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Alcino Lagares*
A juventude brasileira se manifestou!
Espantados, os governantes olham a caravana de governados passar. Ela passa por que... O povo é soberano!
“Todo o poder emana do povo que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
Eis o que reza o parágrafo único do artigo 1.º da Constituição Federal do nosso Brasil.
Ora, então... o povo é soberano?!
Como assim?!
Um olhar um pouco mais atento faz-nos perceber que o povo é um soberano que não pode exercer a soberania. E por que não pode? Porque a exerce através de seus “representantes”.
No único instante em que exerce a soberania _ o momento do voto _ ele o faz tão somente para entregar sua liberdade política a um “representante” através de uma “eleição”. Nesse exato momento, o “povo soberano” torna-se “vassalo” e elege os seus “reis” para que estes ocupem a direção das atividades de interesse público em dois dos três poderes e nos três níveis da estrutura social: municipal, estadual, e federal.
Quem são esses “reis”?
São mágicos!
São seres especiais, nascidos com um “dom”, posto que, sem nenhuma formação nas letras jurídicas, na ciência política, na sociologia, na antropologia, na filosofia, na estatística, na psicologia, na administração, na economia, ou em qualquer outra área das ciências sociais, “sabem” o que é melhor para o povo!
Em síntese: um bando de ignorantes espertos diz à sociedade brasileira que esta deve entregar-lhe a sua liberdade política através da eleição, e os doutos acreditam neles...
Em lugar de um “tribunal da democracia”, temos um Tribunal Superior... Eleitoral!
Neste emaranhado de ideias, confundem-se até mesmo cientistas políticos, os quais têm se pronunciado sobre o movimento jovem brasileiro quando afirmam: “não é possível democracia sem partidos”. E por aí vamos...
Tenho 65 anos. O mundo que circundava a minha geração, enquanto adolescente _ já tendo sido superadas as nefastas ideologias do fascismo de Mussolini e o nazismo de Hitler _ era bipolarizado ideologicamente: de um lado, um capitalismo gerador de riquezas (mas, péssimo distribuidor destas) e, de outro, um socialismo distribuidor da miséria entre o povo (enquanto integrantes da cúpula acumulavam riquezas). As mulheres eram socialmente reprimidas. No Brasil, um movimento social implantara, a partir de 1964, um governo de poucos. Nesse universo, nós, jovens, adquirimos a capacidade de sonhar utopias, em busca de uma sociedade mais justa.
Houve mudanças: as mulheres conquistaram direitos _ que se estenderam muito além da “queima de sutiãs” _, foi derrubado o muro de Berlim, dissolveu-se a União Soviética, o Brasil retornou à democracia.
Hoje, a juventude _ produto de uma “sociedade de mercado” _ encontra-se desencantada: socialmente, encontrou a “liberdade” sexual, mas se sente perdida nela. Economicamente, percebe uma péssima distribuição de renda. Politicamente, vê-se sem vez e quer ter voz. Mas, não sabe como.
Nos encontros e desencontros dos jovens brasileiros, que ora se manifestam nas ruas das maiores cidades, é perceptível a natural dificuldade de expressarem-se politicamente. Óbvio. São jovens. Têm menor experiência. Cabe aos mais velhos desta tribo verde e amarela explicar-lhes e dar significado às suas reivindicações e à sua justa indignação, por mais simples que possam parecer.
Exemplos: aquela pessoa com o humilde cartaz reclamando a volta de uma “tomada de 2 pinos” significa sua indignação por ter-lhe sido negado o direito de participar de decisões (inclusive desta que lhe exige agora adaptar-se aos 3 pinos); aquela outra pede ração para seu cão. Sem importância? Ridículo? Não. Ela quer significar que há uma péssima distribuição de renda (tão ruim que não lhe é possível sequer alimentar seu cão).
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* Coronel da reserva e presidente do Conselho Superior da Academia de Letras "João Guimarães Rosa" da Polícia Militar de Minas Gerais.
Contatos: cellagares@yahoo.com.br