O Rapto de Europa

Da mitologia grega ouvimos a história de uma linda princesa fenícia chamada Europa. Zeus apaixonado disfarça-se de touro e rapta-a levando-a para Creta. Na antiga Grécia passaram a chamar Europa aos territórios para lá da Grécia, o historiador Heródoto, no séc. V A.C. chamou Europa a todo o continente.

A palavra “Europa” parece não fazer sentido nos nossos tempos, estamos perante uma crise económica, política e religiosa, mas também com um vazio em relação à nossa identidade. Sem conhecimento do passado, não temos acesso ao presente. O passado não é apenas um património, mas também uma componente antropológica essencial ao homem europeu. Os europeus devem fazer as contas com a sua história, pois é através do confronto com o passado que temos acesso à nossa identidade. A relação que os países europeus têm com as suas cidades, as suas obras de arte, as suas paisagens, trata-se da própria realidade, da identidade da Europa, da sua sobrevivência. Ao destruir a paisagem europeia com cimento, edificando auto-estradas, centros comerciais e condomínios privados ao “estilo americano”, os especuladores não nos privam apenas de um bem, mas destroem a nossa própria identidade. A própria expressão “bens culturais” é enganadora, pois sugere que se trata de bens entre outros bens, que podem ser desfrutados economicamente e vendidos, como se fosse possível liquidar e por à venda a própria identidade. Zeus ao estar apaixonado pela Europa queria-a só para ele: “For your eyes only”, nós os europeus, ficámos cegos.

O filósofo francês de origem russa Alexandre Kojève (1902-1968) muito antes da tese defendida por Francis Fukayama, afirmou que o homo sapiens havia chegado ao “Fim da História” e tinha diante de si dois caminhos possíveis: para uma animalidade pós-histórica definida pelo American Way of Life e a outra para um Japão que se mantém humano, celebrando as suas tradições, mas já sem qualquer significado histórico. Entre estas duas vias, a Europa poderia ter acesso a um terceiro caminho. Uma cultura que continuava a ser humana, mesmo depois do fim da história, porque pode confrontar-se com ela própria e capaz de alcançar, a partir deste confronto, uma nova vida, isto é abrir os olhos.