Inoperacionalidade e Colapsos de caixa

Uma série de observações sobre processos que levam empresas à falência

Este artigo nasce de um conjunto de minhas blogagens sobre custos e preços, ponto de equilíbrio e fluxo de caixa, visando mostrar um panorama simplificado para o tratamento de empresas em crise.

Inoperacionalidade

Uma inoperacionalidade de/ou no fluxo de caixa considero como a situação em que uma empresa, digamos um comércio simples, tendo de dispor todo o mês de 10 mil reais, para com marcação (mark up) de 100%, ou como prefiro, índice de marcação de 2, faturar 20 mil reais e dispor de 10 mil reais de contribuição (o balanzo operativo de meus amigos castelhanos) para cobrir lucro pretendido (que pode ser até nulo) e necessários custos mensais (fixos e dentro da minha definição, acessórios), restando, novamente, os 10 mil reais correspondente ao custo gerador, que propiciará o novo mês de giro. Matematicamente, nada mais simples.

Nesta situação definida numericamente, a marcha para a inoperacionalidade se dará, e aqui citaremos exemplo útil, quando não for considerado um custo mensal de digamos, 100 reais de despesas de cobrança ou pequenos fretes, lembrando uma hipotética pizzaria. Estes custos deprezados, de uma escala de 0,5% do faturamento e 1% tanto da contribuição necessária quanto do capital gerador, implicará em que no próximo modelar ciclo de caixa mensal (pois a situação pode ter giros semanais ou até diários e por turnos), em termos apenas 9900 reais para o capital gerador ou 9900 para os custos acessórios. Ou seja, houve um déficit de caixa para cobrir/honrar os custos fixos ou manter a capacidade de geração de caixa, pelo custo gerador.

Neste nosso exemplo, este déficit poderia ser lançado nos custos acessórios, e fazer uma determinada rúbrica (uma conta, no linguajar mais contábil) dispor de menos 100 reais. Digamos, a conta de telefone, pouco usada, suponhamos, poderia ser atrasada, também digamos, 1 dia.

Se tal operação de desencaixe (como se diz, e ver abaixo uma definição acredito suficientemente completa) for feita sobre o capital gerador, implicará necessariamente, para as mesmas variáveis, aqui completamente ideais, do faturamento possível no outro ciclo ser de apenas 19800 reais. Logo, o déficit crescerá para 200 reais, e poderá perigosamente se somar a um desencaixe já em andamento e crescer.

Em suma, a inoperacionalidade é o fenômeno de tesouraria de determinada conta/custo – um título – não poder ser coberto/honrado – quitado. Não implica, pelo termo, na empresa se tornar completamente inoperacional. Mas marca exatamente quando, por déficit no fluxo de caixa, requererá, talvez permanentemente (e de maneira a tender ao impossível, mais cedo ou mais tarde) de aportes em seu caixa. Ou no caso de aportes já se mostrarem impossíveis e nenhuma providência administrativa (aqui, toda a Economia e Finanças, sem a ação da decisão e dos atos que geram fatos pouco interessam) tal situação sobre os custos acessórios se levará para os custos geradores, e mais cedo ou mais tarde, na completa incapacidade de uma recuperação, e portanto, a inoperacionalidade absoluta, que é a completa incapacidade de gerar caixa, o que é uma questão muito mais importante administrativamente que os um tanto jurídicos conceitos de falência ou concordata (ou sua modificação apenas em termos e nuances chamada de recuperação judicial).

Para todo negócio que fracassou, sempre havia uma planilha de cálculos que garantia que seria um sucesso.

Para fugirmos de exemplos simples e de pequena escala, que são didáticos mas não geram determinado impacto (administradores tem um tendência um tanto estranha de acharem que exemplos de pequena escala não são comparáveis modelarmente com fenômenos de grandes escalas), usaremos o exemplo que muito me agrada que é o das companhias aéreas.

Companhias aéreas são empresas que possuem, naturalmente, grande escala. Possuem custos de ciclos pequenos/curtos (fornecimentos de alta frequência) como serviços de limpeza e fornecimento de alimentos, que são, relativos a outros frequentes, como os leasings ou parcelamentos de aviões, componentes de aeronaves e combustíveis, pequenos.

Como ao ver-se “apertados”, trocar de fornecedores de alimentos e empresas de serviço pode resolver apenas pequenos problemas de caixa, por curtos períodos de tempo, e implicaram em pouca capacidade de pressão das, sejamos sinceros, vítimas. Já mirar nas companhias de equipamentos pode ser perigoso e nevrálgico, e na verdade, não resolverá um problema crônico de caixa. Invariavelmente, mirarão em protelar títulos de companhias de petróleo.

Por que digo petróleo e não combustíveis?

Para lembrar que companhias de combustíveis, invariavelmente, são ligadas a imensas companhias de petróleo, que estão entre as maiores e mais oligopolistas empresas do mundo. Ao fazerem isso, conseguem folga em seus caixas, mas se o problema crucial não for respondido, sua capacidade de trocar de fornecedor de combustíveis será bastante limitada, e mais adiante, na continuidade da marcha para a inoperacionalidade que defini, se verão obrigadas a uma situação de “cash ou cheque visado” (como se diz no ramo) para poderem abastecer suas aeronaves, e aí, surgirá um claro fenômeno: sua capacidade de manobrabilidade em prazos – débitos de caixa no tempo – sobre uma de suas mais significativas variáveis – e mais nevrálgicos custos geradores, pois sem querosene, aviões não voam, obviamente – se extinguirá. Terão, consequentemente, de manobrar inutilmente sobre variáveis sem a menor capacidade real de apresentar solução para seus problemas em tempo, que é variável de fluxo inexorável.

A sempre útil imagem da “caixa d’água” para o fluxo de caixa, aqui, num ‘fluxo de caixa negativo’.

Animação disponível em www.bized.co.uk.

A marcha para a inoperacionalidade – casos

Apresentemos agora casos claros, com passos dos fenômenos do fluxo de caixa.

Aqui, mostrarei a partir de uma pequena empresa, comercial, extremamente simplificada, com custos tributários considerados insignificantes e lançáveis nos custos fixos a cada mês, sem perdas em cobranças (‘devedores duvidosos’, inadimplentes), etc, como tal processo se dá. Podemos dizer que poderia se tratar de uma loja de doces ou uma tabacaria qualquer.

CASO 1

Mostremos primeiro uma empresa equilibrada e lucrativa, que compra bens a um valor total de 20 mil (o meu “gerador“), acresenta sobre eles uma marcação de 50%, o que lhe leva para um faturamento posível (e no nosso caso igual ao que entra em caixa, o meu “caxeamento”) de 30 mil, de onde gera uma contribuição de 10 mil, que debitado de um total de despesas no mês de 9500, resulta em 500 de um lucro, pelo menos num primeiro momento, de óbvios 500.

Notemos que numa situação desta, o ciclo poderia se manter ad eternum, e a cada ano, propiciar 6 mil de acumulação. Uma reserva razoável para um negócio desta escala.

CASO 1A

Evidente que havendo mercado, o negócio modelar acima descrito poderia reciclar seu capital obtido em novas compras, em aumento do disponível para vendas.

Nesta marcha, em poucos meses, certamente, teríamos uma empresa de muito maior porte. Evidente que aqui fizemos uma nova simplificação, considerando, de maneira completamente irreal, que aumentos de vendas manteriam as despesas fixas estáveis. Mesmo para períodos de tempo tão curtos quanto três meses, e numa escala tão pequena de movimentação, tal não se mostra algo mais que uma idealização.

Agora, comecemos a piorar a situação.

CASO 2

Com uma pequena modificação do acima, que poderia ser a simples compra parcelada de um carro, mesmo um veículo relacionado intimamente com a existência da empresa (um carro de entregas pode ser considerado perfeitamente um capital/custo gerador), poderíamos levar, mesmo um valor primariamente considerado como lucro, a zero:

Uma situação destas é ainda sustentável ad eternum, ou até temporária, mas notemos que sumiu uma liquidez, uma formação de reservas, e seria, sempre, um considerar perigoso que o mundo comporte-se idealmente, sem nenhum risco.

Agora, apresentemos o ingênuo erro de alguns:

CASO 3

Digamos que até por humilde e simplório temor, um incauto pequeno empresário compre menos num mês, mas que imprudentemente, não se aperceba que agora gerará menos contribuição para pagar seus custos mensais, que mantiveram-se constantes, e no outro mês, disporá de menos volume para comprar, e tal ciclo perverso progredirá. Notemos que aqui, fiz uma redução de apenas 6% no volume de compras. Algo tão pouco como em 100 caixas de tabacos variados, ou doces, cortar uma meia dúzia.

Em um ano, a situação torna-se insustentável, e mais nenhuma compra ou o popular “pagamento de contas” é possível.

Se o leitor acha que tal caso não surge em grande escala, percebam que grandes redes de varejo já colapsaram por falta de produtos na prateleira, tentando enfrentar volumes enormes de despesas fixas sobre suas costas, e companhias aéreas já tentaram com menos aviões (aquilo que banalmente se percebe que é onde se colocam passageiros que pagam as passagens) as mesmas estruturas que possuiam para muitas aeronaves. Os casos que apresentamos só aparentam ser simplórios, para serem didáticos, mas mudando-se os zeros e colocando-se outras variáveis, são idênticos mesmo aos de maior escala e complexidade.

CASO 4

Mas digamos que outro empresário similar, proceda, mesmo com compras em volume correto, a descontos exagerados e imprudentes, ou colocação de preços que apenas aparentemente não são vis. O popular “rasgar preço”. Observemos que novamente em um ano, a situação torna-se insustentável, e apenas tirei 3% da margem, em “valores grossos”, ou os mesmos 6%.

Lembrem-se disso quando propuserem descontos “de apenas 10%” às suas listas de preço.

Evidentemente que descontos geram vendas, mas como tratamos neste artigo, sobre outro ponto, nem sempre preço trará proporcionais e compensadoras maiores vendas. Existe sempre uma margem necessária a qualquer operação comercial, e sempre nesta margem, a partir de um volume comprado/produzido, existem riscos na realização, na busca da contribuição.

CASO 5

Agora, voltemos ao carro comprado parcelado, e digamos que ao invés de ser lançado dentro de um “antigo lucro”, um primeiro balanço operativo já garantido como obtido e permanentemente gerado, com plena segurança (em suma, um excedente no caixa), se coloque um adicional de despesas de 100, como por exemplo um modelo mais potente que o necessário, ou com um não tão bem estimado inicialmente custo de impostos, despesas de manutenção e mesmo de simples combustível.

Apenas com 1% a mais de despesas, novamente em um ano, o sistema novamente colapsa.

Notemos que por ajustes dos valores por índices, na verdade todos os casos desastrosos acima são de mesma natureza, matematicamente falando, um desequilíbrio entre o gerador (o que se compra), o gerado (a contribuição possível) e os custos que fluem no tempo.

Um caso que poderia se ainda apresentar, e que deixarei mais detalhadamente para o futuro, é do gerado, do contribuído, num tempo inadequado. Necessitaria se gerar, nos exemplos acima, 9500 em um mês, e por volume de vendas, apenas se gerou 9400. Novamente, tem-se um colapso num determinado tempo.

Desconfia dos pequenos gastos: são os arroios que formam os grandes rios. - Benjamin Franklin

Lembrando a irônica lei de Hofstadter:

É sempre necessário mais tempo que o previsto, mesmo quando se leva em conta a lei de Hofstadter.

Unindo com a máxima popular que tempo é dinheiro. Acrescentando a econômica que dinheiro custa dinheiro no tempo, podemos chegar a:

É sempre necessário mais tempo e dinheiro que o previsto, mesmo quando se leva em conta que já se considerou folga de tempo e reservas de dinheiro.

Poderia chamar isso de ‘corolário de Quiumento a Hofstadter’, sem a mínima, por hora, modéstia.

Por isso que em toda operação em negócios, considera-se uma margem de ganhos, folgas de tempo e reservas de caixa, o que chamo “marginalidades” (de margens), e por este mesmo motivo que o caso 2, de uma empresa estritamente equilibrada, é sempre um “andar sobre o fio da navalha”.

Note-se que em todos os trágicos casos acima, a perigosa marcha se iniciou, inexoravelmente, na manutenção de um ciclo vicioso, no primeiro mês, nada mais que um primeiro trôpego passo.

Desencaixe

Na verdade, um neologismo. Em termos simples, define-se como desencaixe, num fluxo de caixa, quando ao apresentar-se uma conta a pagar, um título vincendo, não dispor-se do valor em caixa para cumprí-la.

Definamos, rapidamente, três tipos perceptíveis de desencaixe:

1) Desencaixe por erro de planejamento, e portanto, a indisponibilidade da provisão para cobrir a conta a pagar. Exemplo simplíssimo: esqueceu-se de na data tal, reservar-se 2 mil reais para o pagamento do aluguel do espaço de nossa teórica pizzaria e até com ganhos, investiu-se em ótima compra de ingredientes. É um erro do planejamento, que pode ou não causar, no todo, perdas (prejuízos). Na rúbrica propriamente dita, na imensa maioria das vezes, gerará o que se chama “onerações de demanda”, sejam juros, multas ou até custos de cobrança e honorários advocatícios.

2) Desencaixe acidental. Por uma não-entrada de valor em caixa, mesmo com o planejamento razoavelmente bem feito, não dispõe-se do valor para a cobertura de determinada despesa vincenda. Exemplo: num comércio, há o atraso na quitação de uma determinada venda à prazo. Pode ser, sempre, um erro de provisão para “devedores duvidosos”.

3) Desencaixe por erro de estrutura de custos, ou, fundamentalmente, um erro da estrutura que gera o fluxo de caixa, nas entradas (receitas, na formação dos preços/margens/contribuições necessárias) ou nas saídas (despesas). Em suma, é um erro de análise de ponto de equilíbrio. Nas saídas, pode ser a hiperestimação, desde ingênua até temerária (a administração temerária) da capacidade da empresa prover, desde seus próprios recursos (em custos acessórios) até luxos insustentáveis.

Exemplo simples e de minha vivência: distribuidora de medicamentos, muito sólida em mercado, com faturamento seguro e bastante razoável para as necessidades e até conforto da família proprietária, no volume de 400 mil reais, com lucro teórico bastante seguro de 10 mil reais por mês, cujo proprietário “se atira” para a compra de um sítio de lazer de muito bom padrão, de mensalidades de 20 mil reais mensais, num total de 100 prestações, finalizando num valor de 2 milhões de reais. Tal levou, obviamente, para uma “marcha para a inoperacionalidade”, e catastrófica.

Desencaixes podem ser, no tempo, eventuais ou crônicos. Desencaixes eventuais são referentes a não provisão para pagamento de um determina título ou conjunto destes, limitados em número, no valor e num período. Desencaixes crônicos mostram-se os que causam o contínuo desencaixe para cobertura de n títulos durante um determinado período de tempo. Desencaixes crônicos podem nascer de desencaixes eventuais, e desencaixes crônicos podem vir a tendencialmente se tornarem uma marcha para a inoperacionalidade.

Desencaixes, para sua cobertura, e consequente recuperação da capacidade de geração de caixa, necessitam de “reengenharia financeira” (pois a engenharia já era o planejamento de um bom plano de contas num período) e a distribuição de pagamentos visando o “encaixe”. Digamos, num desencaixe de 20 mil reais, 10 mil reais de superavit de caixa por dois dias úteis, 5 mil por 4 dias e assim por diante, nada mais simples, nada mais claro. Observemos que o mecanismo de recuperação da normalidade de um fluxo de caixa é exatamente o oposto de uma marcha para a inoperacionalidade.

Contrair dívidas é o mesmo que fazer dos outros donos dos nossos atos. - Benjamin Franklin

Alguns conceitos sobre custos

Custo acessório

Defino custo acessório como o custo que não é custo gerador, ou seja, aquele custo, que após definidos os custos geradores, terá de ser coberto pela contribuição; mais descritivamente: no pós-avaliado, o valor do faturamento “caxeado” – entrado no caixa – debitado dos custos geradores; no pré-avaliado, o valor, pelo índice de marcação menos 1 para cobertura dos custos não geradores, aplicado, multiplicado, sobre o custo gerador; ou, noutras palavras, o valor da contribuição prevista, suficiente para cobrir a contribuição necessária, sobre o custo gerador.

Em exemplos numéricos, considerando uma outra pizzaria hipotética e mais enxuta com custos geradores (Cg) de 10 mil, e marcação de índice (M) 1,8 ou 80%, objetivando cobrir 10 mil de custos fixos (por exemplo), teríamos um faturamento (Fp) e contribuição possível (Cp):

Cg = 10000,00 ; M=1,8 ou 100%

Fp= 10000,00*1,8 ou Fp=10000,00+(1+80%)=18000,00

Cp=18000,00-10000,00=8000,00

Os cálculos simples acima podem ser feitos de dezenas de maneiras diferentes, mesmo com erros de colocação e avaliação, resultarão em valores mais que suficientemente concordantes.

Assim, os custos acessórios, como o aluguel (cá entre nós, uma pizzaria simples poderia funcionar na garagem de uma casa própria, e os custos da casa, mesmo com aluguel considerados, poderiam ser lançados na rúbrica pró-labore), telefone (que pode ser, igualmente o pessoal e familiar), ou mesmo forçando a argumentação, uma fonte de água mireral para a lavagem de equipamentos nos fundos de um terreno.

Para exemplos amplos, um veículo interno e imprescindível de transporte ou locomoção de matérias primas pode ser um custo gerador, mas pela mesma argumentação, o jato executivo do presidente da companhia aérea será um custo acessório.

Logo, custos geradores não são acessórios, pois geram contribuição. Custos acessórios são aqueles cobertos pela contribuição gerada pelos custos geradores.

Estas relações obedecem a um conjunto de equações irresolvíveis a não ser pela ação permanente (todo o sistema sobre o qual não se aplica controle tende ao caos), que podem ser expresso, entre diversas modelagens por:

Fp=Cg*M – faturamento possível é igual aos custos geradores multiplicado pelo índice de marcação necessário.

Fp-P=Cx – faturamento possível menos as perdas é igual ao valor que entra em caixa, o que denomino, em neologismo, “caxeamento”.

Cx-Cg=Cd – o “caxeado” menos os custos geradores, que tem de ser preservados a todo custo (ironicamente a frase e a ideia é esta, em especial, em empresas em crise), é igual ao contribuído disponível.

Cd>Cn ou Cd-Cn=L – o contribuído disponível (um balanço operativo um tanto dinâmico, fluindo no tempo, ou, mais grosseiramente, disponível no período) tem de ser maior que a contribuição necessária, ou o total dos custos acessórios ou ainda, o contribuído disponível debitado do total dos custos acessórios resulta no lucro até pretendido, mas jamais garantido, pois, no tempo, o lucro é sempre teoria, mas apenas o caixa é fato, ou noutra versão, resumida, caixa é fato, lucro é teoria.

Se você discorda disto, imagine-se com suas dezenas de aviões, agora em território de um determinado país, que passando por uma revolução insana, apropria-se de todos os aviões, e inclusive, os devolve, mas desmantelados e sem combustível, o que não era previsto em seguro algum, e exatamente pela lei, de tal situação de prejuízo, mesmo em nossas terras, não se pode recorrer.

Ou seja: o lucro no máximo é pretendido e volátil, embora aparentemente possa estar pretendido, jamais é plenamente garantido. Isto concorda com a máxima da engenharia, de que risco zero implica em custos infinitos, o que veremos na prática abaixo, em Marginalidades.

Inevitabilidade dos custos

Existindo o custo, este terá, inevitavelmente de ser lançado nos preços, seja na forma “aditiva” (existindo um preço, acrescenta-se, por exemplo, a entrega), seja na forma “embutida” (existindo o conjunto de custos que forma um “pré-preço”, acrescenta-se o valor da entrega, e forma-se um novo preço, no caso, diremos “final”), seja no produto/serviço específico (aquele a este custo associado), seja distribuidamente (o somatório dos fretes do mês, por exemplo, dstribuídos como uma “alíquota para fretes mensais”).

Inexorabilidade dos custos

Existindo a ocorrência do custo no tempo, seja correntemente, seja acidentalmente, sua correspondente provisão em caixa ou seguro será necessária, pois inexoravelmente, o custo em questão ocorrerá e será necessário honrá-lo (se corrente) ou cobrí-lo (se acidental) e consequentemente, haverá o débito do caixa.

Em exemplos simples: todo mês existe um aluguel ou parcela de financiamento ou despesa de utilidade como água e energia a se pagar, e em grandes empresas, mais cedo ou mais tarde, um incêndio ou acidente acontece, e inexoravelmente, como exemplo mais que trivial e diário, e meu exemplo favorito, lâmpadas queimam.

Marginalidades

Aqui, trataremos de um termo didático meu, que embora não seja formal, ainda sim é relacionado indiretamente com o conceitos acadêmicos de custo e lucro marginal .

Toda atividade econômica necessita de uma marginalidade de lucro, de uma marginalidade de tempo e de uma marginalidade de caixa.

Uma marginalidade de lucro implica em que todo o lucro possível de ser obtido numa atividade deve ser buscado, seja por valor obtido pelo preço (enfrentando o mercado, que já o limita até moral/legalmente) seja por custos (obtíveis como mais baixos). Sem este over de lucro, mais cedo ou mais tarde, a máxima que caixa é fato e lucro é teoria se manifestará. Na escala de país, vastas enchentes ocorrerão (quando até são, pequenas tragédias, comparadas a outras existentes, agradeçamos pela sorte de nosso país). Na escala de um estado, pontes cairão (e seu valor abala fluxos de caixa de uma unidade de nossa federação). Na escala de um município, mesmo chuvas podem levar ao caixa de um município colapsar. Na escala de um pequena empresa, mesmo um conjunto de lâmpadas fluorescendes quebrado por uma escada pode causar um abalo de caixa.

Como digo, na exata medida que segurança absoluta ou risco zero implicam em custos infinitos, custos não infinitos implicam sempre em riscos físicos, e estes, em riscos de fluxo de caixa.

Portanto, a formação permanente de reservas é necessária, seja na forma de uma reserva de liquidez (com nossas mais que atrativas taxas de juros, mais que viável), seja na forma de reservas relativamente imobilizadas (imóveis que sejam, ainda que não tanto viáveis financeiramente). Lembremos que todo ativo é vendável, o que se discute é preço.

Uma marginalidade de caixa é uma marginalidade diferente da marginalidade de lucro, a meu ver, facilmente explicada por um comparação simples. Tendo eu uma hipotética loja de miudezas, imponho lucrabilidade teórica sobre todas as minhas planilhas de custo de maneira que um ítem (bem representativo) que poderia ser vendido, equilibradamente, a R$ 4,50 , está sendo vendido à R$ 5,00 (inclusive, reduzindo meus custos com troco). Uma marginalidade de lucro está sendo buscada, permanentemente, em enfrentamento racional do mercado, sempre altamente competidor. Uma marginalidade de caixa não necessariamente está sendo gerada, pois vendas crescentes, por exemplo e hipoteticamente, podem não estar mantendo qualquer folga de caixa surgindo ao final de cada semana.

Mais descritivamente, uma marginalidade de caixa é, a cada semana, honradas todas as despesas, estarem restando, no nosso pueril caso, 300 reais de saldo de caixa. Este saldo, acumulado ao longo do tempo, constituirá reservas para imprevistos e ampliações volumosas (como um ativo de mais alto valor que o cobrível com um pequeno acúmulo ou folga no fluxo de caixa).

Um saldo crescente de caixa é representativo claro que está se gerando, pelo menos a princípio, lucro, ou, em palavras mais duras, não geração de caixa implica em não geração de lucro, porém o contrário não é verdadeiro, ainda mais em tempo mais extenso.

Uma marginalidade de tempo relaciona-se intimamente com as marginalidade anteriores, pois os sistemas (e toda atividade econômica é um sistema) comportam-se realmente (do real) e não idealmente (do modelo ideal). Assim, enchentes ocorrem, chuvas ocorrem, caminhões se acidentam e lâmpadas queimam retardando trocas de pneus em um armazém de uma transportadora, logo, por estes decrescentes fatores, os fretes não são perfeitos em sincronias, não existe logística não sujeita a riscos e um just in time perfeito. Percabamos que apenas me mantive na variável fretes.

Logo, temos de ter uma reserva de tempo, pois sendo variável denominadora, um retardo de 1 dia num mês gerará um prejuízo direcionado pelo denominador da fração sobre o faturamento mensal. Explico: um retardo de F/30 em valor, de um dia de um mês de 30 dias, será obviamente 0,0333…F, mas fará o faturamento nos 30 dias ser de 0,9666…F. Se não foi percebido ainda o problema, um retardo de 10 dias, numa empresa de contribuição necessáriade 50% sobre custos geradores, causará a anulação da contribuição gerada, impedindo a empresa, a não ser com capitalização, de honrar pelo seu próprio fluxo de caixa os custos geradores e/ou a contribuição necessária (os custos acessórios). Capitaliza-se, suplementa-se um caixa, mas o tempo é ouro perdido na bolsa do ontem, pois o tempo é variável de fluxo fixo e consumo inexorável.

Assim, uma empresa, para poder gerar lucro, tem de possuir reservas de tempo, ou reservas de valor para poder cobrir deficits de tempo, ou retardos causadores de perdas, lembrando sempre que o mundo é real e não ideal, e mais uma vez, lâmpadas queimam.

Exemplo máximo: é notório caso de montadora de automóveis, estruturada sobre um rígido just in time, que ao ter um caminhão com peças acidentado, mandou recolher as peças e trazê-las de helicóptero até a unidade de produção, pois o custo deste frete absurdo (pelo menos num primeiro momento) era inferior às perdas produzidas pela paralização.

A cobertura e recuperação dos desencaixes

Empresas enfrentam sazonalidades e períodos que uma determinada distribuição caótica das receitas, que podem se somar aos acidentes e imprevistos que geram despesas, igualmente caóticos.

Para estes períodos, apresento os dois gráficos a seguir. O primeiro, pode ser entendido facilmente, por exemplo, como o que custará a ampliação de todo um asfixiado parque aeroportuário, ou, noutra escala, também por exemplo, o que custará o período de incorporação de alunos numa “academia de ginástica” recém aberta.

Sempre que nos situamos operando abaixo da linha do ponto de equilíbrio, operamos no prejuízo, e queimamos reservas (o que pode ser nas empresas o capital de giro ou a forçada capitalização pelos sócios, ou ainda, endividamento), e mesmo na melhor das hipóteses, geramos um passivo a ser coberto pelas aparentes rentabilidades e sobras futuras (quando não um passivo a ser honrado). Mais que nunca, se terá de ter olhos atentos para a máxima que caixa é fato, e lucro é teoria.

Desejando um estado contruir um enorme aeroporto a cada 10 anos (melhor ainda, como necessita-se, 5) necessitará apertar – em salários ou seu número – - em salários ou seu número – seus faxineiros, e certamente ainda mais, seus juízes (para não dizerem que estou perseguindo o necessário poder judiciário, poderei citar aqui deputados, senadores, ministros e secretários, e até os seguranças do palácio que desejarem, ou mesmo, especificamente, os veículos funcionais da empresa estatal que cuida do transporte aéreo, ou a agência que a tudo afirma-se que vigia, pouco interessa, os números, no fim, serão frios e cruéis como sempre são). No caso de uma emprea, o carro do flho do proprietário terá de ser comprado apenas no próximo ano.No caso de uma empresa, o carro do flho do proprietário terá de ser comprado apenas no próximo ano.

Já num caso sazonal, temporário, e tal pode ser uma crise num continente, num setor de negócios ou mesmo na simpática e agradável academia do bairro citada acima, o gráfico será o abaixo, que na verdade, é o mesmo acima, apenas considerando-se um sistema de fluxo de caixa mais estabilizado e não partindo de um ‘momento zero’.

Mas notemos, que qual seja a modelagem, o dia de repor-se, de cobrir-se, de sacrificar-se, e até do golpe em andamento colapsar, chega, e pouco interessam desejos a plena análise improdutivos, seja do proprietário da agradável academia do bairro, seja da poderosa indústria, seja do ministro que lida com os diversos aeroportos de um país, seja do presidente da república que a alguém queira apenas agradar, seja do juiz que se julge sábio e justo, e até mesmo que seja da lei que se proclame como justa.

Jamais houve uma lei, conquanto honesta, que impedisse um crime. – ‘OG’ Mandino

Que eu parafraseio em:

Jamais houve jogo com valores que, ainda que bem intencionados, se desequilibrados, não rumem para a falência ou o golpe

Como deve ser dito e repetido, tão simples e claro quanto isso.

O custo de fazer errado é muito menor do que o custo de não fazer nada.

Segundo Stephen Kanitz, uma de suas primeiras lições em Harvard

Referências

    1. MARTINEZ, José Walter; Gerenciamento de Custos; apostila; Faculdade de Engenharia Mecânica; Cursos de Estensão; 2009

    2. BACIC, M.J., CARPINTÉRO, J.N.C. & MARTINEZ, J.W. (1982) Introdução ao Custo e aos Sistemas de Custeio, mimeo, Unicamp

    3. BACIC, M.J. & VASCONCELOS, L.A.T. (1997) Principais Questões Conceituais e Práticas da Gestão de Custos, mimeo, Unicamp

    4. BACIC, M.J. (1998) Administración de Costos: Processo Competitivo y Estratégia Empresarial; tesis Doctor en Ciencias de la Administración, Universidade Nacional del Sur, Bahia Blanca, Argentina, caps. IV e V.

    5. BERLINER, C. & BRIMSOM, J.A. (1992) Gerenciamento de Custos em Indústrias Avançadas, Base Conceitual CAM-I. T.A. Queiro Editora, São Paulo

    6. BEULKE, Rolando, e BERTÓ, Dálvio José (2001) Estrutura e Análise de Custos, Editora Saraiva.

    7. SOUZA, Nali de Jesus de. “Introdução à Economia”, 2ª ed.. São Paulo: Atlas, 1997.

    8. VARIAN, Hal R. “Microeconomic Analysis”, 3ª ed.. Nova Iorque, EUA: Norton & Company, 1992.

    9. JEHLE, Geoffrey A. “Advanced Microeconomic Theory”. Second Edition, Prentice Hall, 2000.

Ver também

Custo Gerador – Conceituação

O custo fundamental na operação de empresas

Ponto de Equilíbrio para Empresas Multiproduto

Uma metodologia matemática simples para chegar-se ao ponto de nivelamento.

Concentrações de sacado e de valores no tempo

Riscos da concentração na cessão de crédito e na distribuição do fluxo de caixa no tempo.

EM TRANSFERÊNCIA