A VITÓRIA DO BEM
Alcino Lagares Côrtes Costa*
Há três perguntas que merecem reflexão: se tudo que existe é obra do agente perfeito e este é o bem absoluto, donde vem o mal? É possível vencer o mal? Em que consiste a vitória do bem?
Seja a adição “2 + 2 = 4.”
Se o resultado dessa adição for diferente de 4 (por exemplo, “2+2=5”), significa que foi cometido um erro.
Tomemos, em nossa língua, a palavra “principal”. Se trocarmos o “c” pelo “s” (“prinsipal”), ou o “l” pelo “u” (“principáu”), significa que cometemos um erro, porque a ortografia só nos autoriza escrever a palavra de um modo.
Ao conjunto de regras que orientam os comportamentos humanos na vida em sociedade chamamos “Moral”, a qual é sustentada pela “Ética” (um conjunto de valores, em cujo ápice se encontra o bem).
Você está dirigindo. Se, ao invés de parar o carro diante de um sinal semafórico vermelho, avança, está cometendo um erro comportamental.
O cálculo elementar se baseia na exatidão dos números, a redação de uma palavra se fundamenta no rigor da ortografia e os comportamentos humanos são pautados pela moral.
A razão evidencia que erramos contas, escrevemos palavras com letras trocadas, ou cometemos atos antissociais por falhas consequentes de erros e estes jamais poderão ser atribuídos a uma entidade demoníaca _ o “mal em si” _ criadora de formas estapafúrdias de escrita, de aritmética, ou de comportamentos!
O erro é, portanto, a ausência de algo que deveria estar presente na coisa existente e não está.
Segue-se, com relação aos comportamentos, que o bem é um conceito absoluto e o mal é a sua ausência. Logo, o “mal em si” não existe.
Entrementes, costuma-se dizer que “o bem pode vencer o mal”. A contradição dessa afirmação é evidente; pois, só uma coisa existente pode ser vencida.
Não se pode “vencer” o erro de uma conta, da redação de uma palavra, ou de um comportamento.
Para que as pessoas possam fazer contas, escrever, ou adotar comportamentos socialmente desejáveis é necessária a aprendizagem, porque ninguém nasce sabendo essas coisas.
Se a criança for impedida de aprender, ela começará a cometer erros e estes a acompanharão durante sua vida adulta.
Conforme as estatísticas, o Brasil é um dos países mais violentos do mundo e, das profundezas do primeiro escalão do governo, emergiu a excêntrica solução: “armar o homem de bem... para ele matar bandidos”.
Ora, por sua dupla contradição, isso é um erro; pois, (1) ninguém nasce bandido; e (2) homens “de bem” não desejam matar outros homens.
Certa vez, Nelson Mandela (1918-2013) disse: “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender; e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar.”
A "vitória do bem" _ a extinção dos comportamentos antissociais _ implica abandonar a apologia de armas de fogo e adotar a racionalidade crítica e a ciência; logo, estabelecer a educação como prioridade do governo para, cada vez melhor, qualificar a sociedade.
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*coronel da reserva e presidente do Conselho Superior da Academia de Letras João Guimarães Rosa da Polícia Militar de Minas Gerais.
E-mail: cellagares@yahoo.com.br. Publicado no jornal "O Tempo", em 30/04/2021