Função do Autor

Segundo um lugar-comum, o autor é a causa mais evidente, a mais próxima, da obra. A explicação da obra através da vida e da personalidade do autor, constitui um dos métodos mais antigos e mais estabelecidos do estudo literário. O homem e a sua obra tornaram-se a categoria fundamental da crítica em todas as artes, da literatura à pintura, desde o princípio do século XIX. Na literatura, a relação do texto com o autor é central, o leitor romântico, burguês não tolera o anonimato. No entanto, o século XX assistiu à progressão duma outra tradição literária vanguardista, segundo a qual a escrita se refere apenas a si própria.

“A função de autor é, assim, característica do modo de existência, de circulação e de funcionamento de alguns discursos no interior de uma sociedade.”[1]

Em O que é um autor? Foucault questiona-se: “Para quê continuar a usar os nomes de autores?“[2], os autores, como pessoas e autoridades, são acessórios. Foucault reconhece quatro características específicas dos discursos que têm uma “função autor”:

“Resumi-los-ei assim: a função autor está ligada ao sistema jurídico e institucional que encerra, determina, articula o universo dos discursos; não se exerce uniformemente e da mesma maneira sobre todos os discursos, em todas as épocas e em todas as formas de civilização; não se define pela atribuição espontânea de um discurso ao seu produtor, mas através de uma série de operações específicas e complexas; não reenvia pura e simplesmente para um indivíduo real, podendo dar lugar a vários “eus”, em, simultâneo, a várias posições-sujeitos que classes diferentes de indivíduos podem ocupar.[3]

Segundo estas quatro características da moderna “função autor”, este não é mais o produtor e o que garante o sentido; Ele é quem limita a apropriação do texto pelo leitor, numa relação semântica e cultural entre um e outro.


[1] MICHEL FOUCAULT – O que é um autor?,[2] Idem:“Quem é que falou realmente? Foi mesmo ele e não outro? Com que autenticidade, ou com que originalidade? E o que é que ele exprimiu do mais profundo de si mesmo no seu discurso?” E ainda outras, como as seguintes: “Quais são os modos de existência deste discurso? De onde surgiu, como é que pode circular, quem é que se pode apropriar dele? Quais os lugares que nele estão reservados a sujeitos possíveis? Quem pode preencher as diversas funções do sujeito?” E do outro lado pouco mais se ouviria do que o rumor de uma indiferença: “Que importa quem fala”[3] Ibidem