A Grande Ilusão

Em “A Grande Ilusão” (1909) o escritor Norman Angell (1872-1967) argumenta, que a cada vez maior interdependência económica entre os países industrializados justifica a paz. Para existir paz é obrigatório o sistema capitalista. Encontramos diversas contradições neste sistema que nos domina.

Primeiro, em “O Capital” (1867), Karl Marx (18181-1883) diz-nos que não é possível a acumulação do capital, sem explorar a força do trabalho. Ter um trabalho é uma honra, mas trabalhar marca a nossa servidão. Estas são as dualidades, amamos detestando e detestando amamos. Eis a histeria, governos sucessivos declaram guerra ao desemprego, baixando cada vez mais os ordenados em prol da competitividade. Enquanto os executivos de topo e analistas se passeiam nos centros financeiros, ganhando salários exorbitantes e manipulando as regras do jogo económico a seu favor.

Segundo, os empregos não estão a ficar com salários mais baixos, estão a ser substituídos pela automação. A novidade é assistirmos ao desaparecimento da massa de trabalho com educação, os trabalhadores tornaram-se supérfluos. Os empregos estão a desaparecer porque o trabalho está a mudar. Um trabalhador precário e intermitente dos nossos dias, é mais caro do que o “robot”, que pode levar acabo o mesmo trabalho. A transformação do trabalho em valor, está condenada devido às tecnologias que o substituem. O desenvolvimento da tecnologia reduz os lucros na sua totalidade. A população excessiva, já nem serve para ser explorada, a humanidade tornou-se um “excedente”, escreve Jeremy Rifkin em “O Fim do Trabalho”, (1995).

Terceiro, os políticos persistem em dizer que os empregos destruídos num sector são substituídos em novos sectores. O fim do campesino deu lugar aos operários, o fim dos operários deu lugar ao sector dos serviços. Por muito baixos que sejam os custos de trabalho, eles são superiores aos custos das tecnologias que o substituem, e assim chegamos à fase do capitalismo no qual o sistema só recupera a prosseguir a sua lógica de eliminação de trabalho. “O investimento não cria mais emprego, pelo contrário, suprime-o”, diz Anselm Jappe, “Sobre a Balsa da Medusa”(2012): “A subida do desemprego e da precarização foi acompanhada por uma forte queda de receitas do Estado, sectores inteiros da vida social serão abandonados a uma vida da sobrevivência”. André Gorz em “Metamorfoses do Trabalho” (1988) escreve: ”pouco importa de que emprego se trata, o importante é ter um.”

“ (…) cada ser humano auto-proclamado um autómato que simula grotescamente o trabalho e a diversão, o amor, o ódio, o pensamento, a eloquência, a heroicidade, a santidade, o que se quiser – o que não falta aos robôs é versatilidade.”[1] “O que temos à nossa frente é a perspectiva de uma sociedade de trabalhadores sem trabalho, isto é, privados da única actividade que lhes resta.”[2]


[1] “Céu e Inferno”, Aldous Huxley (1956)[2] “Condição Humana”, Hannah Arendt (1958)