BOLETIM 145/2013

Dom Hélder Câmara

O PACTO DAS CATACUMBAS


Fonte: Instituto Humanitas Unisinos

(disponível em www.unisinos.br/ihu/index.php)


No dia 16 de novembro de 1965, poucos dias antes da clausura do Concílio Vaticano II, cerca de 40 Padres Conciliares celebraram uma Eucaristia nas catacumbas de Domitila, em Roma, pedindo fidelidade ao Espírito de Jesus. Após essa celebração, firmaram o “Pacto das Catacumbas”.


O documento é um desafio aos “irmãos no Episcopado” a levarem uma “vida de pobreza”, uma Igreja “servidora e pobre”, como sugeriu o papa João XXIII. Os signatários - dentre eles, muitos brasileiros e latino-americanos, sendo que mais tarde outros também se uniram ao pacto – se comprometiam a viver na pobreza, a rejeitar todos os símbolos ou os privilégios do poder e a colocar os pobres no centro do seu ministério pastoral. O texto teve forte influência sobre a Teologia da Libertação, que um dos signatários e propositores do Pacto foi Dom Hélder Câmara, cujo centenário de nascimento é celebrado neste sábado, dia 


PACTO DAS CATACUMBAS DA IGREJA SERVA E POBRE


(Publicado no livro “Concílio Vaticano II”, Vol. V, Quarta Sessão,Vozes, 1966, organizado por Boaventura Kloppenburg. p. 526-528).


Nós, Bispos, reunidos no Concílio Vaticano II, esclarecidos sobre as deficiências de nossa vida de pobreza segundo o Evangelho; incentivados uns pelos outros, numa iniciativa em que cada um de nós quereria evitar a singularidade e a presunção; unidos a todos os nossos Irmãos no Episcopado; contando sobretudo com a graça e a força de Nosso Senhor Jesus Cristo, com a oração dos fiéis e dos sacerdotes de nossas respectivas dioceses; colocando-nos, pelo pensamento e pela oração, diante da Trindade, diante da Igreja de Cristo e diante dos sacerdotes e dos fiéis de nossas dioceses, na humildade e na consciência de nossa fraqueza, mas também com toda a determinação e toda a força de que Deus nos quer dar a graça, comprometemo-nos ao que se segue:


1) Procuraremos viver segundo o modo ordinário da nossa população, no que concerne à habitação, à alimentação, aos meios de locomoção e a tudo que daí se segue. Cf. Mt 5,3; 6,33s; 8,20.


2) Para sempre renunciamos à aparência e à realidade da riqueza, especialmente no traje (fazendas ricas, cores berrantes), nas insígnias de matéria preciosa (devem esses signos ser, com efeito, evangélicos). Cf. Mc 6,9; Mt 10,9s; At 3,6. Nem ouro nem prata.


3) Não possuiremos nem imóveis, nem móveis, nem conta em banco, etc., em nosso próprio nome; e, se for preciso possuir, poremos tudo no nome da diocese, ou das obras sociais ou caritativas. Cf. Mt 6,19- 21; Lc 12,33s.


4) Cada vez que for possível, confiaremos a gestão financeira e material em nossa diocese a uma comissão de leigos competentes e cônscios do seu papel apostólico, em mira a sermos menos administradores do que pastores e apóstolos. Cf. Mt 10,8; At. 6,1-7.


5) Recusamos ser chamados, oralmente ou por escrito, com nomes e títulos que signifiquem a grandeza e o poder (Eminência, Excelência, Monsenhor...). Preferimos ser chamados com o nome evangélico de Padre. Cf. Mt 20,25-28; 23,6-11; Jo 13,12-15. 


6) No nosso comportamento, nas nossas relações sociais, evitaremos aquilo que pode parecer conferir privilégios, prioridades ou mesmo uma preferência qualquer aos ricos e aos poderosos (ex.: banquetes oferecidos ou aceitos, classes nos serviços religiosos). Cf. Lc 13,12-14; 1Cor 9,14-19.


7) Do mesmo modo, evitaremos incentivar ou lisonjear a vaidade de quem quer que seja, com vistas a recompensar ou a solicitar dádivas, ou por qualquer outra razão. Convidaremos nossos fiéis a considerarem as suas dádivas como uma participação normal no culto, no apostolado e na ação social. Cf. Mt 6,2-4; Lc 15,9-13; 2Cor 12,4.


8) Daremos tudo o que for necessário de nosso tempo, reflexão, coração, meios, etc., ao serviço apostólico e pastoral das pessoas e dos grupos laboriosos e economicamente fracos e subdesenvolvidos, sem que isso prejudique as outras pessoas e grupos da diocese. Ampararemos os leigos, religiosos, diáconos ou sacerdotes que o Senhor chama a evangelizarem os pobres e os operários compartilhando a vida operária e o trabalho. Cf. Lc 4,18s; Mc 6,4; Mt 11,4s; At 18,3s; 20,33-35; 1Cor 4,12 e 9,1-27.


9) Cônscios das exigências da justiça e da caridade, e das suas relações mútuas, procuraremos transformar as obras de “beneficência” em obras sociais baseadas na caridade e na justiça, que levam em conta todos e todas as exigências, como um humilde serviço dos organismos públicos competentes. Cf. Mt 25,31-46; Lc 13,12-14 e 33s. 10) Poremos tudo em obra para que os responsáveis pelo nosso governo e pelos nossos serviços públicos decidam e ponham em prática as leis, as estruturas e as instituições sociais necessárias à justiça, à igualdade e ao desenvolvimento harmônico e total do homem todo em todos os homens, e, por aí, ao advento de uma outra ordem social, nova, digna dos filhos do homem e dos filhos de Deus. Cf.At. 2,44s; 4,32-35; 5,4; 2Cor 8 e 9 inteiros; 1Tim 5, 16.


11) Achando a colegialidade dos bispos sua realização a mais evangélica na assunção do encargo comum das massas humanas em estado de miséria física, cultural e moral - dois terços da humanidade - comprometemo-nos:


– a participarmos, conforme nossos meios, dos investimentos urgentes dos episcopados das nações pobres;

– a requerermos juntos ao plano dos organismos internacionais, mas testemunhando o Evangelho,como o fez o Papa Paulo VI na ONU, a adoção de estruturas econômicas e culturais que não mais fabriquem nações proletárias num mundo cada vez mais rico, mas sim permitam às massas pobres saírem de sua miséria.


12) Comprometemo-nos a partilhar, na caridade pastoral, nossa vida com nossos irmãos em Cristo, sacerdotes, religiosos e leigos, para que nosso ministério constitua um verdadeiro serviço; assim:


– esforçar-nos-emos para “revisar nossa vida” com eles;

– suscitaremos colaboradores para serem mais uns animadores segundo o espírito, do que uns chefes segundo o mundo;

– procuraremos ser o mais humanamente presentes, acolhedores...;

– mostrar-nos-emos abertos a todos, seja qual for a sua religião. Cf. Mc 8,34s; At 6,1-7; 1Tim 3,8-10.


13) Tornados às nossas dioceses respectivas, daremos a conhecer aos nossos diocesanos a nossa resolução, rogando-lhes ajudar-nos por sua compreensão, seu concurso e suas preces.


AJUDE-NOS DEUS A SERMOS FIÉIS.


Nota sobre os participantes da celebração do pacto das catacumbas, na catacumba de Santa Domitila - Roma - 16 de novembro de 1965, por José Oscar Beozzo - São Paulo, 26-06-2009.


Na verdade, tive acesso a duas listas de presença, em diferentes momentos do Concílio (1962 e 1964) dos bispos que participavam do Grupo “Igreja dos Pobres”. Essas listas encontravam-se entre os papéis do Cardeal Lercaro, depositados no Instituto per le Scienze Religose de Bologna.


Não tenho, porém, a lista daqueles 39 bispos que estiveram na celebração da missa na Catacumba de Santa Domitila no dia 16 de novembro de 1965, quando foi firmado entre eles o Pacto das Catacumbas.


Quiseram fazer uma celebração discreta, longe da imprensa, com poucos bispos (inicialmente devia ser para 20 apenas), para evitar que seu gesto de despojamento e compromisso pudesse ser interpretado como uma “lição” aos demais bispos. Tanto assim que a primeira notícia da celebração só apareceu numa nota de Henri Fesquet no Jornal Le Monde, mais de três semanas depois, no dia de encerramento do Concílio, a 8 de dezembro de 1965, sob o título “Un groupe d’évêquês anonymes s’engage à donner le témoignage extériieur d’une vie de stricte pauvreté”, (Henri Fesquet, in Journal du Concile. Forcalquier: Robert Morel Editeur, 1966, pp. 1110-1113). A notícia não citava nomes.


Existe a lista dos que participaram naquela celebração. Ela se encontra entre os papeis de Mgr. Charles Marie Himmer, bispo de Tournai na Bélgica, que presidiu a concelebração daquela manhã e pronunciou a homilia. Trata-se do documento 80 dos “Papiers Himmer” depositado no Arquivo do Vaticano II na Universidade de Louvain. Não tive acesso a esse documento, mas é possível solicitá-lo à universidade, se Jon Sobrino ou o site da PUC-Rio se interessam. M. Lamberigts, professor de História em Leuven e Claude Soetens, também historiador em Louvain-la-Neuve poderiam eventualmente localizar o documento.


Posso dizer que  do Brasil, participaram da celebração, Dom Antônio Fragoso de Crateús CE, Dom Francisco Austregésilo Mesquita Filho de Afogados da Ingazeira, PE, Dom João Batista da Mota e Albuquerque, arcebispo de Vitória, ES, o Pe. Luiz Gonzaga Fernandes que estava para ser sagrado bispo auxiliar de Vitória, dias depois, lá mesmo em Roma, Dom Jorge Marcos de Oliveira de Santo André, SP, Dom Helder Camara, Dom Henrique Golland Trindade, OFM, arcebispo de Botucatu, SP, Dom José Maria Pires, arcebispo da Paraíba, PB.  


De outros países, 

Mgr. Georges Mercier, bispo de Laghouat no Sahara, Mgr. Hakim, bispo melquita de Nazaré, 

Mgr. Haddad, bispo melquita, auxiliar de Beirute, Mgr. Gérard Marie Coderre, bispo de Saint Jean de Quebec do Canadá,

Mons. Rafael Gonzalez Moralejo, auxiliar de Valencia na Espanha,  

Mons. Julius Angerhausen, auxiliar de Essen na Alemanha;

da França, Mgr. Guy Marie Riobé, bispo de Orleans, Mgr. Gérard Huyghe de Arras, Mgr.Adrien Gand, bispo auxiliar do Cardeal Liénart em Lille; 

da Itália, Mons. Luigi Betazzi, naquela época auxiliar do cardeal Lercaro emBologna; 

da África, Dom Bernard Yago, arcebispo de Abidjan na Costa

do Marfim, Joseph Blomjous, bispo de Mwanza, na Tanzânia;

da Ásia,  Mons. Charles Joseph de Melckebeke, belga, mas bispo de Ningsia na China, expulso e morando em Singapura.


Havia também bispos do Vietnã e Indonésia. 

De outros países da América Latina, participavam do grupo Igreja dos Pobres, Mons. Manoel Larrain de Talca no Chile, Mons. Marco Gregorio Mc Grath do Panamá (diocese de Santiago de Veraguas),

Mons. Leonidas Proaño de Riobamba, Equador; 

da Argentina, Mons. Alberto Devoto da diocese de Goya, Mons. Vicente Faustino Zazpe da diocese de Rafaela, Mons. Juan José Iriarte

de Reconquista; 

do Uruguai, Mons. Alfredo Viola, bispo de Salto e seu

auxiliar, Mons. Marcelo Mendiharat;

 da Colômbia, Mons. Tulio Botero Salazar, arcebispo  de Medellín e seu auxiliar, Medina;  Muñoz Duque de

Pamplona, Raúl Zambrano de Facatativá e Mons. Angelo Cuniberti, vigário apostólico de Florencia.


Esses eram os mais fieis do grupo, mas para saber se estavam lá na Missa, é preciso verificar na lista daquele dia. Sei que também Paul Gauthier e Marie Thérèse Lescaze, os dois franceses, mas vivendo na Palestina e animadores da Fraternidade de Jesus Charpentier em Nazaré e do Grupo Igreja dos Pobres, no Concílio, participaram da celebração.


Um momento mais público do Grupo “Igreja dos Pobres” aconteceu na terceira sessão, em que dois documentos ali preparados, em novembro de 1964, recebeu a adesão de mais de 500 padres conciliares:  Simplicitas et paupertas evangélica (Simplicidade e pobreza evangélica) e Ut in nostro ministério primus locus pauperum evangelizationi tribuatur (Para que em nosso ministério [episcopal], se dê o primeiro lugar DO RETIRO)


Dom Hélder Câmara


A ESPIRITUALIDADE DE FOUCAULD NO CONCÍLIO VATICANO II:


NOVO ESPÍRITO NA VIDA DA IGREJA


Pe. Daniel Higino Lopes de Menezes


No encerramento da semana de oração pela unidade dos cristãos, em 25 de janeiro de 1959, o papa João XXIII anuncia o Concílio Ecumênico do Vaticano II. Surpresa e perplexidade em todo o mundo. Realiza-se na Igreja um “novo pentecostes”. Em 500 anos de história havia ocorrido apenas 2 concílios e o papa, considerado de transição, agora convoca toda a Igreja para esse momento novo. Torna-se motivo de esperança, compromisso e realização. Duas guerras mundiais e várias crises políticas e econômicas marcam a primeira metade do século XX. 


No meio desse contexto, fervilham no seio da Igreja Católica vários movimentos na expectativa de mudanças profundas. O anseio maior passava no intuito da Igreja responder, à luz da fé, aos principais desafios da modernidade em crise. Para isso, buscava-se a renovação litúrgica tornando-a mais acessível a participação dos fiéis; o espírito de pobreza entre seus ministros e o compromisso com os pobres; o diálogo com a modernidade, o ecumenismo, o diálogo inter-religioso e a inculturação; a missionariedade da Igreja numa perspectiva de anunciar a Boa Nova do Reino de modo testemunhal. Na catequese e na formação dos fiéis toma centralidade a Palavra de Deus, como fonte de toda educação cristã. Retoma-se na Igreja a relação fé e vida.


A abertura da Igreja no horizonte do Concílio Vaticano II vai para além da publicação de seus 16 documentos. Mais importante é o espírito que conduz a vitalidade desse novo momento. Tais movimentos renovadores contaram com aspectos da espiritualidade enraizados nas fontes originárias do cristianismo: o Novo Testamento, os santos padres, os primeiros Concílios. 


Dentre esses sinais salienta-se a vida de Ir. Carlos de Foucauld e as diversas fraternidades formadas à partir do testemunho e dos numerosos escritos deixados por ele. Homem do vento, percorreu Nazaré em busca de Deus, descobriu o último lugar. Abandonou-se nas mãos do Absoluto e tornou-se irmão universal. Foi para o deserto e aprendeu a gritar o Evangelho com a Vida. No encontro com os tuaregues, aprendeu mais que o idioma, nos ensinou a dialogar com as culturas para descobrir a “semina verbi” presentes nelas. Na contemplação, nos deu lições de amor; na libertação de escravos, traduziu em vida o significado do amor e da compaixão pela humanidade. Enfim, aprendeu de Jesus o sentido do mistério da encarnação e da vida em Nazaré.


Extasiado pela espiritualidade e a oração dos irmãos muçulmanos fez disso o mergulho necessário para aprofundar nas águas mais profundas do cristianismo. Sua morte (1 de dezembro de 1916) representou o germinar da semente desse novo caminho apresentado à Igreja em profundo abandono nas mãos do Pai.


Este caminho de espiritualidade alimentou e iluminou a realização do maior Concílio da Igreja. Quando desejamos a Igreja como comunhão, Povo de Deus reunidos no mistério da trindade, como não lembrar do Ir. Carlos? Demorou ele aceitar a ordenação presbiteral, pois a força do seu ministério centrava-se no batismo e no seguimento da vida pobre e humilde de Jesus de Nazaré. Pensava Ir. Carlos, “a ordenação me distancia cada vez mais do ideal de viver o último lugar”. Levar a Eucaristia aos povos mais distantes o convenceu a aceitar a ordenação. Essa busca de tornar-se irmão universal, de propagar a fé nos lugares mais distantes, aos mais pobres, nos dá o sentido da missionariedade da Igreja no Concílio Vaticano


II. Evangelizar pelo testemunho, anunciar o Reino, ir ao encontro, representam a virada fundamental para a vida da Igreja. Charles de Foulcauld apresenta-se como precursor desse espírito novo na missão.


Além disso, destaca-se nessa jornada do Ir. Carlos a dimensão do diálogo inter-religioso. Essa dimensão afeta positivamente toda a reflexão da Igreja no Concílio em relação a busca da tolerância e da valorização da diversidade.


Além da vida do Ir. Carlos, as inúmeras fraternidades surgidas após sua morte trouxeram muitos frutos para o Concílio. Na Presbiterorum Ordinis destaca-se o tema da fraternidade presbiteral (PO 8 e 12). Tal vivência entre padres diocesanos, anterior à realização do concílio, constituiu-se um elemento importante a ser incentivado. Sem dúvida, experiências como as Fraternidades Jesus+Caritas e outras semelhantes constituem um novo impulso aos ministérios na vida da Igreja. Outro aspecto vivenciado nas fraternidades oriundo da Ação Católica, refere-se a revisão de vida. Utiliza-se o método Ver-Julgar-Agir de Cardjin na prática cotidiana das fraternidades. Entre os meios da Fraternidade, encontra-se a revisão de vida. Esta deve ocorrer no dia da Fraternidade, e, quando possível, após um dia de deserto.


Cabe perguntar: e hoje, como as Fraternidades podem manter vivo o espírito do Concílio Vaticano II no seio de nossa Igreja? Alguns aspectos destacam, sem dúvida. Manter firme o ideal e a vivência da evangélica opção preferencial pelos pobres de modo a preencher toda a existência do presbítero. Dar testemunho de partilha e solidariedade, não só entre os irmãos empobrecidos, mas buscar viver essa máxima cristã no presbitério. Isso exige intensificar a vida em fraternidade, indo ao encontro não apenas dos iguais, mas também dos diferentes. A partilha deverá incluir igualmente a partilha econômica. Não se tornar mero ativista pastoral, executor de tarefas, super-padre no clero, mas garantir a qualidade da ação evangelizadora com a vida de contemplação e oração.

 

Não se acomodar apenas à pregação sobre o valor do Concílio, mas tornar viva em nossas comunidades as orientações pastorais e o espírito: valorizar o protagonismo dos leigos/as, superar práticas autoritárias e clericais, viver de modo simples, trabalhar pelo empenho ecumênico e pelo diálogo inter-religioso, avançar na renovação litúrgica e na inculturação e não deixar morrer a profecia na Igreja.


Outro aspecto importante para manter vivo o espírito do Vaticano II refere-se à missão. Os presbíteros a cada dia são desafiados a ouvir o chamado do Senhor que clama a ir aos lugares mais distantes. Tornar-se irmão universal, eis o convite. Há razoável número de presbíteros na Igreja do Brasil, o que nos faltam são sim presbíteros missionários. Dispostos a sair de si e irem ao encontro dos afastados, dos excluídos. 


Atravessar os rincões do egoísmo e das comodidades e se preciso for, atravessar fronteiras, ir ad gentes. É conhecido de todos, existe cada vez uma maior concentração de padres nos grandes centros econômicos e escassez de padres nos lugares mais pobres.


Cabe ressaltar a importância de várias testemunhas entre nós que perseveram no ideal do Ir. Carlos e praticam com convicção e amor o Espírito do Concílio nas comunidades. Dentre estes, estão as Irmãzinhas de Jesus, muitos presbíteros, alguns bispos e vários leigos/as dispostos/ as a viver com autenticidade o batismo e os diversos ministérios na Igreja.


Peçamos a Deus, ao bem amado Senhor Jesus, a perseverança para que continuem testemunhando com amor a graça de gritar o Evangelho com a Vida.


AÇÃO DE GRAÇAS APÓS O DESERTO


(Dom Edson Damian, em forma de canção)


Cada momento assumir um novo compromisso de fé interiorizando em nosso ser a graça de Deus.

Dou graças Senhor, por Seu imenso amor.

Pelo dia de deserto, dom de graça e de amor.

No deserto nós buscamos o absoluto que é só Deus.

No deserto recebemos a visita do Senhor.

No deserto encontramos Jesus Cristo, o Bem Amado.

No deserto nos sentamos junto ao poço de Jacó.

No deserto nós bebemos na fonte de água viva.

O deserto tira as máscaras e nos ensina ser humildes.

O deserto nos dá força pra vencer as tentações.

O deserto nos prepara para a reconciliação.

O deserto nos conduz pra gritar o Evangelho.

O deserto fortalece a nossa fraternidade.

O deserto renova nossa vida e ministério.

O deserto vivifica o abandono a Deus Pai.

O irmão Carlos de Jesus é nosso guia no deserto.

O Espírito nos recorda o Evangelho de Jesus.

Maria, nossa Mãe, nos acompanha no deserto.

Nosso bom anjo da guarda nos protege no deserto.

No deserto nos unimos aos irmãos que estão no céu.


Dom Edson Damian (na forma de canção)


TESTEMUNHOS PESSOAIS DO RETIRO DE 2013


“O nosso retiro foi um tempo especial de silêncio, escuta e encontro. Silêncio para aquietar o coração, deixar-se modelar pelo Senhor, que trabalha em nós como Ele quer. Tempo de escutar a voz do Senhor, os apelos que Ele nos faz, para onde quer nos enviar. Tempo de encontrarmos e reencontrarmos nossos irmãos e descobrirmos que não estamos sozinhos nesse desejo de trabalhar pelos ideais do Reino: partilha e serviço, principalmente aos mais necessitados. Férias abençoadas, encontros riquíssimos, ouvindo o Senhor que nos fala. Louvado seja Deus!” Pe. Valdo Bartolomeu de Santana – Tupi Paulista/SP – Diocese de Marília.


“O retiro significou para mim um momento de forte renovação interior, vocacional missionária. D. Edson foi muito feliz em suas colocações, muito me ajudou a refletir sobre o itinerário vocacional do Beato Ir. Carlos, interagindo com textos, filmes, reflexões, incluindo o significado do Concilio Vaticano II e suas repercussões para hoje. Deus seja louvado por mais este tempo de renovação espiritual para todos nós.” Pe. José de Anchieta Moura Lima - Juiz de Fora – MG.


“O retiro, para mim, foi uma experiência muito boa. O acolhimento durante o retiro, bem a feitio da Fraternidade, é muito importante na nossa vida de igreja. A exemplo do irmão Carlos, devemos abrir os nossos corações e dividir os nossos ideais compartilhando com todos (pessoas) no ideal de Jesus, e em toda a sua práxis. E viver tudo isso, não basta apenas sentir, mas agir. A via está no “Abandono; Iesus Cáritas” praticado por Charles de Foucauld e também em nós na medida do nosso alcance e em todos os nossos desejos e fraquezas. (...É abandonar-se em Jesus, para poder plenificar-se no amor de Deus).” Pe. José Lucena – Rio de Janeiro – RJ.


“Foi meu primeiro retiro anual na espiritualidade da Ir. Carlos de Jesus. Posso dizer com muita certeza que fiz um encontro com Jesus de Nazaré. As orações, adorações, partilhas, silêncio, convivência, celebrações e a assessoria de dom Edson Damian foram teofanias do Ressuscitado. Viver está espiritualidade neste mundo hipermoderno é trazer novamente o conceito estranho e provocativo neotestamentário de Paulo de “escândalo”, ou seja, ofensa, contradição, revolta e loucura para o homem de hoje. Viver está espiritualidade é fazer Jesus Cristo viver na essência da palavra, principalmente, no meio dos pobres e sofridos.” Alex Sandro Serafim, seminarista da Diocese de Criciúma/SC (participa da fraternidade Jesus†Caritas, no ramo dos seminaristas do Regional Sul IV).


“Um tempo de muito aproveitamento, pois nunca havia feito uma revisão de vida tão profunda. Tive a oportunidade, de ver e sentir a humildade, a alegria e o abandono com que se lançam nos seus trabalhos os que fazem parte da fraternidade. Estou buscando colocar em pratica tudo o que tive a felicidade de viver e aprender, na semana junto a fraternidade.”

Edna Rita Cardoso. Florinea SP – Diocese de Assis (Leiga).


“O retiro em si, já é um tempo rico de graças, oportunizando-nos participar de reflexões, orações, silêncio, contato com a natureza. Outro momento forte foi o relacionamento. Em pouco tempo nos tornamos irmãos. Agradecemos a Deus tamanha dádiva. Um grande abraço fraterno.” Maria de Nazaré Mazullo Leal e Maria José Pinheiro (Leigas Consagradas). Fortaleza - CE


“O retiro está sendo um tempo oportuno de discernimento, revisão do ministério e retomada de anseios adormecidos. Digo está sendo, no presente, pois continuo ainda muito envolvido com todo o clima que vivenciamos no retiro. A fraternidade, vivida na simplicidade do dia-a-dia, nos fez e nos faz penetrar no mistério de nosso Deus-Amor. O retiro ainda não acabou! Sinto que esse tempo está cheio, pleno de possibilidades que estou num trabalho danado de discernimento para poder corresponder àquilo que o retiro fez emergir em meu interior. Foi um tempo, ou melhor, está sendo um tempo de muita beleza. Aquele Abraço!” Pe. Badacer Ramos de Oliveira Neto. Itabuna - BA


“O tempo do nosso retiro foi espetacular. Dom Edson foi maravilhoso em suas pregações. A coordenação na pessoa do Pe. Gildo e sua equipe foi excelente! A nossa fraternidade sacerdotal Jesus Caritas é a chama   impactante do amor de Deus para a pós-modernidade. Na espiritualidade do irmão Charles de Foucauld, temos o caminho seguro e feliz para o coração de Jesus Cristo.” Pe. Inácio José do Vale. Volta Redonda – RJ


“Nos dias 03 a 10 de janeiro, participei do retiro anual das fraternidades, que aconteceu na cidade de Arrozal, RJ. O pregador foi Dom Edson Damian, bispo da diocese de São Gabriel da Cachoeira, AM. Estavam presentes padres de vários estados do Brasil; diáconos, leigos e bispos. Foi um momento muito rico e oração meditação e partilha. Saí desse retiro muito renovado e animado para continuar a missão, sabendo que, quando se caminha junto e na partilha de vida, tudo ganha um sentido novo e gosto de Reino. Me sinto grato e renovado para continuar.” Pe. Valdemar Cardoso. Marília – SP.


A ASSEMBLEIA INTERNACIONAL DAS FRATERNIDADES - 2012

 CARTA DE PARIS


Assembleia Internacional da Fraternidade sacerdotal Jesus Caritas (6 a 21 de novembro de 2012)


Na celebração do 50º aniversário da abertura do Concílio Vaticano II, no início do “ano da fé”, reuniram-se no Foyer de Charité de Poissy, perto de Paris, 47 irmãos originários de 28 países de 4 continentes, entre os quais Mariano Puga e Jacques Midy, membros da Fraternidade há mais de 5 decênios. O delegado da R.D.C. não recebeu o visto e o do Canadá perdeu seu irmão.


A escolha da França foi motivada pela memória do Bem aventurado Carlos de Foucauld na igreja de Santo Agostinho com seu encontro com o Padre Huvelin e sua conversão em 1886, e a basílica de Montmartre onde passou uma noite em adoração com Massignon. A França é também o berço de nossa Fraternidade sacerdotal e de vários ramos da família foucauldiana como as Irmãzinhas de Jesus ou as Irmãzinhas do Evangelho, cujos testemunhos ouvimos.


Tivemos conferências de informações sobre a sociedade francesa e o lugar da Igreja. As imersões nas paróquias e em lugares particulares de missão permitiram-nos apreender a realidade de uma Igreja viva num meio secularizado. A oração litúrgica, a adoração diária, a Eucaristia, o dia de deserto deram à Assembleia uma coloração espiritual fraterna. Os tempos de convivência, os intercâmbios e as refeições partilhadas colaboraram para tal clima.


Agradecemos sinceramente aos membros das fraternidades da França, à equipe internacional que termina e a todos aqueles e aquelas que contribuíram para o êxito de nossa Assembleia.


Depois de ter ouvido os informes das diversas regiões do mundo, sentimos fortemente como a fé sempre em gestação acontece para construir a Igreja de maneira nova e fornecer apelos a orientações novas para nossas fraternidades.


1. Ecos das regiões do mundo


Os diversos relatórios dos vários países e continentes foram enriquecedores. Permitiram-nos criar laços profundos entre nós e nos fizeram tomar consciência de nossa complementariedade, no respeito sincero da diversidade das realidades e humilde reconhecimento dos múltiplos desafios com os quais nos confrontamos.


As fraternidades da África são marcadas pelo contexto de países politicamente instáveis, economicamente fracos e socialmente inseguros, nos quais nossa presença de padres que partilham a vida do povo é muitas vezes percebida como tranquilizadora, e renova a confiança. Para nossas fraternidades, as longas distâncias e as más estradas, assim como a falta de dinheiro e de meios materiais, tornam a comunicação e os encontros menos frequentes. Longe de ser fonte de desencorajamento, tais dificuldades dinamizam ainda mais nossas fraternidades, que não cessam de aprofundar sua identidade e de crescer em número pela acolhida de novos jovens padres.


A Europa e a América do Norte, gozando de certa prosperidade material, conhecem ao mesmo tempo uma crise econômica e financeira profunda que afeta de maneira contínua o equilíbrio de vida de muitas famílias e desenvolve um grande sentimento de insegurança. As fraternidades são numerosas, mas os membros envelhecem, à imagem do clero diocesano. Contudo, padres vindos de fora enriquecem os presbitérios e nossas fraternidades.


O continente latino-americano registra certo crescimento econômico, mas encontra-se em meio de uma insegurança social crescente, com numerosas vítimas dos narcotraficantes num universo religioso marcado por diversas correntes evangélicas. Em união com as diversas famílias foucauldianas, nossas fraternidades contam com numerosos simpatizantes que lhes fornecem regularmente novos membros.


Na Ásia, em pleno desenvolvimento econômico, continente das grandes religiões como o islã e o hinduísmo, a Igreja é em geral minoritária, mas as fraternidades acolhem muitos jovens padres. O diálogo com as outras religiões se desenvolve conservando a identidade da fé cristã.


2. Um anúncio da fé


Em cada lugar do mundo, na diversidade das situações vividas, a fé e o anúncio da fé aparecem diferentemente.


A fé toma em primeiro lugar a forma da coragem de viver, de existir. Nas diversas etapas da vida pessoal e coletiva, trata-se de crer que a vida mantém sua promessa. Esta forma elementar da fé encontra a universalidade do Evangelho, pois todos os seres humanos estão na mesma aventura, a de crer ou não que a vida vale a pena ser vivida.


Diante de todas as categorias do mal que atingem a humanidade, trata-se de anunciar uma Notícia de bondade radical. Associando a Jesus esta Notícia de bondade que é o Evangelho, cremos que o mal não terá a última palavra. É também uma condição que torna possíveis a fé e a liberdade de crer das pessoas, permitindo que a fé possa nascer nelas.


De fato, é em Jesus de Nazaré, em sua maneira de ser e de viver, que podemos ver como tornar o Evangelho presente a todos os seres humanos. Jesus sempre disse o que pensava e fez o que disse; sempre se pôs no lugar do outro, sem, porém, deixar o seu, nos atos que expressavam sua compaixão, levada ao extremo, diante de seus adversários.

 Tornando o evangelho humanamente plausível, Jesus permaneceu livre até dar sua vida. Ouvimos aí o eco da vida e do destino do Irmão Carlos, que procurou imitar Jesus em sua vida e em sua morte.


Esta imitação da vida de Jesus na proximidade e na hospitalidade, na itinerância e na liberdade em relação a si mesmo faz da Igreja uma realidade sempre em gestação. A Igreja nasce onde a fé é gerada. Nos encontros elementares, na hospitalidade e nas atitudes de acolhida, realiza-se a figura do mediador. Relendo as Escrituras, o mediador, que pode ser um de nós, dá uma dimensão visível à fé, ligando os sacramentos aos sinais messiânicos de Jesus. Uma comunidade, mesmo pobre e pequena, descobre então que a fraternidade por ela vivida ultrapassa as fronteiras de espaço e de tempo; quando ela passa o limiar da contemplação na liturgia e na adoração, é-lhe revelado que o Corpo de Cristo se constrói nela, e que ela se insere no imenso povo de Deus, a Igreja, a caminho de Deus.


Compreendemos melhor que as respostas aos mais vastos desafios do mundo se revelam nos gestos do cotidiano. Quando as comunidades cristãs se tornam transparentes ao evangelho, elas relativizam suas preocupações internas, e num movimento ligado à encarnação, arriscam-se testemunhando sua solidariedade com os mais frágeis dos humanos. Reconhecendo a singularidade de cada pessoa, por laços de amizade e de proximidade, elas vivem a alteridade sem medo e se abrem ao universal. A hospitalidade vivida torna-se o lugar da revelação de Deus que transparece no oculto dos encontros e especificamente no encontro do excluído.


Assim, a Igreja que pode por diversas razões desaparecer aqui ou ali, aparece em muitos lugares em figura de diáspora; ela não cessa de nascer lá onde a fé emerge de novo, colocando-a em posição de servir o bem comum e a união social. Encontramos então a expressão atual da Noticia da bondade do próprio Jesus, que nos atingiu em fraternidade e que queremos viver recebendo seus renovados apelos.


3. Apelos e orientações para nossa fraternidade


Nesta Assembleia internacional fizemos a experiência da diversidade, da diferença e da originalidade dos representantes das diversas fraternidades, segundo nossas próprias culturas. Vivemos a alegria da comunhão e da comunicação, no Espírito de Jesus de Nazaré.


Mas o que acontece com todos os que não conhecem Cristo Jesus? E se o conhecem ou ouviram falar dele, como o assumem em sua vida diária?


A atual globalização e as zonas de rupturas nos permitem experimentar a presença do outro diferente de nós, provocando reações de acolhida, de recusa, de medo. Então, como nos encontrar?


Hoje o debate de ordem ética em relação à injustiça encontra resistências em muitas pessoas. Para a construção de um mundo que seja um lar para todos, a partir de nossas originalidades e sem exclusão nem dominação de uns sobre os outros, qual é nossa contribuição enquanto Fraternidade?


Nosso ideal é viver o absoluto de Deus, o amor de Jesus Cristo, à maneira do Irmão Carlos, como fruto do Espírito, na proximidade, na presença e no respeito do outro, a partir da pequenez, do cotidiano, sempre a partir dos mais fracos, dos mais desprovidos e dos mais excluídos, que Deus ama e a partir dos quais nos interpela.


Como padres diocesanos devemos reconhecer a realidade que é a nossa em alguns países: somos pouco numerosos, envelhecemos, por vezes mal compreendidos em certos presbitérios. Mas vemos também muitos comprometimentos, dom de si e fidelidade em nossos irmãos, em tantos lugares do mundo. Por toda parte nós nos sentimos chamados a desenvolver a fraternidade com todos os nossos irmãos padres.


Isso exige de nós reforçar nossa vida comunitária, na revisão de vida, na escuta e na partilha da Palavra de Deus, unidos na adoração eucarística, no dia de deserto e no testemunho simples da vida cotidiana, onde a Igreja nos colocou e nos envia como padres diocesanos.


É importante que os padres mais jovens nos conheçam, não para buscar prestígio ou fama, mas como um serviço sincero prestado à vida espiritual da Igreja, na fidelidade a ela mesma e a nossos bispos. Isso nós o devemos aos pobres.


Os irmãos idosos são parte integrante de nossas fraternidades, são para nós testemunhas da missão que viveram. Temos necessidade de seu testemunho e de seu apoio na oração. Sabemos também que os irmãos que já nos deixaram estão em comunhão conosco.


Aumentar nossa solidariedade e nosso sentido missionário em nível local e internacional, como irmãos universais, sobretudo quando a cultura atual favorece e exalta o individualismo, provocando a solidão e o abandono de tantos de nossos irmãos.


Não nos habituar à realidade, mas nos deixar interpelar e interrogar, a partir do Evangelho e da sabedoria dos pobres. Tomar o caminho de Jesus exercendo a autoridade como serviço.


Ser sinais de acolhida gratuita e amorosa com os migrantes, os refugiados e os exilados que o sistema mundial atual gera, reconhecendo mais a contribuição que nos oferecem do que as dificuldades que suscitam. Reconhecer todas as novas formas de escravidão que se apresentam, que submetem e que alienam tantos de nossos irmãos, fazendo deles objetos engolidos pelo sistema dominante que privilegia somente alguns.


Nosso grande sofrimento e nossa vergonha em relação aos abusos sexuais cometidos por alguns padres tornaram-nos mais humildes e mais fiéis a Deus. “Permaneçam atentos!”


Amadurecer, crescer e viver na vida em fraternidade. O fato de se encontrar só ou isolado deve ser uma exceção, que é preciso ultrapassar com prontidão. Essa é a nossa força maior, que nos ajuda a discernir com outros o que Jesus Cristo nos diz hoje. É a ajuda mais eficaz para fortalecer nossa própria vocação no mundo, na Igreja e em nosso meio.


Testemunhar silenciosamente por uma presença real, por uma vida de oração que une a fé e a vida, na ação solidária cotidiana, mesmo simples, é a resposta mais apropriada a todo fundamentalismo que obscurece o amor de Deus Pai e impede o encontro real e eficaz, em relação com nossa própria identidade. É aí que nos encontramos Jesus Cristo ressuscitado. 


Preocupar-nos com a realização do Mês de Nazaré afim de que todos os irmãos de nossas fraternidades tenham a possibilidade de viver essa experiência, no espírito do Irmão Carlos, na intimidade do amor de Jesus Cristo, que determina nossa orientação e nossa ação enquanto vida fraterna a serviço dos pobres, deixando-nos conduzir pelo Espírito Santo a partir deles e com eles.


Enfim, é preciso aprofundar e realizar encontros regionais e continentais, a fim de nos conhecer e experimentar a comunhão, no serviço dos pobres, no caminho que nos propõe o Irmão Carlos, no amor e na fidelidade a Jesus Cristo que nos dá a vida, que nos restabelece em nossa dignidade de filhos de Deus, irmãos responsáveis uns pelos outros.


Elegemos Aurelio Sanz, da Espanha, como Responsável internacional e aprovamos sua equipe composta de Jean François Berjonneau (França), Mark Mertes (USA), Emmanuel Asi (Paquistão), Mauricio da Silva Jardim (Brasil), Félix Rajaonarivelo (Madagascar).


4. Conclusão


Nestes anos em que comemoramos o Concílio Vaticano II, lembremo-nos que há aspectos da espiritualidade do Bem-aventurado Carlos de Foucauld nos textos conciliares e que a família foucauldiana, da qual fazemos parte, contribui para o nascimento da Igreja de nosso tempo presente em todas as nações, para torná-la acessível a todos os homens. Testemunhas e portadores do Evangelho da bondade, em fraternidades sempre em gestação, com o lugar original de nosso carisma e de nossa vocação, tornamos presente aos homens esse Deus de amor que se fez irmão em Jesus de Nazaré.


ASSEMBLEIA INTERNACIONAL DA FRATERNIDADE E

MÊS DE NAZARÉ


Pe. Maurício Jardim. Arquidiocese de Porto Alegre - RS


O mês de Nazaré foi uma das temáticas refletidas na última assembleia internacional da fraternidade em Paris. A reflexão teve como ponto de partida as experiências realizadas nos países da Áustria, França, Estados Unidos da América e Chile. Depois destas partilhas muitos irmãos fizeram contribuições de suas vivências locais e chegou-se nestas conclusões:


O mês de Nazaré é uma espécie de noviciado da fraternidade. Em certo sentido, é semelhante ao mês Inaciano. É um marco na vida do presbítero, um compromisso de pertença à fraternidade. Contudo, não é algo institucional. É antes de tudo, um chamado a conversão interior, onde nos tornamos sujeitos desta escolha. O mês de Nazaré inicia com uma decisão pessoal, como algo vital e necessário. Esta conversão interior necessita de tempo prolongado de escuta para experiência profunda de Deus em fraternidade. Tempo onde a máxima é: “Deixar Deus ser Deus”.


Também é uma experiência mística e contemplativa onde sentimos necessidade de ajuda, uns dos outros através da revisão de vida.


O objetivo deste mês é alimentar-se como homem de Deus que sempre volta ao deserto com tempo prolongado para escutar-se. Qual Deus? O Deus revelado em Jesus de Nazaré que traz boa notícia do Reino.


Repetia-nos Ir. Carlos: “Deus, se tu existes, faz com que te conheças”.


Também são objetivos pilares deste mês: aprofundar a vida e o testemunho do Ir. Carlos, o compromisso com os mais pobres, a vida eclesial, a vida em fraternidade e a contemplação.


Tempo de novo impulso de homens que tem a coragem de cortar a situação pastoral. Tempo para dar-se a Deus. Se não temos este tempo seremos traidores dos pobres. Tempo largo de silêncio para escuta de um Deus que fala. É necessário dar-lhe tempo para gratuidade. Tempo oportuno de deixar-se amar por Deus para sermos homens de fraternidade, de hospitalidade, de proximidade aos mais pobres.


Também se discutiu sobre o que é específico do mês de Nazaré. 


Primeiro insistiu-se na ideia de que é um mês e não menos, também mais do que estudo ou conferencias deve favorecer na experiência de partilha, oração e  encarnação, através de trabalhos manuais no cotidiano.


Enfim, analisou-se o desafio de que somos filhos de uma mentalidade clerical que repete: “Não tenho tempo”. Por isso deixar a paróquia por um mês torna-se grande desafio. No geral somos filhos de modelos conservadores que acumulam ministérios. Porque nos custa tanto deixar as atividades? Em síntese o pano de fundo é a realidade de padres funcionários do sagrado que tem linguagem e estilo de vida empresarial.


Tem objetivos e metas para cumprir. Contudo, o tempo de Deus é diferente deste empresarial, de resultados e eficácia. Temos necessidade de retirar-nos como parte essencial da missão. Esta opção nos ajudará a retomar as opções fundamentais, como a opção preferencial pelos mais pobres.


Retomar a consciência de filhos amados que precisam encontrar-se mais profundamente com o Pai.  Pe. Maurício da Silva Jardim. Arquidiocese de Porto Alegre – RS


A Missão entre as missões

 

A missão faz refletir à missão. Mais de três anos passaram desde minha partida do Brasil até Moçambique. Neste tempo, cresceu-me a consciência de que a iniciativa e provocação missionária foi graça do Espírito de Deus.  Já na chegada me perguntava: Qual missão entre tantas missões estou sendo convocado?  

O cotidiano carregado de surpresas e imprevistos, intercalado com a escuta orante da Palavra de Deus me fez pensar sobre o essencial e o conjunto da missão. Em África onde se fala e vive a pobreza absoluta, somos tentados fazer da missão um dar coisas, reformar antigas estruturas ou cair nas lógicas falidas de nosso mundo onde o dinheiro aparentemente resolva tudo. Missão para e não missão com. Ao chegar vive-se este dilema. O que fazer? 

Nós missionários estrangeiros ainda somos vistos como aqueles que podem dar. Somos brancos, temos carro, casa bem situada e não nos falta comida e água. Muitos vem até nós com a expressão mackua “Mukivahe” que significa dá-me. Com mãos estendidas as crianças nos encontram vindo do mercado e nos dizem: “dá-me pão”. Se dermos pão a uma, outras aguardam nossa atitude e esperam também receber. Também nos pedem carona, medicamentos, dinheiro, emprego, cimento para construir capelas, poços nas comunidades, apoio para pequenas associações, cadernos, canetas, bicicletas, pastas e  há aqueles que pedem Bíblias, terços e livros.

As marcas deixadas pelo colonialismo português, aqui acampado durante séculos, a situação de pobrezas sociais, a guerra civil, a situação política corrompida e as organizações não governamentais que aqui atuam, contribuíram e contribuem para esta mentalidade de receber. Os que chegam na missão em Moçambique passam por esta dúvida e por este teste: Dar ou não dar aquilo que te pedem. Assim fui aprendendo que é preciso dizer não, para dizer sim a um projeto de missão que construa e fortaleça pequenas comunidades ministeriais e autônomas. 

A atitude de colocar-se como fraco, pobre e necessitado já é missão. Jesus nos recomenda: “Vão!...não levem bolsa, nem sacola, nem sandálias”(Lc10, 3-4). A Missão evangélica se faz com meios pobres, sem barulho, sem arrogância de visibilidade e sem demonstração de força com meios poderosos onde transita altos valores econômicos. A atividade missionária dos discípulos de Jesus tem raízes pobres e atitude permanente de fé e confiança no Espírito que atua silenciosamente nos corações. 

A missão entre as missões carrega um conteúdo de paz e de anúncio de que o Reino chegou. “Digam primeiro: A paz esteja nesta casa!” (Lc10,5b); “curem os doentes e digam ao povo: O Reino de Deus está próximo de vocês” (Lc10,9). Deus envia para cidades e lugares onde Ele próprio devia ir. E lhes dizia: “A colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos”(Lc10,2). Missão de colheita. O que significa? Antes de chegarmos aos lugares concretos de missão, Deus já chegou bem antes e fez todo trabalho da graça de preparar a terra, semear, limpar e fazer crescer. Basta de nós a paciência da espera, a escuta, o conhecimento do terreno, a identificação dos frutos e a colheita propriamente dita.   

Estando nas missões, ainda peregrino na busca do essencial da missão. O tesouro escondido do Reino onde habita corações apaixonados. Já descobri que o mais importante não é dar coisas, mas dar a si mesmo e partilhar dons recebidos. Valeu atravessar oceanos na busca e na oferta daquilo que a traça e a ferrugem não podem destruir. “Busquem o Reino, e Deus vos dará todas as coisas como acréscimo” (Lc12,31). 

Ainda sonho que o projeto missionário que nos enviou continue oferecendo de sua pobreza, padres, irmãs e leigos(as) a outras dioceses necessitadas de Moçambique como Lichinga e também a outros países do continente africano. Não tenhamos medo, o Pai de ternura que nos envia, cuida, veste, protege, ampara e alimenta seus filhos.

 

 

Pe. Maurício da Silva Jardim

Missionário em Moçambique

 

Tempo e missão

 

Completados três anos na missão, tenho refletido e partilhado sobre o tempo. O tempo cronológico, o tempo como fato ou acontecimento, o “tempo perdido”, o tempo real e o tempo que se faz missão na gratuidade. Concepções múltiplas sobre o tempo que definem estilos e projetos de vida.

            Nas reflexões sobre o tempo tenho como base dois mundos. Aquele ao qual sou filho e este ao qual vivo como missionário. Entre as lógicas moçambicanas do povo macua e as nossas lógicas globalizadas, o tempo é marcado ou vivido de modos diversos. O tempo como força que envelhece, mata, distancia, produz e lucra e o tempo como gratuidade, perda, ausência e direito de ser “inútil e improdutivo”.

            Aqui na missão acostumamos dizer que um dia parece ter muito tempo. O tempo não é medido e acelerado. O dia termina ou inicia com expressões: “já anoiteceu e já amanheceu”. A noite é feita para dormir. Não se faz mais nada ao anoitecer, além do jantar e do encontro familiar. No ritmo diário se faz uma coisa de cada vez e o tempo real parece ser bem aproveitado. Também se aprende viver e desfrutar do momento presente sem precisar fazer nada. Estar com os outros, ouvi-los ou simplesmente amá-los sem necessidade de produzir, ensinar ou dar algo. A impressão que dá é que o tempo é nosso. Foi dado a nós como oportunidade de estar todo nele na missão que Deus nos confiou.  

Neste mundo de poucos relógios e agendas, não se festeja aniversários. Ninguém conhece o dia, mês ou ano de nascimento. As referências são pessoas, acontecimentos ou fatos marcantes. Nasceu no tempo do padre Camilo, antes do ciclone, quando o Morola era rei da tribo. Assim o que determina categorias, idades e fases da vida são outras referências. 

            No mundo que nasci, onde os relógios estão em toda parte, ouvi sempre pessoas falarem que não tem mais tempo. O tempo lhes foi roubado. Os ladrões ocuparam todo o tempo com agendas lotadas. O paradoxal desta lógica é que não ter mais tempo dá uma satisfação de herói. Convivem conosco estes heróis que há anos não fazem férias e não encontram tempo para si e para os outros, como se tudo dependesse deles. São estes que recebem lugar de destaque e são reconhecidos como vencedores, contudo se tornaram escravos do tempo. Ocupar o tempo desta forma pode dar a sensação de nada ter feito ao término de cada dia, ou ainda mais trágico, nada ter feito no final da vida.

            Sem verbalizar agimos como se o tempo fosse dinheiro, por isso não devemos perdê-lo. Desde criança, “nossos educadores” nos ensinaram as leis do mercado competitivo que não admite perdas de tempo. Quem ocupar todo seu tempo chegará por primeiro. Chegará ao topo com muito sucesso e dinheiro, no entanto sem tempo.   

Na missão descobri que nós temos o relógio, o calendário e as agendas, mas os africanos é que têm o tempo. Tempo que é governado pelas fases de preparo da terra, plantio, cuidado, colheita e queimadas. Há tempo de espera e de comercialização do produto. Tempo de seca e de chuvas. Tempo de fome e fartura. Tempo de calor e frio. Tempo dos sacramentos e das formações. Na realidade há tempo para tudo e até hoje não ouvi de um moçambicano que não tenho mais tempo.

            Aqui os donos do tempo me ensinaram que missão se faz na gratuidade que não se mede e codifica. A missão acontece mais na dimensão do ser que abre brechas no tempo, do que do simples fazer produtivo. Neste sentido, valeram mais as horas e os dias de presença gratuita nas visitas em comunidades. 

Assim espero que estas reflexões provoquem novas atitudes e novos olhares sobre o tempo na sua relação com a missão. Que o Pai, dono da missão, continue dando aos trabalhadores da última hora o mesmo salário. 

 

Pe. Maurício da Silva Jardim

Missionário em Moçambique


Adoração Eucarística[1]

 

A Eucaristia, presença viva de Jesus, foi o centro da vida do irmão Carlos. Somos presbíteros e presidimos a oração eucarística do povo de Deus. Lidando com os mistérios da fé, podemos fazer uma experiência pessoal do mistério pascal de Jesus, transformando-o no ritmo e na pulsação de nossas vidas e do nosso ministério. Esta experiência se faz primordialmente na celebração da missa, a oração do corpo ressuscitado de Cristo, e no serviço ministerial prestado ao povo de Deus. A fraternidade nos convida a permanecer nesta misteriosa presença em adoração silenciosa e contemplativa. Para o irmão Carlos, o mistério central da eucaristia era claro e profundo: Jesus dando sua vida por seu povo. Esta oferta única se torna presente de forma simbólica, mas eficaz na simplicidade de nossa presença silenciosa diante de Jesus. A hora passada em atenta oração na presença eucarística prepara e prolonga a liturgia da missa com o povo de Deus. René Voillaume assim descreve essa realidade: "Viver da eucaristia significa entregar-se pelo povo e tornar-se para ele, no amor e na contemplação eucarística, um alimento digno”. Na mesma linha das convicções do irmão Carlos, os membros da fraternidade consideram o tempo dedicado à adoração como integrante do dia de trabalho. A adoração faz parte do programa do dia. A ela não se destina o tempo que sobrar, se sobrar. Uma hora diante do Santíssimo, cada dia, faz parte do programa diário dos membros da Fraternidade. A experiência de Deus na vida do irmão Carlos foi tão marcante que ele compreendeu que não poderia viver a não ser para Deus. Estar junto de Deus seria uma atitude lógica e coerente se não fosse antes de tudo uma atitude de amor e amizade. Jesus é muito real para o irmão Carlos. Ele nutre por seu Bem-Amado Senhor Jesus uma amizade afetiva que o leva a querer estar junto dele, em sua presença. Nossa presença diante do Santíssimo quer ser essa presença de amor e amizade. A presença não é sensível, é por vezes árdua, mas é na perseverança corajosa que algo novo começa a acontecer em nossa vida. É preciso experimentar. 

 

  

Em busca de uma Oração Contemplativa[2]

 

Para que uma verdadeira Fraternidade seja possível, a vida de cada um de seus membros deve estar enraizada numa atitude contemplativa.

Sofremos muitas vezes nos caminhos da oração. O próprio Espírito Santo vem em socorro de nossa fraqueza e nos impulsiona a perseverar na presença do Senhor Jesus : “Ler e reler sem cessar o Santo Evangelho para ter sempre, diante do espírito, os atos, as palavras, os pensamentos de Jesus, a fim de pensar, falar, agir como Jesus”.

O amor que Deus nos manifestou no dom de seu Filho, até a morte na cruz, o testemunho do Irmão Carlos e o apelo de nossos irmãos e irmãs, incitam-nos, dia após dia, a uma fidelidade maior:

- À adoração eucarística regular e prolongada. Alguns se consagram uma hora por dia.

- A uma leitura meditada da Escritura.

- À prática mensal do dia de deserto, que se revela como um meio importante para o reconhecimento do absoluto de Deus em nossa vida.

48. Cada um se esforça por encontrar o ritmo de oração que lhe convém e retoma em revisão de vida com sua Fraternidade, os pontos exatos em que entra em jogo sua fidelidade a Deus e aos irmãos.

 

 

Fins e Meios da Associação[3]

 

2.3 – No espírito de Charles de Foucauld, querem amar e seguir Jesus para encontrar cada dia mais a atualidade do mistério do Ressuscitado:

- meditando e vivendo o Evangelho da melhor maneira possível, nas encruzilhadas da Igreja e do mundo;

- adorando, demorada e corajosamente o Senhor na Eucaristia;

- encontrando-o fielmente na solidão (dia de deserto).

- vivendo perto dos mais desfavorecidos tanto no plano material como espiritual

 

 

 

Adoração [4]


«Adorar a Hóstia santa deveria ser o centro da vida de todo homem».

 

«A Eucaristia é Deus conosco, é Deus em nós, é Deus que se dá perenemente a nós, para amar, adorar, abraçar e possuir». 



[1] Meios para uma Espiritualidade Presbiteral

[2] DIRETÓRIO da Fraternidade Sacerdotal, 1976

[3] Estatuto Canônico, 2000 – Fins e Meios

[4] As melhores frases de Charles de Foulcauld, Mês de Nazaré, 2010


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