Tributos da saudade

À memória do meu jovem amigo Dr. Antônio Augusto do Amaral,

falecido a 22 de março de 1883

Tão cedo, ainda na flor da mocidade,

Desta vida mortal transpondo as raias

Soltaste a vela ao mar da eternidade,

Ao mar que não tem praias!...

Do mundo no caminho insidioso

Bem depressa cansaste,

E perdido por trilho tenebroso

Na campa tropeçaste.

Por mortífero sopro despencadas

Na quadra mais gentil da humana vida,

As puras rosas de um porvir risonho

Caíram-te da fronte esmorecida

Em lutuosos goivos transformadas

No túmulo medonho.

Mas por entre estas lágrimas, que verto

Ao pé do teu jazigo,

Do pai, e dos irmãos ao desalento,

Em lúgubre concerto,

Prantos mesclando de saudoso amigo,

Eu diviso no azul do firmamento

A consolar-me uma visão celeste,

Que vem a ti baixando

E entre coros angélicos pairando

De divinais fulgores se reveste.

De uma mulher a veneranda imagem

Simpática resplende.

E dentre os véus da mística roupagem

Os alvos braços com fervor te estende.

Nadam-lhe os olhos em celeste brilho

De inefável, dulcíssima alegria,

Como da mãe que ao abraçar o filho

Em suaves transportes se extasia.

Ah! sim! é tua mãe, que ao céu te chama

Nos meigos lábios poisa-lhe um sorriso,

Que traduz a ventura em que se inflama

Quem já tem por morada o paraíso.

É ela! da eterna! felicidade

A radiosa auréola fulgura

Por sobre a fronte pura

Em que transluz a angélica bondade

Daquele coração; piedoso ninho

De mansidão, de amor e de carinho.

A ti se chega com fagueiro aspeito,

E com aquela voz suave e calma,

Com que outrora acalentou-te ao peito

Assim te fala: "Ó filho de minha alma,

Primeira flor da minha primavera,

Meu filho, eu bem quisera

Não te deixar tão cedo neste mundo

De tredas ilusões pego profundo,

Onde tudo que é belo, degenera.

Tu eras meu prazer, minha ventura,

Tu eras no porvir meu sonho de ouro,

No passado lembrança terna e pura

Eras minha esperança, e meu tesouro.

Ah! Bem cedo deixei-te entre os abrolhos

Dessa escabrosa vida,

Fraco lutando entre milhares de escolhos.

Em afanosa lida.

Talvez jamais verás realizados

Teus sonhos de criança...

Quem sabe?! do porvir aos céus nublados

Não acharás ventura nem bonança.

Teu nobre coração não mais laceres

Desse mundo nos ásperos espinhos;

A mão te estendo; vem, se assim o queres,

Gozar no céu dos maternais carinhos;

Vem, ó meu filho, vem, ó meu amigo,

A par dos anjos vem gozar comigo".

E tu, meu bom amigo, aqui dormindo

Da existência mortal quebraste os laços

E foste despertar além sorrindo

De tua mãe nos braços.

Ouro Preto, 22 de abril de 1883.