Amor Ideal

Há uma estrela no céu

Que ninguém vê, senão eu

(Garrett)

Quem és? - d'onde vens tu?

Sonho do céu, visão misteriosa,

Tu, que assim me rodeias de perfumes

De amor e d'harmonia?

Não és raio d'esp'rança

Enviado por Deus, ditamno puro

Por mãos ocultas de benigno gênio

No peito meu vertido?

Não és anjo celeste,

Que junto a mim, no adejo harmonioso

Passa, deixando-me a alma adormecida

Num êxtase de amor?

Ó tu, quem quer que sejas, anjo ou fada,

Mulher, sonho ou visão,

Inefável beleza, sê bem-vinda

Em minha solidão!

Vem, qual raio de luz dourando as trevas

De um cárcere sombrio,

Verter doce esperança neste peito

Em minha solidão!

Nosso amor é tão puro! - antes parece

A nota aérea e vaga

De ignota melodia, êxtase doce,

Perfume que embriaga!...

Amo-te como se ama o albor da aurora,

O claro azul do céu,

O perfume da flor, a luz da estrela,

Da noite o escuro véu.

Com desvelo alimento a minha chama

Do peito no sacrário,

Como sagrada lâmpada, que brilha

Dentro de um santuário.

Sim; a tua existência é um mistério

A mim só revelado;

Um segredo de amor, que trarei sempre

Em meu seio guardado!

Ninguém te vê; - dos homens te separa

Um véu misterioso,

Em que modesta e tímida te escondes

Do mundo curioso.

Mas eu, no meu cismar, eu vejo sempre

A tua bela imagem;

Ouço-te a voz trazida entre perfumes

Por suspirosa aragem.

Sinto a fronte incendida bafejar-me

Teu hálito amoroso,

E do cândido seio que me abrasa

O arfar voluptuoso.

Vejo-te as formas do donoso corpo

Em vestes vaporosas,

E o belo riso, e a luz lânguida e meiga

Das pálpebras formosas!

Vejo-te sempre, mas ante mim passas

Qual sombra fugitiva,

Que me sorriu num sonho, e ante meus olhos

Desliza sempre esquiva!

Vejo-te sempre, ó tu, por quem minh'alma

De amores se consome;

Mas quem tu sejas, qual a pátria tua,

Não sei, não sei teu nome!

Ninguém te viu sobre a terra,

És filha dos sonhos meus:

Mas talvez, talvez que um dia

Te eu vá encontrar nos céus.

Tu não és filha dos homens,

Ó minha celeste fada,

D'argila, d'onde nascemos,

Não és decerto gerada.

Tu és da divina essência

Uma pura emanação,

Ou um eflúvio do elísio

Vertido em meu coração.

Tu és dos cantos do empíreo

Uma nota sonorosa,

Que nas fibras de minh'alma

Ecoa melodiosa;

Ou luz de benigna estrela

Que doura-me a triste vida,

Ou sombra de anjo celeste

Em minha alma refletida.

Enquanto vago na terra

Gomo mísero proscrito,

E o espírito não voa

Para as margens do infinito,

Tu apenas me apareces

Como um sonho vaporoso,

Ou qual perfume que inspira

Um cismar vago e saudoso;

Mas quando minh'alma solta

Desta prisão odiosa

Vaguear isenta e livre

Pela esfera luminosa,

Irei voando ansioso

Por esse espaço sem fim,

Até pousar em teus braços,

Meu formoso Querubim.