Carta 03

Carta Filosófica Nº 03

A cada escolha uma renuncia...

E cada renúncia, um preço à pagar.

TODA RUPTURA faz sangrar de forma visível ou invisível. Todo fim significa o começo de algo nem sempre desejado. Toda dúvida traz em si, a dor do sofrimento pela busca da certeza. Toda escolha traz consigo a angústia da renúncia. Toda cissura significa o cerceamento de uma possibilidade factual. Assim como se corta uma árvore em seu tronco, desaba; assim como a um pássaro suturado em suas asas; a ferida costuma não sarar nunca, cicatriza sim, mas continua a doer por dentro, por toda vida, e abre toda vez que se lembra de como era, e queima em ferro quente quando se imagina como poderia ser. Uma marca em brasa que permanece enquanto houver cicatriz.

Quando de verdade se ama é assim, há um medo sutil que nos vigia, como se todo tempo tentasse cortar o fio de prata que nos une, antes pelo coração, de modo que soltos no espaço vazio, vamos sem direção, ao léu, até nos depararmos com um outro. Com ele sublimamos o sofrer e engolimos a cada beijo o querer não vivido. Mas a ferida continua ardendo, lembrando-nos que na verdade, quem queremos é, simplesmente quem nos queira como a nós mesmos, que nos ame como ninguém nunca nos amou e nem poderá nos amar. Alguém que nos ajude a desfazer das cargas de sermos quem não somos e a dividir conosco o peso de sermos quem somos.

Outubro, de 1999

Westerley