DOM JÚLIO ENDI AKAMINE
Meu irmão, minha irmã!
Todos nós estamos ligados necessariamente a uma família. Nela, nós encontramos as raízes de nossa existência e nossa origem como pessoa humana: ser pessoa humana é ser de outros. Somos como um tecido de fios de muitas outras vidas, gerados por um homem e uma mulher, ambos tecidos de duas outras famílias. São duas correntes da humanidade que se uniram e que, num dado momento, geraram uma nova vida. Portanto, estar ligado a uma família, dela receber a existência, por ela ser acolhido e educado é próprio de nossa condição humana e corresponde à nossa natureza.
Ao se encarnar, o Filho de Deus assumiu integralmente a natureza humana que inclui o fato surpreendente de ter nascido em uma família. Jesus teve uma família. Deus leva a sério a encarnação e assume todas as suas consequências: torna-se homem como nós sem deixar de ser Deus. O Filho de Deus não se contentou apenas de entrar na história humana através de uma família, mas também participou de todo o processo de crescimento e amadurecimento dentro da família como qualquer um de nós. Jesus aprendeu na família a arte de ser homem. É a partir da família que Jesus aprendeu a se relacionar com o mundo e com os homens; a partir dela, foi ampliando seu círculo até dimensões mais vastas. Com efeito, no evangelho, se relata que Jesus “crescia e tornava-se forte, cheio de sabedoria; e a graça de Deus estava com ele” (Lc 2,52).
A Sagrada Família (Jesus, Maria e José) revela que a família é sagrada, porque o Filho de Deus nela viveu a maior parte de sua vida. Por trinta anos aproximadamente, Jesus partilhou a condição da imensa maioria das pessoas; viveu uma existência cotidiana sem grandeza aparente; trabalhou e ganhou o próprio sustento com suas mãos e com o suor do seu rosto; foi submisso aos seus pais; experimentou a beleza austera e simples da vida com Maria, José e os parentes próximos.
Os Evangelhos não nos narram muito sobre a vida de Jesus em Nazaré, mas, a partir de sua vida pública, muito podemos intuir dela. Assim a obediência filial total da Quinta-feira Santa (“não a minha vontade...” Lc 22,42) tem suas raízes e sua antecipação na submissão diária de Jesus a seus pais; o amor extremo de Cristo pelos mais pobres e sofredores foi preparado e semeado na experiência que ele faz do afeto humano genuíno que estava na base dos relacionamentos familiares. Podemos até mesmo ver nas parábolas de Jesus evocações de experiências feitas no lar de Nazaré: a mulher que mistura o fermento na massa, que varre a casa em busca da dracma perdida, o sal que conserva e dá sabor, a luz acesa no candeeiro, as refeições diárias e as festivas, o amigo que bate à porta em hora inoportuna...
Com o nascimento de Jesus em Belém e a sua vida oculta em Nazaré, a noite da humanidade se ilumina. O menino de Belém, o adolescente e o jovem de Nazaré nos revela: tudo possui um sentido secreto e tão profundo que o próprio Deus quis assumi-lo. Vale a pena viver em família! Tanto que o Filho de Deus viveu oculto na Sagrada Família por trinta anos! Ele entra, toma parte, participa de nossa vida que é constituída principal e essencialmente de vida familiar. Nazaré nos mostra que vale a pena viver a vida familiar como a experimentamos: às vezes, monótona e anônima, sempre trabalhosa e fiel na luta de sermos cada dia melhores. Vale a pena viver em família: vida exigente na paciência, em suportar as contradições e em aprender delas.
A vida em família é ameaçada de muitas maneiras: rompimentos dolorosos do pacto matrimonial, infidelidade ao amor prometido, ofensas à sacralidade do matrimônio, concepções e práticas que contradizem a essência da vida familiar. Dois homens ou duas mulheres não podem ser considerados família. Os cristãos não se rendem aos que querem justificar o que não pode nem deve ser justificado porque têm sempre diante dos olhos Cristo e o modo como ele viveu a vida humana. No lar de Nazaré encontram o modelo e a meta de sua existência que inclui também a vida em família.
Neste natal, olhemos bem fundo nos olhos do menino Jesus: nele sorri a humanidade e a jovialidade de nosso Deus. Tentemos, neste natal e também durante nossa vida toda, ser bons e realmente irmãos uns dos outros. Assumamos nossa vida cotidiana, anônima, trabalhosa, cheia de dificuldades com alegria assim como Cristo a assumiu. Olhemos para nossas mães e para as nossas esposas com respeito, e descubramos nelas um símbolo da Virgem Maria. Fixemos o olhar em nossos pais e redescubramos neles a solicitude e a dedicação altruísta de José. Olhemos para nosso próximo e lembremo-nos que ele é um irmão de Cristo e nosso irmão. Façamos de cada pessoa um próximo e de cada próximo um irmão. Neste natal, abracemos nossos filhos, nossas crianças como se abraça o Filho que Deus nos dá no Natal.
Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade!
DOM JÚLIO ENDI AKAMINE.