Alcino Lagares Côrtes Costa*
Especialmente a partir da metade do século XX, a humanidade eliminou alguns dos medos que tinha graças aos avanços do conhecimento e da consequente tecnologia que possibilitaram, se não evitar totalmente, pelo menos reduzir danos de perigos naturais (terremotos, vulcões, Tsunamis, etc.).
Mas, há um medo que a humanidade tem (desde sempre) e não conseguiu reduzir: medo de si própria!
A existência do ser humano não se explica em termos de processos biológicos. Apenas o indivíduo solitário encontra-se no nível animal. Nosso período fetal estende-se por um ano após o nascimento e nosso organismo ainda está se desenvolvendo quando já nos encontramos em relação com uma ordem cultural e social.
Mas, a “socialização” pode ser malsucedida: uma criança (ou adolescente) que, em razão de sua aparência física, é considerada objeto de atos de violência física ou psicológica (“bullying” na escola, por exemplo) fica sem “defesa subjetiva”, recebe a identidade estigmatizada que lhe é atribuída, sente-se “inferior” na relação social e reage ao seu “destino” com raiva.
A teoria de “Psicologia individual” de Alfred Adler (1870-1937) _ coerente com a “vontade de poder” enunciada filosoficamente por Friedrich W. Nietzsche (1844-1900) _ explica que, ao se perceber “inferior” numa relação, a pessoa sente necessidade de buscar por “superioridade”.
Embora tendo consciência de si como pensamento, o ser humano tem um corpo e convive com instintos egoístas. Assim como o Medo é a emoção principal relacionada ao “instinto de sobrevivência”, a Raiva a é em relação ao instinto de “conservação, ou expansão do ser” que contém reflexos inatos de “apropriação” (ter) e de “autoafirmação” (buscar aprovação e reconhecimento e temer a ironia, o ridículo e a má-fama).
Decorrente da raiva, a Inveja pode levar-nos a querer que o outro perca aquilo que não podemos ter, agredir quem tem, ou sentir-nos felizes com a desgraça alheia.
Edward Alsworth Ross (1866-1951) tornou-se o introdutor em Sociologia do conceito de “ordem social” ao publicar, em 1901, o livro “Controle Social” (uma pesquisa sobre os fundamentos da ordem).
Ensina o autor que a primeira das 3 funções do “Controle Social” é a “conquista e manutenção de uma ordem social” (limites dentro dos quais possam ser exercidas as liberdades individuais e sem os quais não existiria liberdade alguma para ninguém). Seguem-se as funções de “Eficiência Social” (a obtenção de objetivos desejados pela sociedade através do funcionamento harmonioso de suas partes) e de “Proteção Social”.
Fica mais fácil compreender a função de “Proteção Social” quando indagamos:
- Qual é o conjunto de valores que deve ser garantido?
- Quais são os perigos e ameaças?
- Quais são os autores da garantia?
- Quais são os meios de que dispõem os autores da garantia?
Após ocorrer assassinatos numa escola, além de espanto, luto e tristeza, o medo passa a fazer parte do cotidiano de mães e pais. A principal pergunta que fazem é: “como evitar tragédias dessa natureza nas escolas onde temos de deixar nossos filhos”?
É tendência natural que governantes pensem em soluções que envolvam tecnologias eletrônicas, cercas perimetrais, sistemas de alarmes e em ampliar a presença da polícia nas escolas; e é tendência natural que as pessoas recorram à polícia quando temem ameaças. Afinal, para minimizar “efeitos”, é essa “garantia” que parece estar ao alcance “do Estado e da Sociedade civil”.
Mas, para evitar as “causas” da violência _ eis a verdadeira “garantia” _, ao invés de “aparatos” de segurança, é necessário que (em casa e nas escolas) pais, mães e professores estejam engajados para ensinar às crianças que reciprocidade de tolerância implica em respeito pelas pessoas com diferentes atributos físicos, diferentes escolhas, ou pensamentos divergentes dos nossos e é inconciliável com atitudes de zombaria, de ameaças, ou de violência.
E quanto aos jovens em “sofrimento mental”?
Quem decide matar pessoas numa escola está decidido a se matar ou ser morto porque não está encontrando um “sentido para a vida”... e apresenta sinais: refere-se à escola ou a colegas com expressões grosseiras, não se enturma, conecta-se virtualmente _ depois, pessoalmente _ com desconhecidos igualmente frustrados, pesquisa, adquire e se fotografa com trajes, armas e explosivos.
Se, além de “ansiosa”, a pessoa estiver “depressiva”, pode apresentar-se desmotivada, incapaz de realizar afazeres habituais, com pensamentos pessimistas, desinteressada dos círculos de amizade e o foco de sua atenção é voltado para si própria.
Viktor Frankl (1905-1997) acrescentou a “vontade de sentido” às enunciadas vontades “de prazer” de Sigmund Freud e “de poder” de Alfred Adler e criou a terceira linha vienense de psicoterapia, a “Análise existencial”.
Seu método, em síntese, consiste em levar a pessoa a encontrar um “significado” para a própria vida substituindo o “vazio existencial” por um “plano existencial” para um futuro melhor.
Professores, familiares e amigos devem estar atentos aos sinais e buscar ajuda profissional, sempre que essa for necessária.
A humanidade agradece.
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*coronel QOR da PMMG e conselheiro da Academia de Letras dos Militares Mineiros Capitão-médico João Guimarães Rosa. E-mail: lagaresimh@gmail.com