outros temas importantes, recorrentes nos sinóticos: a infância de Jesus, as tentações, o sermão da montanha, o ensino em parábolas, as expulsões dos demônios, a transfiguração, a instituição da Eucaristia... Por outro lado, apresenta material que não consta nos sinóticos: as alegorias do Bom Pastor, da porta, do grão de trigo e da videira, o discurso sobre o pão da vida, o da ceia, a oração sacerdotal, os episódios das bodas de Cana, da ressurreição de Lázaro e do lava-pés, os diálogos com Nicodemos e com a samaritana... Enquanto nos sinóticos o ministério de Jesus dá-se quase por inteiro na Galileia, a maior parte do Quarto Evangelho passa-se na Judeia, com poucas cenas na Galileia. Os discursos de Jesus são numerosos e longos, ao passo que são poucos os episódios narrativos. 

No entanto, trata-se de um Evangelho (= Boa Nova): é um anúncio das palavras e obras de Jesus como mensagem salvífica a ser aceita na fé. Como os sinóticos, trata-se de um anúncio de Jesus como Messias e Filho de Deus (cf. 20,31). O Quarto Evangelho não pretende completar os sinóticos; é sim uma tradição independente, que apresenta de um modo todo próprio o mistério de Cristo! 

II. Autor, data, destinatários, história literária

Muito se estuda e muito se diz sobre o Quarto Evangelho. Segundo a tradição, seu autor é João, filho Zebedeu e irmão de Tiago Maior, um dos Doze. Seria ele o “Discípulo Amado” ou “o outro discípulo”, que aparece ao lado de Pedro. Um problema é explicar como esse João, um simples pescador galileu era “conhecido do Sumo Sacerdote” (cf. 18,15).

Segundo alguns bons estudiosos, poderíamos, hoje, pensar a formação do evangelho do seguinte modo:

(1) O Discípulo Amado é realmente João, testemunha ocular da história de Jesus e pregador do Evangelho. Com Jesus manteve diálogo íntimo e profundo e ocupou posição de prestígio, junto com Pedro: foi ele quem “viu e acreditou” (cf. 20,28): o “ver” é histórico-testemunhal, o “acreditar” é a leitura fiel do fato, a interpretação religiosa do acontecimento. Ao que tudo indica, este discípulo fora seguidor de João Batista e depois passou para Jesus. São dele as afirmações sobre o Batista: “ele não era a luz, mas viera para dar testemunho da luz” (1,8), não era o Cristo, nem o Esposo, mas apenas o amigo do Esposo (cf. 3,28-30), não realizou sinal algum, mas tudo que disse sobre Jesus era verdade (cf. 10,41). Certamente João não escreveu nada – o texto do Quarto Evangelho é de um grego bom demais para um pescador da Galiléia -, mas João é o fundamento da tradição escrita que viria depois dele. Ele realmente é o pai da tradição joanina!

(2) Do Discípulo Amado surgiu toda uma tradição. A história de Jesus de Nazaré é vista como símbolo e revelação de uma realidade superior que somente pode ser desvendada através da fé. Neste processo inserem-se os sete milagres de Jesus, chamados de sinais, que revelam juntamente com os discursos, quem é Jesus (mais uma vez, observe-se a importância dos “Eu Sou”). Também a paixão-morte-ressurreição são apresentadas de um modo novo. Por seu fundamento no apóstolo João, esta tradição tem profundo conhecimento da topografia da Palestina e da liturgia do Templo. Podemos afirmar que esta tradição já aparece difundida na Palestina antes do ano 70, em língua aramaica (pensem-se nos termos hebraicos e aramaicos usados por João).

(3) A tradição foi posteriormente cristalizada na primeira edição do evangelho, escrito em grego, com a conclusão em Jo 20,30-31. O evangelista (isto é, quem redigiu a tradição deixada pelo apóstolo João) é, portanto, este teólogo que vive no mundo grego, na Ásia Menor, e dirige-se aos judeus-cristãos de cultura grega que aí viviam. Os símbolos de João são bíblicos, há inúmeras referências às festas judaicas e alusões às Escrituras: o dualismo moral tão caro a Qumran, o Verbo que arma a tenda (ekénosen = skn = shekinhah). Há também várias alusões à excomunhão que os cristãos sofreram por parte da sinagoga lá pelo ano 90. Aos judeus-cristãos, refutados pelos judeus, o evangelista convida a permanecer na palavra de Jesus e no seu amor (cf. 8,31; 15,7.9)... “para que continueis a acreditar que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus... e tenhais a vida em seu nome” (20,31).

(4) Finalmente, numa segunda edição, além de alguns retoques internos, acrescentou-se o capítulo 21, com nova conclusão geral, exaltando o Discípulo Amado; tanto ele quanto Pedro morrerão; ficará a Igreja com as duas testemunhas: a tradição joanina e o ministério de Pedro (cf. Jo 21,22s; 21,19; 21,15ss). Assim, com toda certeza, o Evangelho de João encontrou sua redação final já entre os anos 90 e 100 de nossa era. 

III. O Jesus de João 

Para João, Cristo é o Enviado, revelador do Pai. É o Filho de Deus, Senhor, Salvador, pão da vida, luz do mundo, bom pastor, caminho, verdade e vida, ressurreição, verdadeira videira e Verbo encarnado.

João tem um núcleo histórico e apresenta o Jesus histórico, mas seu evangelho não é primariamente uma narração historicamente fidedigna no sentido atual nem é uma crônica de fatos ligados a Jesus de Nazaré. Trata-se, antes, do sentido soteriológico (= salvífico) de sua vida, morte e ressurreição e, mais ainda, de sua Pessoa. O evangelho de João não dissolve a história, mas nos fatos históricos descobre uma significação profunda, que aponta para a identidade e am issão de Jesus, o filho de Deus, revelador único e absoluto do Pai: seu fundamento é a consciência da importância histórica, concreta de Jesus: “O Verbo se fez carne e armou tenda entre nós!” (1,14).

No entanto, a linguagem dos discursos de Jesus não é de Jesus, mas do evangelista (basta comparar com as epístolas e as palavras do próprio Batista – cf. Jo 3,27-36)! Isso não quer dizer que o evangelista tenha imposto uma teologia sua a Jesus, tenha inventado um Jesus: em João, Jesus revela-se a si mesmo como o Salvador e caminho para o Pai, já que dele vem. A intenção do evangelista é explicitar a revelação acontecida na pessoa e na história de Jesus de Nazaré; com sua linguagem própria, ele transmite o que o Senhor revelou e o que a Comunidade eclesial experimentou na fé (cf. 3,11; 21,24). João, numa teologia bem desenvolvida, contempla Jesus do alto da sua glória de ressuscitado. A gente somente compreende bem o Jesus de João e seus gestos e palavras, quando o contempla como o Glorioso-Ressuscitado! Na pobreza dos dias terrenos de Jesus, João deseja mostrar a glória do Filho de Deus. 

IV. Uma proposta de leitura de João

Um esquema do Evangelho de João é muitíssimo discutido. Sendo assim, apresentaremos apenas algumas pistas para a leitura. 

A. PRÓLOGO (1,1-18)

Trata-se de um hino oriundo dos círculos joaninos que fala da revelação de Deus, de como ele se explicou para nós: através do seu Verbo existente desde o princípio e, depois, feito carne.

Esquema:

A. O Verbo voltado para Deus (vv. 1-2) A’. O Filho no seio do Pai (v. 18)

B. Papel na criação (v. 3) B’. Papel na recriação (v. 17)

C. Dádiva à humanidade (vv. 4-5) C’. Dádiva à humanidade (v. 16)

D. Testemunho de João (vv. 6-8) D’. Testemunho de João (v. 15)

E. O Verbo vem ao mundo (vv. 9-11) E’. O Verbo se faz carne (v. 14)

F. Por intermédio do Verbo nos tornamos filhos de Deus (vv. 12-13)

B. O LIVRO DOS SINAIS (1,19 – 12,50)

Apresenta o ministério de Jesus: por sinais e palavras ele se mostra ao seu povo como revelação do Pai. O resultado é a rejeição.

a) A semana inaugural:

 Primeiro dia (vv. 19-28), segundo dia (vv. 29-34), terceiro dia (vv. 35-39), quarto dia (vv. 40-42), quinto dia (vv. 43-51), sétimo dia (vv. 2,1-11): “No terceiro dia houve núpcias e ele manifestou a sua glória e seus discípulos creram nele”.


b) Os sete sinais:

O primeiro sinal: a água transformada em vinho (2,1-11): o vinho de Jesus é o último a ser servido, é o melhor e mais abundante: o Cristo fulgura no seu sinal, que produz a fé dos discípulos.

A isso seguem-se três narrativas com a mesma lógica de recriação e superação: a purificação do Templo (Jesus é o novo templo); o encontro com Nicodemos, judeu que estuda Jesus e vem procurá-lo nas trevas (é necessário nascer do Alto, pela água e o Espírito) e o encontro com a Samaritana (Jesus é o Salvador do mundo que dá á água da vida; por ele é possível adorar o Pai em espírito e verdade, superando Jerusalém e o Monte Garizim).

O segundo sinal: a cura do funcionário real em Caná (4,43-54), encerra esta seção. ”Se não virdes sinais não acreditareis...” – Jesus relativiza os sinais: são importantes se levam ao entendimento. Observe-se que o funcionário é um pagão (o centurião?), como os samaritanos que creram. Este sinal, onde Jesus age somente pela sua palavra, já prepara o próximo... 

Dos capítulos 5 – 10 são as festas judaicas que servem de marcos para a revelação de Jesus.

O terceiro sinal: a cura do paralítico de Betesda, numa Festa (segundo muitos Pentecostes, festa dos sete sábados): ele faz o que somente Deus pode fazer no sábado; ele tem o poder de julgar.

O quarto sinal: a multiplicação dos pães, numa festa da Páscoa: Jesus é o novo Pão, o novo ázimo: pão de sua Palavra, de sua Carne e seu Sangue. (Na purificação do Templo Jesus já havia expulsado as ovelhas e os bois: ele é o novo Cordeiro!).

O quinto sinal: Jesus caminha à noite sobre as águas: evocação do Êxodo, juntamente com a multiplicação dos pães. Ele se revela como o EU SOU!

O sexto sinal: a cura do cego de nascença, na Festa dos Tabernáculos (procissão de luzes e água lustral de Siloé): Cristo dá a vista ao cego, mandando-o lavar-se em Siloé: “quem tem sede venha a mim e beba!” – promessa do Espírito.

O sétimo sinal: Jesus ressuscita Lázaro logo após a Festa da Dedicação: ele se apresenta como o verdadeiro Consagrado-Dedicado ao Pai. A ressurreição de Lázaro é antecipação da de Jesus e da dos que nele acreditam: “Os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus; os que a tiverem ouvido, viverão!” O óleo de Maria guardado para a sepultura e o grão de trigo que cai e morre ligam a morte de Lázaro à de Jesus. 

c) A conclusão final: a rejeição de Jesus (12,37-50) 

C. O LIVRO DA GLÓRIA

Aos que o aceitam Jesus revela sua glória, retornando ao Pai pela sua Páscoa. Plenamente glorificado, ele comunica o Espírito de vida.

A Última Ceia, com o lava-pés, gesto de extrema humilhação (segundo O. Cullmann é representação não somente da morte como também da Eucaristia, carne e sangue oferecidos ao homem).

O último discurso, centrado nos temas da fé e do amor. – agora o preceito já não mais é amar o próximo como a si mesmo, mas como Jesus que dá a vida. Jesus promete por cinco vezes o Paráclito e termina confiando ao Pai sua Comunidade.

A narrativa da paixão. Cristo é preso numa cena epifânica (EU SOU). A narrativa desenvolve-se em quatro cenas: no jardim, o Eu Sou; o processo judaico, o processo romano que se dá em torno das ideias de “rei” e de “verdade”; finalmente a cruz, que revela a verdadeira realeza de Jesus. Com o “Está consumado!” Jesus, do alto, celebra seu triunfo. A cena do lado aberto é de rico significado...

Jesus ressuscitado: é necessário um olhar diferente para reconhecê-lo; já não se pode retê-lo – ele é transcendente. O Ressuscitado doa o Espírito. 

D. COMPLEMENTO 

O capítulo 21 é complemento posterior, resultado da segunda redação. Pedro e João, as testemunhas desaparecem: permanece a Igreja, com o ministério petrino, que deve amar e apascentar e a certeza de ser amada pelo Senhor. Assim encerra-se uma época – a das primeiras testemunhas.

Conclusão geral (20,30-31) 

V. Conclusão 

Ler e meditar o Evangelho de João é uma verdadeira experiência mística de Cristo. É um texto para ser saboreado num clima de oração, docilidade ao Espírito Santo e profundo espírito de fé e intimidade com o Senhor.

Além de apresentar o mistério de Cristo deu m modo saborosíssimo, João apresenta-nos os temas fundamentais da fé e do amor, a revelação mais completa dos mistérios da Santíssima Trindade e da Encarnação do Verbo, Filho eterno e Unigênito no seio do Pai, que nos torna filhos adotivos. Apresenta-nos também pontos sobre a doutrina a respeito da Igreja (cf. 10,1-18; 15,1-17; 21,15-17) e dos sacramentos (cf. 3,1-8; 6,51-59; 20,22-23) e apresenta-nos muito sobre o papel da Virgem Maria, a “Mulher”, nova Eva, Mãe da nova humanidade resgatada (cf. 2,1-5; 19,25-27).

Por tudo isso, vale a pena uma leitura meditada, estudiosa e orante do Quarto Evangelho.

fonte: http://www.domhenrique.com.br/index.php/estudos-biblicos/341-o-quarto-evangelho


Missa Tridentina

Publicada em 20/02/2020 PELO Diário de Sorocaba  - (Diário de Sorocaba - Missa Tridentina)

Dom Julio Endi Akamine, SAC 

O que significa ‘missa tridentina’? Na Arquidiocese de Sorocaba, celebra-se ‘missa tridentina’?

 

Há duas formas de celebrar: a forma extraordinária e a forma ordinária do Missal Romano promulgado pelo Papa São Paulo VI. A forma extraordinária é assim chamada porque o uso do Missal antigo pressupõe um certo grau de formação litúrgica e o conhecimento da língua latina; e quer uma, quer outro não é muito frequente encontrá-los. Por estes pressupostos concretos, já se vê claramente que o novo Missal permanece, certamente, a forma ordinária do Rito Romano, não só porque o diz a normativa jurídica, mas também por causa da situação real em que se encontram as comunidades de fiéis.

 

A coexistência pacífica e serena da forma extraordinária com a forma ordinária da mesma Liturgia Romana revela que, na liturgia, há crescimento e progresso, mas nenhuma ruptura. Aquilo que para as gerações anteriores era sagrado, permanece sagrado e grande também para nós - e não pode ser de improviso totalmente proibido ou mesmo prejudicial. Podemos comprovar esse progresso sem ruptura no fato de termos tantos santos que se santificaram celebrando o mistério eucarístico no período tridentino. É preciso reconhecer, porém, que há também muitos santos que se santificaram com a liturgia eucarística renovada: São João Paulo II, Santa Madre Tereza de Calcutá, Beata Dulce dos Pobres, Beata Chiara Luce Badano, Santa Maria Maravilhas de Jesus, Santo Oscar Romero, São Paulo VI. Deve-se evitar o erro de pensar que a forma extraordinária da missa detenha o monopólio da santidade.

 

Uma finalidade da coexistência pacífica e serena das duas formas da Liturgia Romana em nossa Arquidiocese é a busca do seu recíproco enriquecimento. Assim, no missal antigo poderão e deverão ser inseridos novos santos e alguns novos prefácios, da mesma forma como na celebração da missa segundo o missal de Paulo VI se poderá manifestar o senso de sacralidade e de veneração característico da forma extraordinária. 

 

A celebração da missa na forma extraordinária não pode, nem deve afetar a autoridade do Concílio Vaticano II, tampouco que uma de suas decisões essenciais – a reforma litúrgica – seja posta em dúvida (cf. Summorum Pontificum).

 

É preciso reconhecer, por fidelidade ao Magistério da Igreja, que o Concílio Vaticano II é um dos Concílios Ecumênicos da Igreja Católica, legitimamente convocado e presidido pelo Papa São João XXIII e continuado pelo Papa São Paulo VI, que promulgou todos os seus documentos. É preciso reconhecer que o Missal Romano, estabelecido pelo Papa São Paulo VI para a Igreja Universal, foi promulgado pela legítima autoridade da Santa Sé, a quem compete, na Igreja, o direito da legislação litúrgica e que é, por isso mesmo e em si mesmo, legítimo e católico. Por isso, se reconhece que as missas fielmente celebradas segundo o novo rito são válidas e lícitas e de nenhum modo se insinua que elas sejam heréticas ou blasfemas ou que devam ser evitadas pelos católicos.

 

É preciso rejeitar que a missa promulgada pelo Papa São Paulo VI contenha erros contra a fé, embora o rito possa ser sempre enriquecido pela autoridade competente. Por tudo isso, os fiéis aderentes à forma extraordinária não podem excluir, em linha de princípio, a sua participação na forma ordinária. Eles também não devem apoiar, nem pertencer a grupos que se manifestam contrários à validade ou à legitimidade da Santa missa ou dos Sacramentos celebrados na forma ordinária, nem ser contrários ao Romano Pontífice como Pastor Supremo da Igreja.

 

O bem comum exige e pressupõe o empenho de todos, pois a unidade é um dom e uma exigência que brota da própria natureza da Eucaristia, sacramento de piedade, sinal de unidade, vínculo de caridade. –

 Dom Julio Endi Akamine, SAC, é arcebispo metropolitano de Sorocaba

OS BENEFÍCIOS DA ORAÇÃO

 - Dom Julio Endi Akamine

 

A tradição cristã nunca reduziu a contemplação e a meditação como um sistema de técnicas

Muitos falam da necessidade de contemplação; há outros que ensinam técnicas de contemplação; outros ainda estudam os benefícios da contemplação para a saúde. Mas, afinal, o que é contemplação?

A partir do século XX, o mundo ocidental se voltou repentinamente para as práticas de contemplação inspiradas em religiões orientais, como o hinduísmo e o budismo. Firmou-se entre as pessoas a opinião comum de que as religiões orientais são mais espirituais do que o cristianismo, e o resultado disso é que algumas palavras se tornaram mais conhecidas do que muitas palavras cristãs. Hoje, por exemplo, usamos a palavra “guru” como sinônimo de perito em todo tipo de conhecimento e técnica. Outro exemplo é a palavra “mantra” para indicar qualquer tipo de bordão, expressão repetida, slogan de publicidade ou de marca.

Esses poucos exemplos mostram como a sede humana de contemplação religiosa se manifesta nos contextos culturais mais secularizados em que as pessoas vivem. Até mesmo essa necessidade básica se tornou um produto de consumo. Técnicas de relaxamento e de meditação são vendidas e compradas, e mesmo que sejam oferecidas gratuitamente, tais produtos continuam inseridos no sistema produtor-consumidor.

A tradição cristã nunca reduziu a contemplação e a meditação como um sistema de técnicas. O cristianismo, nas suas diversas escolas de espiritualidade, nunca oferece para as pessoas um “produto pronto para o consumo”; oferece sim um modo de vida no qual a oração é componente-chave.

Para dar uma pequena “amostra-grátis” (com muitas aspas nesta expressão!) proponho a leitura do evangelho da transfiguração como uma passagem que nos faz entrever o que é a contemplação cristã. Por isso, antes de continuar a leitura deste artigo, leia Mc 9,2-13, a fim de poder, no fim, voltar a meditar a mesma perícope.

Para contemplar é preciso primeiro aceitar que Jesus nos conduza a um lugar retirado, ao alto do monte assim como ele conduziu Pedro, Tiago e João. Essas são, portanto, as condições para quem deseja: o recolhimento habitual, mesmo em meio a várias ocupações, o silêncio para ouvir a Palavra de Deus, ter o olhar livre de distrações e para ver a luz do rosto de Deus.

Não somos nós que provocamos a revelação de Deus. Mesmo que sejam necessárias e indispensáveis as purificações, a atitude fundamental de quem contempla é a da humilde atenção e a da espera paciente e confiante.

Não podemos exigir que Deus mostre a sua face só porque fizemos todos os esforços requeridos. Pelo contrário, a revelação sempre acontece depois de um caminho difícil. Moisés e Elias, de quem fala a passagem de Mc 9,2-13, receberam a manifestação de Deus em momentos difíceis da vida: Moisés contemplou Deus no deserto, e Elias quando estava fugindo de uma perseguição mortal.

Também os discípulos contemplam a glória divina de Jesus no início do caminho pascal. Foi nesse momento de grande crise que os apóstolos lhes concedem a graça de ver por entre os véus da humildade a glória divina de Jesus.

Deus se revela em Jesus. Assim a contemplação cristã está voltada para a contemplação do rosto de Cristo. Essa é uma graça especial que nós não podemos nos dar a nós mesmos: podemos somente esperá-la com perseverante confiança, desejá-la com ardor crescente. A contemplação do rosto de Cristo permanece, porém, com um dom inefável a ser recebido.

A graça da contemplação tem uma única finalidade: a de ouvir Cristo com coração disponível e com o desejo de segui-lo mais de perto. Nesse sentido, é preciso obedecer: “Este é o meu Filho amado. Escutai o que ele diz”.

“Os discípulos, de repente, olhando em volta, não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus.” Jesus permanece com os discípulos. Em certo sentido, pode-se dizer que eles não veem mais Deus, mas somente Jesus.

A contemplação cristã é um ver Deus, mas tal contemplação só é possível porque Jesus está sempre presente. A maior parte das vezes não vemos Deus, por isso é necessária a fé, fé ancorada em Jesus que permanece sempre conosco. Mesmo que não possamos contemplar a todo momento a glória divina, podemos todos os dias ouvir a sua Palavra e podemos segui-lo.

Assim nos preparamos para a vida eterna que consiste exatamente em ver Deus. O verdadeiro benefício da oração não é a saúde, nem a paz interior, nem o equilíbrio, tampouco a eficiência no trabalho ou a prosperidade econômica.

Tudo isso pode ser de algum benefício em determinadas circunstâncias, medida e condições. O verdadeiro, o único e o supremo bem da oração, no entanto, é o próprio Deus. Sem Ele, nenhum “benefício” se reverte para o nosso bem. Com Ele, até mesmo os piores “malefícios”, que possam sobrevir a nós, concorrem para o nosso bem.

 

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba.


SEPULTAR OU CREMAR?

Há um documento da Congregação Para a Doutrina da Fé, do Vaticano, que dá instruções “oficiais” para os que desejam cremar os seus falecidos. Quem quiser ler o documento na íntegra, clique aqui: AD RESURGENDUM CUM CHRISTO. Aqui mostramos alguns pontos do documento: 


1- Que o costume de sepultar os defuntos seja conservado, apesar de haver a possibilidade de cremação. 


2- A cremação não é contrária à fé cristã e portanto não devem ser negados os sacramentos e as exéquias dos que pediram para ser cremados, pois esse pedido não vai contra os dogmas cristãos. 


3- Pelo Batismo já participamos da morte e ressurreição de Cristo e sacramentalmente fomos assimilados a ele (Colossenses 2,12). Em nossa ressurreição, Deus vai unir novamente nossa alma ao nosso corpo. 


4- A Igreja recomenda, segundo uma tradição antiga, que os corpos sejam sepultados num cemitério ou num lugar sagrado. Enterrando os corpos, a Igreja confirma a fé na ressurreição da carne e salienta a grande dignidade do corpo humano como parte integrante da pessoa. A Igreja não pode, portanto, permitir comportamentos e ritos que envolvam concepções errôneas sobre a morte, como a do aniquilamento definitivo da pessoa (pessoas que acreditam que com a morte acaba tudo), ou a crença de que na morte haveria uma fusão do falecido com a Mãe natureza ou com o universo, ou como uma etapa no processo da reencarnação, ou ainda ter a morte como a libertação definitiva da “prisão” do corpo. 


5- Tobias é elogiado pelos méritos alcançados junto a Deus por ter enterrado os mortos (Tb 2, 9; 12, 12). A Igreja considera a sepultura dos mortos como uma obra de misericórdia corporal (Catecismo da Igreja Católica, n. 2300.) 


6- ”A sepultura dos corpos dos fieis defuntos nos cemitérios ou em outros lugares sagrados favorece a memória e a oração pelos defuntos por parte de seus familiares e de toda a comunidade cristã, assim como a veneração dos mártires e dos santos”. 


7- Entretanto, onde for escolhida a cremação (por motivo higiênico, econômico ou social), lembrando-se de que essa escolha não deve ser contrária à vontade explícita ou razoavelmente presumível do fiel defunto, a Igreja não vê razões doutrinais para impedir tal costume: a cremação não toca o espírito e não impede à Onipotência divina de ressuscitar o corpo. Ou seja, a cremação não implica uma negação da doutrina cristã sobre a imortalidade da alma e a ressurreição dos corpos. 


8- Portanto, a cremação não deve causar escândalo ou suposição de indiferentismo religioso. Depois da celebração das exéquias, a Igreja acompanha a cremação seguindo as respectivas indicações litúrgicas e pastorais. 


9- As cinzas do defunto devem ser conservadas, por norma, num lugar sagrado ou num local contíguo à igreja especialmente dedicado a esse fim, determinado pela autoridade eclesiástica (em alguns lugares estão sendo cogitadas as construções de igrejas apropriadas para esse fim, como em Sorocaba SP). A conservação das cinzas num lugar sagrado favorece as orações e a recordação dos parentes e da comunidade cristã pelos falecidos cujas cinzas estão ali conservadas, mesmo nas gerações futuras. 


10- A Igreja não permite que as cinzas sejam conservadas em casa, a não ser por uma concessão especial das autoridades eclesiásticas. Entretanto, mesmo que haja essa permissão, “As cinzas não podem ser divididas entre os vários núcleos familiares e deve ser sempre assegurado o respeito e as adequadas condições de conservação das mesmas”. 


11- “Para evitar qualquer tipo de equívoco panteísta, naturalista ou niilista, não seja permitida a dispersão das cinzas no ar, na terra ou na água ou, ainda, em qualquer outro lugar. Exclui-se, ainda a conservação das cinzas cremadas sob a forma de recordação comemorativa em peças de joalharia ou em outros objetos, tendo presente que para tal modo de proceder não podem ser adotadas razões de ordem higiênica, social ou econômica para motivar a escolha da cremação”. 


12- “No caso do defunto ter claramente manifestado o desejo da cremação e a dispersão das mesmas na natureza por razões contrárias à fé cristã, devem ser negadas as exéquias, segundo o direito”. (Código de Direito Canônico, can. 1184; CCIO, can. 876, § 3) 


O Original termina com estes itens: 

Vaticano, 18 de março de 2016. 

Roma, Congregação para a Doutrina da Fé, 15 de Agosto de 2016, Solenidade da Assunção da Virgem Santa Maria. 

Gerhard Card. Müller , Prefeito


SETEMBRO, MÊS DA BÍBLIA


Estamos iniciando o mês de setembro, mês dedicado à bíblia. Tomemos consciência do que temos nas mãos. Temos nas mãos a bíblia. Ela é a fonte que sacia nossa sede infinita de Deus. Dela bebemos sem esgotá-la e podemos voltar a ela todos os dias com alegria, sabendo que sua torrente não seca. Como fonte perene, sempre deixaremos mais do que podemos tomar: “A minha alma tem sede de vós, a minha carne vos deseja mais do que a terra sedenta e sem água”. 


Temos nas mãos os livros sagrados. Eles são floresta de biodiversidade infinita, de significados e de densidade de sentidos. Como numa selva obscura, nela não adentramos sozinhos: contamos sempre com a orientação milenar da Mãe Igreja que a tem meditado, estudado, vivido, testemunhado até o sangue. 


Ensinai-me a viver vossos preceitos! Quero guardá-los até o fim! 


Temos nas mãos a escritura. Com a sagrada tradição, ela é um rio que tem sua nascente em Deus, e nele desemboca. 


Esse rio caudaloso é formado pela vida de inumeráveis gerações que ouviram a palavra de Deus, gravaram-na no coração, viveram-na com alegria, e a transmitiram com o próprio testemunho. “Transborda em toda a terra o vosso amor, ensinai-me, ó Senhor, a vossa vontade”! 


Temos nas mãos o juízo de Deus. Como espada que penetra fundo na alma, separando articulações e nervos, a escritura julga nossas atitudes e faz a separação entre o pecado e a graça, entre o bem e o mal. 


Ela tira as máscaras, desnuda as aparências. Provocando uma salutar e purificadora dor, a escritura provoca a crise, ameaça, adverte com a perdição, corrige com misericórdia e com firmeza: “Mostrais assim como sois justo na sentença e quanto é reto o julgamento que fazeis”. 


Temos nas mãos as palavras que contêm A palavra. Por isso, estamos diante do oceano profundíssimo, no qual a inteligência não fica bloqueada, mas no qual ela pode imergir com trepidação e assombro. 


Como o oceano profundíssimo e vasto, as palavras preenchem a razão humana e a superam com suas imensas riquezas. 


Tão impossível como sorver o oceano inteiro, assim também é a imensidão dos mistérios presentes nestas palavras. “Como anseio pelo vosso mandamento”! 


Temos nas mãos o Antigo e o Novo Testamentos. Contendo coisas novas e antigas, os dois testamentos formam uma unidade incindível, que não se pode separar. O Novo Testamento está oculto e prefigurado no Antigo, e o Antigo Testamento se torna claro e patente no Novo. 


“Vossa palavra é minha herança para sempre porque ela é que me alegra o coração”. 


Temos nas mãos as leituras proclamadas na liturgia. Elas são mesa abastecida com generosidade pelo divino hóspede, que depois de bater e entrar pela porta, por nós aberta, serve o Pão da vida eterna, que é ele próprio. Nutridos e robustecidos por ele, podemos ainda nos deleitar com sua doçura e delícia: “Como é doce ao paladar vossa palavra! Ela é muito mais doce do que o mel na minha boca”. 


Temos nas mãos um tesouro. Cabe a nós recebê-lo com gratidão e com alegria partilhá-lo. 


Receba de Deus, receba da palavra de Deus a bênção do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, Amém! 


Dom Júlio Endi Akamine,

Dd. Arcebispo de Sorocaba SP. 


AS RIQUEZAS OCULTAS DO VATICANO


Dom Julio Endi Akamine

Recebi esta pergunta de um jovem que, creio eu, pode ser também a de muitos outros: “Por que a Igreja Católica ostenta tanta riqueza em ouro no Vaticano, sabendo que existem tantas pessoas passando fome no mundo e Jesus levou uma vida humilde?”

Estive várias vezes no Vaticano e não vi ostentação de riqueza em ouro. Há algumas imagens douradas, mas elas não são de ouro. Visitei várias vezes os museus Vaticanos e também o subsolo da Basílica onde se encontram a cripta dos papas e as escavações arqueológicas. Também nesses lugares não há ostentação em ouro. O que vi, e todos podem ver, é que o Vaticano possui uma grande riqueza artística em imagens, pinturas, construções. Deve-se, porém, levar em conta que esse patrimônio é o resultado de 2 mil anos de história e o acúmulo de mais de dois milênios de uma instituição presente no local e ativa economicamente. Se você tem uma casa que é bem cuidada por gerações sucessivas haverá evidentemente um acúmulo de patrimônio.


Essas riquezas do Vaticano não estão à venda nem podem ser vendidas. Isso por duas razões: trata-se de um patrimônio da humanidade que o Vaticano cuida para a própria humanidade. Vender esses bens para particulares seria negar o acesso de tais obras ao público. Em segundo lugar, a maior parte do patrimônio artístico nem pode ser vendida. Imagine vender a Basílica de São Pedro para fazer dela um shopping center, ou vender a capela Sistina para fazer dela um bar. Não se pode esquecer que as obras de arte foram feitas originalmente como obras de culto. Esse é o caso das estátuas da Pietá e de Moisés de Michelangelo. Imagine tirar essas estátuas do culto público para transformá-las em peças de museu, ou pior ainda, como peças decorativas de um particular.

O fato de ter que conservar todo esse patrimônio artístico gera também despesas. Por vários anos (de 2007 a 2009) o balanço econômico do Vaticano fechou em déficit. Foi preciso do socorro de algumas dioceses para que o Vaticano pudesse pagar todas as suas contas.

A pergunta, porém, permanece. O que a Igreja faz com o dinheiro? Por que não ajuda os pobres?

O dinheiro da Igreja provém da doação dos fiéis e também da produção dos próprios religiosos. Como instituição, a Igreja Católica é a maior instituição beneficente do planeta. Ao longo de sua milenar história, a Igreja Católica fundou escolas, hospitais, universidades, asilos de idosos, orfanatos, casas para acolher moradores de rua e dependentes de drogas. Não há paróquia, casa religiosa, comunidade por mais pobre que seja que não tenha um programa de ajuda aos pobres, de cuidado para com crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, atendimento a doentes e idosos. O próprio Vaticano, na pessoa do papa, mesmo quando passa por dificuldades econômicas, tem enviado recursos em dinheiro para ajudar os pobres de Ruanda, o Curdistão iraquiano, Equador, Bangladesh, Jordânia, República Centro Africana, Síria, Filipinas, Indonésia, Haiti, Índia, Uganda, Grécia. Muitas pessoas ajudadas pessoalmente pelo papa não são católicas. Se você desejar pode, por conta própria, pesquisar sobre isso em http://www.obolodisanpietro.va/it.html.


Em nossa Arquidiocese, há várias instituições que cuidam dos mais pobres. Esse é o caso da Santa Casa de Misericórdia. Mas isso não é tudo: há asilos para acolher idosos, casas de recuperação de dependentes, estruturas para educar crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade e em conflito com a lei, há programas de recolhimento e de doação de cestas básicas, de roupas e remédios. Há também, em todas as escolas católicas ou de inspiração católica, um programa de bolsas de estudo integrais e/ou parciais.

A Igreja pode fazer mais? Sem dúvida pode e deve fazer muito mais, pois se as chagas sociais persistem é porque há muito a ser feito. Por isso, em vez de ficar criticando a Igreja ou a acusando de ter ouro escondido em não sei lá em que depósito secreto, seria muito mais proveitoso ocupar o tempo se engajando ou se envolvendo em alguma obra de caridade da Igreja.

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba


Pálio, um chamado para viver a comunhão com o Papa

Presentes na Missa presidida pelo Papa na Solenidade dos Santos Pedro e Paulo, três arcebispos brasileiros e um moçambicano: Dom José Carlos Souza Campos, de Montes Claros (MG); Dom Juarez Sousa da Silva, de Teresina (PI); Dom Paulo Jackson Nóbrega de Sousa, de Olinda e Recife (PE); e Dom João Carlos Hatoa Nunes, de Maputo.


Tiziana Campisi – Cidade do Vaticano


"Serei sempre fiel e obediente ao Bem-aventurado Apóstolo Pedro, à Santa e Apostólica Igreja de Roma, a ti, Sumo Pontífice, e a teus legítimos sucessores. Assim me ajude Deus Onipotente."

Este é o juramento feito na manhã deste dia 29 de junho pelos arcebispos metropolitanos nomeados durante o ano, a quem o Papa Francisco entrega o pálio, o paramento litúrgico símbolo da comunhão com a Igreja de Roma. O rito tem lugar no início da Celebração Eucarística da Solenidade dos Santos Pedro e Paulo, na Basílica Vaticana, às 9h30, horário italiano. 


São 32 arcebispos metropolitanos que pediram para receber o pálio e aos quais será imposto na própria sede pelo núncio apostólico local. Destes, 29 estarão presentes na Missa presidida pelo Papa, entre os quais quatro lusófono: três brasileiros e um moçambicano. Trata-se de Dom José Carlos Souza Campos, de Montes Claros (MG); Dom Juarez Sousa da Silva, de Teresina (PI); Dom Paulo Jackson Nóbrega de Sousa, de Olinda e Recife (PE); e Dom João Carlos Hatoa Nunes, de Maputo.


Também presente Dom Ivan Maffeis, nomeado no dia 16 de julho do ano passado à frente da Arquidiocese de Perugia - Città della Pieve. Falando ao Vatican News, o arcebispo italiano destaca que o pálio é um chamado à comunhão quer para os pastores como para as comunidades de fiéis.


O senhor ocupou vários cargos na Conferência Episcopal Italiana e há cerca de um ano é arcebispo de Perugia - Città della Pieve, agora recebes o pálio. Qual o valor, o significado do pálio?


É um sinal de profunda comunhão com o Santo Padre; por um lado, é um chamado a viver esta comunhão e, por outro, é também um dom que acolho como sinal de Igreja, portanto com um sopro de gratidão e responsabilidade.


O pálio é um símbolo de comunhão com a Igreja de Roma. Como os fiéis vivem esta comunhão?


Acredito que seja importante para nós bispos ser cada vez mais fiéis, estar cada vez mais em conformidade com o Magistério do Papa, portanto, procurar ouvi-lo, abrir espaço antes de tudo na nossa vida e, portanto, no nosso serviço, às suas indicações e ao seu testemunho, à palavra e à obra que o Santo Padre está realizando. Nas comunidades encontro grande atenção pela figura do Papa, encontro carinho, encontro estima, e encontro também uma expectativa de que as reformas que ele está realizando possam se concretizar, a começar por uma reforma que nos reconduza ao frescor e alegria do Evangelho.