BOLETIM 113-2003

Caros Leitores, Amigos e Irmãos da Fraternidade.

 

É com o coração cheio da alegria das Festas Pascais que nos dirigimos a cada um de vocês leitores e amigos das Fraternidades para apresentar lhes o Boletim 113.

Em primeiro lugar queremos lhes pedir mil desculpas pelo atraso e pelo conteúdo deste Boletim. Como já é tradição, o primeiro Boletim do ano traz sempre o conteúdo do retiro anual de janeiro. Mas devido há alguns problemas, o conteúdo do retiro será publicado num dos próximos números, o mais rápido possível. 

Estamos preparando a revisão do Boletim 109, um número especial dedicado aos Meios da Fraternidade, para ser publicado numa segunda edição corrigida e atualizada. Aguardem!

Neste Boletim estamos dando continuidade aos artigos publicados na edição internacional Courrier des Fraternités sobre os “50 anos da Fraternidade Sacerdotal”. Agora é a vez do Michel Bècquart apresentar Pierre Cimitière, o nosso querido e amado “Vieux Frère”, no artigo intitulado Graças a Eles.

A Oração do Abandono tem um destaque especial em dois textos: o primeiro é do Antoine Chatelard que apresenta a Oração de uma forma didática e de diferentes modos, enquanto o nosso Mons. Aderson, do Belém do Pará, apresenta a mesma oração vivida na sua vida ministerial.

Não poderíamos deixar de apresentar aos leitores alguns testemunhos de pessoas que participaram do retiro anual de 7 a 14 de janeiro de 2003, em Itapuã, Salvador, Bahia, seguidos da prestação de contas do retiro e do ano de 2002.

Finalmente queremos pedir a atenção de todos para algo interessante: “Frutos do Deserto”, é uma fita de vídeo sobre a vida do Irmão Carlos e o relato dos principais ramos da família espiritual. Em “O que ler” vocês encontrarão indicações de alguns livros que poderão ajudá-los a uma boa leitura. Por favor, olhem a agenda e participem das atividades das Regiões e enviem noticias das Fraternidades locais.

Boa leitura.

 

Michel Bécquart

 

1. Graças a Eles: Pierre Cimetière, o “Vieux Frère”, 

          

“Nada vale tanto quanto a amizade”

 

          Pierre Cimetière faleceu em 1969, em Thélus, vilarejo perto de Arras, no norte da França. 

          Lá viveu os quinze últimos anos de sua vida. Muitos padres do mundo inteiro o conhecerão como o “Vieux Frère” (Velho irmão). É um dos fundadores da Fraternidade Jesus Caritas e nós lhe devemos muito. 

          Fui ao cemitério de Thélus, para um aniversário discreto, nos dias chuvosos de dezembro. O túmulo de Pierre está bem perto da entrada, rico de símbolos. 

          Sim, o tempo passa depressa: as inscrições no túmulo são dificilmente legíveis, mas há crisântemos novos que dizem que ele não foi esquecido. Suas datas: 1896-1969 e a lembrança do grande compromisso de sua vida: “padre da União Jesus Caritas”. 

          O nome “União”, que permaneceu até 1976, evoca as evoluções que, aliás, foram vivamente desejadas pelo Vieux Frère: “Velho irmão, sim, mas não velho bonzo!”

          Diante de seu túmulo, voltado para o visitante, há um pequeno arbusto, moldado em forma de coração, “Jesus Caritas”, a Fraternidade é somente isso, um coração que ama, um coração de irmão, de irmão universal.

          Este túmulo, ao lado do de um outro padre, é o primeiro na entrada, como aquele que nos introduz, que nos faz entrar na compreensão deste lugar e, por isso mesmo, em nossa vida. É um lugar no qual se pode meditar, no alto das colinas de Vimy e de Lorette que lembram os longos combates da guerra de 1914-1918 e diante da planície de Lens, tão próspera no tempo do carvão. 

          Ordenado padre em Lille, em 1923, Pierre Cimetière deixa essa diocese e vai para a de Arras em 1929. 

          Por volta de 1950, ele se sente um tanto sem fôlego em seu ministério de decano de Pas-em-Artois, grande cidade rural, algo como insatisfação. Sem dúvida, ele possui a fé sólida e enraizada de sua família apegada à terra e caminha para a frente, em particular fundando as primeiras equipes da JAC, tendo sido formado por padres sociais e democratas da diocese de Lille. 

Mas, ele espera alguma outra coisa... como um sopro refrescante. E então, pelos acontecimentos da vida de sua família, o encontro que muda tudo, com Carlos de Foucauld. Ele conta:

          “Com 55 anos. Em setembro de 1951, no Tubet, nas Irmãzinhas de Jesus, encontrei alguns padres dos quais diversos me haviam ultrapassado em sua busca....foi neste por assim dizer retiro que o Irmão Carlos, ou antes, o Senhor literalmente me seduziu e possuiu... algo fulminante numa evidente clareza de ter enfim encontrado o que procurava na inquietude desde o seminário...Desde muito tempo, sem dúvida, porque eu estava procurando mal, porque tinha necessidade de descobri-lo nas profundezas de Jesus Salvador, através de um coração humano que ele tinha invadido totalmente, um coração vibrando nas dimensões da humanidade porque vivendo nas dimensões do coração de Deus... Sentia-me pego por uma grande luz que, pobre e desprovido, eu acabava de receber...” (Origens e etapas por duas testemunhas).

          Para poder responder a esse novo apelo ao serviço de seus irmãos padres, na busca de uma espiritualidade especificamente diocesana, ele pede para ser mudado. “Desce”; de decano passa a simples pároco dessa aldeia de Thélus que verá uma quantidade de padres e cuja categoria, no correio, passará a um nível superior por causa da abundância de cartas. 

          Com Guy Riobé, Gabriel Isaac e alguns outros, é um pioneiro.

Conheci o Vieux Frère já nos primeiros anos de meu sacerdócio. Depois de minha ordenação, fui vê-lo em Thélus e entrei em sua Fraternidade. Para dizer a verdade, ele me causava um certo medo, ou antes, eu me sentia intimidado por ele. Não tinha muita coisa a lhe dizer, naquele momento; estava entusiasmado com a vida, sem muitos problemas. Vivi no seminário como um pensionista num colégio e, vigário numa primeira nomeação, tinha o apoio de uma equipe de padres. Comíamos todos os dias juntos. Cada semana nos reuníamos com os padres do setor. Eu gostava muito de ouvi-lo nos encontros de fraternidade. Ele se sentava num velho sofá de couro, fumando tranqüilamente seu cachimbo, um pouco distante de nossa mesa de encontro e, no entanto, vivamente atento. Então, repentinamente, ele nos falava de um padre do Viet Nam ou do Brasil. Comentava trechos de cartas ou visitas recebidas, como nestas notas de um de seus retiros:

“Não existem somente nossos países do ocidente. Há o imenso continente da América Latina, cuja população duplicou e vai triplicar em relativamente pouco tempo, onde a Igreja ainda não perdeu a classe operária, embora esteja a caminho de perdê-la. Cito para vocês somente fatos que conheço através de padres que encontrei ou cartas que recebi durante o espaço de um ano. Passei um mês neste verão com um padre do Brasil. Hélio, único padre para uma favela de 40 mil habitantes. Como é duro, muito duro viver para milhares de pessoas! Na Guatemala, sacerdotes foram expulsos. Falaram muito das misérias do país. Paro aqui. São apenas pequenos fatos entre muitos outros. Serão suficientes, creio, para colocar vocês bem dentro do drama da Igreja”.

 

          Numa abadia, por ocasião de um encontro de fraternidade, eu conversava com um padre, sobre os “sem papéis” de Calais, que aguardam desesperadamente a regularização de sua situação, e eu me dizia “nós, os padres não são somos sem papéis! para evocar a massa de documentos que amontoamos sem poder aprofundá-los e pô-los em prática. É verdade que o escritório de Pierre estava também  cheio de cartas e de revistas, mas ele permanecia pobre. Sua casa estava aberta a todos. Ele não vivia entulhado de tarefas. Não estava estressado. Acolhia em sua casa a qualquer hora. A casa paroquial era um oásis  onde a caravana parava para beber na fonte, refazer as forças, descarregar o fardo e continuar reconfortada. Pierre Cimetière, padre comum de um pequena aldeia da França, tinha um coração disponível e universal, à imagem do coração de Jesus. Sua casa era um poço de Jacó onde Jesus vinha repousar e revelar os segredos de seu coração a uma samaritana que reencontrou o sentido da vida. Seu último escrito, no Diário (dezembro de 1969) nos mostra o fundo de seu coração:

“Digamos que temos todos necessidade de um verdadeiro preconceito de amizade. Permitam-me ainda dizer a vocês o que mais me dominou nos últimos meses em meu relacionamento com os padres da União de todos os continentes e com os que estão mais perto na diocese, aquilo de que todos mais necessitamos: não julgar nem condenar antes de conhecer. Um simples e verdadeiro olhar de amizade é mais importante que as mais sábias exposições”. 

 

Terminando esta rápida evocação, alguns chavões do Vieux Frère, que provocavam riso mas que ficavam na memória daqueles que o ouviam tantas vezes:

 

“Um padre partilhado não pode ser feliz. O máximo de alegria no máximo de renúncia, é o maior testemunho que podemos dar” (Diário de dezembro de 1969).

 

“Quando é Deus que preside nossa vida, ele põe sempre uma ordem, uma calma, sua paz, sua alegria. Algumas tensões interiores nos cansam e nos desanimam muito mais do que todos os nossos trabalhos”.

 

“Uma oração que não nos faz agir é tão falsa quanto uma ação que não nos faz rezar”. 

 

Antoine Chatelard

 

2. Oração do Abandono - REFLEXÃO SOBRE A ORAÇÃO DO ABANDONO

 DESTACAMOS ESTE ARTIGO. VOCÊ PODE LÊ-LO CLICANDO NESTE LINK:

 

Mons. Aderson Neder

 

3. A Oração do Abandono na Vida Ministerial

                      Na celebração Eucarística pelos meus quarenta anos de Ministério Sacerdotal, fiz umas adaptações dos cantos que foram entoados durante a mesma. Em dois deles escrevi esta expressão, “no ocaso da vida”, para dar a entender que meu ministério sacerdotal estava quase terminando. Essa expressão, como não podia deixar de ser, doeu-me na alma, embora fizesse um esforço para aceitar tudo das mãos de Deus, inclusive as diversas etapas da vida, como as finais, pois numa vida de consagrado tudo é do Senhor e para Ele. Humanamente, porém, essa aceitação é algo dolorido e Deus sabe muito bem disso. 

                     Dias atrás, fui avisado que dentro de dias deixaria meu cargo de pároco da paróquia de São José, em Castanhal. O impacto conseguiu ser “engolido” e no momento não o transpareci em nervosismo. Ao contrário, até ponderei certos aspectos do que viria depois da minha renúncia efetiva e na Missa da tarde foi com muita serenidade que comuniquei o fato aos fiéis presentes à matriz. Depois da celebração, alguns paroquianos foram até a sacristia para me abraçar e um casal, que parecia comovido, agradeceu-me tudo o que fizera por eles.  Fiz-lhe ver que o que acontecera, - o caso foi de conversão e de recomeço de vida cristã, - não tinha sido obra minha, mas de Jesus, de Quem sou simples instrumento de salvação. 

                     No dia seguinte, depois de uma noite relativamente calma, o coração começou a apertar pela circunstância de me sentir, muito ao vivo, “no ocaso da vida ou do ministério”. Gostaria de poder dizer ao Pai, como Jesus na cruz, “tudo está consumado” ou tudo está realizado, se tivesse sido um padre um pouco mais santo ou um tanto mais disponível e doado ao meu Deus e aos meus irmãos. Desde que aceitei ser consagrado pelo sacerdócio, tomei como resolução o que mandei gravar em minha lembrança de ordenação e de primeira Missa: “Mais um servo para a Igreja de Deus”.  Tenho plena consciência que essa resolução não a consegui realizar plenamente, mas também tenho certeza de que ela não ficou esquecida. Com vinte e seis anos doados a paróquias, seis e meio à direção de Seminários, quatro a capelanias e quatro e meio ao vicariato geral da Arquidiocese, teria algo a oferecer ao Senhor e sua Igreja. Isso, contudo, é tão pouco e poderia ser muito mais, se minha saúde ajudasse e se minha espiritualidade fosse maior. Agora, a “aposentadoria” com certeza será aproveitada para me dedicar um pouco mais aos meus carismas, inclusive ao de escrever ou ao de me doar mais ao “Igreja Jovem”. Isso se Jesus me conceder ainda alguns anos a mais de vida. Aqui lembro do bondoso Dom Alberto Ramos, fazendo planos de, quando aposentado, poder se doar ainda a uma paróquia do interior, na missão de pároco que ainda não exercera. No entanto, Jesus logo o levou para o Reino eterno. 

                     Entrego-me nas mesmas mãos de Jesus. Esse sentimento de entrega, possivelmente o tenho por rezar diariamente, às vezes repetidamente, “a oração do abandono”, composta e rezada pelo servo de Deus, Charles de Foucauld. Rezei-a sempre, mesmo pedindo a Jesus a coragem de poder de fato me entregar “em suas mãos sem medida”. Isto supõe fazer sempre a vontade de Deus e não a nossa, coisa que não é fácil. Precisamos aprender, com o próprio Jesus, a viver a sua súplica, na maior angústia do Jardim do Getsêmani, quando implorou ao Pai “que se fizesse a vontade deste e não a dele”. Como Homem, o Senhor podia ter vontade diferente do Pai. Essa vontade estaria condicionada, como acontece conosco, pelo sofrimento, por outros objetivos ou justos desejos ou por outras aspirações. 

            Abandonar-se nas mãos divinas é deixar tudo a critério de Deus. Ele sabe muito mais e melhor o que nos convém e o que realmente nos fará feliz. Por isso, neste ocaso do meu ministério, que pode ser também da vida, esforço-me por repetir corajosamente em todas as circunstâncias: “Que seja feita a tua vontade, Senhor meu Deus!”. 

 

Retirar-se é preciso

 

          O verbo do ditado é navegar. Vem de uma dolente canção portuguesa, de autor brasileiro: “Navegar é preciso...” O verbo que escrevo aqui, em substituição ao navegar-se, é o retirar-se. Não discuto dele o significado.   As retiradas nem todas são iguais. Nem poderiam sê-las. Uma são mais estratégicas, diante de um perigo que deve ser vencido. Outras são apressadas e basta um átimo para serem totalmente realizadas. No entanto, quando a retirada é feita com a vida ou talvez com o coração, ela deve ser precedida de conscienciosa preparação, de aconchegante encontro, no devagar da atenção, para não se correr o perigo de torna-la levianamente errada.

          A verdade é que quase toda retirada se torna sofrida. Especialmente quando não planejada, sem conhecimento exato da realidade que a motiva e a exige. No caso, quem se retira sofre e não é pouco o sofrimento. Para se exigir uma retirada é preciso primeiro descobrir se ela corresponde de fato àquilo que Deus quer. A vontade do Senhor deve ser a razão primeira de qualquer mudança ou transformação em nossa vida e, conseqüentemente, do ter de retirar-se de um lugar para o outro ou de uma situação para outra. Só a vontade do Senhor pode exigir de nós uma autêntica desinstalação. Nesse caso fazemo-la sem humilhação, com dignidade e até com alegria e satisfação. 

          Compreende-se que o cumprimento da obediência pode obrigar a aceitação da retirada, mesmo dolorida, mas sabemos que Deus sempre se coloca do lado do mais fraco, do injustiçado, do que sem discussão obedece. Às vezes, essa obediência, depois de aceita e praticada, acarreta ainda maior dor e até enfermidade, pois toda violência, mesmo sendo altruisticamente assumida, redunda sempre em sofrimento maior. 

          No mando de uma retirada deve haver diálogo. A delicadeza na colocação das razões é sempre profícua. A partida quase sempre supõe uma renúncia muito grande, que faz sangrar o coração da alma e faz doer enormemente. Principalmente quando essa partida tem a possibilidade de ser a última etapa de uma vida. O sim que se dá em tal circunstância exige muito mais fé e mais amor, para que se possa ter a necessária coragem do passo inicial ou mesmo de toda a caminhada. Não é fácil partir, muito mais quando o coração aflora em lágrimas, porque se aproxima a retirada final em busca da eternidade de Deus. 

          Retirar-se é preciso. Quase sempre é preciso, mas quem sai ou se retira deve ser tratado de maneira a poder aceitar evangelicamente a condição de “servo inútil” sobre a qual preveniu Jesus. Isso porque, como já dizia Pascal, “o coração tem razões que a razão desconhece”. Se representado por um órgão de carne, o coração é o que representa o mais recôndito, o mais íntimo da alma. Se às vezes ele parece estar já prevenido ou já preparado para um embate, com mais reservas de coragem e de decisão, outras vezes ele está simplesmente ferido, daquelas feridas que nem sempre são percebidas, que doem sem aparecer.

          Vale a pena saber discernir as circunstâncias que envolvem as horas difíceis da decisão de obedecer e de retirar-se. Não adianta titubear, nem vacilar. É preciso ver além das aparências e só enxergar o essencial, pois tudo depende exclusivamente da fé. Se é Deus quem de fato está chamando e pedindo a retirada, só vale correr e cair em seus braços divinos. Doendo ou não o coração ficará feliz, daquela felicidade que não se troca por nada, porque recende a própria felicidade de Deus.

 

Enfim, só...

 

                     Enfim só... Solidão à vista, mas que não exclui a presença do Amigo maior. Ele só sairia, ocasionando a mais terrível ausência, se eu quisesse. Ninguém poderia arrancá-lo de mim, mesmo me despojando de tudo, dentro da esfera humana, naturalmente. 

                     A solidão pesa e machuca, mas não é capaz de sufocar o amor e, conseqüentemente, o perdão. Este deveria ser normal entre cristãos, com exigência de um diálogo fraterno. Sem este, a sensação de abandono fere demais a alma e faz pensar em Jesus, na cruz, mesmo sendo o Filho de Deus, perguntando a Este, na recitação do salmo 22: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Se Ele, sendo Deus, assim sentiu a angústia da solidão no momento supremo da imolação, por que nós, pobres pecadores, não podemos ter a mesma ansiedade? Será pecado sofrer a dor a mais cruel?

                     É terrível saber que não há resposta para o “por que?”, o qual, em se tratando de Deus, é substituído pelo “para que?”. Isso, contudo, não acontece dentro das nossas estruturas humanas, a não ser que façamos um esforço inaudito para, através da fé, aceitarmos ver o “dedo” divino naquilo que o povo costuma sintetizar num provérbio: “Deus escreve certo mesmo com linhas tortas”.

                     Não há objetivo válido, a ser alcançado, se ele, para ser conseguido, supõe o ferimento e a destruição de outros valores. Jesus pregou e exigiu de seus apóstolos e demais seguidores a fraternidade: “Vocês são todos irmãos!” O falecido dominicano frei Mateus Rocha diz, em um de seus livros, que para os religiosos não deveria existir o voto de obediência, mas sim o de fraternidade, porque neste já estaria incluída a obediência naquilo que ela deve ter de mais peculiar, ou seja a co-responsabilidade pela congregação e pela vida comunitária. Aqui, o amor fraterno é que age e realiza tudo segundo o desígnio do Senhor. 

                     Dentro dessa linha autenticamente cristã, a humildade faz ver no Senhor o verdadeiro mandante e o verdadeiro obediente, Ele que “foi obediente até a morte e morte de cruz”.  Ele obedeceu porque sabia que era essa a vontade do Pai, embora fosse um “cálice” muito amargo para ser sorvido. O que estava em jogo era a nossa redenção e esta exigia a doação máxima do Senhor, até a entrega da vida sem medida, no derramar todo o sangue até a última gota.

                     Em fim, só. É na esperança que se deve assumir também uma possível e forçada solidão. Mesmo que esta de um certo modo seja imposta, procurar amá-la, à maneira do irmão Carlos, que a escolheu como prova de amor a Jesus e aos irmãos. Aceitar aqui é tudo: enfim só, mas com Jesus! Por Ele aceitei obedecer.

 

4. Testemunhos de Participantes do Retiro de janeiro de 2003

 

 

Sem. Waldecy Leitão. Esta foi a minha primeira experiência de vivência mais concreta dos valores instituídos por Charles de Foucauld: Fraternidade, adoração e deserto. Atenção especial ao deserto por se tratar de um momento oportuno de reflexão jamais vivido intensamente. Nele, a princípio, fui tomado por um medo, certamente porque me encontrava distante das minhas seguranças. Através da experiência do deserto pude dar um passo significativo no conhecimento da minha pessoa diante do Absoluto que me basta.

 

Pe. José Eugênio. Depois de muitas tentativas para participar do retiro anual da Fraternidade Sacerdotal, pude estar com vocês nestes dias, que para mim se tornaram especiais, marcando uma nova etapa da minha caminhada.

Todo o retiro senti o Ir. Carlos ao meu lado me instruindo, fazendo comigo meditações preciosas, ensinando-me a estar em adoração, me abandonar em Deus.

Tive oportunidade de pensar na relatividade daquilo que somos e fazemos para contemplar o Absoluto de Deus.

Para mim se torna uma busca de identidade maior a “imitação de Jesus”, quando aprendo e aceito viver o exemplo do Ir. Carlos “Eu não posso ser diferente ser diferente de cristo”.

A partir deste ano minha experiência na África, junto aos irmãos e irmãs de Moçambique, será minha Nazaré, desejo mesmo que seja um flasch de experiência de e com Deus.

Agradeço a oportunidade, a acolhida e a amizade de todos, pela oportunidade e incentivo, sempre.

 

Irmazinha Genoveva. Foi a primeira experiência. Revitalizou alguns aspectos... da nossa vocação comum... importante para mim que vou começar agora numa nova inserção.

O dia de deserto foi muito valioso, momento forte de solidão... e também dos imprevistos dos acontecimentos que apareceram, cortaram a solidão. Mas não tiraram a paz profunda que eu estava sentindo.

Uma coisa muito forte que me marcou, foi o nosso relacionamento durante esses dias de grande “fraternidade” e “simplicidade”.

 

 

Pe. Luis Cardalda. Achei que o retiro foi um bom exercício de fraternidade e saio fortalecido nessa proposta de criar fraternidade. O exemplo do Ir. Carlos é sempre desafiador e a referência à sua vida e aos seus escritos me parece fundamental nos nossos retiros. Mas quero frisar que o que mais me impactou foi a primeira meditação sobre o Absoluto de Deus.

A disposição do encontro de silêncio e adoração e na parte da tarde de fraternidade pareceu-me ótima. Penso que caberia uma maior ênfase no exercício prático da revisão de vida.

A todos vocês que trabalharam para fazê-lo possível e em especial ao Pe. Celso Pedro pela sua disponibilidade um muito obrigado.

 

José Siqueira Barbosa. É a primeira vez que participo de um retiro desta natureza. No começo cheguei um pouco desanimado, mas lentamente fui contagiado pela graça e bondade de Deus. Não posso deixar de dizer que o carinho, a alegria e a amizade dos irmãos e irmãs também me ajudou a renovar o espírito e o coração.

Todo o retiro foi gratificante para minha vida, mas os momentos de adoração ao Santíssimo foram profundamente marcantes. No Domingo ao apresentar a Jesus minha vida, minha vocação, minha família e as pessoas que me pediram orações, senti algo muito forte. Foi uma emoção misturada com tristeza, alegria e lágrimas. Compreendi que naquele momento o Senhor Deus estava realizando sua bondade de nos curar de muitas coisas. Em mim com certeza a indisposição inicial, pois hoje que finaliza o retiro me sinto diferente, mas feliz...

 

Pe. Jeová Elias Ferreira. Para mim o retiro foi uma oportunidade para resgatar a paixão do chamado inicial de Deus para o serviço pastoral. Desde o meu primeiro ano de seminário (1985) que não vivia uma experiência de oração tão intensa como agora. Destaco em especial o dia de deserto que foi um dos momentos mais fortes no contato apaixonado com o senhor. Destaco também os momentos de adoração e a vigília, como de muita importância o espírito das celebrações litúrgicas cheia de vida, sem formalidades, tratando a espontaneidade da relação com Deus.

Foi o meu primeiro encontro com a fraternidade e deixou uma impressão muito boa, sobretudo o idealismo de fazer do ministério sacerdotal um verdadeiro serviço. Acho que poderia ser convenientes um momento de lazer, ou passeio com o grupo, o que poderia estreitar ainda mais os laços de fraternidade. Sou grato a todos por estes dias.

 

Pe. Hernesto Pereira de Oliveira. Como a cada ano bebi, nas fontes da Fraternidade Jesus+Caritas, sob o impulso das palavras do nosso pregador, aquela água benfazeja da espiritualidade do Ir. Carlos de Foucauld, que me sustenta nos “desertos e nazarés” de cada dia da missão de apascentar os irmãos no ministério sacerdotal que é sempre difícil e delicado.

Me senti como sempre, na minha timidez, conheci pessoas novas, revi amigos de outros encontros, vivi momentos a sós com o meu bem amado Senhor Jesus e momentos de conversas com muitos irmãos, fortaleci o ânimo pelas partilhas nas fraternidades de vida.

Para mim foram de muita valia as noites com testemunhos das pessoas que colocaram suas experiências, os intercâmbios que tivemos com os outros continentes, pela presença do Pe. Helmut e do Pe. Felicien.

 

Pe. João Batista Dinamarques

 

5. Prestação de Contas

 

Contabilidade 2002 Fraternidade Sacerdotal Jesus+Caritas

 

Histórico

Entradas

Saídas

Saldo


Contabilidade 2002 Fraternidade Sacerdotal Jesus+Caritas


Histórico Entradas Saídas Saldo

Saldo Anterior   1.360,00

Contribuições 3264.45  

Correios (Boletins e Correspondências)  1.670,25 

Gráfica  2.750,00 

Tarifas Bancárias  162,59 

Empréstimo para Boletim 500,00  

Diversos  125,00 

Saldo 5.124,45 4.707,84 416,10



Contabilidade Retiro 2003 Fraternidade Sacerdotal Jesus+Caritas


Histórico Entradas Saídas Saldo

Diárias 18.300,00  

Contribuição 1.885,00  

Boletim 1.890,00  

Intenções de Missa 1.000,00  

Venda de livros e Santinhos 853,00  

Doação para Boletim 2.000,00  

Diárias  19.460,00 

Boletim  800,00 

Táxi  22,00 

Fotocópias  52,50 

Refrigerantes para confraternização  72,00 

Correios  13,75 

Fotocópias  16,20 

Livros Loyola  420,70 

Livros Cidade Nova  248,50 

Correios  24,10 

Passagem Pe. Felicien Salvador/SP  388,00 

Passagem Pe. Mariano SP/Poá  400,00 Saldo 25.928,00 21.917,75 4.010,25



6. Agenda


1. Mês de Nazaré

06 a 30 de janeiro de 2004

Fátima de São Lourenço, MT

Responsável: Pe. Freddy Goven e Equipe


2. Retiro Anual

06 a 13 de janeiro de 2004

Local: São Paulo, SP

Assessor: Pe. Antônio Reges Brasil


3. Região Sudeste

26 a 28 de maio de 2003

Arrozal, RJ

Responsável: Pe. Gildo


26 e 27 de maio de 2003

Bauru, SP

Responsável: Pe. Carlos Roberto


01 a 03 de dezembro de 2003

Praia da Ribeira

Angra dos Reis, RJ

Responsável: Pe. Gildo 


1ª quinzena de dezembro de 2003

Marília, SP

Responsável: Pe. Valdo


4. Região Centro Oeste

09 a 11 de junho de 2003

Goiânia, GO

Responsável: Pe. Ernanne Pinheiro


5. Região Nordeste

22 a 24 de julho de 2003

Juazeiro/Carnaiba

Responsável: Pe. Silvano


6. Região Sul

05 e 06 de maio de 2003

Local: Porto Alegre, RS

Responsável: Pe. Maurício


7. Região Norte

1ª quinzena de julho de 2003

Santarém/Belém, PA

Responsável: Pe. Antônio Carlos


01 a 03 de dezembro de 2003

Boa Vista, RR

Responsável: Pe. Edson Damian


8. Equipe de Coordenação

08 a 11 de setembro de 2003

Pirai, RJ

Responsável: Pe. José Bizon


7. Um Livro Um Amigo


O Que Ler


KHATLAB, Roberto, Maria no Islã, Editora Ave-Maria, Embu - São Paulo, 2003. “Devemos conhecer o que as outras religiões crêem e colocar Deus entre nós. O Espírito de Deus nos fará descobrir um ao outro”.


CONSELHO NACIONAL DE IGREJAS CRISTÃS DO BRASIL - CONIC, Relatório sobre a Dignidade Humana e a Paz no Brasil, Editora Salesiana, São Paulo, 2002. “O Relatório sobre a dignidade humana e a paz no Brasil – 2002  publicado pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil – (CONIC) no quadro das comemorações dos seus vinte anos de existência, dá continuidade ao esforço ecumênico da Campanha da Fraternidade 2000, que tratou desse mesmo tema”.


CASTRO, Marcos de, Dom Hélder - misticismo e santidade, Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2002. “O resgate deste livro nasceu de uma conferência do padre Comblin – Espiritualidade de Dom Hélder - pronunciada em Olinda algum tempo depois da morte daquele que foi o maior nome da história da Igreja no Brasil no século XX”.


KHATLAB, Roberto, As Igrejas Orientais - Tradições vivas, Editora Ave-Maria, Embu - São Paulo, 1997. “Portanto as Igrejas Orientais formam um grande mosaico, no entanto refletem a variedade de cores de Igrejas vivas que estão engajadas dentro do turbilhão dos acontecimentos mundiais e regionais, e dão testemunho de fidelidade a Deus e ao homem dentro de uma história divino-humana”.

DIÁRIO DAS IRMÃZINHAS DE JESUS 1952-1954, O renascer do povo Tapirapé, Editora Salesiana, São Paulo 2002.“Este Diário das Irmãzinhas de Jesus, O renascer do povo Tapirapé, é uma página matriz da nova evangelização no meio dos povos indígenas. Uma pequena jóia de antropologia vivida e de missão inculturada. No respeito, na gratuidade, na acolhida. Na procura, na surpresa, na fé”.


 COLETÂNEA EM HOMENAGEM AOS 80 ANOS DE JOSÉ COMBLIN, A esperança dos pobres vive, Paulus, São Paulo 2003. “Ele é, sem a menor dúvida, um latino-americano nascido na Bélgica, um belga que assumiu como sua a causa de libertação dos povos deste continente !


8. Frutos do Deserto – A herança de Carlos de Foucauld



Finalmente saiu o vídeo – Frutos do Deserto, A herança de Carlos de Foucauld – com a vida do Irmão Carlos e o relato dos principais ramos da família espiritual. O filme original foi feito pelos Irmãos do Evangelho e Irmãzinhas de Jesus a partir da realidade norte-americana.


Diante da boa qualidade do vídeo, os vários ramos do Brasil decidiram realizar uma versão brasileira, mostrando os grupos que aqui vivem e como trabalham. Assim aparecem as Fraternidades das Irmãzinhas de Jesus, dos Irmãos de Jesus, dos Irmãos do Evangelho, a Fraternidade Sacerdotal, a Fraternidade Secular, a Fraternidade Missionária, O Instituto Jesus Caritas e a Fraternidade Aliança (Arturo Paoli), além de citar a Associação Charles de Foucauld, o Sodalício e a Fraternidade de Damasco.


O vídeo é um excelente material para divulgar a mensagem do Irmão Carlos e a vida dos grupos seguidores de sua espiritualidade.


A distribuição está sendo feita pela Verbo Filmes.

Valor: R$30,00, mais R$6,00 de despesa postal.

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9- Lista dos Participantes do Retiro da Fraternidade Sacerdotal Jesus+caritas 2003

Nome

Nascimento

Ordenação

Pe. Alfredo Rodrigues Martins

25/03/1948

29/06/1974


Sem. Airton de A. Bezerra

29/04

 

Pe. André Seutin

14/09/1934

17/07/1960


Sem. Antonio Julio Borecki

11/07/1969

 

Pe. Antonio Lopes Ferreira

 

10/12/1994

Pe. Antonio de Oliveira

19/06/1947

18/04/1976


Pe. Ademário Benevides de Souza

22/03/1940

15/08/1990


Pe. Aldenor Alves de Lima

01/11/1970

27/01/2001


Pe. Aldenor Claudino de Oliveira

12/04/1963

24/09/1995


Pe. Alberto Dionisio Santos

04/03/1966

02/08/1998


Sem Caio Augusto de Andrade

25/09/1976

 

Pe. Carlos Roberto dos Santos

28/09/1963

17/02/1996


Sem. Darci de Souza

22/04/1964

 

Côn. Celso Pedro da Silva

13/03/1936

03/12/1961


Sem. César Augusto Dias Garcia

14/12/1972

 

Pe. Edson Damian

04/03/1948

20/12/1975


Pe. Eliésio dos Santos

22/07

16/12


Pe. Emerval Antonio de Lima

08/03/1954

12/12/1990


Pe. Edivaldo Pereira dos santos

05/10/1969

16/08/1997


Sem. Edenildo Pereira da Silva

20/06/1975

 

Sem. Eugênio Lemos

09/02/1972

 

Pe. Feliciem Bernad

10/10/1965

15/10/1994


Pe. Fioravante  A Moreschi

20/12/1929

08/12/1954


Pe. Franco Manetti

01/01/1945

21/04/1968


Pe. Francisco Lunod Pintac

02/04/1949

14/04/1976


Pe. Freddy Goven

16/12/1945

05/06/1971


Pe. Gaspar Kruster

24/11/1936

14/03/1964


Sem. Geraldo R. Kramer

08/08/1972

 

Pe. Geraldo João Lima

16/10/1937

29/06/1964


Pe. Geraldo K. Brandstetter

10/12/1935

29/06/1961


Sem. Gescione Dias de Araújo

26/05/1974

 

Ir. Genoveva de Jesus

15/09/1933

25/03/1958


Pe. Gildo Nogueira Gomes

04/06/1955

15/12/1985


Pe. Hernesto Pereira de Oliveira

18/05/1965

03/06/1995


Pe. Henrique Geraldo Martinho Gereon

03/09/1937

02/02/1963


Pe. Jean Marie Lemaire

08/09/1937

15/07/1962


Pe. José de Anchieta

02/04/1958

04/08/1985


Pe. José Bizon

14/08/1954

09/05/1981


Pe. José Dilson de A Barbosa

16/05/1963

25/01/1992


Pe. José Vicente de Lima

25/07/1957

17/12/1983


Pe. José dos Santos Almeida

16/06/1935

29/06/1959


Pe. José Ernanne Pinheiro

02/09/1938

05/12/1965


Pe. José Eugênio Fávero

12/02/1956

07/12/1987


Sem. José Siqueira Barbosa

11/12/1963

 

Pe. Jeová Elias Ferreira

24/08/1961

30/11/1991


Sem. João de Souza Cabral Junior

27/02/1976

 

Pe. Júlio Antonio Rocha

12/04/1970

30/01/1999


Pe. Luis Cardalda

21/06/1935

17/03/1962


Maria Lucia da Silva

30/06/1966

 

Ir. Melani Sabathy

17/12/1937

 

Ir. Miguelângela Bosco

12/12/1927

26/09/1952


Ir. Neid de Jesus

28/02/1952

07/12/1991


Pe. Paulo Wafflari

27/08/1957

23/06/1985


Pe. Ricardo Zanchin

20/03/1958

09/09/1984


Pe. Valdemar Aparecido dos Reis – Pardal

15/07/1963

27/08/1989


Pe. Vilmar Nunes Marques

15/11/1955

19/03/1994


Pe. Zacarias de Souza Lima Neto

09/10/1953

19/12/1982


Sem. Waldecyr Leitão

10/06/1974


10-Na hora escura do amanhecer

D. Pedro Casaldáliga - circular 2003-02-18

            

            Passaram-se dois anos do novo século XXI e o Mundo continua cruel e solidário injusto e esperançado. Ainda há guerra e há império, e o império acaba de inventar a guerra preventiva. Ainda o Mundo se divide pelo menos em três: Primeiro, Terceiro e Quarto.

            

            A fome, a pobreza, a corrupção e a violência têm aumentado; mas  aumentaram também a consciência, o protesto, a organização, a vontade explícita de alternatividade.

 

            Aquele selo místico, que Rahner profetizara para este novo século, aparece sem dúvida, com muitos rostos, em confusão e em diálogo também. As Religiões são cada vez mais pluralismo religioso, e haverão de ser convivência e intercâmbio. A fé se refrata em mil nomes e mil buscas e a fé convivida fraternalmente será o grande suporte da esperança humana.

 

            Deus está à vista. À vista está Humanidade nova.

 

            Existem um crescente, incontrolável, anseio de mudança. Em mensagens e fóruns e plataformas a consigna básica é: “Queremos outra coisa!” Queremos um outro Mundo, porque um outro Mundo é possível, e necessário e urgente. Um Mundo uno, sem primeiros nem terceiros, sem impérios e sem genocídios, sem lucros sanguinários e sem exclusões desesperantes. Queremos uma outra América, dizemos concretamente aqui: sem dominações e sem alcas, em fraterna União. Queremos uma outra Igreja também, sem “classes”, sem centralismos, sem rixas denominacionais.

 

            No Mundo esta vontade de mudança expressa-se no Fórum Social Mundial e nos fóruns regionais. Em Nossa América, a mudança mais significativa chama-se agora Lula, com projeção de esperança para todo o Continente. Na Igreja as inquietudes estão convergindo na proposta de um processo conciliar, que parecerá inoportuna a certos espíritos involucionistas, e que entretanto traduz mui eclesialmente a vontade multitudinária de ser e de fazer uma outra Igreja: mais ao lado dos pobres do Reino, mais inculturada, mais samaritana, mais sinodal, mais corresponsável, mais fraterna. Não é nenhuma inoportunidade sonhar com o Concílio Vaticano III ou com o México I o com um Bombai bem asiático...

 

            A verdade é que estamos cansados de dominação e de falta de transparência, nas diferentes esferas públicas e nas secretas esferas pessoais. Este nosso Mundo e este nosso pequeno coração, tão maus aparentemente, carregam um profundo peso de boa vontade, de sede de Verdade, de fome de Vida e de Deus. Os signos dos tempos, apesar de tantos antisignos, são até luminosos, esperançadores. Como diz o provérbio sefardita, “a hora mais escura é quando vai amanhecer...”

 

            Nesta Prelazia de São Félix do Araguaia, nossa adolescente Igreja particular, estamos também de mudança. Neste ano eu completo os 75 e, como é de rigor canônico, renuncio à mitra. Nos últimos meses tivemos um período bastante fecundo de “transição”, com as Assembléias regionais e a promulgação do Manual – objetivo, atitudes, normas, que é referencial e guia da nossa caminhada.

 

            Nesta hora e com esta breve circular, quero agradecer, em nome de todo o Povo da Prelazia e de toda a Equipe Pastoral, a solidariedade, a colaboração, a presença, gratuita e incondicional, de tantas amizades e instituições que vêm nos acompanhado e possibilitando nossa missão e suas estruturas de serviço. Em primeiríssimo lugar, recordamos evidentemente os/as agentes de pastoral que aqui suportaram “o peso do dia e do calor”, e me suportaram a mim. A lista, de agentes e de amizades, é longa demais para citar nome por nome. Deus os tem todos escritos no Livro da Vida. Algumas amizades e entidades vêm nos acompanhando desde a primeira hora e sobretudo nos acompanharam nas horas da repressão e da incompreensão. Eu sei que nossas amizades e essas entidades - vocês – continuarão sendo amizade, solidariedade, presença, para a Prelazia de São Félix do Araguaia. Somos já todos/todas gente de casa, empresa de família, uma parcela pequena mas estimulante do Reino de Deus “entre o Araguaia e o Xingu, o Pará e o Travessão”.

 

            Pessoalmente sinto-me como quem espera num ponto de ônibus, sem saber bem nem a hora nem o destino imediatos, sabendo porém que continuaremos em comunhão a humilde viagem humana para a Casa paterna-maternal.

 

            O provérbio sefardiua fala da luz do amanhecer; um provérbio universal diz que na hora do ocaso nenhuma luz ofusca... Faço meus nesta hora uns versos de “El hombre de la Mancha”, que me traduzem expressivamente:

 

“Sonhar  mais um sonho impossível.

Lutar quando é fácil ceder.

Vencer o inimigo invencível.

Negar quando a regra é vender.

 

Quantas guerras terei que vencer por um poço de paz!

E amanhã, se esse chão que eu beijei

for meu leito e perdão,

vou saber que valeu delirar

e morrer de paixão!”

 

E nesta hora, e em todas as horas, valha sobretudo a consigna que as Irmãzinhas de Jesus nos recordaram, celebrando na Prelazia seus 50 anos de presença no meio do povo Tapirapé: “Gritar o Evangelho com a vida”.

             Não nos despedimos. Seguiremos unidos, na Paz militante do Reino.

 

 

                                                                                               Pedro Casaldáliga  


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