MEU “PATHOS” PARTICULAR
Alcino Lagares*
A filosofia deve a René Descartes (1596 - 1650) um de seus teoremas mais bem fundamentados _ embora, mesmo assim, refutado, portanto jamais tendo sido considerado um axioma _ sobre a afirmação do que somos: “Cogito, ergo sum” (latim: “penso, logo sou”. Geralmente, as traduções assim chegam até nós: “penso, logo existo”; significando que, se “sou” um pensamento, “existo” enquanto pensamento)!
Ele estabeleceu uma dúvida hiperbólica (ou seja, uma metódica dúvida exagerada) permitindo-se considerar a possibilidade de ser falso tudo que não pudesse provar ser verdadeiro.
Porém, ao considerar que tudo era falso, percebeu que _ tanto para duvidar quanto para ser enganado _ tinha de ser verdade que pensava; pois, ao mesmo tempo em que ele queria pensar que tudo era falso, fazia-se necessário que ele, que pensava, fosse alguma coisa. Ora, se pensava, existia como “res cogitans” (latim: “a coisa pensante”).
O filósofo compreendeu ser uma substância, cuja essência ou natureza consiste apenas no pensar e que, para ser, não necessita de lugar algum nem depende de qualquer coisa material.
Intuo que, por ter um corpo _ e apenas por ter um corpo _ convivo com instintos egoístas, os quais são impulsionados por reflexos inatos.
No entanto, percebo em mim, sentimentos altruísticos que predominam sobre os instintos e me fazem acreditar que existem conceitos igualmente inatos, tais como a “justiça em si”, a “beleza em si”, a “verdade em si”, e o “bem em si”.
Eu posso, consequentemente, não apenas “conhecer”, mas, sim, “reconhecer” quando algum feito é “justo”, quando algo é “belo”, quando é “verdadeiro”, ou quando é um “bem” particular ou singular. Para tanto, é suficiente que eu relacione, sem medo de errar, o que percebo objetivamente com aqueles subjetivos conceitos inatos.
Enfim, é a partir da presença permanente e absoluta de uma referência que posso manter a coerência.
A minha maior angústia _ meu “pathos” particular (grego: uma espécie de ansiedade que nos faz sofrer e nos impulsiona permanentemente em busca de um saber que possa aliviar tal sofrimento) _ apresenta-se sempre que penso:
i. Se for verdade que nós, humanos, tenhamos sido criados à “imagem e semelhança” de um “Demiurgo criador” (e não apenas “organizador” do cosmos), em nada mudamos, em nada mudaremos e, eternamente, seremos tais quais somos!
ii. Se for verdade que nós, humanos, sejamos produto de uma “darwiniana” evolução, estaríamos no meio de um caminho!
Neste caso... qual será o “produto final” da “evolução da humanidade" somada ao “processo civilizatório” em curso? Prevalecerão os instintos egoísticos, ou os sentimentos altruísticos?
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* Coronel da reserva e presidente do Conselho Superior da Academia de Letras "João Guimarães Rosa" da Polícia Militar de Minas Gerais.
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