Data de postagem: May 06, 2011 9:7:34 PM
PROCESSO Nº 0010175-98.2011.8.16.0017
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
O fumus boni juris está bem demonstrado. Os documentos demonstram que o Hospital Universitário atribuiu aos casos de todos os pacientes de que fala a inicial a classificação de “alta complexidade”, o que conduziria à sua remoção para atendimento em outros hospitais. Ocorre que o documento datado de 5/5/2011, emitido pela 15ª Regional de Saúde, confirma que todos os casos de que fala a inicial são de média complexidade. Está fortemente indiciado, assim, que ocorreu, por parte de prepostos do HUM, a manipulação da classificação dos casos, com objetivo de transferi-los indevidamente para outros hospitais.
Ocorre as transferências não ocorreram, e as cirurgias não foram realizadas. Trata-se de emergências ortopédicas, algumas delas aguardando vaga e cirurgia há mais de vinte dias. O direito dos pacientes à saúde não pode ser postergado em razão de divergências entre os órgãos públicos incumbidos da prestação do serviço de saúde.
O periculum in mora está evidente, pois os pacientes permanecem com fraturas em consolidação sem o atendimento necessário e preconizado pelos seus médicos assistentes, o que justifica temer a má evolução, a consolidação inadequada e sequelas no futuro.
Ainda quando no pólo passivo figura o Estado, o STJ tem entendido que cabe a concessão da tutela antecipada, em face da ponderação dos valores em conflito, e por ser a preservação da saúde um dos papéis do ente estatal:
“O art. 1º da Lei 9.494/97 deve ser interpretado com temperamento e de forma restritiva, não cabendo sua aplicação em hipótese especialíssima, na qual resta caracterizada a necessidade premente da continuidade de tratamento da medida antecipatória. Precedentes jurisprudenciais” (STJ, REsp nº 396815/RS, Rel. Min. Garcia Vieira, 1ª T., j. em 12.03.2002, DJ 15.04.2002, p. 184).
No voto condutor do acórdão supra mencionado o Ministro relator salienta que
“Já é pacífico nesta C.Corte o entendimento de que cabe a antecipação de tutela contra a Fazenda Pública quando se trata, como no caso sub judice, de tratamento de saúde necessário à sobrevivência do necessitado”, e menciona, no mesmo sentido, vários outros precedentes do STJ (REsp nºs 202093, 200686, 174582, 218546, 148072, 161479, 275649).
De outro lado, a mora do poder público e seus agentes em fornecer o atendimento médico necessário é aparentemente ilegal, na medida que a saúde é um direito social previsto na Constituição Federal, cabendo ao Estado zelar por ela em toda a sua amplitude, resguardando o acesso universal a todos os que dela necessitam. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem afirmado que:
“Administrativo. Moléstia grave. Fornecimento gratuito de medicamento. Direito à vida e à saúde. Dever do Estado. Direito líquido e certo do impetrante. 1. Esta Corte tem reconhecido que os portadores de moléstias graves, que não tenham disponibilidades financeiras para custear o seu tratamento, têm o direito de receber gratuitamente do Estado os medicamentos de comprovada necessidade. Precedentes. 2. O direito à percepção de tais medicamentos decorre de garantias previstas na Constituição Federal, que vale pelo direito à vida (art. 5°, caput) e à saúde (art. 6°), competindo à União, Estados, Distrito Federal e Municípios o seu cuidado (art. 23, II), bem como a organização da seguridade social, garantindo a 'universalidade da cobertura e do atendimento' (art. 194, parágrafo único, I). 3. A Carta Magna também dispõe que 'A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação' (art. 196), sendo que o 'atendimento integral' é uma diretriz constitucional das ações e serviços públicos de saúde (art. 198). 4. In casu, não havendo prova documental de que o remédio fornecido gratuitamente pela administração pública tenha a mesma aplicação médica que o prescrito ao impetrante - declarado hipossuficiente -, fica evidenciado o seu direito líquido e certo de receber do Estado o remédio pretendido. 5. Recurso provido. (STJ, RMS 17425/MG, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 14/09/2004, DJ 22.11.2004 p. 293)”.
A jurisprudência do Paraná não diverge, como mostra este precedente:
"Direito constitucional. Mandado de segurança. Direito à vida e à saúde. Moléstia grave. Medicamento essencial à preservação da saúde. Hipossuficiência financeira do impetrante para custear o tratamento. Item não constante de tabela oficial. Irrelevância. Fornecimento gratuito. Dever do Estado. Exegese dos artigos 5º, caput, 6º e 196 da Constituição Federal, e artigo 168 da Constituição Estadual. Direito líquido e certo. Configuração via judicial adequada. Precedentes do excelso Supremo Tribunal Federal e colendo Superior Tribunal de Justiça. O direito social à saúde, estatuído pelo artigo 196 da Carta Magna, é imperativo e deve ser assegurado não só pela União, mas também pelos Estados e Municípios, incluindo-se neste dever o fornecimento gratuito de medicamento prescrito por profissional médico à pessoa hipossuficiente portadora de doença grave, desprovida de recursos financeiros para custear o tratamento sem comprometimento de seus sustento próprio e de sua família, sob pena de colocar em risco sua vida" (M.S. nº 162.537-0, I Grupo de Câm. Cíveis do TJPR, Curitiba, Rel. Des. Sérgio Rodrigues, j. 03.03.2005, maioria).
A mesma razão – tratar-se de medida necessária para conservação da vida de pessoa humana – afasta qualquer restrição baseada numa suposta irreversibilidade da tutela:
“A regra do § 2º do art. 273 do CPC não impede o deferimento da antecipação da tutela quando a falta do imediato atendimento médico causará ao lesado dano também irreparável, ainda que exista o perigo da irreversibilidade do provimento antecipado. Recurso não conhecido” (STJ, REsp nº 417005/SP, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, 4ª T., j. em 25.11.2002, DJ 19.12.2002, p. 368).
Defiro, por isso, antecipação da tutela jurisdicional, para o fim de ordenar que os réus, em 3 dias e sob pena de multa de R$ 1.000,00 por dia de mora e por paciente, realize as intervenções cirúrgicas adiante listadas para os pacientes nominados:
a) Ana Maria Dreyer, cirurgia para correção de “Fratura do colo femural”;
b) Adonias Ferreira, cirurgia para correção de “fratura platô tibial lateral joelho direito”;
c) Cleverson Gibeão Lima Souza, “Artroscopia” para correção do “menisco medial luxado”;
d) José Carlos de Almeida, cirurgia para correção de “fratura sub trocartésica fêmur esquerdo”;
e) Maximilia Kiyoe Irie, Cirurgia de quadril;
f) Elitéia Ortega Salva, cirurgia adequada para correção de “fratura óssea em região dos espinhos intercondilíacos femorais com pequenos fragmentos ósseos”;
g) Idalina Baratella Ferrassa, cirurgia de “fratura de colo de fêmur direito”.
Int.-se para cumprir, e cite-se. Cópia autenticada desta decisão serve de mandado para todos os fins de direito.
Defiro o cumprimento das diligências na forma do art. 172 § 2º do CPC, tendo em vista a urgência.
Em Maringá, 6 de maio de 2011.
Alberto Marques dos Santos
Juiz de direito