SOLIDARIEDADE. NEM DIREITA, NEM ESQUERDA!
Alcino Lagares*
“Homens são iguais por natureza, mas desiguais socialmente. Ao Estado compete manter a desigualdade através das leis.”
(Thomas Hobbes, 1588-1679)
Na Europa, a partir do século XI, ao “Feudalismo” (aristocracia rural) seguiu-se o “Estamento” (uma aristocracia urbana), o qual impunha uma hierarquia com pouca mobilidade social (pela “divina vontade”, conforme a igreja católica ensinava ao povo).
Assim, no século XVIII, sob o reinado absolutista de Luiz XVI, a França vivia, numa sociedade “estamental”, três níveis hierárquicos: o clero e a nobreza (não trabalhavam e recebiam impostos) e o povo (“terceiro estado” _ “Le tiers état” _ trabalhava e pagava impostos aos primeiros).
A “Revolução Francesa” (1789) pôs fim ao regime absolutista e possibilitou o nascimento de novos modelos sociais, políticos e culturais na Europa (os quais se espalharam pelo mundo).
O povo _ dividido em “alta burguesia” (a parcela mais abastada, os “Girondinos”) e “baixa burguesia” (a parcela menos opulenta de trabalhadores, os “Jacobinos”) _ reuniu-se numa “Assembleia Constituinte” para redefinir o destino do Estado francês.
No salão da reunião sentaram-se, do lado esquerdo, os “Jacobinos” liderados por Robespierre, Danton e Marat; e, do lado direito, os “Girondinos” liderados por Pierre Brissot.
Das divergências entre “jacobinos” (em busca de laicismo, soberania popular e redução dos poderes do clero e da nobreza) e “girondinos” (defendendo manter o “status quo”) nasceram os conceitos de “esquerda” e de “direita”.
Nos séculos XIX e XX, regimes “ditatoriais” mostraram-se como “de direita”, tal como o “Nazismo” de Adolf Hitler (1889-1945) ou “de esquerda”, tal como o “comunismo” de Lênin (1870-1924) e de Stalin (1879-1953) e, concomitantemente contra o capitalismo e contra o comunismo, o “Fascismo” de Benito Mussolini (1893-1945)!
No Brasil, no período do governo militar (1964 a 1985), as ideias que apoiavam a situação eram consideradas de “direita”; as de oposição eram de “esquerda”.
A queda do “muro de Berlim” (1989) e a dissolução da União Soviética (1991) evidenciaram novos cenários políticos e os dois termos passaram a ser usados em diferentes contextos.
Pode-se, presentemente, entender a “direita” como um conjunto de ideias que defendem a “livre iniciativa, privatizações, a propriedade particular e as leis de mercado” e, por “esquerda”, um conjunto de ideias que defendem a “economia solidária, justiça social, taxação de grandes fortunas e maior distribuição de renda”.
Com a greve de caminhoneiros no Brasil_ maio de 2018 _, pessoas diziam-se “de direita” (logo, em tese, a favor das “leis de mercado”) ao mesmo tempo em que, “em atitude de esquerda”, protestavam contra a “falta de solidariedade” de donos de supermercados e de postos de gasolina em face do aumento dos preços dos escassos combustíveis e alimentos. Que bom! Eis aí, quem sabe, um primeiro impulso para que possamos ter, no atual cenário de globalização da economia, uma ética pluralista: ideias em defesa do capitalismo, mas cuidando do lado social.
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*coronel da reserva e presidente do Conselho Superior da Academia de Letras João Guimarães Rosa da Polícia Militar de Minas Gerais. Divulgado em 31/05/2018