Gabinete de Amador

Representação microscópica de uma Pinacoteca. O aparecimento do Gabinete de Amador surge, inicialmente, com a intenção de esconder as paredes de uma sala, exibindo as pinturas muito próximas umas das outras, moldura com moldura. Esta parede de pinturas gozava de uma certa mobilidade. A parede, antes de receber os quadros movíveis, era coberta por cabedal ou uma superfície colorida que servia de fundo para os quadros, separando-os, enquadrando-os e isolando as imagens.

Em finais do século XVII, é possível encontrar uma outra origem para os Gabinetes de Amador, nos catálogos imaginados, género literário em voga pela Europa: Galeria de Marino (1619), Gabinete de Georges de Scudéry (1646), A Galeria de Salástano (1651-3). O Gabinete de Amador é então definido por uma super-moldura, que exibe uma colecção de pinturas num mosaico de relações entre uma pintura e outra. É um sistema de imagens que se torna visível e emerge da pintura que o representa. Esta fragmentação de imagens impede a linearidade da leitura, permitindo ao visitante a liberdade de construir o seu próprio percurso visual.

Em 1651, o Arquiduque Léopold Guillaume, celebra um contrato com Teniers.Este viajaria pela Europa, comprando obras valiosas para aumentar a sua colecção, obras que, a seu pedido, foram posteriormente reproduzidas pelo pintor, em pequeno formato. A obra de David Teniers II, A Galeria do Arquiduque Léopold-Guillaume em Bruxelas, constitui como que uma resenha: os trabalhos reproduzidos neste Gabinete de Amador são facilmente reconhecíveis devido aos nomes dos autores inscritos em cada moldura, numa assemblage que reflecte uma secção precisa da sua colecção. Nestas pinturas, certos autores brilhavam mais do que outros, certos mapas pareciam representar melhor a colecção do Arquiduque Austríaco. Estas pinturas de Gabinetes de Amador serviam para oferecer e, por se constituir como um grupo de imagens de uma colecção pessoal, nunca eram exibidas quando a colecção original estava exposta.

O Gabinete de Amador, catálogo de pinturas, acabará por ser substituído pelo livro catálogo, que surge por volta de 1660: Theatrum Pictorium Davidis Teniers Antverpensis. Neste, David Teniers coloca em cada página uma reprodução da obra. Esta noção de colecção para o catálogo advém de Borghini e do seu studiolo. A invenção de Borghini consistia num sistema de imagens que era definido como um inventário de coisas (um catálogo). O studiolo não era um catálogo de pinturas, mas sim de “naturalia”, repositório guardado num armário.

Os Gabinetes de Amador são selecções de pinturas de uma colecção, representam o princípio do catálogo inventariado. De certa maneira, o Gabinete de Amador assume-se como toda a colecção, pois é sempre possível encontrar elos numa panóplia de colecções e entre um grande número de obras. O Gabinete de Amador é, então, o espelho da colecção “ad infinitum”.