BOLETIM 147-2013

DA REDAÇÃO

 

APRESENTAÇÃO

Pe Edivaldo Pereira dos Santos (Assis - SP)

 

Contemplar a vida através de Testemunhas do Evangelho nos permite tantas coisas boas e novas que, ficamos comprometidos a dar testemunho com o mesmo Evangelho, na força do Espírito Santo. Como lembra a Carta aos Hebreus: “...estamos rodeados dessa grande nuvem de testemunhas. Deixemos de lado tudo o que nos atrapalha e o pecado que se agarra em nós. Corramos com perseverança na corrida,  mantendo os olhos fixos em Jesus, autor e consumador da fé. Em troca da alegria que lhe era proposta, ele se submeteu à cruz, desprezando a vergonha, e se assentou à direita do trono de Deus. Para que vocês não se cansem e não percam o ânimo, pensem atentamente em Jesus, que suportou contra si tão grande hostilidade por parte dos pecadores” (Hb 12,1-3).

Charles de Foucauld é uma dessas raras figuras que consegue fazer do Evangelho uma verdadeira fonte para a vida pessoal, além de contagiar a todos, com o seu estilo de vida e convicções.

Meditando Mt 14,31, onde está escrito: “Homens de pouca fé, por que duvidastes”, assim diz Foucauld: “Como é grande a fé que Nosso Senhor nos pede, e como é justo o seu pedido. Que fé não lhe devemos nós?... Depois da palavra do Senhor: ‘vem’, Pedro nada mais devia temer, mas caminhar com confiança sobre as águas... Assim, quando Jesus nos chamou a um estado; quando nos fez saber a nossa vocação, nada mais devíamos temer. Devíamos abordar, sem hesitações, os mais difíceis obstáculos. Cristo disse: ‘Vem!’ Temos a graça para caminhar sobre as ondas. Isto parece-nos impossível, mas Cristo é Senhor do impossível.”

O Boletim 147 chega, em suas mãos, com um convite muito direto: contemplar a vida através do testemunho de Foucauld e sentir os respingos de sua espiritualidade na vida e missão de muitos irmãos e irmãs, que, como ele, não resiste aos encantos do amado, irmão e senhor Jesus.

Cada releitura dos textos e da vida de Carlos de Foucauld acrescenta, em muito, à perspectiva da evangelização que, visa em primeiro lugar, o testemunho de conversão de quem anuncia e, que, fala mais alto e mais eloquentemente do que qualquer discurso. Hoje, mais do que nunca, o que importa é a vida de quem anuncia e não, somente, as suas palavras.

Em cada linha deste boletim, estão partilhadas experiências profundas do Evangelho, de acordo com aquelas descobertas feitas por Foucauld e que se tornaram um patrimônio de espiritualidade tão forte e tão cativante que, não só toca o coração, mas, principalmente, toca a vida e nos chama ao amor fraterno e à permanente conversão.

Na escrita ou na leitura, este boletim seja oportunidade de muitas e fecundas partilhas.

 

 

 

A VIDA DE FOUCAULD

 

O LEGADO ESPIRITUAL DE CHARLES DE FOUCAULD

Pe. Edivaldo Pereira dos Santos – Assis – São Paulo

 

Buscando algumas fontes para saborear alguns escritos sobre Foucauld, me deparei com um Livro da Coleção Éfeso de uma editora portuguesa, Editorial Aster, 1958. Uma verdadeira preciosidade que compartilho, neste espaço, conforme vem a seguir.

 

Alimentado pela leitura dos Santos e, particularmente, pelas obras de São João Crisóstomo, de Santa Tereza e de São João da Cruz, aplicava-se por aplicar ao seu caso concreto, os conselhos e a doutrina que neles encontrava. Não é propriamente um teólogo, mas, pela sua inteligência, pelo seu amor à Cruz, pela busca da vontade de Deus e pelo esquecimento de si próprio foi, sem dúvida, igual a muitos mestres nesta difícil ciência. Como foi, também, o primeiro, na teoria e na prática, que ensinou com perfeição a arte de se aproximar dos mulçumanos, como irmão; de vencer, pela caridade, barreiras, obstáculos e preconceitos seculares; de fazer com que passassem a ter por bendito o nome de cristão, povos que sentiam repugnância por essa palavra; de os trazer, pouco a pouco, com uma ternura inexcedível a essa verdade que só nele, Charles de Foucauld, encontrava arauto e defensor entre as tribos nômades.

Na primeira página das suas vinte e uma conferências, datada de 1903, em Bèni-Abbés, ele próprio escreveu debaixo do título: Pequena introdução ao catecismo. E era isso mesmo. É nisso que consiste a originalidade de “L’Evangile, présenté aux pauvres du Sahara”

 

O TRAPISTA

 

Três anos após a conversão, a 16 de janeiro de 1890, o visconde Charles de Foucauld entrava na Trapa de Nossa Senhora das Neves, em Ardèche. Tinha pedido que, depois dos seis meses de noviciado, o mandassem para o mosteiro mais pobre e agastado da Ásia Menor, e, partiu para Akbès, na Síria, a 17 de julho de 1890, onde vivei até 1897.

Desse período temos, aqui, algumas cartas extraídas da correspondência de Charles de Foucauld, quando já era Frei Marie Albéric.

 

Trapa de Nossa Senhora do Sagrado Coração (Síria)

 

18 de agosto de 1891

A um trapista

“Pode-se lamentar aquele que faz a vontade de Deus? Haverá alguma coisa de mais aprazível, neste mundo, que fazer a vontade a quem se ama? E se, na sua execução, encontramos qualquer espinho, então, o prazer é duplo!...” 

 

7 de fevereiro de 1891

A um trapista

“A nossa paz interior está em alegrarmo-nos com a felicidade infinita de Deus, e, olhando um pouco mais abaixo, em alegrarmo-nos com os nossos sofrimentos e em deseja-los cada vez mais numeroso, porque assim teremos a felicidade de o imitar e de lhe provar o nosso amor – última alegria de um coração que ama. Nunca nos faltarão, nem Deus, nem os sofrimentos.”

 

15 de agosto de 1891

A um amigo (no seu aniversário natalício)

“Todas as datas parecem dizer adeus e falar do regresso eterno, Todas elas parecem gritar que Cristo não se esconderá eternamente dos seus pobres filhos; e esta fala do céu ainda mais expressivamente que as outras. É tão bom dizer-se quando se está, como eu estou tantas vezes, tão terrivelmente frio, tíbio e distraído diante do Tabernáculo, que chegará um dia em que esse Deus que nós tanto queríamos amar nos aparecerá na sua beleza, e que, enfim, o amaremos... Sabe bem ver passar os dias, Quem pode dizer quanto nos resta de vida? Muito ou pouco que seja, que o próprio Deus possa agir em nós, para que este resto seja só para Ele, só para consolar o seu coração!...”

 

29 de novembro de 1896

“Quando se ama, queremos falar constantemente à pessoa que amamos, ou pelo menos olhá-la sempre. E a oração mais não é que um colóquio familiar com o bem amado. Olhamo-lo, dizendo-lhe que o amamos, alegra-nos estar aos seus pés, dizemos-lhe que ao pé dele queremos viver e morrer...”

 

MEDITAÇÕES SOBRE O EVANGELHO

 

As meditações, das quais trazemos, aqui, alguns excertos tem, todas elas, dois únicos temas: a oração e a fé. Charles de Foucauld escreveu-os durante o tempo que viveu na Trapa e, especialmente, durante sua estadia na Ásia Menor, na Trapa de Akbés. 

Foucauld tira dos evangelistas os textos que dizem respeito ao colóquio da alma com Deus. Procederá do memso modo no que diz respeito à fé.

 

Oração

(...)

“Pedireis tudo o que quiserdes, e ser-vos-á concedido” (Jo 115,7)

Recebereis, ou acrescentam os Santos Padres, dar-vos-ei algo de melhor ainda... O Senhor promete ouvir todos os nossos pedidos (puros e isentos de pecado, naturalmente, porque os outros seriam para ele um ultraje). Reserva-se apenas um direito: mudar o objeto do nosso pedido para melhor, dar mais ainda do que nós lhe pedimos.

‘Reserva esta pela qual tu, meu Deus, encontras maneira de fazer mais do que tudo. Como nós somos felizes, Senhor! Como a tua providência é prudente! Pois nós somos tão ignorantes que, com a melhor das intenções, pedimos muitas vezes coisas medíocres ou perigosas, coisas que nos fariam mal... Mas tu, meu Deus, arranjas todas as coisas e dás-nos o que é melhor para nós.’

 

“Pai é chegada a hora, glorifica o teu Filho, para que teu Filho te glorifique a ti” (Jo 17,1)

Eis a mais longa oração que o Evangelho nos conservou de Jesus Cristo (a oração depois da ceia)... Estudemo-la em todos os seus pormenores, gravemo-la no nosso espírito, para fazer dela o modelo da nossa oração. Consideremos, sobretudo, duas coisas: o seu caráter geral e a sua substância, neste versículo. 

Destaca-se pela confiança, pelo abandono, pela extrema simplicidade da expressão, pela sua terna familiaridade: é um Filho que fala com um familiar, ternamente abandonado a seu pai.

No fundo, pede a glorificação de Deus ‘para que teu filho te glorifique’. Notemos que este caráter e esta substância são, também, as duas primeiras palavras do Pater: ‘Pai nosso... santificado seja o vosso nome...’.

 

(...)

“Por que temeis, homens de pouca fe? (Mt 8,26)

Uma das coisas que os nossos deveres, em relação ao Senhor, impõem, é não ter medo... Ter medo, é fazer-lhe uma dupla injúria. É esquecê-lo, esquecer que Ele está conosco, que nos ama e é todo-poderoso. É, ainda, não nos conformarmos com a sua vontade: se conformarmos a nossa vontade com a sua, dado que tudo o que nos acontece é querido ou permitido por Ele, ficaremos satisfeitos com tudo o que suceder e nunca estaremos inquietos ou medrosos...

Esta é a fé que devemos ter e que se opõe a todo o medo. Temos ao nosso lado, junto a nós, em nós, Nosso Senhor Jesus Cristo, nosso Deus, que nos ama infinitamente, que é todo-poderoso, que sabe o que nos convém, que nos disse que procurássemos o Reino dos Céus e que o resto nos seria dado por acréscimo. Caminhemos em frente, com este bendito e poderoso companheiro, pelo caminho da maior perfeição, e fiquemos certos que nada nos acontecerá que não seja para a sua maior glória, para a nossa santificação e para a santificação do próximo, porque tudo o que acontece foi querido ou permitido por Ele, e, por conseguinte, em vez de ter sombra de medo, só nos resta dizer: ‘Bendito seja Deus, aconteça o que acontecer’, e pedir-lhe que tudo disponha, não segundo as nossas ideias, mas em ordem à sua maior glória. Não esqueçamos nunca estes dois princípios: ‘Jesus está aqui comigo... Tudo o que acontece, acontece por vontade de Deus.’

 

SERVO DAS CLARISSAS

 

Durante os seis anos da sua vida na Trapa, concretiza-se a mais excepcional vocação do nosso tempo, que devia levar Charles de Foucauld aos lugares mais difíceis e solitários. Nos princípios de 1897, chegou a hora de renovar os seus votos de trapista, Mas não foram renovados, O visconde de Foucauld com a aprovação dos seus superiores, que reconhecem um apelo especial, deixa a Trapa e oferece-se como criado, jardineiro e moço de recados num convento das Clarissas, em Nazaré e, assim, vive três anos, de 1987 a 1900.

 

Retiro em Nazaré

Charles de Foucauld vivia numa cabana de tábuas, espécie de guarita coberta de telhas, encostada ao muro da clausura das Clarissas, e onde antes se guardavam as alfaias de jardinagem. Durante seu retiro (15 a 25 de novembro de 1897), Charles de Foucould, ora meditava na sua cela, ora diante do Santíssimo Exposto. Dai, as suas alusões alternadas ao silêncio do campo e à presença de Nosso Senhor na hóstia.

Nazaré foi a grande revelação para Charles de Foucauld. Foi o território das graças. Foi onde pode viver as semeaduras do Espírito Santo como mistério da encarnação em sua vida

 

Objeto do Retiro

Meu Senhor e meu Deus, que estás aqui presente, que estás em mim e à minha volta, eu te adoro com toda a minha alma. Obrigado pelas tuas graças infinitas, perdão pelas minhas inumeráveis infidelidades. Ajuda-me para que eu te console o mais possível durante todos os instantes da minha vida.

Procurar conhecer melhor a tua vontade para melhor a servir (e mais te glorificar) é o duplo fim deste retiro... Abençoa-o, Senhor. Eu faço-o apenas por ti. Não por mim, mas por ti. Não para os outros, mas para ti... Devo amar-me a mim próprio e aos outros, mas só por ti... Amar os homens é secundário: tu és o principal, meu Deus, meu universo, tu és o único que possuís o ser... Ajuda-me, Senhor, a fazê-lo o melhor possível, em ti, e para ti, e que ele me sirva para te conhecer, para te amar, para conhecer e cumprir a tua vontade. E tudo para consolar o mais possível o teu coração, o meu único desejo. Amém

 

Deus: suas perfeições e sua presença

Como és bom, meu Deus! Esta manhã, estava eu nesta pequena cela, onde sabe tão bem passar horas em silêncio a teus pés, e estar contigo enquanto o sono abraça a terra, estava eu – dizia – adorar-te de joelhos, e dizendo-te que te amo, enquanto tudo está mergulhado nas trevas, no silêncio e no sono... Estou diante do Santíssimo exposto! Estou perto de ti, tão perto, meu Deus! Faz com que esteja dignamente, dá-me os pensamentos, as palavras que eu devo ter, em ti, por ti, para ti!

Obrigado, meu Deus por iniciar este retiro em dia de exposição do Santíssimo! Não me queres negar nenhuma só graça? Obrigado! Obrigado pelas tuas mercês, obrigado porque elas são tão ternas, obrigado porque eu compreendo a necessidade que delas tenho e, quanto a minha miséria, a minha covardia, a minha enorme tibieza, precisam do teu auxílio. Tu concedes a tua graça, não segundo os méritos de cada um, mas segundo as tuas necessidades, e, ainda bem. Tu vieste para os doentes, não para os sãos – como agora sito esta verdade...

Tu queres que neste retiro, eu medite em primeiro lugar em ti que és Deus e Homem... depois, que eu medite no que tu queres de mim, isto é, nos meus deveres, na minha vida, em mim próprio, já que toda a minha vida, eu todo, mais não devo ser que a realização de tua vontade... faz com que nunca haja diferença entre mim e a realização de tua vontade. Oh! Meu Deus, possam ser sempre idênticas estas duas palavras, em ti, por ti, para ti! Amém!

 

Meu Criador, meu Pai, tu que estás ai, apenas a três metros de mim e sob a aparência da hóstia, tu és a suprema beleza. Toda a beleza criada, a beleza da terra e do pôr do sol, a beleza das florestas sombrias e dos jardins floridos, as montanhas, os horizontes imensos, os desertos, as neves, os glaciares, a beleza de uma alma grande espalhada num rosto sereno, a beleza de uma boa ação, de uma vida reta, - tudo isto é o pálido reflexo de tua beleza, ó Deus. Tudo o que encantou os meus olhos neste mundo, mais não é que um reflexo de tua infinita beleza!...

Senhor, concede-me a graça de só te ver a ti, mesmo quando estou diante das criaturas. A graça de nunca me deter nelas, de nunca considerar a beleza material ou espiritual que nelas exista, como algo de seu, mas, como reflexo da tua beleza. Ajuda-me a ver mais longe, a nunca me deter nesse pobre composto de nada, e dum ser tão imperfeito, tão frágil, tão miserável. Ajuda-me a ver em toda a criatura algo que ultrapassa as aparências e que está para além da matéria; a descortinar, para além do pobre composto, o ser essencial, senhor de todo ser e de quem a criatura que nos agrada é uma parcela. Se esta parcela nos parece tão bela, quanto o não deve ser o Ser perfeito que a deixou cair como uma esmola que se dá a um pobre. Meu Deus, dá-me a graça que deste a Santa Teresa, de nunca atribuir às criaturas os dons materiais ou espirituais que nelas existem, e de nunca me deter neles, porque não os têm por si. Deter-me neles, seria uma indelicadeza, uma ingratidão, um abuso de confiança, porque Deus só concede a beleza às criaturas, e, só permite que a minha alma se alegre comisso, para melhor se evidenciar a si próprio, para me atrair a si, para excitar o meu reconhecimento pela sua bondade, o meu amor pela sua beleza, e para me fazer subir até ao seu trono, onde o devo adorar, numa contemplação embevecida.

Senhor, digna-te conceder-me o sentimento contínuo da tua presença, em mim e à minha volta... e ao mesmo tempo, faz com que esteja diante com o amor tímido que se sente na presença do bem-amado – esse amor em que é impossível desviar os olhos dele, em que nos sabe bem fazer o que lhe agrada, o que é bom para ele, e tememos fazer, dizer, ou pensar qualquer coisa desagradável ou nociva... Em ti, por ti e para ti. Amém.

 

Pensamentos de Deus

Devo procurar conhecer-te, Senhor, para melhor te amar. Quanto melhor te conhecer, mais te amarei, por que tudo em ti é perfeito, digno de admiração e amor. Conhecer-te melhor, é ver a beleza mais radiante, mais diáfana; é ficar mais inebriado de amor... Tu, meu Deus, és pensamento, palavras e obras. Tu te refletes continuamente a ti próprio, no teu próprio espírito... Os teus pensamentos não mudam. Tu te vês, sempre, a ti próprio e, as tuas perfeições; em ti, vês as tuas obras presentes e futuras, e todas as possíveis, em todos os séculos e em todos os tempos. Tu te vês, porque és inteligência. Tu te amas infinita e necessariamente, porque és justo e, sendo justo, amas o ser infinitamente digno de ser amado – Tu próprio...

Senhor, que estás em mim, à volta de mim e nessa hóstia exposto, são estes os teus pensamentos: um olhar e um amor... Um olhar para ti próprio, sobre ti próprio... e, neste olhar, tu vês todas as tuas obras. Um amor soberano, infinito para ti mesmo, amor necessário e que não pode deixar de existir, porque é a consequência da tua justiça infinita. E, neste amor, amas as tuas obras; em parte porque vêm de ti, são atos do ser infinitamente amável e amado; em parte, por causa da beleza que nelas existe, por causa da parcela do ser, do reflexo de beleza divina que tu puseste em cada uma delas e que é algo de bom e digno de ser amado. Finalmente, por pura bondade, ‘quonian bonus’, porque tu és bom e amar é natural para ti...

 

Palavras e Atos de Deus

Tu falas aos homens de duas maneiras: em voz alta, se assim posso me exprimir, e, em voz baixa. Em voz alta, pelos livros inspirados por ti, a Sagrada Escritura; em voz baixa, por tudo o que a tua graça inspira, por todas as palavras interiores que inspiras aos fiéis... Falas aos espíritos puros? Como? A quem falas ainda? Ignoro-o, Senhor. Tu és infinito, eu sou um ponto, um átomo. Que sei eu de ti? O suficiente para conhecer que és o infinito, o Ser, a perfeição, e isto basta para me mostrar que te devo amar sem medida. Por isso alegro-me por te conhecer melhor no Céu; ao ver mais perfeitamente a tua beleza, hei de amar-te ainda mais.

 

Jesus, a sua encarnação, o seu nascimento.

6 de novembro, 1897

A encarnação tem origem na bondade de Deus... Mas uma coisa ressalta em primeiro lugar, tão maravilhosa, tão brilhante, tão inédita, que refulge como fascinante sinal: a infinita humildade que este mistério supõe... Deus, o ser, o infinito, a perfeição, o criador, o soberano, o onipotente, o Senhor de tudo, fazendo-se homem, unindo-se a uma alma e a um corpo humanos, aparecendo na terra como um homem, como o último dos homens... 

E que é a estima do mundo? Conviria que Deus a procurasse? Contemplando o mundo segundo o olhar de Deus, tudo é igual a seus olhos. O grande e o pequeno são igualmente formigas, vermes da terra... desdenhando todas essas falsas grandezas que são, em verdade, duma extrema pequenez, Deus não quis revestir-se com elas... E como vinha à terra para nos resgatar e ensinar, e para se fazer amar e conhecer, intencionalmente dar-nos desde a sua aparição no mundo e durante toda a sua vida, uma lição de desprezo pelas grandezas humanas, de desprendimento completo da estima dos homens... Cristo nasceu, viveu e morreu na maior abjeção e nos piores opróbios. Ocupou sempre um lugar tão ínfimo, que nunca ninguém estava mais baixo que Ele... Ora, se Ele ocupou com tanta constância, com tanto cuidado, este último lugar, fê-lo para nos ensinar que os homens e os seus preconceitos nada são, nada valem; que não devemos desprezar os que vivem na mais baixa condição; que os mais pobres, os mais abjetos se não devem entristecer com a sua própria miséria, porque estão perto de Deus, mais perto do Rei dos reis deste mundo. E para nos ensinar que, se não somos deste mundo, pouco nos devem importar os juízos deste mundo. Temos, sim, de viver para esse reino dos céus que o Filho do homem via, aqui de baixo, pela visão beatífica, e que devemos apreciar, a toda a hora, com os olhos da fé, caminhando neste mundo como se aqui não estivéssemos, sem cuidarmos das coisas exteriores, ocupando-nos apenas em olhar, amar o Pai Celestial, e em fazer-lhe a vontade.

Resoluções: Nos meus pensamentos, palavras e ações, quer para mim, quer para o próximo, não fazer caso algum das grandezas, da erudição, das opiniões humanas, e ter na mesma consideração os pobres e os ricos... Considerar tanto o último operário como o príncipe, porque Deus apareceu como o último operário... Para mim, escolher sempre o último dos últimos lugares, para ser tão humilde como o meu Senhor, para estar com Ele, caminhar atrás dele, passo-a-passo, como criado fiel e fiel discípulo e porque na sua infinita e incompreensível bondade, digna-se permitir-me falar-lhe assim, como irmão fiel.

Por conseguinte, organizar a minha vida de maneira a ser o último, o mais desprezado dos Homens, para a passar com o meu Senhor e Irmão, que foi a abjeção do povo, e o opróbio da terra: “um verme e não um homem.”

Viver na pobreza, na abjeção, no sofrimento, na solidão, no abandono, para estar na vida com o meu Senhor e irmão, com o meu Deus, que assim viveu toda a sua vida e me deus o exemplo desde o seu nascimento.

 

Jesus, a sua vida oculta

Senhor, que estás tão perto de mim, inspira-me o que é preciso que eu medite sobre a tua vida oculta... “Ele desceu com eles e foi para Nazaré e foi-lhes obediente”. Cristo desceu, baixou-se, humilhou-se... foi uma vida de humildade: meu Deus, tu apareces-me como homem, como o último dos homens. A tua vida foi uma vida de abjeção, até o último os últimos lugares. Nasceste para viver com eles a sua vida, a vida dos pobres artesãos que vivem do seu trabalho. A tua vida foi, como a sua, pobreza e trabalho: eles eram obscuros, tu viveste na sombra da sua obscuridade. Foste para Nazaré, pequena aldeia da montanha, donde “não saia nada de bom”, diziam: era o retiro, o afastamento do mundo e das capitais, e tu viveste nesse retiro...

Tu obedecias-lhes submisso como um filho a seus pais; era uma vida de submissão, de submissão filial; obedeceste, em tudo, como obedece um bom filho.

Se um desejo de teus pais não eram conforme à tua vocação divina, não o cumprias. Obedecias “a Deus mais que aos homens” como quando ficaste três dias em Jerusalém; mas salvo quando a tua vocação se opunha aos seus desejos, obedecias-lhes inteiramente, como o melhor dos filhos, e, consequentemente, obedecias não somente aos seu menores desejos, mas procuravas adivinhar, fazendo tudo o que os pudesse alegrar, consolar, tudo o que pudesse tornar a vida doce e agradável, procurando de todo o coração, fazê-los felizes, sendo o modelo dos filhos, e tendo todas as atenções possíveis para com os teus pais, na medida em que, bem-entendido, o permite a tua vocação... Mas a tua vocação era ser perfeito e tu não podias deixar de ser perfeito, Senhor. Assim, durante 30 anos, tu foste o filho submisso, mais amável, mais consolador, fazendo todas as vontades possíveis a teus pais, ajudando-os, amparando-os, encorajando-os no seu trabalho de cada dia, reservando para ti a maior parte possível para que eles descansassem, não os contradizendo nunca, a não ser por necessidade de maior Gloria de Deus. E mesmo quando eras obrigado a isso fazia-o com um carinho, uma bondade, uma ternura que tornavam a contradição mais doce que o assentimento, e tal como um orvalho celestial, tendo todas as tentações e todas as amabilidades que tornam a vida aprazível, quando saem duma alma boa... Nada esqueceste que pudesse consolar teus pais e fazer da sua morada o que ela era realmente: o céu...

Isto foi a tua vida em Nazaré. A tua vida aqui neste lugar, já que tenho a suprema ventura e a graça imensa de viver nesta querida aldeia.

A tua vida foi o modelo dos filhos que vivem numa família de trabalhadores. Mas esta era apenas metade da tua vida, a que diz respeito à terra, embora refletisse no céu um perfume celestial... esta era a parte visível. Porque a parte invisível era a vida em Deus, a contemplação perene, Trabalhavas, ajudavas os teus pais, conversavas terna e santamente com eles oravas com eles durante o dia... Mas oravas, também. Na solidão e na sombra da noite, e a tua alma exalava-se em silêncio...

Sempre... Oravas sempre, oravas a todo o momento, porque orar é estar com Deus e tu és Deus. Mas a tua alma humana prolongava esta contemplação durante as noites, como durante todos os momentos do dia se unia à tua divindade... como a tua vida foi um contínuo difundir-se em Deus, um contínuo olhar a Deus; contemplação continua de Deus, em todos os instantes!... E em que consistia a oração que preenchia metade da tua vida em Nazaré. Era antes e, acima de tudo, adoração, isto é, contemplação, a adoração muda, o que é o mais eloquente dos louvores “Tibi silentium Laus”. Era a admiração muda, que exprime a mais apaixonada declaração de amor, tal como o amor-admiração é o mais ardente dos amores. Depois, em segundo plano, e tomando menos tempo, a tua oração era ação de graças: ação de graças, em primeiro lugar, pela Glória de Deus, porque Deus é Deus, e, depois, pelas graças concedidas na terra a todas as criaturas; era a súplica de perdão por todos os pecados cometidos contra Deus, de perdão por todos aqueles que o não pedem; ato de contrição pelo mundo inteiro, dor de ver Deus ofendido; era, finalmente, um pedido da glória de Deus, para que Ele seja louvado por todas as criaturas, para que estas pobres criaturas recebam, espiritual e temporariamente, o que precisam, e sejam assim libertadas de todo o mal, neste mundo e no outro... E ainda para que as graças se espalhe especial e abundantemente sobre aqueles que a vontade divina pôs ao pé de Jesus, à sua volta: sua Mãe, seu pai, seus primos, amigos, as almas que o amam, os que se prendem a Ele.

 

A tua vida pública, Senhor, o que foi ela?

“Procuro salvar os homens pela palavra e pelas obras de misericórdia, em vez de me contentar em salva-los pela oração e pela penitência como o fazia em Nazaré. O meu zelo aparece ao de fora...”.

“E, no entanto, apesar da minha vida se tornar exterior, conserva uma parcela de vida solitária (muitas vezes retiro-me uma noite, ou alguns dias inteiros para a solidão, para rezar) e é, então, uma vida de oração, de penitência, de recolhimento interior. E para além do tempo consagrado à evangelização... uma vida de solidão...

“Esta vida foi uma vida de fadiga. As contínuas viagens, os longos discursos, os retiros no deserto, sem abrigo, não se fazem sem grandes fadigas. Sofrimentos materiais: a intempérie das estações, as noites sem abrigo, a alimentação fora de hora, nos intervalos que o trabalho permitia, trazem sofrimento; sofrimentos morais: a ingratidão dos homens, a sua indiferença à minha voz, a sua má vontade, o seu endurecimento, todas as misérias humanas do corpo e da alma tocadas diariamente, a visão do pequeno número dos eleitos e da multidão dos condenados, as dores humanas, os sofrimentos dos justos, os da minha Mãe, a visão cada vez mais clara da minha próxima paixão, as perseguições e as inimizades em troca das minhas palavras de salvação, do meu amor a todos oferecido, a ingratidão, sobretudo, ‘essa raça infiel e perversa’ – tudo isso fazia sofrer o meu coração terno e compassivo...! De perseguição, eu era perseguido em todo o lado e por toda a gente, em Jerusalém e em Nazaré; queriam lapidar-me e precipitar-me... em todas as cidades e aldeias, fariseus, escribas, saduceus, herodianos, procuravam prender-me, faziam-me emboscadas, insultavam-me em privado e em público, chamando-me possesso, demônio, sedutor, impostor, denunciando-me aos sacerdotes... os gentios desprezavam-me como desprezavam os israelitas... Em todo o lado, a minha vida estava ameaçada, quer por Herodes, quer pelos fariseus. Era obrigado a fugir de terra em terra... Muitas vezes quiseram apanhar-me e, só me salvava por milagre... Foi o tempo da coragem contra os homens, acusando-os abertamente dos seus erros, castigando-os as vezes, desmascarando em público os hipócritas, proclamando a doutrina divina diante dos seus poderosos e fogosos contraditores, gritando a verdade diante da turba amotinada que me repudiava, fazendo, no meio do templo e das sinagogas, as ações de que me acusava e porque me condenavam. Com que coragem falei, no templo de Jerusalém, a todo esse povo que tinha sempre uma pedra na mão para me ferir, e nas sinagogas da Galiléia, onde os fariseus arreganhavam os dentes contra mim e faziam mil combinações para me perder!...”

“O Amor pela verdade, tive-o sempre, eu que sou a verdade por excelência. Mas, como o mostrei espalhando-a, com tanto zelo, no meio de tão grandes perigos e contrariedades, fiz também saber quanto custava. Humildade. Fui humilde fazendo-me batizar por João..., humilde, proibindo tantas vezes que os meus apóstolos me proclamassem Filho de Deus; humilde, escondendo os meus benefícios, os meus milagres; dizendo tantas vezes àqueles que curava que nada dissessem a ninguém; humilde, fugindo de cidade em cidade, durante a perseguição. Eu o Todo-poderoso, que com uma só palavra podia, justamente, aniquilar os meus inimigos...

 

Jesus, a sua paixão

A tua paixão, meu Deus, eis o que tu queres que eu medite; constrói tu os meus pensamentos. Pois eu fico impotente perante tais visões!...

A paixão... Quantas recordações! As bofetadas e as pancadas dos criados dos pontífices: “profetiza e diz quem te bateu.” O silêncio diante de Herodes e Pilatos... A flagelação... a coroação de espinhos... o caminho do calvário, a crucificação... a Cruz... “...Meu Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito”. ...Que visões, meu Deus, que quadro!

(...)

 

Jesus, a sua Ressurreição e Ascensão

Tu ressuscitas e sobes ao Céu!... Estás, agora, em toda a tua glória. Já não sofrerás, já não sofrerás mais. És feliz e sê-lo-ás eternamente.

Meu Deus, se eu te amo, quão feliz devo sentir-me! Se o que mais me preocupa é o teu bem, como devo estar satisfeito e feliz! Meu Deus, tu és bem-aventurado para a eternidade, nada te falta, és infinita e eternamente feliz. Também eu sou feliz, meu Deus, porque te amo acima de todas as coisas. Posso dizer que nada me falta... que estou no céu, que, suceda o que suceder, aconteça o que acontecer, sou feliz pela tua felicidade.

(...)

 

Jesus na Sagrada Eucaristia

Senhor, tu estás na Sagrada Eucaristia, Estás ai, a um metro de mim, no sacrário. O teu corpo, a tua alma, a tua humanidade, a tua divindade, todo o teu Ser está ai, na tua dupla natureza. Como estás perto de mim, meu Deus, meu irmão! Não estavas mais perto da Virgem Santíssima durante os nove meses que Ela te trouxe no seu seio, que quando eu comungo. Não estavas mais perto da Virgem Santíssima e de São José, na gruta de Belém, na casa de Nazaré, na fuga para o Egito, em todos os instantes da vida desta Sagrada Família, que estás de mim neste momento e tantas, tantas vezes neste sacrário! Santa Madalena, sentada a teus pés, em Belém, não estava mais perto de ti que eu, neste altar. Não estavas mais perto dos teus apóstolos quando estavas sentado no meio deles, do que o estás de mim agora, Senhor. Como sou feliz. Estar só, na minha cela, conversando contigo no silêncio da noite, sabe bem, meu Senhor; e tu estás aqui, como Deus e pela tua graça. Mas ficar na minha cela quando podia estar diante de ti no sacrário, é como se Madalena, quando estiveste em Betânia, te deixasse só... para ir pensar em ti, sozinha no seu quarto... Beijar os lugares que santificaste na tua vida mortal, as pedras, do Gethsemani, do Calvário, o solo da Via Dolorosa, as ondas do mar da Galileia, sabe bem, meu Deus. Mas, preferi-lo ao sacrário, é deixar o Jesus vivo a meu lado e, ir sozinho, venerar as pedras mortas onde Ele não está. É deixar o quarto onde está ele e a sua divina companhia, para ir beijar a terra dum quarto onde Ele esteve mas, já não está... Deixar o tabernáculo para ir venerar as estátuas, é deixar Jesus vivo ao pé de mim e ir a um outro quarto cumprimentar o seu retrato...

Quando se ama, não nos parece bem empregado o tempo que passamos ao pé de quem se ama? Não é este o tempo mais bem empregado, salvo quando a vontade ou bem-estar do ser amado nossa chama a outra parte?

“Onde quer que exista a Santa Hóstia, está o Deus vivo, está o Salvador tão real como está agora no céu. Nunca percas uma comunhão por tua culpa. A comunhão é mais que a vida, mais que todos os bens do mundo, mais que o Universo inteiro. A comunhão é o próprio Deus, sou Eu, Jesus. Podes preferir-lhe alguma coisa? Podes, se me amas, por muito pouco que seja, perder voluntariamente a graça que eu te faço de entrar assim em ti? Ama-me com toda a grandeza, com toda a simplicidade do teu coração...”

 

Jesus, a sua vida na Igreja e na alma fiel

Senhor, tu estás “conosco até à consumação dos séculos”, não apenas na Sagrada Eucaristia, mas também pela tua graça... A tua graça está na Igreja: ela existe e vive em todas as almas fiéis. A Igreja é a tua esposa... Qual a ação da tua graça sobre elas? Conformá-las com a tua vontade... A tua graça age continuamente na Igreja para torná-la mais perfeita. Mais perfeita pelo número sempre crescente dos seus santos, juntando-se cada dia novos nomes aos antigos, e aperfeiçoando-se a coroa dos seus santos com novos diamantes. Mais perfeita pela explicação cada vez mais clara dos seus dogmas, pela organização cada vez mais completa da sua vida litúrgica e da sua disciplina. Mais perfeita pelas novas cruzes com que a sobrecarregas cada dia e pelas vitórias que ela obtém diariamente sobre o príncipe do mundo. Mais perfeita, pelas perseguições que suporta de século em século e que a tornam, pelos sofrimentos que suporta, cada vez mais parecida com o Seu Esposo. Mais perfeita pelo volume dos méritos anteriores, crescendo continuamente com novas glorificações de Deus a acrescentar à glorificação antiga sempre viva aos olhos do Senhor. Mais perfeita, pela multidão de missas, de sacrários e comunhões, onde Cristo é diariamente oferecido a Deus pela terra, juntando-se as novas às antigas oferendas. Mais perfeita porque, juntando-se a graça de hoje à graça de ontem, não pode deixar de impelir a sua Esposa de elevação em elevação, até se aproxima mais do seu esposo.

Jesus é a alma da Igreja: dá-lhe tudo o que a alma dá ao corpo: a vida eterna. A vida eterna, tornando-a inquebrantável; a luz tornando-a infalível na declaração da verdade; Cristo ora por ela e continua por seu intermédio, a obra que iniciou com o seu corpo, na sua vida terrena: a glorificação de Deus para a santificação dos homens... E esta obra é o fim da Igreja, como foi também o objetivo de Cristo, Jesus realiza-o, nela, sem cessar, através dos séculos. 

 

 

CHARLES DE FOUCAULD: UM DOS MÍSTICOS CONTEMPORÂNEOS

Pe. Carlos Roberto dos Santos (Marília – SP)

 

Charles nasceu numa família rica de Strasburgo, na França. Ficou órfão de pai e mãe ainda bem pequeno, e foi educado por seus avós. Teve boa formação cristã e também estudou em bons colégios. Em contato com o ateísmo, afastou-se da vida cristã e, como todo adolescente, viveu seus conflitos interiores e foi muito indisciplinado.  Jovem, foi oficial do exército francês, mas passou a juventude se entregando aos prazeres da vida até o dia em que, numa expedição ao Marrocos, com vinte e poucos anos de idade, quando ainda era ateu, ficou profundamente comovido com o testemunho de vida e de fé do povo muçulmano, pois viu que eles levavam a sério o amor de Deus em suas vidas. Este fato provocou uma reviravolta em sua vida e, deste então, Charles de Foucauld se tornou um “buscador” de Deus. 

Ainda neste período de crise e busca,  Charles sempre dizia uma pequena oração: “Senhor, se o senhor existe, faça com que eu Te conheça”.  E esta procura se tornou seu itinerário de vida. Em Paris, sua prima Maria de Bondy o levou na Igreja Santo Agostinho, onde Charles encontrou-se com o Pe. Huvelin, com quem teria uma boa discussão sobre religião. Ledo engano, pois movido pelo Espírito de Deus, Pe. Huvelin pediu para o jovem se ajoelhar e confessar-se. Este fato o marcou profundamente e aconteceu uma segunda reviravolta em sua vida. O próprio Charles escreveu mais tarde: "Logo que descobri que Deus existe, entendi que não podia mais fazer outra coisa a não ser viver somente para Ele: minha vocação religiosa começou naquele exato momento de minha conversão, quando despertou a minha fé".

A partir daquele momento Charles de Foucauld começou um longo itinerário espiritual em busca do absoluto de Deus. Procurou esvaziar-se de tudo o que não era o Evangelho em sua vida. No silêncio e no abandono, Charles mergulhou no essencial, procurando identificar-se cada vez mais com Jesus, a quem chamava: “meu Bem amado irmão Jesus”. 

Tornou-se monge trapista e seguiu em tudo este itinerário de perfeição. Mas o mosteiro se tornou pequeno demais diante de sua busca do absoluto de Deus, que o impulsionava a ir cada vez mais longe. Charles escreveu: "No mosteiro passei seis anos e meio, depois, desejando querer me assemelhar a Jesus, fui autorizado a viver como alguém desconhecido, vivendo do meu trabalho cotidiano". E assim foi viver em Nazaré, como jardineiro no convento das Irmãs Clarissas. 

Aí se fez luminoso o paradoxo do Evangelho: quanto mais Charles se aniquilava, tornando-se pequeno e servidor, escondido em Nazaré, mais seu coração se alargava numa dimensão universal, mais ele participava da humildade de Jesus e se assemelhava mais e mais com seu amado Senhor Jesus. Foi ali, nos acontecimentos escondidos da vida, que se desenvolveu uma autêntica espiritualidade evangélica, espiritualidade de Nazaré, espiritualidade do silêncio, da escuta da Palavra de Deus, da adoração eucarística, da simplicidade da vida e da partilha fraternal.

Sua busca de Deus o levou ainda mais longe: ao deserto do Saara, onde foi viver em meio aos tuaregs, um povo local. Evangelizou não com palavras nem com longos discursos ou belas liturgias. A missão de Charles entre os tuaregs foi o inverso do proselitismo. Charles emprestou sua própria vida a Deus, uma vida não retida, mas doada inteiramente em favor daqueles que não tinham nada. Não procurou conquistá-los para o cristianismo, mas através de sua vida e sua maneira de viver entre eles, revelou-lhes a face de um Deus presente, um Deus que é amor, que é solidário e é completamente comprometido com os pobres. Sim, Charles evangelizou com sua própria maneira de viver, sendo, simplesmente, a presença silenciosa de Deus entre os tuaregs. E de sua parte, os tuaregs começaram a chamá-lo de "marabuto branco", isto é, o homem da oração e o homem de Deus. Foi assim que se tornou o "irmão universal", porque sua maneira de viver abrangeu o mundo todo e todos os povos, a partir da intensidade de sua presença entre os tuaregs. 

Charles morreu silenciosamente, assassinado aos 58 anos, no dia 1º de dezembro de 1916. Quando foi encontrado, o ostensório, com Cristo Eucarístico, estava ao seu lado. Em toda sua vida viveu a radicalidade da entrega a Deus, a radicalidade do aniquilamento e do compromisso, como o Bem amado irmão Jesus. 

Em sua vida Charles não teve seguidores e, como Jesus morto na Cruz, parecia que sua missão foi um fracasso. Não foi. Uma vez enterrada a semente, ela cresceu e produziu muitos frutos. Essa seiva viva da espiritualidade do irmão Charles de Foucauld percorreu as veias da Igreja, e várias congregações surgiram. Dentre elas destacamos, de maneira especial as Irmãzinhas de Jesus, os Irmãozinhos de Jesus e Fraternidade Sacerdotal Jesus Cáritas, para padres diocesanos. 

O que Charles nos ensinou? Voltar ao Evangelho, pois “quem guarda a própria vida para si mesmo, vai perdê-la, mas quem a entrega, vai ganhá-la”. Em nosso caminho de evangelização, antes de evangelizar, é necessário amar. Antes de proclamar as palavras e anunciar a mensagem, é necessário vivê-la, sem arrogância e nem orgulho, na própria vida. Nossa missão é apenas ser dócil ao Espírito Santo, que nos conduz na história. Nós somos apenas o instrumento por meio do qual Deus quer estar presente; no final, é Ele quem deve tocar o coração do outro; só Ele pode converter o coração e abrir os olhos e os ouvidos. 

E mais ainda, Charles nos ensinou a viver o Evangelho no meio dos conflitos e tempestades de nosso mundo relativista. Enquanto o mundo pede um “Jesus Light”, de acordo com os interesses do homem atual, descompromissado com a vida em si mesma, Charles nos mostra que o anúncio do Evangelho não satisfaz, não converte e não transforma se não for acompanhado de uma entrega total ao Deus da vida. Se não for acompanhado de um compromisso profundo com Jesus de Nazaré, sobretudo na paixão e no calvário. Se não for acompanhado de uma solidariedade contagiante com os mais pobres e que mais precisam de ajuda, e da nossa presença. 

 

 

 

CHARLES DE FOUCAULD: JESUS ÚNICO MODELO

Pe. Inácio José do Vale – Rio de Janeiro

 

O psicólogo e sociólogo alemão Erich Fromm dizia: “É preciso despertar, descartar as ilusões e ver a realidade tal como ela é”.

O renomado sociólogo polonês Zygmunt Bauman em seu livro Ética Pós-moderna, caracteriza nossa nova época como ‘ré encantamento’ do mundo, devolvendo dignidade às emoções e legitimidade ao inexplicável. “Livres da prisão da modernidade, podemos agora nos confrontar com a capacidade ética humana sem ilusões”.

O documento de Aparecida diz: “O compromisso missionário de toda comunidade é sair ao encontro dos afastados, interessa-se por sua situação, a fim de ‘reencantá-los’ com a Igreja e convidá-los a retornarem para ela”, (n. 226 d).

O mundo é uma grande ilusão. Suas paixões são efêmeras e no ingrediente banal e violento resultam em crimes e corrupção.

As aventuras virtuais, vícios capitais, o canzil da depressão e o conceito religioso da teologia da prosperidade levam ao vazio do nada.

Tudo isso conduz ao sistema de fluxo e refluxo, sístole e diástole, expansão e retração, indo e voltando, exatamente como na cópula sem sentido. É o prazer sem gozo, é o tocar sem sentir, é o pouco feliz e muito algoz, é o momento sem futuro e a tomada da sapiência pela boçalidade.

Diante das tantas incompatibilidades, descomunhão eclesial, carreirismo eclesiástico, encontro, reencontro e desencontro, o epônimo eremita Charles de Foucauld é citado gloriosamente no livro O Cisma Silencioso, de Piero Cappelli, com a frase: “O amor louco de Cristo”

Realmente, a espiritualidade do sábio Charles de Foucauld é a fortaleza para as almas sedentas pelo amor de Jesus de Nazaré.

A nossa era marcada pelo virtual, parcial, superficial e infernal, resta tão somente algo muito forte, impactante e louco para restaurar os quebrados, desconjuntados, perturbados e desencontrados pela ilusão do mundo enganador e mortal do sectarismo.

Dizia Foucauld: “Entrego minha vida em vossas mãos, eu vo-la dou, meu Deus, com todo o amor do meu coração porque eu vos amo” (Oração do Abandono).

Diante de um mundo capitalista, guerreiro e conflituoso ensina Foucauld: “Ser caridoso, manso, humilde com todos os homens: é o que aprendemos com Jesus. Não ser guerreiro com ninguém: Jesus nos ensinou a ir ‘como cordeiros entre os lobos’, não a falar com aspereza, com rudeza, nem a injuriar, nem a pegar em armas”.

O ‘Cisma Silencioso’, perda da fé, busca do poder eclesiástico, psicologia de príncipe, a indiferença com o sagrado e a hipocrisia religiosa é devido à falta de amor. O sábio e beato eremita Charles de Foucauld afirma de modo magistral: “Amemos a Deus, pois Ele nos amou primeiro. A Paixão e o Calvário, é uma suprema declaração de amor. Porque o amor é o meio mais poderoso de atrair o amor, porque amar é o meio mais poderoso de fazer-se amar...”.

Ver a realidade tal como ela é oportunidade de reencantamento. É preciso reencantar os afastados da Igreja, integrando-os como membros do seu Corpo Místico. Só com uma espiritualidade focada no amor e no testemunho impactante do Evangelho do Mestre de Nazaré, é capaz de fazer isso.

Na centralidade do projeto de Cristo, exclama Charles de Foucauld: “Você tem um ÚNICO MODELO: JESUS. Não procure outro”.

Na era do Papa Francisco, temos como modelo a ser seguido no espírito da pobreza e da misericórdia: São Paulo Apóstolo, Santo Antão, São Francisco de Assis, Santa Teresinha do menino Jesus e o beato Charles de Foucauld que, é conhecido como: Irmãos Carlos de Jesus, Irmão Universal e o eremita ecumênico por excelência.

O maior empreendedorismo que se pode fazer em prol das pessoas é o serviço da dignidade, configurado em Jesus Cristo e no seu Santo Evangelho. Dentro desse contexto a espiritualidade foucauldiana entra para alimentar a vida espiritual numa dimensão renovada avivada e sempre reavivada.

A espiritualidade foucauldiana está explícita na autêntica prática missiológica e eremítica de Charles de Foucauld, daí, gritar o Evangelho com a vida tomada de amor e paixão pela libertação das almas.

Essa maravilhosa espiritualidade tem seguidores no mundo inteiro. É uma chama flamejante que conduz as almas pelo verdejante pasto do Bom Pastor.

 

Fontes: ZYGMUNT Balman. Ética pós-moderna. São Paulo: Paulus, 1997. JÉSUS, Annie de. Charles de Foucauld: nos passos de Jesus de Nazaré. Vargem Grande Paulista, SP: editora Cidade Nova, 2004. PIERO, Cappelli. O cisma silencioso: da casta clerical à profecia da fé. São Paulo: Paulus, 2010.

 

 

TESTEMUNHO

 

VEVA NA ALDEIA ETERNA

Edson Damian (Bispo de São Gabriel da Cachoeira, AM)

No dia 24 de setembro, no meio da aldeia onde viveu 60 anos, Geneviève Helene Boyé, ou simplesmente Veva, partiu para a Casa do Pai. Completou 90 anos em agosto do ano passado. Chegou francesa, adquiriu cidadania brasileira, mas, por opção evangélica tornou-se índiaTapirapé. Mareaxigi, nome que lhe deram os Tapirapé, seguiu a orientação da fundadora, Irmãzinha Madaleine, quando deixou as três companheiras, em 1952, no Mato Grosso. "Explico às Irmãzinhas o meu pensamento que é muito simples: elas se farão Tapirapé para, daqui, irem aos outros e amá-los... Mas serão sempre Tapirapé".

Veva era miudinha, humilde, de aparência frágil, porém, capaz de transmitir a vitalidade e a coragem de quem descobriu que viver o Evangelho numa aldeia significa "ser índia com os índios". Ninguém como ela conheceu as dificuldades que teve que enfrentar o povo Tapirapé para conseguir sobreviver e preservar sua cultura.

“De fato quando nós viemos aqui, eles não só estavam morrendo fisicamente por causa das doenças... nós pegamos o sarampo, a malária que matou um bocado de gente. Enfim, todas essas coisas. A gente deu o remédio, mas não é só isso. É ajudar eles a criar confiança e ter vontade de vencer aquele momento. Junto com os remédios foi importante estar junto. Eles estavam em um mundo que só queria acabar com eles, tudo era inimigo. Então eles ficavam dentro da aldeia, mais ou menos à vontade. Mas tudo o que era de fora era agressor. Então ter algum apoio dentro, para enfrentar essas agressões é que foi importante. São duas coisas: o tratamento e o apoio para eles terem coragem de sentir eles mesmos, para eles ainda acreditarem neles mesmos. Queríamos viver no meio deles o amor de Deus que não deseja outra coisa senão que vivam e cresçam como Tapirapé”. (de uma entrevista em 2005).

Na aldeia elas moravam numa casa igual às demais. Aprenderam com as mulheres a tecer as redes em que dormiam, a confeccionar peneiras e utensílios domésticos. Aprenderam o preparo de peixes e de carnes de caça. Comiam do que plantavam e do que era partilhado pelos indígenas. Sem nunca impor sua fé à comunidade, limitavam-se a reverenciar as “sementes do Verbo”, presentes na cultura e crenças do povo. Não converteram sequer um membro da tribo. Mas conseguiram muito mais: fizeram-se parteiras de um povo, à luz daquele que entendeu sua missão de “trazer vida e vida em abundância”. E isso o fizeram com atenção especial à saúde, o que reduziu a mortalidade dos índios, com apoio às lutas pela demarcação de suas terras. 

Em 1995, quando era assessor do Setor Vocações e Ministérios, acolhi a Irmãzinha Veva na sede da CNBB, em Brasília. Acompanhei-a nas embaixadas da França e da Espanha. Ela precisava preparar a documentação para viajar a estes países. As Irmãzinhas e os Tapirapé haviam recebido o prêmio Bartolomé de las Casas, oferecido pelo rei da Espanha. Tal condecoração é dada às pessoas ou instituições que ajudam minorias em extinção a garantir sua sobrevivência. Disse-me que o único motivo que as levou a aceitar tal distinção foi a "possibilidade de receber ajuda econômica para continuar a luta pela demarcação da terra dos índios e tornar conhecido o povo Tapirapé".

Recordo que precisou de um par de sapatos para comparecer diante do rei. Habituada a caminhar de pé no chão, fez alguns calos para ajeitar-se nos sapatos novos. Naqueles dias eu tinha um encontro com algumas irmãs.  Convidei a Veva para que desse um testemunho de sua missão. Ficou escandalizada quando uma das imãs lhe perguntou se os índios ainda eram antropófagos. Delicadamente pediu-me que não a convidasse mais para tais encontros.

Ela viajou à Europa acompanhada por dois caciques. Hoje os Tapirapé são mais de 800 e conseguiram conquistar outra aldeia que tinham perdido. No regresso descreveu-me as reações deles diante das novidades do velho Continente. Admirados com o que viam diziam-lhe: "Veva, você deixou tudo isto para viver sem nada junto com a gente?!

Herdeira autêntica do carisma de Charles de Foucauld, Veva testemunhou o Evangelho inculturado através da inserção radical, do profundo respeito pelo diferente, do permanente diálogo intercultural e interreligioso. Sem impor nada, soube caminhar de mãos dadas e integrar a boa nova da cultura Tapirapé com a Boa Nova de Jesus. Deste modo, as Irmãzinhas tornaram-se as "parteiras do CIMI", novo jeito de ser presença cristã missionária no meio dos povos Indígenas.

Segundo o ritual Apyãwa, como se autodenominam os Tapirapé, Veva foi enterrada dentro da casa onde morava. A cova foi aberta com todo o cuidado. A uma altura de uns 40 centímetros do chão foram colocadas duas travessas, uma em cada extremidade da cova. Nestas travessas foi amarrada a rede que ficou na posição de uma rede estendida com quem está dormindo. Sobre as travessas foram colocadas tábuas. Em cima delas foi depositada a terra peneirada pelas mulheres. No dia seguinte esta terra foi molhada e moldada para ficar firme e espessa como chão batido. Tudo acompanhado com cânticos e danças rituais. Na rede em que dormia, Veva continua o sono eterno entre aqueles que escolheu para ser seu povo e que soube amar até o fim.

Plantada em território Tapirapé está Veva-Mareaxigi, um monumento de coerência, silêncio e humildade, de respeito e reconhecimento do diferente, gritando o Evangelho com a vida, com ações simples e pequenas, salvando a vida e o tesouro da cultura de um povo.

Encontrei a Veva pela última vez no Congresso que celebrou os 40 anos do CIMI, em Brasília, de 20 a 23 de novembro do ano passado. Cansada, magrinha, encurvada, mas muito lúcida, sempre alegre e com os olhos brilhando de felicidade.

Estou chorando sua despedida. O consolo me vem da certeza de que os amados povos indígenas do Rio Negro e de toda a Abya Yala ganharam uma carinhosa e intrépida intercessora na definitiva Terra Sem Males, na Aldeia Eterna.

Que bom seria se você pudesse ler o belíssimo livro "Renascer do Povo Tapirapé - Diário das Irmãzinhas de Jesus de Charles de Foucuald", Editora Salesiana, São Paulo, 2002, organizado pelo caríssimo Benedito Prezia (vendaslivros@editorasalesina.com.br). Não resisto a tentação de transcrever o magnífico prefácio de Dom Pedro Casaldáliga.

 

"Eu sou testemunha

Este Diário das Irmãzinhas de Jesus, O renascer do povo Tapirapé, é uma página matriz da nova evangelização no meio dos povos indígenas. Uma pequena jóia de antropologia vivida e de missão inculturada. No respeito, na gratuidade, na acolhida. Na procura, na surpresa, na fé.

Diante de um mundo colonialista e de uma tradição pastoral mais ou menos compulsória, elas, as ‘Irmãzinhas azuis’, como dizia Darcy Ribeiro, aprenderam e ensinaram a ver e acolher o outro, como outro e como igual.

O dia-a-dia, o detalhe, a delicada atitude e toda uma vida dada evangelicamente a esse povo, que elas, em grande parte elas - as Irmãzinhas de Jesus -, ajudaram a salvar da extinção.

Para minha conscientização e para minha pastoral, tive a sorte de viver o primeiro contato com os povos indígenas à sombra luminosa das Irmãzinhas de Jesus no povo Tapirapé.

A veterana Genoveva, nossa Veva, tão singelamente heróica, continua aí e aí estava bem antes da minha chegada. Aí estava a saudosa Mayie Batista, falecida há pouco.

E neste ano de 2002, precisamente, as Irmãzinhas de Jesus e nós todos/todas, com elas, celebramos seus cinquenta anos de presença junto ao povo Tapirapé. Seus cinquenta anos de presença em Nossa América.

Logo no início desta nova ‘missão’, que seria depois a Prelazia de São Felix do Araguaia, eu senti como um detalhe amoroso da Providência a presença aqui de uma Fraternidade das Irmãzinhas. O irmão Carlos de Foucauld já vinha marcando minha vida. O que eu não conhecia ainda era essa contribuição pioneira das Irmãzinhas à nova pastoral indigenista, que apenas despontava.

Este Diário, tão simples como veraz, dá fé de uma verdadeira alvorada de missão nova, feita de amizade, de partilha, de testemunho. Ser e estar ali mesmo é mais do que fazer.

Em boa parte, pela aventura evangélica cujos primórdios este Diário recolhe, nada seria igual na pastoral indigenista. Há sementes escondidas que revolucionam toda uma colheita...” (Pedro Casaldáliga - Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, MT) 

 

 

 

CARTA DO PRIMEIRO ENCONTRO DA IGREJA CATÓLICA NA AMAZÔNIA LEGAL

 

“Não ardia o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho,

quando nos explicava as Escrituras!” (Lc 24,32)

 

Irmãs e irmãos,

 

Reunidos no Primeiro Encontro da Igreja Católica na Amazônia Legal, em Manaus, entre os dias 28 e 31 de outubro de 2013, nós, bispos, presbíteros, religiosas e religiosos, agentes de pastoral leigas e leigos, queremos partilhar com vocês as reflexões e análises sobre a situação atual da nossa região e as respostas que, como pastores, pretendemos dar aos desafios de nossos tempos. Agradecemos a Deus pelas maravilhas que operou entre nós e nossos irmãos e irmãs que, por um compromisso profético, testemunharam sua fé, muitas vezes até às últimas consequências (cf. Jo 13,1), dispostos a “dar não somente o Evangelho, mas até a própria vida” (1 Tes 2,8). Ao nos prepararmos para celebrar os 400 anos do início da evangelização na Amazônia, assumimos a missão que o Senhor nos propõe, de sermos suas testemunhas, discípulas/os, missionárias/os de sua Palavra, pois a Igreja é “enviada por Cristo a manifestar e a comunicar o amor de Deus a todos os homens e mulheres e a todos os povos” (AG 10).

 

“CRISTO APONTA PARA A AMAZÔNIA” (Papa Paulo VI): memória da caminhada.

Mesmo antes da criação da Amazônia Legal em 1953, a Igreja católica na Amazônia se reunia através dos seus bispos para posicionar-se pastoralmente diante dos problemas sofridos pelos povos desta região e enfrentar os grandes desafios que se anunciavam, pelas intervenções políticas e econômicas.

“Se o governo vai tentar o soerguimento econômico destas regiões, é urgente que um largo surto espiritual se antecipe aos progressos materiais, e os acompanhe, e os envolva, dando-lhes rumo seguro e feliz”. (1º Encontro inter-regional dos Bispos da Amazônia, Manaus 2 a 6 de julho de 1952, Documento final).

Apesar de não ter todas as condições necessárias, seja pela precariedade de instalações e meios, seja pela falta de pessoal qualificado para enfrentar os novos problemas, a Igreja amazônica nunca desanimou de sua missão. Sempre contou com missionárias e missionários vindos de outras regiões do Brasil e do mundo que, vivendo a mística do amor e do serviço, deram tudo de si para que povos da Amazônia não só recebessem uma orientação adequada para sua vivência de fé, mas tivessem respeitados seus direitos, sua dignidade e plena cidadania, suas tradições e culturas.

“...em nossas prelazias e dioceses existem sinais de alegria e esperança, próprias de uma Igreja que, mesmo tendo muitas dificuldades,está viva e responde com coragem aos desafios que se lhe apresentam” (Discípulos missionários na Amazônia, Manaus, 11 a 13 de setembro de 2007).

Ao longo de seis décadas, desde o primeiro encontro dos bispos em Manaus, a Igreja tem demonstrado sua vitalidade e posicionamento profético e solidário. Em Santarém 1972, decidiu basear sua ação pastoral e evangelizadora em duas diretrizes: (1) a Encarnação na realidade, pelo conhecimento e pela convivência, na simplicidade, e (2) a Evangelização Libertadora. Armou sua tenda no meio do povo de tal modo que apareceu um rosto eclesial bem amazônico na diversidade sociocultural, na defesa do lar que Deus criou para toda a humanidade e na promoção da Vida em todas as suas dimensões, sobretudo quando é ameaçada pelos impactos causados por um equivocado conceito de progresso que confunde desenvolvimento com crescimento meramente econômico, multiplicação de riqueza material, incremento do PIB, expansão do agronegócio, aumento de produção de biocombustíveis, descuidando-se, porém de políticas públicas e deixando de promover a justiça e o bem-estar de todos e para todos.

A Igreja na Amazônia adotou e incorporou as novas orientações eclesiológicas e pastorais vindas do Concílio Vaticano II, de Medellín e Puebla, Santo Domingo e Aparecida e buscou evangelizar a partir de uma visão mais ampla e profunda da vida e da realidade amazônicas. Assumiu a mística e espiritualidade do seguimento de Jesus Cristo, uma pastoral e uma missionariedade dentro da realidade local. Centenas de milhares de irmãs e irmãos leigos, religiosas e religiosos, presbíteros e bispos embrenharam-se nas matas, navegaram rio abaixo, rio acima, viajaram pelas estradas desse mundo desigual, levando a Palavra de Deus, fundando e organizando as comunidades eclesiais, vivas e participativas, proféticas e missionárias, numa grande rede de solidariedade que as fez enfrentar as precariedades existenciais, manter viva a chama de sua fé e sua esperança, e valorizar sobretudo sua religiosidade popular expressada nas festas religiosas, em novenas e procissões.

“E porque progredimos na compreensão de sermos uma Igreja no mundo, amando o mundo amazônico, temos a certeza que estamos dando à sociedade amazônica nossa contribuição histórica de alta qualidade para o resgate das dívidas sociais tão pesadas neste Norte do Brasil” (A Igreja arma sua tenda na Amazônia, Manaus, 9 a 18 de setembro de 1997).

Esta ação evangelizadora favoreceu o crescimento de uma Igreja mais local, ministerial, laical e missionária. Ao celebrar os 40 anos desde o Documento de Santarém, a Igreja na Amazônia manifesta a continuidade de sua caminhada como discípula missionária do Reino e enfrenta corajosamente velhos e novos desafios: “Diante dos desafios sociais, políticos, econômicos, culturais, religiosos e eclesiais da realidade amazônica, decidimos fortalecer o compromisso profético de transformação e reafirmar o projeto de formação inspirado na espiritualidade do seguimento de Jesus, que convoca a Igreja para uma profunda conversão pastoral”. (DAp, 170-175; 360-365, citado em “Conclusões de Santarém: memória e compromisso, 2012”).

As palavras do Papa Francisco aos Bispos do Brasil por ocasião da Jornada Mundial da Juventude dão-nos novo impulso para refletirmos sobre a realidade política e religiosa da Amazônia Legal e promover e defender a vida dos habitantes dessa região e de sua rica biodiversidade. Cala fundo em nosso coração a expressão do Papa Francisco de que a Amazônia é “teste decisivo, banco de prova para a Igreja e a sociedade brasileiras” (Rio de Janeiro, 27 de julho de 2013). Essas palavras incentivam-nos a retomar as intuições de Santarém 1972 e Manaus 1974 e dar-nos conta da atualidade das prioridades de então: formação de agentes de pastoral – comunidades cristãs de base – pastoral indígena – grandes projetos – juventude. 

 

PRIMEIRO ENCONTRO DA IGREJA CATÓLICA NA AMAZÔNIA

“A Igreja está na Amazônia, não como aqueles que têm as malas na mão, para partir depois de terem explorado tudo o que puderam. Desde o início a Igreja está presente na Amazônia com missionários, congregações religiosas, sacerdotes, leigos e bispos e lá continua presente e determinante no futuro daquela área”. (Papa Francisco aos Bispos do Brasil, Rio de Janeiro, 27 de julho de 2013).

Conscientes de que falta muito a ser realizado em nossa missão evangelizadora, conforme nos pede o Senhor da História (cf. Col 1,13 – 20), novamente nos encontramos em Manaus, desta vez com a participação de todos os regionais da CNBB que integram a Amazônia Legal (Norte I, II e III, Noroeste, Nordeste 5 e Oeste II). Sabemos que temos um mesmo caminho a palmilhar. Lembramo-nos de que Jesus mesmo é o Caminho (Jo 14,6). Jesus caminha conosco como o fez com os discípulos de Emaús que exclamaram: “Não ardia o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho, quando nos explicava as Escrituras!” (Lc 24,32). E não foi adiante, mas “entrou para ficar” (Lc 24,29). Jesus está na Amazônia para ficar. E o reconhecemos ao partir o pão.

Neste caminho comum damo-nos conta de que são comuns os problemas e desafios que nos interpelam. Confiando em Jesus, presente no meio de nós, queremos formar uma ampla rede integradora de nossas ações pastorais e evangelizadoras e convocar os irmãos e as irmãs a empenharem-se em favor de um mundo justo, fraterno e solidário. Queremos convocar também mulheres, e homens que não professam a nossa fé ou se afastaram de nossa Igreja a irmanarem-se conosco na defesa da dignidade e dos direitos dos povos da Amazônia e da criação que Deus em sua bondade e imenso amor confiou ao seu zelo e seus cuidados (cf. Gn 1,18).

Refletimos nestes dias sobre problemas que continuam a atingir e causar danos e ameaças à vida e à existência de pessoas e povos e ao meio ambiente na Amazônia. Ajudados por estudiosos e especialistas e ouvindo pessoas que sentem na pele os dramas causados por políticas de dominação em total desrespeito aos legítimos anseios e necessidades dos povos desta região:

 

·        analisamos e discutimos a realidade urbana e a mobilidade humana que tantos sofrimentos têm causado aos povos amazônidas como o desenraizamento da terra e a perda do patrimônio cultural e religioso próprio e comum aos povos tradicionais e dos que vêm de outras regiões;

·        verificamos um acentuado crescimento das igrejas evangélicas e dos sem-religião também na Amazônia, como consequência da precária presença de nossa Igreja nos movimentos migratórios;

·        fomos informados a respeito dos grandes projetos implementados na região, de modo especial as hidrelétricas, que representam uma nova invasão do capital visando explorar as nossas riquezas naturais e aproveitar o potencial energético de nossos rios, sem olhar para os prejuízos que causam ao meio-ambiente com sua imensa biodiversidade e a destruição da vida e da história de muitos povos tradicionais;

·        o desmatamento contínuo e novamente crescente das florestas amazônicas nos assusta pelos prejuízos incomensuráveis e pela ameaça ao equilíbrio ecológico do planeta; frente ao desmatamento, à concentração da terra e às monoculturas percebemos a urgência da realização da Reforma Agrária e Agrícola;

·        constatamos o crime impune da prática do trabalho escravo que ocorre nas empresas do agronegócio e nas áreas de mineração;

·        ficamos horrorizados ante o criminoso tráfico de pessoas e drogas, sustentado pela ganância, miséria e impunidade, e o assassinato de jovens;

·        ouvimos ainda os relatos de um representante dos povos indígenas e de um quilombola que nos falaram de suas organizações, lutas e conquistas e nos alertaram para os graves riscos de perderem, através da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 215), direitos conquistados em relação à demarcação e garantia de seus territórios, asseguradas nos Art. 231 e 232 da Constituição Federal de 5 de outubro de 1988; lembramos ainda que o Art. 68 das Disposições Transitórias da Constituição Federal reconhece aos remanescentes dos quilombos a propriedade definitiva de suas terras, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.

 

Enfim, constatamos que o domínio de um sistema único de mercado, o individualismo típico da cultura/sociedade de hoje e a violência urbana destroem os laços e as relações tradicionais: a família, a natureza, o mundo dos povos indígenas, dos caboclos, seringueiros, agricultores, ribeirinhos. Tudo é desagregado e desestruturado e essa realidade provoca a crise da esperança, pois rouba os sonhos, as aspirações, desorganiza as lutas, abre espaços para messianismos políticos e religiosos ou para um milenarismo alienante e vazio de sentido. 

Esses problemas atingem também os fiéis em suas necessidades subjetivas: sua busca de Deus e sua noção de vinculação com a Igreja. Está na hora de valorizarmos a religiosidade do povo e ampliarmos o diálogo ecumênico e inter-religioso.

 

COMPROMISSOS 

Os enormes desafios apresentados nos relatos e testemunhos nos interpelam como Igreja na Amazônia Legal a assumir compromissos pastorais que devem nortear a caminhada de nossa Igreja no presente e no futuro:

·        Reafirmamos nossa identidade de ser Igreja discípula da Palavra, testemunha do dialogo, servidora e defensora da vida, irmã da criação, missionária e ministerial, que assume a vida do povo, que se articula na paróquia como rede de comunidades e nas comunidades eclesiais de base (cf. Conclusões de Santarém: memória e compromisso, 2012, p. 19).

 

Causa-nos uma profunda dor ver milhares de nossas comunidades excluídas da eucaristia dominical. A maioria delas só tem a graça de celebrar o Memorial da Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor uma, duas ou três vezes ao ano. O Senhor, na véspera de sua morte, não deu um bom conselho, mas um mandato explícito: “Fazei isto em minha memória” (1 Cor 11,24; Lc 22,19). O Decreto “Presbyterorum Ordinis” do Concílio Vaticano II declara que a Eucaristia é fonte e, ao mesmo tempo, ápice de toda a Evangelização (cf. PO 5). “Nenhuma comunidade cristã se edifica sem ter a sua raiz e o seu centro na celebração da santíssima Eucaristia, a partir da qual, portanto, deve começar toda a educação do espírito comunitário” (PO 6). Também a Constituição Dogmática “Lumen Gentium” fala da Eucaristia como “fonte” e “ponto culminante de todas a vida cristã” (LG 11). Torna-se urgentemente necessário criar estruturas em nossa Igreja para que os 70% de comunidades, que hoje estão excluídos da celebração eucarística dominical, possam participar da “fração do pão” (At 1,42), do “sacramento da piedade, sinal de unidade, vínculo da caridade, banquete pascal” (SC 47).

A cultura urbana transforma profundamente a compreensão do papel dos leigos e da mulher na Igreja. Na sociedade civil, eles vivenciam processos de empoderamento social quando se exercitam na construção de uma sociedade que preserve os direitos sociais e coletivos. Práticas  e relações cotidianas exigem hoje, no interior das pastorais, modelos eclesiais assentados em relações recíprocas, mais do que no complemento, no diálogo horizontal em lugar de imposições verticais, na profunda experiência de serviço em lugar das lutas pelo poder.

O protagonismo dos leigos é insubstituível e imprescindível, na ação transformadora da realidade em que vivem, marcada pela exclusão e pela violência. O campo específico da missão dos leigos/as é o das realidades em que vivem e trabalham. É o mundo da família, do trabalho, da cultura, da política, do lazer, da arte, da comunicação, da universidade. É nos diversos níveis e instituições, nos Conselhos de Direitos, em campanhas e outras iniciativas que busquem efetivar a convivência pacífica, no fortalecimento da sociedade civil e do controle social. É na formação de pensadores e pessoas que estejam, nos níveis de decisão, evangelizando com especial atenção e empenho (cf. EN 70).

A corresponsabilidade e participação de leigas e leigos, como sujeitos com vez e voz, deve acontecer na elaboração e execução dos planejamentos pastorais, nos centros de discussão e decisão das Igrejas Particulares.

“Urge formar ministérios adequados às necessidades das comunidades, especialmente do Ministério do Pastoreio de comunidades, exercido por leigas e leigos que sejam servas e servos do povo, abertos ao diálogo e ao trabalho em equipe, e que, devidamente preparados, assumam em nome da Igreja a direção pastoral de uma comunidade” (A Igreja arma sua tenda na Amazônia, Manaus, 9 a 18 de setembro de 1997, n. 47).

Almejamos investir na formação de presbíteros e de irmãos e irmãs de vida consagrada – autóctones e os que chegam de fora – para que sejam despojados, simples, não busquem a autopromoção, que sejam missionários e vivam em maior sintonia e contato com as comunidades e saibam trabalhar em equipe com os/as leigos/as, evitando centralismo, clericalização e autoritarismo.

Comprometemo-nos em a dar visibilidade ao tráfico de pessoas para enfrentar esses crimes hediondos contra a liberdade e dignidade da pessoa humana. Apostamos na Campanha da Fraternidade de 2014 que tem como tema “Fraternidade e Tráfico Humano”.

Precisamos dar mais ênfase aos meios de comunicação, pois sabemos da sua importância para a Evangelização.

Conscientes de que a problemática da Amazônia é global, queremos abrir-nos a uma visão panamazônica que nos convoca a buscar caminhos de colaboração e compromisso entre as Igrejas na América Latina.

Queremos dar atenção especial aos jovens, através do apoio e incentivo à Pastoral da Juventude, estimulando as dioceses e congregações religiosas a liberarem presbíteros e religiosas para acompanhar os jovens, para que sejam oferecidos cursos de formação de assessores, preparando-os para este serviço à juventude na Amazônia.

 

UMA IGREJA COM ROSTO AMAZÔNICO

A Igreja Católica na Amazônia Legal vive e cresce com características próprias, enraizadas na sabedoria tradicional e na religiosidade popular que durante séculos alimentou e continua a manter viva a espiritualidade dos povos da floresta e das águas, e agora, do mundo urbano. Enfrenta com alegria as dificuldades das distâncias e da falta de comunicação para encontrar e oferecer ao rebanho, confiado a nós pelo Senhor da messe, a luz da Palavra de Deus e a Eucaristia como alimentos que revigoram e animam as forças para viver a comunhão com Deus e cuidar da Amazônia como chão da partilha, pátria solidária, “morada de povos irmãos e casa dos pobres” (DAp 8).

A carinhosa devoção a Nossa Senhora de Nazaré, Rainha da Amazônia, nos leve a cumprir o que ela nos pede: “Fazei o que Ele vos disser!” (Jo 2,5).

 

 

ENTREVISTA

 

Pe. Virgílio Leite Uchôa

Importância do momento com o Papa Francisco para a Igreja e a nossa Fraternidade

 

O Pe. Virgílio, da Fraternidade Sacerdotal de Brasília, compartilhou seu sentimento sobre o momento importante para as Fraternidades com o ministério do Papa Francisco. Vê como um momento peculiar e revolucionário, na esperança de concretização dos princípios do Concílio Vaticano II. O Papa “tem indicado o caminho de coisas essenciais e mostrado coragem e firmeza em deixar de lado aquilo que não mais tem sentido para a Igreja”.

Falou também sobre o valor da fraternidade para a vida dos Presbíteros, os cem anos de martírio do Irmão Carlos e sobre a nova Evangelização. Acha que “A evangelização hoje é muito menos preocupação em ganhar espaço, mas estar nos espaços e descobrir Deus acontecendo neles e nas pessoas”. 

Confira a entrevista concedida ao Pe. Nelito, membro da fraternidade de Brasília e assessor da CNBB:

 

Pe. Nelito: Como o Senhor avalia este momento para a Igreja e para a Fraternidade?

 

Pe Virgílio. Em primeiro lugar uma saudação a todos. É uma grande alegria poder compartilhar aquilo que temos acompanhado.

Há acontecimentos importantes no mundo, na sociedade, no Brasil e na Igreja. O papa Francisco tem nos dado sinais de poder caminhar na esperança de uma Igreja que concretize os princípios do Concílio Vaticano II. É um momento muito peculiar. Diria mesmo revolucionário. Tem indicado o caminho de coisas essenciais e mostrado coragem e firmeza em deixar de lado aquilo que não mais tem sentido para a Igreja.

Para a nossa fraternidade tudo é muito significativo. Há um reforço de estar sintonizado com tudo aquilo que é compaixão pelo sofrimento do mundo e das pessoas. Particularmente em relação aos pobres e aos excluídos na periferia da sociedade. Excelente oportunidade da Igreja se reencontrar com sua vitalidade.

São muitos os sinais da crise institucional pela qual a Igreja passa: as velhas cristandades desaparecem, seculares igrejas estão sendo fechadas, até mesmo sendo transformadas em cemitérios de urnas de cinzas como pude constatar recentemente na Alemanha. Há uma clara indicação de que o caminho da Igreja é o caminho do apóstolo Paulo: caminho da Igreja doméstica; Igreja itinerante; Igreja centrada na Palavra e na Eucaristia; dentro da vida do povo, sintonizada com todas as suas preocupações e suas lutas. Não uma Igreja poderosa, cheia de coisas desnecessárias e acidentais, mas uma Igreja viva! Isso nos encoraja e antecipa o que poderá ser o novo. A hora é essa! Seria lamentável perdermos essa oportunidade!

Vamos confiar e esperar e agir. Neste ano da fé que estamos terminando os caminhos de Deus parece que se abrem. Que pelo nosso testemunho e pela nossa esperança outras pessoas se agreguem a nós e se convertam. É a hora da conversão! É a hora da mudança! É a hora de viver plenamente os ideais lançados pelo Concílio Vaticano II.

 

Pe. Nelito: Virgílio, no dia 1º de dezembro de 2016, nós celebraremos os 100 anos de martírio de nosso irmão, Charles de Foucauld. O que esta celebração poderia nos motivar?

 

Pe. Virgílio. Em primeiro lugar, a celebração da morte é, sempre, uma celebração da vida, para nós que temos fé. Urge reavivar em nós a certeza de que o testemunho dele não foi em vão. E nós podemos e precisamos trilhar este caminho do irmão Carlos. A experiência de martírio dele e de muitas outras pessoas é e sempre foi fecunda para a caminhada da Igreja. Os quatro primeiros séculos na sua história foram vitais os testemunhos dos mártires. Há muitas formas de entregar a vida pela Igreja. Há testemunhos perto de nós. Celebramos os oitenta anos de Dom Celso Queirós, que foi secretário geral da Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil CNBB, por muitos anos. Ele foi um dos grandes animadores da renovação pastoral da Igreja no Brasil. É preciso ficar atentos àquilo que ele tem escrito ou tem falado porque isso ajuda a gente a reavivar, com a história da Igreja do Brasil, essa esperança de que a gente recupere um pouco desse espaço de renovação que foi uma das marcas da Igreja no Brasil, até meados dos anos 80 e, que, infelizmente foi interrompido. A gente precisa recuperar um pouco disso. E, vejam! O papa Francisco, com a sua visão nova: deixar de lado os penduricalhos e as coisas que não tem sentido, realmente nos ensina a centrar mais as energias, a esperança e a fé naquilo que é mais importante e mais definitivo. Isso é entregar a vida por coisas que valem a pena. Nestes dias faleceu Dom Waldyr Calheiros de Novais, bispo emérito de Barra de Piraí - Volta Redonda. Homem corajoso e destemido nos tempos difíceis da ditadura militar. Um dos que trouxe até nós a Fraternidade do irmão Carlos. 

 

Pe. Nelito. Como padre, você sempre viveu esta experiência da Fraternidade de Carlos de Foucauld. Qual é o valor, qual é a importância da Fraternidade para a vida, no presbitério.

 

Pe. Virgílio. É sempre uma descoberta! Acho que a Fraternidade é fundamental. Na verdade eu tinha conhecimento desta experiência, antes de entrar no seminário, quando participei da experiência da Juventude Universitária Católica (JUC). Li muitas coisas de Renée Voillaume a respeito do irmão Carlos. Encontrei a possibilidade de participar de um grupo da fraternidade a partir do retiro em Mogi das Cruzes. Mas foi o mês de Nazaré para mim experiência marcante. O mês de Nazaré não como uma espécie de diploma que se adquire, nem uma iniciação. É um momento que você tem, se souber experimentar a graça e a misericórdia de Deus, para sintonizar a própria vida à fraternidade e consolidar a direção da vida em Jesus de Nazaré. Eu diria que seria uma espécie de passaporte permanente de melhoria de sua vida; de recomposição de sua história. É um marco da graça e do tempo de Deus, dentro da nossa vida. Essa experiência foi muito marcante, bem como os retiros anuais. Participei de quase todos nos últimos anos. Importante também as experiências dos grupos de fraternidade. A ideia é forte, uma das principais do Charles de Foucauld: “nós temos que ser semente”! Nós não precisamos ter nenhuma preocupação de ostentação, nenhuma preocupação de número, de quantidade, mas, a gente acredita no testemunho, gritando o Evangelho com a vida. A vida já tem muito do Evangelho. A gente tem que estar muito atento à realidade da experiência do Evangelho de Deus acontecendo no cotidiano. A evangelização hoje é muito menos preocupação em ganhar espaço, mas estar nos espaços e descobrir Deus acontecendo neles e nas pessoas.

 

Pe. Nelito. Nós estamos, agora, num tempo de Nova Evangelização. Inclusive houve um sínodo recente sobre esse tema e, o papa já disse que vai fazer, agora, a exortação sobre a Nova Evangelização, que não vai ser uma exortação pós-sinodal, por causa da distância, mas, vai ser algo assim. O papa Paulo VI, já nos anos 60, quando publicou a Encíclica Populorum Progressio que, também, era sobre a nova evangelização ele citou, textualmente, o Charles de Foucauld como modelo da Nova Evangelização. E, nesses últimos tempos, nós vivemos a passagem de nossa irmã, Genoveva, que viveu 60 anos com os Tapirapés. O que você tem a dizer sobre isso?

 

Pe. Virgílio. Eu acho que a Nova Evangelização é uma atitude de escuta. A gente tem certa ilusão, achando que vai evangelizar falando muito. Eu penso que a gente vai evangelizar, prestando mais atenção nos caminhos que Deus está construindo através das pessoas. Tem que ser, um pouco, aquela atitude de Paulo que chegava onde as pessoas estavam. Observava o ritmo delas e dos acontecimentos que as envolviam. Tinha coragem de perder tempo. Escutava muito e com atenção ruminava  os fatos. Só depois começava a conversar. A atitude é importante: conversar e não simplesmente falar. Conversar é estabelecer o diálogo sem fim, sem pressa. A Evangelização é muito mais presença, itinerância e conversa. Assim torna-se anúncio. O anúncio tem uma formalidade para cada tempo. Hoje pode ser diferente. Amanhã também. Não podemos ter a pretensão de conquistar o mundo com a nossa palavra e com o nosso ardor. Evidentemente ele é importante quando deixa clara a transparência do Senhor Jesus. Sempre dialogando e ajudando as pessoas a dialogarem entre si e fazerem a experiência de redescoberta da ação do Espírito de Deus em nós. Partir apenas da nossa experiência pessoal, de nossas categorias, torna-se difícil evangelizar. Se a gente, entretanto, tiver a capacidade de ficar perto, ouvir, sentar, conversar, ajudar a pensar, tudo começa a ser diferente. Acho que o Evangelho vai entrar com mais facilidade. Temos muito que reaprender como se comunicar bem. Temos muitas coisas a comunicar. Podemos falhar por causa de meios inadequados. Criar novos meios e instrumentos de comunicação. Podemos aprender a partir da maneira como as pessoas estão se comunicando hoje. Ao ganhar a confiança pelo diálogo e respeitando as coisas como são, o ritmo das pessoas e dos seus momentos, tudo se torna mais simples e direto. Tenho a impressão que foi esta a experiência fundamental do irmão Carlos. Não ter medo do aparente fracasso. Porque no aparente fracasso é que está a vitória. Eu acho que o testemunho de Foucauld nos 100 anos de seu martírio, vem nos mostrar isso: a grandeza da inutilidade; a certeza de que o inútil é o melhor e o mais definitivo se nós quisermos fazer a experiência do mistério de Jesus de Nazaré.

 

 

 

NOTÍCIAS

 

 

ENCONTRO ANUAL DA COORDENAÇÃO DAS FRATERNIDADES 

Pe. Jeová Elias Ferreira (Sobradinho, DF)

 

Do dia 21 a 23 de outubro, na comunidade do Dique, cidade do Rio de Janeiro, na capela S. Mateus, Paróquia Santa Rosa de Lima, no bairro Jardim América, aconteceu o encontro anual da coordenação das Fraternidades. Estavam presentes nove presbíteros, representando as diversas regiões e serviços: Gildo, Cobo, Antonio Carlos, Sílvio, Antonio Lopes, José de Anchieta, Jeová Elias, Edivaldo Pereira (Didi) e Valdo; além do anfitrião, Pe. Jordi. 

Em sintonia com a proposta do Ir. Carlos, e acolhendo o apelo do Papa Francisco de ir às periferias, optou-se em realizar o encontro nessa favela do Dique: experiência marcante e inquietante para os participantes. As famílias nos acolheram carinhosamente em suas residências e as reuniões ocorriam na capela.

Seguimos o seguinte roteiro: Ofício Divino, apresentação e encaminhamentos dos temas propostos, partilha de vida, adoração, Eucaristia e, numa manhã, visita às famílias e locais com projetos sociais. Nos momentos de oração contamos com a participação das pessoas da comunidade.

Foi marcante a partilha do Pe. Jordi, que reside na sacristia da capela S. Mateus na comunidade do Dique. Sua preocupação é simplesmente ser presença gratuita, como fez o Irmão Carlos.  Realiza visita às famílias e celebra a Eucaristia entre os barracos. Relatou que os católicos são minoria, predominando os evangélicos. São 9 capelas e cerca de  39.000 habitantes no complexo de favelas, sendo 14.000 na comunidade do Dique, com muitos nordestinos e portugueses. Há 4 círculos bíblicos e uma participação pequena nas celebrações. Muitos problemas sociais: drogas, tráfico, alcoolismo, analfabetismo, ausência do Estado, lixo...  A comunidade paroquial marca presença com algumas ações sociais: distribuição de sopa, aula de reforço escolar, cestas básicas etc.

Entre os temas tratados no nosso encontro, destacaram-se:

Mês de Nazaré: será realizado de 3 a 26 de janeiro, no Mosteiro da Anunciação e já conta com 9 pessoas inscritas;

Retiro anual: de 13 a 20 de janeiro em Salvador, com inscrições em andamento. Será pregado pelo Pe. Camilo Pauleti. Devemos motivar os colegas a participarem e convidar novos;

Retiro dos seminaristas: ficou definida a data de 16 a 20 de julho de 2014, e sugerido o Mosteiro da Anunciação como local;

Boletim das Fraternidades: precisa ter mais colaboradores com artigos e de atualização dos endereços dos assinantes. Foi sugerida a contribuição de R$ 10,00 por boletim e R$ 30,00 por assinatura;

Contribuição para a Fraternidade: Sugerido uma anuidade. Ou seja, a contribuição de 10% da renda mensal, de cada membro, uma vez por ano. Há um saldo em caixa de R$ 7.709,25. Será repassado 10% deste valor para a fraternidade internacional como contribuição anual e, depois, 10% das entradas;

Celebração do centenário de morte do Ir. Carlos em 2016: foram pensadas algumas atividades que poderão ser realizadas: Missa em Aparecida; encontros e celebrações com as diversas famílias da fraternidade; promoção de fóruns e debates; publicação de artigos nos diversos meios de comunicação; boletim especial em novembro de 2015, como abertura do centenário, que se estenderá de 1 de dezembro de 2015 a 1 de dezembro de 2016; resgate da caminhada das fraternidades no Brasil; abertura de uma página da fraternidade para divulgação no facebook;

Presença das fraternidades no Brasil: foram contabilizadas cerca de 23 fraternidades assim distribuídas: 5 em São Paulo; 3 no regional Leste; 3 no sul; 4 no nordeste; 3 no norte e 5 no centro-oeste; Avaliamos que a fraternidade é um importante  espaço para cultivar a amizade, a espiritualidade e caminho de superação do isolamento e egoísmo. Também constatamos ser um bom momento, considerando a pregação e carisma do papa Francisco, para divulgar a nossa espiritualidade.

Nosso encontro terminou com o almoço no dia 23, onde estiveram presentes 3 colegas da fraternidade do Rio de Janeiro. Ficou definida o próximo encontro da coordenação para Belém, de 20 a 22 de outubro de 2015.

Deixamos nossa gratidão ao Pe. Jordi e às famílias que fraternalmente nos acolheram. Este encontro ficará marcado no nosso coração.

 

 

...E POR FALAR NO MÊS DE NAZARÉ

 

Querido José (Anchieta)!

Hoje cheguei de Hidrolândia! Lá, onde, nós, as irmãzinhas do Brasil, vivemos nosso retiro, animado pela Mercedes Budallés, do Mosteiro de Goiás e, depois, tivemos dois dias de encontro de Região. Somos agradecidas porque, o Senhor nos acompanhou, passo a passo!

Te escrevo para dizer que as irmãzinhas estão e estamos contentes sabendo que Dulcita e Edejanira estarão com vocês no mês de Nazaré, já estão preparando com muito carinho, com o aporte também de Iracema, o que irão partilhar com vocês! Eu quero pedir perdão porque não vou poder participar... nesses dias eu devo estar no Rio, com outro compromisso, porém, estou bem tranquila e confiante porque tanto Dulcita quanto Edejanira serão uma presença boa e propicia!

Da minha parte acompanharei com minha oração! Se você precisa de alguma coisa ou esclarecimento pode escrever para: torresdulcidea@gmail.com

Um forte abraço.

Dorinha.

 

 

NOTA DE FALECIMENTO

 

Faleceu no dia 14/11, às 8h30 da manhã, o querido irmão, Pe. Jean Marie LEMAIRE, da Diocese de Itabira - Fabriciano. O seu sepultamento aconteceu no dia 15/11, em Jaguaraçú, sua paróquia, cidade próxima a Ipatinga.

Ao Deus Pai de ternura, o nosso agradecimento pelo convívio, amizade e fraternidade como o querido Jean Marie, grande missionário estrangeiro no Brasil. Que lhe seja concedido o descanso nos braços do Pai e a alegria do Banquete celeste.

Da vida entregue em missão, a lembrança de alguém que soube gritar o Evangelho com a vida.

 

AGENDA

 

MÊS DE NAZARÉ

Será realizado de 3 a 26 de janeiro de 2014, no Mosteiro da Anunciação e já conta com um número expressivo de participantes.

 

RETIRO ANUAL DAS FRATERNIDADES

Acontecerá de 13 a 20 de janeiro de 2014, em Salvador, no “Convento Dom Amando”. Av. Aliomar Baleeiro (Antiga Estrada Velha do Aeroporto), Km 6,5 – Bairro Nova Brasília. Tel.: (071)3393-3154 e 9185-6200 – e-mail: conv-dom-amando@ig.com.br. Taxa: R$ 70,00 (setenta reais) a diária por pessoa.

Pede-se para levar o Ofício Divino das Comunidades e Bíblia. Assessor: Pe CAMILO PAULETTI – Diretor das Pontifícias Obras Missionárias

 

RETIRO DE SEMINARISTAS

Acontecerá entre os dias 16 a 20 de julho de 2014, em Goiás Velho, no Mosteiro da Anunciação, Diocese de Dom Eugênio Rixen.

 

 

 

LI, ASSISTI E INDICO...

 

Quando as pessoas conversam, além de se entenderem, as ideias fluem. E foi o que aconteceu! Numa roda de conversa, alguns irmãos tiveram a ideia de promover a socialização dos conteúdos de formação. Seria o seguinte: entre nós, podermos circular as descobertas pessoais feitas através de bons livros e de bons filmes. Não, simplesmente, fazendo citações bibliográficas e videográficas técnicas, mas, compartilhando as luzes, as boas novas, as impressões e as intuições pessoais quando, da leitura do livro ou do vídeo assistido. Este espaço é, desde o começo, uma conquista!

 

INDICAÇÕES DE LEITURAS

 

BOFF, Leonardo. Francisco de Assis e Francisco de Roma. ed. Mar de Ideias, RJ 2013, 72 p. O livro faz algumas comparações mostrando se não estamos vivendo numa nova primavera da Igreja. Ele aproxima de figuras simbólicas, como constatação de uma inspiração divina. Os dois Franciscos são marcados pela exigência evangélica de simplicidade, humildade, preocupação com a ecologia.

KASPERS, Walter (Cardeal). Servidores da alegria. ed., Loyola, SP. 2008, 126 p. O livro nos apresenta as dificuldades do sacerdote do futuro que, em meio as dificuldades, deve renovar sua espiritualidade, com confiança e alegria, buscando fortalecer a sua identidade e motivação. Na página. 64, cita a nossa Fraternidade Sacerdotal, como uma ajuda e enriquecimento para a comunhão sacerdotal. (Pe. José de Anchieta Moura Lima – Juiz de Fora – MG).

 

CNBB. Igreja e questão agrária no início do século XXI. Documento de Estudos. 

Interessante para manter os pés no chão... como verdadeiros discípulos de Cristo no Espírito de Carlos de Foucauld.

STÖCKER, Monika-Maria. Teresa de Lisieux: Aventura de um grande amor., ed. 02. MUSA Editora, 2003. Boa apresentação da Santa., edição especial para Jornada Mundial da Juventude.

O Renascer do Povo Tapirapé: Diário das Irmãzinhas de Charles de Foucauld, ed. 01, São Paulo, Salesianas, 2002, 254 p. Para lembrar a vida da recém falecida Ir. Genoveva.

Documentos Pontifícios. Exortação Apostólica: Evangelii Gaudium. (Pe. Tiago Hahusseau – Roraima).

 

ALMEIDA, João Carlos, MANZINI, Rosana, MAÇANEIRO, Marçal. As janelas do Vaticano II, A Igreja em diálogo com o mundo, Editora Santuário, Aparecida, 2013.

MIESZKOWSKA, Anna. A história de Irena Sendler, A mãe das crianças do holocausto, Palas Athena, São Paulo, 2013. (Padre José Bizon – Casa da Reconciliação – São Paulo/SP).

 

VERGHESE, Abraham. O 11º mandamento. S. Paulo: Companhia das Letras, 2011. Trata-se de um romance envolvente, apresentando como personagens missionários em Adis Abeba, capital de Etiópia. Uma freira Carmelita, tendo como missão atenuar o sofrimento dos doentes e evangelizar, que envolve-se afetivamente com um médico, brotando dois filhos gêmeos. A mãe morre no parto e o pai, desconhecendo a gravidez, desaparece. Os filhos são adotados por um casal de médicos missionários e crescem em meio à rotina hospitalar onde desenvolvem o interesse pela medicina.

O livro apresenta a abnegação de profissionais da medicina em hospitais sem recursos, doando-se pelos doentes mais pobres. Há muito de medicina, de conflitos políticos, de paixão e amor, sofrimento e generosidade. Romance excelente, que prende a atenção.

REDIKER, Marcus. O navio negreiro – uma história humana. S. Paulo: Companhia das Letras, 2011. Apesar do subtítulo, “uma história humana”, o livro traz a história desumana da escravidão entre o século XV e XIX, onde foram embarcadas e transportadas em navios cerca de 12,4 milhões de pessoas, chegando ao destino cerca de 10,6 milhões de sobreviventes.

Rediker apresenta a principal “tecnologia” que tornou possível o tráfico: o navio negreiro. É reconstruída, com detalhes que provocam revolta, a rotina nessas embarcações, envolvendo a perversidade dos capitães, o trabalho dos marujos, o sofrimento e levantes dos escravos, as doenças, o comércio em torno da escravidão. Texto que provoca indignação e vergonha pela escravidão.

HERVIEU-LÉGER, Daniele. O peregrino e o convertido – A religião em movimento. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes, 2008. Hervieu-Léger apresenta o panorama religioso do final do milênio passado e início do novo, marcado pela difusão do crer individualista, pela disjunção das crenças e das pertenças confessionais e pelas trajetórias diversas percorridas por “crentes passeadores”. Uma excelente análise sociológica da religião nessa época de pós-modernidade. Destaco como oportuno o que diz sobre as Jornadas Mundiais da Juventude. (Padre Jeová Elias Ferreira – Sobradinho – Brasília).

 

CNBB. Comunidade de Comunidades: Uma nova Paróquia. Edições CNBB, 2013. Partindo da perspectiva bíblica e teológica lança luzes para a renovação da paróquia

FRANCISCO (papa). Lumen Fidei. Edições Loyola, 2013

Uma profunda reflexão do Papa Francisco sobre a fé como luz que ilumina a vida. (Padre Orlando de Almeida Alves – Assis – São Paulo).

 

VAN THUAN, François Xavier Nguyen. TESTEMUNHAS DA ESPERANÇA - Quando o amor irrompe em situações de heroísmos e no dia-a-dia. Cidade Nova Editora. Um livro que amei porque nos mostra o Poder da Força da Fé em nossa vida... Nos dá a dica do esvaziamento de nossos tormentos para que Cristo nos Fortaleça. Onde o autor nos diz: "Olhe para a cruz e encontrará a solução para todos os problemas"... Livro para ser lido meditado e vivido...

Contextualização: Fim da Guerra do Vietnã, 1976. O novo governo, marxista, prende as pessoas consideradas perigosas para o povo. Entre elas, o arcebispo católico François Van Thuan. Ele passa treze anos no cárcere, nove incomunicáveis; depois vai para um "campo de reeducação" ... Só lhe restam duas possibilidades: amar a Deus, no segredo de sua cela, e amar a cada próximo que encontra. (Catarina FJC - Fortaleza – CE).

 

BERGOGLIO, Jorge M (Cardeal). Corrupção e Pecado. São Paulo, ed. Ave- Maria, 2013, 48 p.

O livro traz algumas reflexões a respeito da corrupção. Gostei das colocações achadas às páginas 9 e 10, falando das características do corrupto: "Está tão escudado na satisfação de sua autossuficiência que não permite nenhum questionamento... Diante de qualquer crítica fica mal, desqualifica a pessoa ou instituição que a faz, procura aniquilar toda autoridade moral que o possa questionar, recorre ao sofisma (...) para se justificar, desvaloriza os outros e arremete com o insulto contra quem pensa diferente. O corrupto costuma se perseguir de maneira inconsciente, e é tal a raiva que lhe causa essa autoperseguição que a projeta nos outros, e, de autoperseguido, transforma-se em perseguidor ...

Acredito que, nesta época do "mensalão" e da prisão de alguns "mensaleiros" revoltados contra o STF, estas reflexões do Bergoglio, quando arcebispo de Buenos Aires, oito anos atrás, merecem ser meditadas. (Pe. Jaime François Jongmans – Ribeira do Amparo – BA).

 

CAPPELLI, Piero. O Cisma Silencioso, Paulus, 2010. Na p. 239, cita de forma gloriosa o sábio eremita Charles de Foucauld e seu pensamento: “O amor ‘louco’ de Cristo Senhor”.

Esse livro é emitente na informação e na revelação desse terrível Cisma Silencioso e venenoso na Igreja Católica! Na visão proposta pelo beato Foucauld não existe espaço para esse infame Cisma quando “GRITA O EVANGELHO COM A VIDA em prol da salvação e comunhão radical das almas”. O carreirismo eclesiástico, fama, mídia, poder dominador que exclui, divide, adoece e mata são algumas causas dessa tragédia. Muito e muito cuidado com a ecopraxia e não esquecer o Mito de Ariadne. O fio de saída é a cura e a unidade no amor a Cristo e a Santa Igreja.

A nossa era pós-moderna é radical na desintegração, no facciosismo e na indiferença com o desluzir pessoal e institucional. A humilhação, a exclusão e o descaso é executado numa destruição lenta e progressiva enquanto os dignos valores são congelados e a morte fria sem sentimentos. A cremação não é só do corpo, mas do relacionamento, da vida e da alma. Na esfera religiosa sobressai o teatro da hipocrisia, psicastenia e a boçalidade. 

“Toda a nossa existência, todo o nosso ser deve Gritar o Evangelho de cima dos telhados. Nossa pessoa inteira deve respirar Jesus, todas as nossas ações. Toda a nossa vida deve gritar que pertencemos a Jesus, refletem uma forma de vida evangélica. Todo o nosso ser deve ser uma proclamação viva, um reflexo de Jesus”, dizia Charles de Foucault.

O Padre Charles de Foucauld sempre sonhou em compartilhar a sua vocação com os outros: depois de ter escrito várias regras para a vida religiosa, ele chegou à conclusão de que essa vida a "vida de Nazaré" pode ser conduzido por todos. Hoje, a "família espiritual de Charles de Foucauld" engloba várias associações de fiéis, comunidades religiosas e dos institutos seculares de ambos os leigos e sacerdotes espalhadas no mundo inteiro. Cada um deve gritar o Evangelho com o seu testemunho de amor, união, fraternidade e ecumenismo.

A obra missionária de Charles de Foucauld e a sua vida eremítica fundamentam-se na Palavra de Deus e na tradição monástica, tendo como resultado a promoção da dignidade da pessoa humana, salvação das almas, união eclesial e a fraternidade universal. E em tudo: “o amor ‘louco’ por Cristo e pela unidade”. (Padre Inácio José do Vale – Rio de Janeiro – RJ).

 

Encontrei dois artigos um sobre o papa e o outro do papa, a respeito do próximo sínodo, que merecem a nossa atenção. E, quem sabe, nós, padres, poderíamos trabalhar com as nossas bases. 

Um artigo é: “UM SÍNODO COMO QUER FRANCISCO”. Novidades e incógnitas do primeiro Sínodo deste pontificado. As mesmas que caracterizam o método com que o Papa Bergoglio governa a Igreja. A reportagem é de Sandro Magister e publicada no site Chiesa.it, 12-11-2013. A tradução é de André Langer.

O outro artigo é: “OS DESAFIOS PASTORAIS SOBRE A FAMÍLIA NO CONTEXTO DA EVANGELIZAÇÃO”. Documento de preparação da III Assembleia extraordinária do Sínodo dos Bispos

Vaticano 2013. (Padre Freddy Goven – Alagoinhas – BA)

 

 

INDICAÇÕES DE FILMES

 

João XXIII, o papa da bondade. Paulinas Vídeo 2004 - 204 min. - Cor.

O filme, pelo próprio nome, indica a principal característica do nosso Beato João XXII, o papa que marcou com o seu carisma, simplicidade, jovialidade e bom humor, por um pequeno tempo de pontificado, a convocação do Concilio, trazendo uma grande renovação para a vida de Igreja. A interpretação, no filme, apresenta várias fases da vida do papa da bondade. Vale a pena conferir.

Juventude: crises, cruzes e luzes. Pe. Zezinho, Paulinas Multimidia, 45 min. 2013 cor.

Pe. Zezinho, num monólogo, relata de forma bem diversificada, atraente, com muitas imagens de jovens, de várias partes do mundo, de várias etapas da história da humanidade, a maneira de como os jovens, em vários ambientes e situações, mostram a cara, de forma que nem sempre os jovens se encaixam em lugares no passado. Procuram ser otimistas sem desperdiçar os frutos do presente. (Pe. José de Anchieta Moura Lima – Juiz de Fora – MG).

 

Molokai, a ilha maldita. Obra espanhola de 1959, em preto e branco, de Luis Lucia.

Filme que narra a história do Pe. Damião, sacerdote espanhol que embarca num navio para trabalhar com leprosos segregados numa ilha no Oceano Pacífico em 1873. Ali permanece durante 16 anos, quando falece, contraindo a mesma doença.   Esse padre foi beatificado por João Paulo II em 1995 e canonizado por Bento XVI em outubro de 2009. O filme pode ser visto pelo YouTube e indico como ilustração dos textos evangélicos sobre os leprosos. Também tem sintonia com a espiritualidade do Ir. Carlos de estar com os últimos. (Padre Jeová Elias Ferreira – Sobradinho – Brasília).

  

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ORAÇÃO DO ABANDONO

 

ORAÇÃO DO ABANDONO

Meu Pai, a vós me abandono:

fazei de mim o que quiserdes!

O que de mim fizerdes, eu vos agradeço.

Estou pronto para tudo, aceito tudo, 

contanto que a vossa vontade se faça em mim

e em todas as vossas criaturas.

Não quero outra coisa, meu Deus.

Entrego minha vida em vossas mãos.

Eu vo-la dou, meu Deus,

com todo o amor de meu coração,

porque eu vos amo.

E porque é para mim uma necessidade de amor

dar-me, entregar-me em vossas mãos sem medida,

com infinita confiança, porque sois meu Pai.