Estrofes
Dedicadas ao Sr. José Tinoco, espirituoso
e ilustrado cronista do "Jornal do Comércio",
quando passou pelo Ourto Preto acompanhando
SS. MM. II. em visita a esta província
Viajor, que visitas nossas plagas
Alpestres e sombrias,
E do Itacolomi nas duras fragas
Vens pousar alguns dias,
Eu te saúdo; tua mão aperto,
E às expansões achas um peito aberto.
Que vês aqui?... de altíssimas montanhas
Os topes sobranceiros,
De rochas colossais formas estranhas,
Furnas, despenhadeiros,
E água clara jorrando aos borbotões
Entre sombrios, frígidos grotões.
Se a vista estendes pelos horizontes,
Vês negras serranias,
Erguendo ao céu as denteadas frontes
De nuas penedias,
Elevando-se em grupos caprichosos
Por sobre socavões vertiginosos.
O pátrio ribeirão aqui se espalha
Por sobre a fina areia,
E se estendendo em nítida toalha
Sonoro serpenteia,
Como fímbria de prata alvinitente,
Que orla do monte a túnica virente.
Ei-lo que além de altíssimos fraguedos
Despenha-se ruidoso,
E mais longe se embebe entre penedos
Rosnando furioso,
Qual ferido jaguar, que busca a toca,
Pondo-se a salvo em solapada roca.
Aqui tu vês a histórica cidade
Entre combros aluídos
Ainda recordando com saudade
Os tempos já volvidos,
Quando entornava às regiões estranhas
Ouro a granel das mádidas entranhas.
Ei-la se encosta de escalvado morro
Ao flanco lacerado,
Por onde a aluvião caindo em jorro
No vale escalavrado
Derramava qual mágico tesouro
Entre fino esmeril palhetas de ouro.
Além o monte imita altas cimalhas
De templos denegridos,
Pendentes torreões, rotas muralhas,
Castelos derruídos,
Que no aspecto severo e venerando
Estão eras antigas recordando.
Ergue os olhos: por sobre a tua fronte
Verás a catadura
Do gigantesco, aspérrimo Itamonte,
Que pela esfera pura
Mergulha a grimpa qual cerúlea pluma,
Que sobre um elmo colossal se apruma.
À sombra dessa rude penedia
Outrora flamejou
Clarão libertador, que no outro dia
Em sangue se apagou;
Cometimento audaz, santo delírio,
Ao qual só coube a glória do martírio!
De Xavier a inclita cabeça
Ali plantada estava,
E como um sol rompendo a treva espessa
Aos ventos balouçava
Aos vindouros mostrando em crise borrenda
Da liberdade a luminosa senda.
Além, naquela encosta vicejante
Gonzaga ainda suspira
Cantando as graças da formosa amante
Na maviosa lira;
Cuida-se ali ouvir a voz dolente
Do desditoso e nobre inconfidente.
Muitas outras lembranças gloriosas
Na mente levarás,
Que em teu país, em horas mais ditosas
Um dia contarás,
Sem te esqueceres do singelo abrigo,
Que vieste encontrar em seio amigo.
Adeus!... doce memória guardaremos
Da rápida passagem,
Em que nos lares nossos te acolhemos;
Adeus, boa viagem!...
E em sinal da saudade que nos deixas,
Leva em teu coração estas endeixas.