Porque o Design Inteligente é um Criacionismo

Uma demonstração lógica simples.

Neste artigo apresentamos uma demonstração em poucos passos de porque as afirmações do chamado Design Inteligente é um Criacionismo apenas com nuances menos bíblicas e não fixistas nas espécies.

O que é o Design Inteligente

O chamado Design Inteligente (D.I.) é uma relativamente nova corrente entre determinados teístas com conceituação de uma divindade interferente nos processos biológicos.[MEYER, 2006]

Em outras palavras, é um conjunto de afirmações de que determinadas estruturas bioquímicas são tão complexas, e integradas em suas partes,[Nota 1] que seriam impossíveis de existir sem a ação integradora de um designer, necessariamente sobrenatural, que também necessariamente tem de projetar e construir tais estruturas nos seres vivos, com os exemplos mais destacados do flagelo bacteriano [Nota 2] e do olho dos seres vivos [Nota 3].[MILLER, 2014][WELLS, 2018]

Tal conjunto de afirmações, a despeito de seu conteúdo e solidez, busca responder de maneira contrária às afirmações da teoria da evolução das espécies já em questões levantadas por Darwin:

Se pudesse ser demonstrada a existência de qualquer órgão complexo que não pudesse em absoluto ter sido formado por modificações numerosas, sucessivas e ligeiras, minha teoria cairia por completo. Mas que tipo de sistema biológico poderia ter não sido formado por modificações numerosas, sucessivas e ligeiras?[DARWIN, 1859]

Refutações

Neste artigo, nem vamos nos dedicar a citar as extensas refutações aos inúmeros argumentos dos defensores de tais proposições, desde uma abordagem pela não necessidade de sistemas plenamente integrados e funcionais, como em Orr,[ORR, 1996/1997][ORR, 2002 - I][ORR, 2002 - II] Pigliucci [PIGLIUCCI, 2001] (ver nosso artigo sobre o tema) e Pennock,[PENNOCK, 2002] e em numerosos artigos (de divulgação) de Kenneth Chang,[CHANG, 2005] Laurie Goodstein (em que destaca que os promonentes do Design Inteligente NÃO opõe-se totalmente às afirmações da teoria da evolução)[GOODSTEIN, 2005] e as questões legais no ensino de Biologia nos EUA,[NCSE, 2008][DCMDP, 2005][POWELL, 2005][CROWTHER, 2005][RAFFAELE, 2005] assim como da obviedade que o olho não se apresenta entre os seres vivos de forma “completa” (como se isso existisse em biologia) entre os diversos táxons dos seres vivos, como vemos nós, em relação aos nossos, olhos dos moluscos.

As Bases

As bases da argumentação do design inteligente estão no chamado argumento do relojoeiro de Paley, de William Pailey, teólogo britânico, lançado em 1831 e diversas argumentações teleológicas ao longo da história da chamada Filosofia Natural, antes do nascimento da moderna ciência.[MEYER, 2006][PENNOCK, 1999] Determinadas afirmações de mesmo cunho, quanto as polimerizações das moléculas da bioquímica, foram mais tarde feitas pelo físico Hoyle, e hoje até tratadas como uma falácia específica sobre o tema.

Outras questões e abordagens filosóficas sobre o design inteligente, como Hume e a questão teleológica e as afirmações teleológicas sob a moderna Filosofia da Ciência foram já tratados em nosso artigo Falácia da Poça D’Água.

A Demonstração

Aqui nos dedicaremos a apresentar em passos simples que o dito Design Inteligente, é na verdade, uma forma de Criacionismo sutil, e até oculta, mas ainda sim um Criacionismo.

    1. Existem estruturas na natureza que não podem se originar e processos evolutivos ou bioquímicos naturais, pois sua complexidade ou integração entre as partes não o permite.

    2. Logo, existe uma entidade, digamos uma civilização extraterrestre que atuou em momentos da história da vida propiciando a existência de tais estruturas.

    3. Esta civilização, sendo fruto de um processo evolutivo completamente natural, de todas as suas estruturas, por si permite o processo evolutivo completamente natural.

    4. Se esta civilização também é fruto em alguma de suas estruturas, de um design inteligente superior, e o tem de ser, pelos mesmo argumentos de (1.), poderia ser fruto do design inteligente de uma civilização ainda superior.

    5. Repetindo-se os passos 3 e 4, chegamos a conclusão ou que existe o processo evolutivo em algum lugar do universo, e partir daí propagando a “construção da vida” pelo restante do universo, ou caímos numa sequência infinita de civilizações, o que se mostra absurdo. Logo, necessariamente, caímos numa “causa primeira”, aos moldes de Tomás de Aquino e Aristóteles, a qual origina as estruturas vivas que consequentemente produzirão outras, seja em qual nível for de design entre as civilizações acima apresentadas.

Pelo demonstrado, pelo design inteligente, o processo evolutivo ocorre, mas necessariamente possui uma divindade sobrenatural que o coordena, logo, o universo, a natureza, é incapaz de produzir suas estruturas vivas. Logo, em algum momento da história do universo, uma entidade, e vimos que tem de ser uma divindade, logo num ato de criação, e dentro da sutil argumentação dos defensores do design inteligente, preferencialmente a divindade judaico-cristã.[MEYER, 2006][PENNOCK, 1999]

Um vídeo, bastante didático e divertido, com esta mesma argumentação:

YouTube: Proof that Intelligent Design is Creationism

Notas

1

Neste ponto, devemos destacar a conceituação do autor destacado em Design Inteligente, Behe, do que seja complexidade irredutível,[MILLER, 2014] a afirmação que há estruturas biológicas que não poderiam ter evoluído de um estado mais simples, mesmo a própria célula, unidade fundamental dos seres vivos, que é composta de centenas de máquinas moleculares complexas (como se não existisse inúmeras graduações de complexidade entre as células na natureza, desde as mais simples bactérias até os complexos protozoários). Afirma-se que sem tais estruturas, a célula não funcionaria (como se entre as células, não tivéssemos, por exemplo, células sem membrana nuclear como as bactérias ou sem mitocôndrias, como também as bactérias), daí, num salto lógico afirma-se que a célula é irredutivelmente complexa, ou seja, que não pode ter evoluído de um estado mais simples, porque não funcionaria nesta configuração mais simples, e a seleção natural só poderia optar por características que já estivessem em funcionamento.

2

Sendo que deve-se observar que até o mecanismo do “flagelo” se encontra sem diversas partes em várias bactérias, como na causadora da peste bubônica (Yersinia pestis), sendo que o flagelo dessa bactéria não “roda”, portanto não é usado como motor.[MILLER, 2016][MILLER, 2016][PALLEN, MATZKE, 2006]

3

Este ponto tratamos pelo ponto de vista da construção das estruturas no artigo Olho e A Redutibilidade de Sua Complexidade. As questões bioquímicas da visão, já presentes mesmo nos seres unicelulares, e presentes evidentemente em cada célula responsável pela visão neste artigo, são tratadas por autores até no aspecto do número de gerações necessárias para sua evolução.[NILSSON, PELGER, 1994]

Referências

CHANG, Kenneth, In Explaining Life's Complexity, Darwinists and Doubters Clash. Aug. 22, 2005. - www.nytimes.com

CROWTHER, Robert (December 20, 2005). "Dover Intelligent Design Decision Criticized as a Futile Attempt to Censor Science Education". Evolution News & Views. Seattle: Discovery Institute.

DARWIN, Charles (1859). On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life (1st ed.). London: John Murray. LCCN 06017473. OCLC 741260650

DCMDP. Kitzmiller v. Dover Area School District, 04 cv 2688 (United States District Court for the Middle District of Pennsylvania December 20, 2005). Memorandum and Order, July 27, 2005.

MEYER, Stephen C. (December 1, 2005). "Not by chance". National Post. Don Mills, Ontario: CanWest MediaWorks Publications Inc. Archived from the original on May 1, 2006. Retrieved 2014-02-28.

MILLER, Kenneth R. The Flagellum Unspun: The Collapse of "Irreducible Complexity" Archived 2014-02-14 at the Wayback Machine with reply here "Archived copy". Arquivado do original on 2006-04-03. Visitado em 2006-04-26.

Biology by Miller & Levine. Rehoboth, Mass.: Miller and Levine Biology. Retrieved 2014-02-28. "This is a pre-publication copy of an article that appeared in 'Debating Design from Darwin to DNA,' edited by Michael Ruse and William Dembski.

MILLER, Kenneth R. The Collapse of Intelligent Design: Section 5 Bacterial Flagellum Arquivado em 2016-10-17 at the Wayback Machine (Case Western Reserve University, 2006 January 3)

NCSE. "Intelligent Design on Trial: Kitzmiller v. Dover National Center for Science Education". National Center for Science Education. Berkeley, Calif.: National Center for Science Education. October 17, 2008. Retrieved 2014-02-28.

NILSSON Dan-E.; PELGER, S. A pessimistic estimate of the time required for an eye to evolve. Proc Biol Sci. 1994; 256 (1345): 53‐58. doi: 10.1098/rspb.1994.0048

- www.cs.bgu.ac.il

ORR, H. Allen. "Darwin v. Intelligent Design (Again), The latest attack on evolution is cleverly argued, biologically informed — and wrong" Boston Review, December 1996/January 1997, 28–31. - bostonreview.net

ORR, H. Allen. Book Review: No Free Lunch, 2002 - bostonreview.net

ORR, H. Allen. The Return of Intelligent Design, The Boston Review (Summer 2002 Issue).

PALLEN, M.J.; MATZKE, N.J. (2006). "From The Origin of Species to the origin of bacterial flagella". Nature Reviews Microbiology. 4 (10): 784–790. doi:10.1038/nrmicro1493.PMID 16953248

PENNOCK, Robert T. Intelligent Design Creationism and Its Critics: Philosophical, Theological, and Scientific Perspectives (editor). The MIT Press, 2002. ISBN 0-262-16204-0, ISBN 0-262-66124-1

PIGLIUCCI, Massimo. Design Yes, Intelligent No: A Critique of Intelligent Design Theory and Neocreationism. Volume 25.5, September / October 2001. - infidels.org

POWELL, Michael (December 21, 2005). "Judge Rules Against 'Intelligent Design'". The Washington Post. Archived from the original on September 28, 2007. Retrieved 2007-09-03.

RAFFAELE, Martha (December 20, 2005). "Intelligent design policy struck down". Dallas Morning News. Associated Press.

WELLS, Jonathan. Is the Human Eye Really Evidence Against Intelligent Design? April 13, 2018. - evolutionnews.org

Observação: Este texto em defesa do D.I. tem uma boa relação de referências e literatura sobre a evolução do olho. Cópia nos nossos arquivos: docs.google.com

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