JESUS E AS IDEOLOGIAS
Alcino Lagares Côrtes Costa*
Os animais conhecem apenas um mundo: o da experiência (interna e externa); mas, o ser humano tem a faculdade de ter “ideias” e, a partir destas, conceber “ideais” e acrescentá-los ao real. Ideais permitem extrapolar do que a sociedade é para o que deveria ser. Agregam. Criam um mundo fraterno e justo.
Porém, o ser humano tem também a possibilidade de, a partir das ideias, inventar “ideologias”. Ao contrário dos ideais, as ideologias dividem a sociedade em “nós” e “eles”.
Em sua obra “Do contrato social”, diz Jean Jacques Rousseau (1712 – 1778): “Na minha opinião, enganam-se os que distinguem a intolerância civil da intolerância teológica. Essas duas intolerâncias são inseparáveis.”
Em 63 a.C., Jerusalém fora tomada pelas tropas romanas comandadas pelo general Pompeius Magnus (106 a.C. - 48 a.C.); portanto, a Judeia encontrava-se ocupada pelos romanos quando nasceu Jesus e havia ali duas opostas ideologias: a dos dominados (expressada através do “judaísmo”) e a dos dominantes (expressada através do “paganismo” romano).
Nas duas opostas ideologias, os governos eram teocráticos, logo exerciam o poder secular juntamente com o espiritual: reis eram sacerdotes e sacerdotes eram reis, em busca de uma vida longa e feliz sobre a terra.
Jesus se colocou contra as duas. Quais as evidências desta afirmação? Bem (além de ter sido condenado pelos judeus e pelos romanos!), vejo três indícios.
i. Na ideologia judaica, Moisés colocara a mulher em inferioridade fazendo-a de uma costela do homem na “divina criação” e, nas “tábuas da lei”, colocando-a como propriedade e no mesmo nível de animais (“não cobiçarás... a mulher, o boi e o jumento do teu próximo”). Quando escribas e fariseus levaram-lhe uma mulher “apanhada em adultério” para ser apedrejada “segundo a lei de Moisés”, Jesus demoveu-os daquela intenção. Eles largaram as pedras e se foram e Jesus disse à mulher: “Ninguém te condenou? Nem eu também te condeno”.
ii. Expressamente discordando da ideologia romana que considerava César, se não a própria divindade, o representante de Deus na terra, Jesus disse aos fariseus: “Daí a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.”.
iii. Foi Jesus que separou o poder secular do poder espiritual ao anunciar um reino transcendente à vida e à morte, dizendo a Pontius Pilatus (12 a.C – 39 d.C.): “O meu reino não é deste mundo (...)”.
Após um salto histórico de 20 séculos _logo após a eliminação das ideologias surgidas na Itália (Fascismo) e na Alemanha (Nazismo) _, o mundo ficou dividido entre duas ideologias: de “direita”, o capitalismo decorrente do liberalismo (que colocava o indivíduo no ápice da sociedade) e de “esquerda”, o comunismo (que seria a expressão mais elevada do socialismo e dele decorrente).
O equilíbrio entre essas ideologias era assegurado pelo mútuo receio das armas atômicas reciprocamente apontadas entre os Estados Unidos da América e a União Soviética, a “guerra fria”.
Porém, no final do século XX, fracassou o comunismo: dissolveu-se a União Soviética e caiu o “muro de Berlim”. Deixou de existir a “esquerda” e, consequentemente, também a “direita” (pois, só existe direita se houver esquerda e vice-versa).
Tornaram-se anacrônicos quaisquer discursos de “esquerda” e “direita”, os quais ainda são mantidos apenas por pessoas desinformadas ou interessadas em dividir e distrair o povo.
Deve ser buscada, dentro da reinante “globalização” da economia, uma pluralidade ética: o mundo pode ser mais justo com igualdade de oportunidades e menores distâncias sociais. Se a sociedade for mais fraterna, a humanidade poderá abandonar o medo que tem de si própria.
Qual a fórmula? A que foi apontada pelo mestre Jesus através do “mandamento da caridade” e do “princípio da reciprocidade” assim sintetizados: “ama teu próximo como a ti mesmo” e “trata os outros como gostarias de ser tratado”.
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*Coronel da reserva e Presidente da Academia de Letras João Guimarães Rosa da Polícia Militar de Minas Gerais