A VIDA DE NAZARÉ

A VIDA DE NAZARÉ

As lições de Nazaré (Do Papa Paulo VI, homilia da Sagrada Família)

Nazaré é a escola onde se começa a compreender a vida de Jesus: a escola do Evangelho.

Aqui se aprende a olhar, a escutar, a meditar e penetrar o significado, tão profundo e tão misterioso, dessa manifestação tão simples, tão humilde e tão bela, do Filho de Deus. Talvez se aprenda até, insensivelmente, a imitá-lo.


Aqui se aprende o método que nos permitirá compreender quem é o Cristo. Aqui se descobre a necessidade de observar o quadro de sua permanência entre nós: os lugares, os tempos, os costumes, a linguagem, as práticas religiosas, tudo de que Jesus se serviu para revelar-se ao mundo. Aqui tudo fala, tudo tem um sentido.


Aqui, nesta escola, compreende-se a necessidade de uma disciplina espiritual para quem quer seguir o ensinamento do Evangelho e ser discípulo do Cristo.


Ó como gostaríamos de voltar à infância e seguir essa humilde e sublime escola de Nazaré! Como gostaríamos, junto a Maria, de recomeçar a adquirir a verdadeira ciência e a elevada sabedoria das verdades divinas.


Mas estamos apenas de passagem. Temos de abandonar este desejo de continuar aqui o estudo, nunca terminado, do conhecimento do Evangelho. Não partiremos, porém, antes de colher às pressas e quase furtivamente algumas breves lições de Nazaré.


Primeiro, uma lição de silêncio. Que renasça em nós a estima pelo silêncio, essa admirável e indispensável condição do espírito; em nós, assediados por tantos clamores, ruídos e gritos em nossa vida moderna barulhenta e hipersensibilizada. O silêncio de Nazaré ensina-nos o recolhimento, a interioridade, a disposição para escutar as boas inspirações e as palavras dos verdadeiros mestres. Ensina-nos a necessidade e o valor das preparações, do estudo, da meditação, da vida pessoal e interior, da oração que só Deus vê no segredo.


Uma lição de vida familiar. Que Nazaré nos ensine o que é a família, sua comunhão de amor, sua beleza simples e austera, seu caráter sagrado e inviolável; aprendamos de Nazaré o quanto a formação que recebemos é doce e insubstituível: aprendamos qual é sua função primária no plano social.


Uma lição de trabalho. Ó Nazaré, ó casa do “filho do carpinteiro”! É aqui que gostaríamos de compreender e celebrar a lei, severa e redentora, do trabalho humano; aqui, restabelecer a consciência da nobreza do trabalho; aqui, lembrar que o trabalho não pode ser um fim em si mesmo, mas que sua liberdade e nobreza resultam, mais que de seu valor econômico, dos valores que constituem o seu fim. Finalmente, como gostaríamos de saudar aqui todos os trabalhadores do mundo inteiro e mostrar-lhes seu grande modelo, seu divino irmão, o profeta de todas as causas justas, o Cristo nosso Senhor.

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Para sentirmos a presença de Deus em nossa vida, devemos viver como Jesus viveu por trinta anos em Nazaré, ou seja, uma vida de oração, contemplação e trabalho, fazendo tudo para conservar-nos num caminho de santidade, na caridade e evitando os pecados.

Todos nós temos nossos pecados, mas precisamos confiar plenamente na Misericórdia divina. Isso implica, é claro, mudarmos nossas vidas de tal forma que tudo o que fizermos agrade a Deus.

Um acontecimento inesperado de sofrimento pode ocorrer em nossa vida, como ocorreu na minha. Aproveitemos esse acontecimento para nos purificar, para tomarmos a resolução sincera e corajosa de recomeçar a nossa vida abandonando tudo o que não agradar a Deus. É difícil e, às vezes, até impossível, sem a ajuda de Deus.


Por isso eu sugiro num tempo de pelo menos 3 horas diárias de oração: o dízimo de 24 horas seria 2 horas e 24 minutos. Com no mínimo esse “dízimo” de oração a Deus, pelo nosso maravilhoso dia, estaremos nos colocando sob sua proteção, sentiremos sua presença e estaremos sempre felizes, aconteça o que acontecer à nossa vida.


Gosto muito do trecho em que São Paulo Apóstolo fala: “Irmãos, quanto a mim, não julgo que O haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que ficaram para trás, e avançando para que estão diante de mim, prossigo em direção à meta, para conquistar o prêmio que, do alto, Deus me chama a receber em Cristo Jesus” (Filipenses 3,13-14).

A VIDA DE JESUS EM NAZARÉ


Transcrevo em primeiro lugar um texto muito bonito que encontrei no site "Dei Verbum", de Porto Feliz. Em seguida, uma pequena história do que poderia ser a vida em Nazaré. Veja também o texto do "Jesus-Cáritas" sobre esse assunto.


A VIDA DE NAZARÉ E A CONVERSÃO DE DEUS À CONDIÇÃO HUMANA.


"De Nazaré pode sair algo de bom?”(Jo 1,46). Natanael, que fez esta pergunta aos primeiros discípulos de Jesus, tinha suas razões para duvidar. Lucas precisa dizer a região em que fica Nazaré, pois seus leitores, sobretudo os de fora da Palestina, não saberiam onde fica Nazaré, de tão pequena e sem importância no grande mundo do Império Romano.


Os evangelhos apócrifos têm certa impaciência com esta pequena Nazaré. Jesus, segundo alguns, antes de começar sua missão pública, teria ido ao Egito ou até à Índia para conhecer a sabedoria destes centros do mundo.


Ou, conforme outros apócrifos, Jesus já fazia alguns milagrezinhos de crianças para se divertir. É muito difícil aceitar que o Messias, o próprio Filho de Deus, tenha passado a maior parte de sua vida num ambiente absolutamente comum, em total anonimato, sem nada de extraordinário, como a maioria da humanidade.


ELE CRESCIA


Depois de cumpridos os mandamentos a respeito dos nascidos, Lucas afirma uma vez de João e duas vezes de Jesus que eles cresciam, ficavam fortes, com sabedoria, graça e espírito. João no deserto e Jesus em sua pequena e quase desconhecida cidadezinha de Nazaré. Enquanto o ambiente de João lembra os grandes momentos de Israel no deserto, Jesus, que seria o maior, crescia numa condição mais comum.


O desígnio de Deus passa pelo mergulho no cotidiano da vida humana. Em Nazaré tudo devia ser muito simples, pois nem estava à beira do lago da Galiléia e nem na planície que se estendia mais adiante aos seus pés, onde estava a rica cidade de Séforis, uma cidade que, estranhamente, não é mencionado nos evangelhos.


A vida social se daria em torno de um lugar de oração, com ao menos um rabino para ensinar os adolescente, e torno da única fonte até hoje existente.


Um pouco de agricultura e um pouco de animais, uma vida muito simples. O mistério de Deus passa por uma política e por uma economia muito marginais, por uma religiosidade simples e sincera. Os apócrifos tinham impaciência em aceitar esta “ignorância” do Filho de Deus, e esta necessidade de crescimento e de aprendizado a partir de um contexto tão rude.


FILHO DE MARIA E “FILHO DA LEI”


NA Galácia, alguns judeus não conseguiam crer que alguém tão humilde, pudesse ser maior do que a Lei de Israel com toda a sua grande história . Mas Paulo insistiu:


Deus nos enviou seu próprio Filho, “nascido de uma mulher”, portanto muito humano, e submetido às leis humanas, solidário com tudo o que é humano (Cf.Gl 4,4). Lucas faz um teste, abrindo, com muito pudor, uma janela para examinarmos o crescimento de Jesus: uma vez completado doze anos, todo judeu deve realizar o ritual de iniciação que ainda hoje se chama “Bar Mitzwáh”,ou seja, ele deve tornar-se “ Filho da Lei. Isso significa ler as Escrituras em público, na Sinagoga,participar do círculo dos mestres na lechiváh, a escola rabínica, e, naquele tempo, devia começar a acompanhar os adultos na peregrinação anual à Cidade santa de Jerusalém e ao templo.


Lucas nos atesta tudo isso a respeito de Jesus: ele esta no momento crucial do seu crescimento, está se tornando adulto. Assim, quando Jesus diz à sua mãe, que o guiou até os doze anos, que está cuidando das coisas “de seu Pai” no templo, entre mestres, ele está assumindo a Lei, pois é “filho” da Lei, e esta é, de agora em diante, o seu “pai”, a autoridade e o guia de sua vida. E Lucas cerra a janela com discrição, repetindo a frase: ele voltou a Nazaré, e continuava seu crescimento em idade, sabedoria e graça. “Em tudo igual a nós –consubstancial a nós segundo a humanidade”, diria em 431 o concílio de Éfeso. (Aqui termina a citação do referido site)

(deste site:)


AGORA UM POUCO DE IMAGINAÇÃO SOBRE O QUE PODERIA SER A VIDA DE NAZARÉ, VIVIDA POR JESUS EM SUA ADOLESCÊNCIA


Quando já morava em Nazaré, um dos amigos de José foi visitá-lo e seu filho de 12 anos, quase mesma idade de Jesus, que tinha 10, foi também. Ele sabia de cor muitas leis, preceitos e orações judaicas. O rapaz que fora com o pai à casa de Jesus não era muito de praticar a religião, pois seu pai era pagão e apenas sua mãe frequentava o templo, num lugar reservado aos casados com pagãos. Ele ia às vezes e se encontrava com Jesus na saída, de seis a dez garotos que voltavam juntos, comentando o que tinham ouvido.


Entretanto, todos se calavam ao ouvir a versão de Jesus do que tinha sido dito: era sempre algo diferente, maravilhoso, vindo não se sabe de onde. Brotavam do coração de um Deus feito homem. Eram ideias muito, muito além daquele tempo.


Jesus gostava muito de repetir a parte da lei que dizia “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração...”etc. Jesus vivia ali, mas não estava só ali: o lugar onde estavam parecia embutido num local mais extenso e mais profundo. Jesus estava com os demais, mas parecia imergido num mundo muito mais bonito, muito mais feliz que aquele.


Mais tarde muitos descobriram, porém, que aquele mundo diferente e maravilhoso estava em seu santo e puro coração. É dali, de seu coração, que brotavam luzes de um novo tempo e de uma nova vida, brotada do amor santo, puro e verdadeiro. E seus felizardos amiguinhos abriam a mente e os corações para verem se recebiam um pouco, pelo menos, daquela sabedoria, amor e santidade. Mas tudo isso era barrado pelos olhos pobres e materialistas daquelas pessoas que com ele conviviam.


Naquele dia em que o amigo de José foi visitá-lo, seu filho ficou à frente da casa com Jesus, conversando, quando Maria levou-lhes dois pães para comerem. Era a hora do lanche. Apareceu, então, um rapaz leproso, ao longe, tocando aquela horrível sineta para lembrar a todos que não deviam aproximar-se. Todos se afastaram, mesmo o amigo de Jesus. Ele, não. Ficou ali até o rapaz chegar perto. Entregou o seu pedaço de pão ao mendigo, com um sorriso. O rapaz fitou-o e a nuvem de angústia que o cobria desapareceu. O sorriso se esboçou e acabou por tomar conta de sua face. Não se curara exteriormente, mas sua vida acabara de tomar um novo rumo, uma nova feição.


Maravilhado ao ver a mudança estonteante obtida por esse simples ato e esse simples olhar, o amigo de Jesus quedou-se em sua insignificância e preconizou:


“Algum dia esse rapaz será curado!”.


Imediatamente adiantou-se e também deu o seu pedaço de pão não ao leproso, mas a Jesus, para que lho entregasse. Ele sorriu e o agradeceu, e entregou o pão ao mendigo. O rapaz leproso colou-se ao chão e não queria mais sair dali, não queria mais se afastar daquela presença extasiante. Jesus, porém, percebendo que ainda não podia fazer mais nada, disse-lhe: “Vai em paz!” Só então o outro saiu. Mas enquanto podia, voltava-se para olhar Jesus de longe, até perder-se de vista.


Foi por esses tempos, aos dez anos de Jesus aproximadamente, que Arquelau, que governava despoticamente aquela região, destruiu uma cidade distante 8 km de Nazaré, Séforis. Eu presumo que muitos sobreviventes (muitos ficaram escravos) tenham fugido para Nazaré e com toda a certeza foram hospedados por José, Jesus e Maria.


Devido a esse e a outros maus governantes, Jesus viu muita violência entre os 3 e 12 anos de idade, conforme nos ensina o Frei Carlos Mesters em seu livro “Com Jesus na Contramão”. É engano nosso achar que Jesus viveu sempre em ambiente tranquilo e pacífico. A infância dele foi marcada pela violência desses déspotas que governavam. A maldade de Arquelau era tanta que logo depois da destruição que ele causou em Séforis, foi deposto pelo governo romano.


Essa violência poderia ter sido, de fato, constatada por ele nessas migrações de pessoas que conseguiam escapar do morticínio ou da escravidão a que eram submetidos nessas cidades circunvizinhas a Nazaré. Consta que duas mil pessoas foram crucificadas em Séforis quando da destruição da cidade.


Quanto a Nazaré, era tão pequena que fora da bíblia não se fala dela. Seus moradores, e José e Jesus estão incluídos nisso, trabalhavam na pequena agricultura. José e seu filho Jesus trabalhavam também na carpintaria: eram camponeses e operários. Jesus ficou, pois, trinta anos trabalhando como camponês e operário e apenas três anos pregando o evangelho, utilizando-se de todo esse conhecimento obtido nessa sua vida de Nazaré.

Diz o Frei Carlos Mesters:

Ele nasceu em Belém, na Judeia do Sul (Mt 2,1) e foi criado no interior, nessa cidade de Nazaré, na Galileia, no Norte (Lucas 4,16). Falava o aramaico com sotaque de judeu da Galileia. Para os samaritanos era judeus (Jo 4,9) e para os judeus da Judeia era galileu (tudo isso está no livrinho do Frei Carlos Mesters indicado acima).


Era de família não sacerdotal, ao contrário de João Batista (Zacarias , Lc 1,5). Nasceu leigo, pobre, sem nenhuma proteção financeira. Como já dissemos no capítulo anterior, José provavelmente era migrante provindo de Belém, talvez para tentar uma vida mais digna.


Jesus aprendeu o que sabia em casa, com a mãe, e na sinagoga. Essas coisas a gente vê na bíblia, por exemplo, em Lucas 2,4 (migrante), Atos 22,3 (Jesus não estudou como Paulo), Mt 13,55 e Mc 6,3 (os filhos seguiam a profissão do pai.


18 bênçãos (manhã, tarde, noite);


Shemá (3 benditos e 3 leituras ), manhã e noite, sendo:


1 bendito ao Deus Criador,


1 ao Deus Revelador,


3 leituras:Dt 6,4-9 (receber o reino); Dt 11,13-21 (receber a Lei de Deus); Números 15,37-41 (receber a consagração),


1 bendito ao Deus Salvador que liberta o povo.


TUDO MISTURADO COM SALMOS.


Jesus tinha muita intimidade com Deus, seu Pai. Rezava muito, passando noites em oração, como vemos em Lucas 6,12. Nas orações procurava sempre saber o que o Pai queria dele, como em Mateus 26,39. Todos os sábados ia com os pais à Sinagoga (livro citado do Frei Carlos Mesters).


Nos trinta anos que viveu com os pais, em Nazaré, procurou vislumbrar, em seu horizonte, o que faria, qual seria sua missão. Não lhe faltaram muitas tentações, mesmo nesse tempo de Nazaré, como depois, na vida pública, em que foi tentado não apenas pelo demônio, mas também pelas pessoas, que sugeriam-lhe um desvio de sua vocação.


O Frei Carlos Mesters faz um pequeno elenco dessas tentações:


Pedro: tentação de ser um Messias glorioso- veja Mateus 16,22; Marcos 8,33;


Seus pais – veja Lucas 2,48; Lucas 2,49.


Seus parentes, que queriam levá-lo para casa. Veja Marcos 3,21 e 3,33;


Os apóstolos gostaram do afluxo do povo. Veja em Marcos 1,38;


João Batista queria um juiz severo. Veja em Lucas 3,9. Mateus 3,7-12; Mateus 11,3. Jesus mandou João conferir as profecias e confrontá-las com a realidade dos fatos. Veja em ateus 11,4-5; Isaías 29,18-19; Isaías 35,3-5; Isaías 61,1;


O assédio dos fariseus. Veja em Lucas 13,31.32


O povo o queria rei-messias, poderoso. Veja em João 6,15. Jesus se retirou.


O demônio o tentou pedindo que ele fosse o novo Moisés, para alimentar o povo (Mateus 4,3), um Messias que se manifesta (Mateus 4,5-6; João 7,27), um Messias nacionalista que conquistaria o mundo (Mateus4,9). Jesus reage. Veja em Mateus 4,4.7.10.


No Horto das Oliveiras, pede ao Pai que o livre do cálice, mas logo pede que se faça a sua vontade. Veja em Marcos 14,36.


Na prisão, tem a tentação de ser um Messias guerreiro, quando Pedro corta a orelha do outro. Veja em Lucas22,53 e Mateus 26,52.


Todos nós podemos viver a Vida de Nazaré vivida por Jesus, mesmo sendo missionários e pessoas ativas na comunidade. Há muitas horas de descanso e de intervalo em nossas atividades, que podemos muito bem usá-las para uma vida tranquila, de contemplação. Como vimos acima, a vida que Jesus levou em Nazaré não foi assim tão tranquila. Houve muitos momentos de violência externa, que ele e sua família teve de ver e assistir sem poder fazer muita coisa. Jesus veio para ser cem por cento homem e cem por cento Deus, mas não podia usar em benefício próprio sua divindade. Ele veio justamente para nos ensinar e nos mostrar que é possível ser uma pessoa santa, mesmo com os afazeres diários.


O problema sério, principalmente de hoje em dia, é que nós nos apegamos aos nossos trabalhos como se fossem nossa tábua de salvação, e acabamos muitas vezes nos afastando da fonte de tudo, que é Deus.


Diz o salmo 126 (127), que não adianta nada trabalhar sem Deus. É trabalho perdido, jogado fora. Vejo tantas pessoas se matando simplesmente por causa do dinheiro, e ainda mais, que não é do próprio sustento, mas para coisas supérfluas que muito bem poderiam ser deixadas de lado.


O cardeal Van Thuan, bispo do Vietnam fazia apenas alguns meses, foi preso porque era católico. Ficou 13 anos preso, sendo 9 de solitária. Quando chegou à prisão, ficou angustiado, pois tinha deixado muito trabalho apostólico. No fim de alguns dias, após muita oração descobriu que ele não havia escolhido, em sua vida, as obras de Deus, mas o próprio Deus, que se manifesta em qualquer lugar.


Dizia Santa Teresinha do Menino Jesus que “A alegria não está nos objetos, mas no mais íntimo do coração; podemos sempre senti-la, tanto no mais rico palácio, como na mais triste prisão”. E é a mais pura verdade. Jesus foi Deus-homem verdadeiro em todos os lugares, seja em Nazaré, como na vida de pregação como na morte. Fosse qual fosse a situação, ele não deixava sua intimidade com o Pai.


Jesus deveria ser a cara de sua mãe. Deveria ser muito parecido com ela, pois sua carne veio só de Maria. Nossa mãe do céu, que tão bem soube ensinar e educar Jesus, pode também nos educar, nos ensinar, nos orientar no caminho de nossa vocação, seja ela qual seja.


Entretanto, fica aqui um lembrete para que não deixemos a oração, a intimidade com Deus, e Jesus nos deu o exemplo, quando ficava noites inteiras rezando. Nosso sucesso na vida espiritual vai depender não tanto de nossas ações, mas de nossas orações e de nossa confiança na Providência Divina, como fizeram Jesus, Maria e José.


COMPLEMENTO


A VIDA DE NAZARÉ E O BEATO CARLOS DE FOUCAULD

Em busca da santidade, podemos viver como Jesus viveu em Nazaré durante os seus primeiros trinta anos de vida: trabalhando com José, rezando, contemplando e convivendo com as pessoas. Nada de "espetacular". A vida de Nazaré antes de tudo é uma vida em família. Se você não vive em família, faça de sua comunidade a sua família.

Nós procuramos viver essa vida de Nazaré, procurando pregar o evangelho mais com a vida do que com as palavras. Dizia o Beato Irmão Carlos de Foucauld que precisamos não apenas proclamar, mas gritar o evangelho e não apenas com as palavras, mas com a própria vida!

Eis algumas meditações que o Beato Ir. Carlos escreveu sobre a vida de Nazaré:

Tenho tanta sede de levar enfim a vida que entrevi, que adivinhei, ao caminhar pelas ruas de Nazaré, ruas que os pés de Nosso Senhor pisaram, e Ele, o pobre artesão perdido na abjeção e na obscuridade... (Carta à sra. de Bondy, 24/6/1986).

Há uma semana mandaram-me rezar diante do corpo de um empregado (do mosteiro), um nativo católico, falecido numa cabana próxima: que diferença entre esta casa e nosso convento. Eu suspiro por Nazaré (Carta à sra. de Bondy, 10/4/1894, Oeuvres Spirit. p. 702).

“Desceu com eles e veio a Nazaré”. Durante toda sua vida ele só se abaixou: ao encarnar-se, ao fazer-se criancinha, ao obedecer, ao fazer-se pobre, abandonado, exilado, perseguido, supliciado, pondo-se sempre no último lugar.(Voyageur dans la nuit, p 308).

Meus últimos retiros para o diaconato e para o sacerdócio mostraram-me que esta vida de Nazaré, que parecia ser minha vocação, era preciso levá-la não na Terra Santa tão amada, mas entre as almas mais doentes, as ovelhas mais abandonadas. Este banquete divino do qual sou ministro, era preciso apresentá-lo não aos irmãos, aos parentes, aos vizinhos ricos, mas aos coxos, aos cegos, às almas mais abandonadas, mais carentes de sacerdotes (Carta ao Pe. Caron, 8/4/1905).

Eu sou um velho pecador que, no dia imediato ao da sua conversão – há quase 20 anos – foi poderosamente atraído pelo Senhor para levar a mesma vida que Ele levou em Nazaré. Desde então, esforço-me por imitá-lo... bem miseravelmente, é certo. Passei muitos anos nessa querida e abençoada Nazaré, como criado e sacristão do convento das Clarissas. Só deixei este lugar bendito há cinco anos, para receber as santas ordens.

Sacerdote não residente da diocese de Viviers, os meus últimos retiros de diácono e sacerdote mostraram-me que esta vida de Nazaré, a minha vocação, era necessário levá-la, não na tão amada Terra-Santa, mas entre as almas mais doentes, entre as ovelhas mais abandonadas.

O divino banquete de que sou o ministro, era preciso oferecê-lo, não aos irmãos ou aos parentes ou aos vizinhos ricos, mas ao mais coxo, ao mais cego, às almas mais abandonadas, as privadas do sacerdote. Na minha mocidade, percorri a Argélia e Marrocos. Marrocos tão grande como a França, com dez milhões de habitantes, não tinha nem um único padre no interior. O Saara argelino, sete ou oito vezes maior que a França e mais habitado do que anteriormente se julgava, tinha doze missionários.

Nenhum povo me pareceu tão abandonado como este e assim pedi e obtive do Reverendíssimo Prefeito Apostólico do Saara, a licença para me fixar no Saara argelino, e de levar na solidão, na clausura e no silêncio, pelo trabalho das minhas mãos e no estado de pobreza, só ou com alguns padre ou irmãos leigos, uma vida tão semelhante quanto possível à vida oculta de Cristo em Nazaré ...

Estabeleci-me há três anos e meio, em Beni-Abbès, mesmo na fronteira de Marrocos, procurando, embora miserável e tibiamente, levar a bendita vida de Nazaré. Até agora estou só... O grão de trigo que não morre, fica só...” Peça ao Senhor para que eu morra para tudo o que não seja a sua vontade. Um pequeno vale é a minha clausura; só de lá saio quando um imperioso dever de caridade me força a isso... a falta de outro sacerdote (o mais próximo está a 400 quilômetros ao norte)... ou para levar Cristo a qualquer outro lugar (Carta ao Pe. Caron, 8/4/1905, Textos Espir. p.213-215)

Escolho Tamanrasset, lugarejo de vinte casas em plena montanha, no coração do Hogar e entre os Dag-Rali, principal etnia [Tuareg], afastado de todos os centros importantes. Não parece estar prevista nenhuma guarnição militar, nem telégrafo, nem europeu, e por muito tempo não haverá missão. Escolho esse lugar abandonado e aqui me instalo, suplicando a Jesus que abençoe esta instalação na qual quero, para minha vida, tomar um único exemplo, sua vida de Nazaré (Carta ao Pe. Huvelin, 4/12/1909).

Quero que todos os habitantes, cristãos, muçulmanos, judeus... se acostumem a ver-me como irmão, como irmão universal ... Eles estão começando a chamar minha casa de “fraternidade”, e isso me dá muita alegria (Carta à sra. de Bondy, 7/1/1902).

Ele [Jesus] assume a vocação de gritar o Evangelho em cima dos telhados, não com palavras, mas com a vida. (Retiro em Nazaré, 1897).

Levem o Evangelho, pregando-o não com palavras, mas pelo exemplo. Não o anunciado, mas vivendo-o... (Retiro em Efrém, 1898, 2ª f. depois do 3º domingo da Quaresma).

Que os irmãos tenham o mesmo zelo pelas almas e as mesmas virtudes que os cristãos dos primeiros séculos e realizarão as mesmas obras. Espalharão, como eles, ocultos, dissimulados, o bem que não podem fazer abertamente. O amor mostrar-lhes-á os meios, e o Senhor sabe tornar eficazes os esforços que inspira.

Recapitulemos: “Não podemos medir os nossos trabalhos pela nossa fraqueza, mas os nossos esforços pela nossa obra”. Se as dificuldades são grandes, apresemo-nos ainda mais a dedicar-nos ao trabalho e multipliquemos mais ainda os nossos esforços (Projeto de Missão no Marrocos, Textos Espir. p. 275).