Alcino Lagares*
Conforme demonstrei, através do artigo “O IPEA VÊ, MAS NÃO SABE O QUE ESTÁ VENDO... FELIZMENTE”, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), por intermédio dos pesquisadores _ e autores do relatório _ Rafael Guerreiro Osório e Natália Fontoura, admitiu ter errado ao divulgar, em 27 de março, que a maioria da população brasileira concordava que "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas".
O IPEA assumiu nesta sexta-feira, dia 4, “que houve falha e que o percentual correto de pessoas que concordam com essa afirmativa é de 26%” e não de 65,5%!
Uau! É uma senhora diferença!
Mas, conforme demonstrarei, o IPEA persevera no erro (neste tópico sobre “mulheres que (...) merecem ser atacadas” e naquele “se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros”).
Por favor, acompanhe meu raciocínio: da amostra, apenas 35,5% eram homens. Segue-se que apenas 8,71% dos homens ouvidos podem ter concordado com a afirmação. Faça as contas: 26/100 X 35,5 = 8,71!
Mas, mesmo após a correção, o instituto reforça teimosamente que "os demais resultados se mantêm, como a concordância de 58,5% dos entrevistados com a ideia de que se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros".
Reafirmo: esta questão do IPEA (constante em seu gráfico 25: “Se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros?”) é uma típica pergunta que induz ao erro:
a) O primeiro pressuposto induzido em nossa mente com tal pergunta é: “as mulheres não sabem se comportar”;
b) O segundo pressuposto induzido pela pergunta é: “há mais estupros porque as mulheres não sabem se comportar”;
c) Aí vem a questão que, pela lógica induzida, leva à resposta desejada pelo entrevistador: “se as mulheres soubessem se comportar...”
Ora, uma questão assim colocada estimula o entrevistado _ especialmente num universo de 41,5% de pessoas que têm “menos que o ensino fundamental”, logo, indivíduos que teriam evidente dificuldade de perceber o sentido dos aspectos subjetivos propostos _ a dar resposta meramente coerente com a lógica tautologicamente imposta (a indagação já insinuava a resposta).
Porém, mesmo em tal contexto, a análise dos dados coletados é desvirtuada e contraditória: apenas 33,5% dos entrevistados eram do sexo masculino. Ainda que o percentual apresentado (58,5%) pelos pesquisadores fosse verdadeiro entre os homens; ainda que fossem estes pessoas letradas e capazes de perceber o aspecto subjetivo oculto e induzido, e as respostas à questão tivessem sido afirmativas, isso significaria 19,59% (58,5/100 X 33,5 = 19,59)!
Não é possível, portanto, inferir que 58,5% _ nem de homens, muito menos das próprias mulheres _ pensem que as mulheres “não sabem se comportar” e que, “se soubessem”, haveria menos estupros!
A senhora Dilma Rousseff, presidente do Brasil, que se pronunciara sobre o tema, demonstrando solidariedade à jornalista Nana Queiroz, uma das organizadoras do movimento "Eu não mereço ser estuprada", deveria é pedir desculpas à nação brasileira, porque a divulgação feita estava totalmente errada (não apenas parcialmente como querem remendar) e porque o IPEA (um órgão oficial da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República) não se corrigiu... INFELIZMENTE.
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* Coronel da reserva e presidente do Conselho Superior da Academia de Letras "João Guimarães Rosa" da Polícia Militar de Minas Gerais. Contatos: cellagares@yahoo.com.br