O empregado público (soneto)

Se vires sobre tosca campa fria,

Orando junto lacrimosa gente,

Não perguntes quem jaz, pois certamente

Aí jaz quem ocupou Contadoria.

Se o dó a saber mais te desafia,

Sabe, que o morto deixa pobremente

Família grande, triste e descontente,

Herdeira do pão nosso cada dia.

Sabe mais, que apesar de honroso porte,

Se não é ginja, se não é solteiro

Nunca o triste empregado muda a sorte.

Sempre doente, sempre em cativeiro

Vive bem pouco, e vê chegar a morte

Sem prazeres, sem glória e sem dinheiro.

É de notar a existência, em João Joaquim da Silva Guimarães, como atesta este soneto, das qualidades de humorista que depois se afirmariam em Bernardo Guimarães. Na sua "Biografia crítica das letras mineiras, pág. 58, Waltensir Dutra e Fausto Cunha anotam esta particularidade, para dizer "que o humorista Bernardo teve a quem sair". Já observara aliás Agripino Grieco na sua "Evolução da poesia brasileira" (2ª edição, Livraria H. Antunes, Rio de Janeiro, pág. 35): "O pai de Bernardo Guimarães era poeta e prosador, tendo deixado rimas avulsas, que o filho incluiu piedosamente em sua "Folhas de Outono", rimas impregnadas de um misto de lirismo e sarcasmo, dons antagônicos que também coabitariam no rebento vate malogrado".