Concentrações de sacado e de valores no tempo

Riscos da concentração na cessão de crédito e na distribuição do fluxo de caixa no tempo

Neste artigo tratamos de riscos inerantes à excessiva colocação de valores a receber sobre poucos clientes com pagamento a prazo e sobre poucas operações no tempo, em poucos recebimentos, pouco distribuídos no período correspondente ao ciclo de giro de capital de empresas.

Concentrações de sacado e de valores no tempoQuando se concentra as receitas de uma empresa (ou qualquer organização) sobre poucas áreas, realiza-se o que em administração de fluxo de caixa, e consequentemente em administração de vendas e administração de crédito e cobrança se chama concentração de sacado. Sobre esta concentração mais conhecida, acrescentaria a concentração de volumes no tempo, ou concentração de fluxo.

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Sobre estas concentrações, em descarregar-se todas as esperanças (na verdade, todo o faturamento futuro é uma esperança, e inclusive toda receita, toda entrada futura em caixa, igualmente) construí frases simples que exemplificam e marcam didaticamente os procedimentos mais arriscados:

1) Prefiro nove de mil que um de dez mil. É preferível ter-se nove clientes de volume de faturamento F/10, totalizando 0,9F que um cliente com volume F. Esta diferença de 10% será compensada pela distribuição estatística ao longo de tempo, em que clientes vem e vão, “fecham” (encerram suas atividades à revelia de honrar seus compromissos) e vão à falência. Ao se perder um cliente de F, perde-se todo o faturamento de valor F, evidentemente. Ao se perder mesmo dois ou três clientes de faturamento 0,1F, perderemos no máximo 0,3F, nesta exemplificação. Concentrar a geração de caixa sobre poucos clientes é sempre procedimento perigoso. Quando poucos sacados (quando se acrescenta o prazo), evidentemente o risco cresce.

2) Prefiro um de mil por dia que um de trinta e dois mil por mês. Na verdade, pode ser relacionado com o acima dadas algumas combinações possíveis, mas digamos que sejam títulos distribuídos harmoniosamente entre alguns clientes/sacados. Uma distribuição de titularidades de F/30, entrando todos os dias, chegarão a um valor total F no final de um mês comercial de 30 dias, raros entre empresas (poucas operam, na verdade, todos os dias do mês). Ao faltarem mesmo 25% destas entradas, seja por perdas completas, seja por incidentes, seja por flutuações, perderemos um volume entrante no fluxo de caixa de 0,25F e ficaremos com uma entrada total de 0,75F, obviamente. Quando temos um retardo de 30 dias de uma entrada única de valor F, ficaremos obviamente 30 dias sem este valor F em nosso caixa. Simplíssimo, e lembrando que na minha frase didática sobre a questão, considerei um valor tendendo a um valor ligeiramente maior que F, como (32/30)F=1,0666…F, até porque uso de valores “forçados”, pois obviamente nenhum mês possui mais de 31 dias comerciais plenos (com operações).

Portanto, distribuir valores ao longo do mês, e não concentrá-los sobre poucos clientes em poucas datas é um caminho seguro.

Mas há, a meu ver, uma terceira concentração, um pouco mais complexa e de variáveis extras.

3) Prefiro uma fatura de mil de alguém por semana que uma de quatro mil deste mesmo alguém por mês. Usemos uma exemplificação estrita: Se concentramos o valor do faturamento mensal de um cliente em um única fatura de valor F, ao haver o retardo desta fatura, ele causará, obviamente um desencaixe de F no nosso fluxo de caixa. Este desencaixe de F, assim como ocorre no meu caixa, por partidas dobradas ocorrerá pelo mesmo valor (o que é “ululante” de óbvio) e causando o mesmo nível de problema e proporcional capacidade necessária para ser solucionado no meu devedor.

Para explicar tal em outras palavras, um valor que me é um problema pela falta de recebimento, é o mesmo valor que causa um problema para ser honrado em meu sacado. Se o meu sacado é mais capacitado financeiramente, poderá ser até facilmente resolvido. Se é de pequena capacidade, já poderá estar falido ou em marcha para a inoperacionalidade, que é, em se manter, uma inexorável marcha para a falência. Problema imensamente maior se o sacado (agora já um devedor) é um sacado pouco confiável ou com, digamos, “distúrbios de caráter”, para com o tratamento das suas obrigações.

Assim, quando dividimos um F em 4 x 0,25F, podemos sofrer um retardo em um, em dois, digamos nos quatro títulos, mas como são de valores menores, a capacidade do sacado manifesta-se mais facilmente em resolver o débito, e quitará os valores, nem que seja parcialmente, lesando menos nosso fluxo de caixa, e mesmo numa futura cobrança, permitirá a distribuição das quitações em parcelas mais tratáveis, e colocáveis mesmo numa nova engenharia financeira de nosso devedor, talvez em piores condições, e esta erosão de seu caixa, poderá ser realizada mais paulatinamente.

Duas máximas:

Sacado absolutamente confiável não existe.

Crédito não relaciona-se com capacidade financeira e sim com caráter.

Expliquemos: Não existe sacado que não esteja sujeito a acidentes, até naturais. Não existe sacado que seja possua estrutura administrativa imune a desfalques. Não existe sacado, por maior que seja, que seja imune a um nível de incompetência perigoso em sua administração. Não existe sacado que não esteja sujeito à extinção de seu mercado, ou ajustes deste que a levem à uma marcha para a inoperacionalidade.

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Mesmo o mais capacitado financeiramente sacado pode, por simples “ego patológico”, direcionar-se ao “não pagar”, por simples exercício de sua vontade distorcida. Vide bancos, que por mais capitalizados que já tenham sido, por administrações que nem temerárias foram, e sim, direcionadas ao simples crime, se tornaram massas falimentares nas piores condições. Por outro lado, mesmo o menor em capacidade devedor, pode, por ação de uma vontade pétrea, honrar até o último centavo um valor devido inclusive superior às suas, a primeira análise, capacidades.

Observações

Existe, especialmente entre os administradores de empresas de pequeno e médio porte, uma tendência a considerarem para efeitos de custos a serem acrescentados (desde investimentos até simples retiradas de pró-labore para “desejos de consumo”) os valores previstos para um determinado período de atividade como entradas, as Entradas de Caixa Projetadas. Consequentemente, tais comprometimentos e ações no caixa serão da natureza dos valores que de fato ocorreram, ou seja, serão Saídas de Caixa Realizadas, já no tempo presente ou em pouco tempo no futuro, noutras palavras, foram ou serão realizados em termos de entradas e saídas de recursos financeiros. O recomendável é tender-se a realizar os projetos, colocados inicialmente como Saídas de Caixa Projetadas, orçamentos de projetos, como a serem cobertos com Entradas de Caixa Realizadas, em suma, disponibilidade de caixa que “sobreviveram” aos custos eventuais e imprevistos. Nisto não estamos negando o “correr-se riscos”, mas exatamente, o considerá-lo.

O importante gráfico do fluxo de caixa em compras e vendas/pagamentos e recebimentos,

seguidamente utilizado perigosamente pelo administrador de empresas de pequeno e médio porte

para cobrir despesas que de forma alguma lhe gerarão caixa (sebraepr.com.br).

Referências

    • BLATT, Adriano. Avaliação de Risco e Decisão de Crédito. Um enfoque prático. São Paulo: Nobel,1999.

    • GITMAN, Lawrence J. Princípios de Administração Financeira. São Paulo: Harbra,1978.

    • SCHRICKEL, Wolfgang Kurt. Análise de Crédito. Concessão e gerência de empréstimos. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1998.

Ver também

Custo Gerador – Conceituação

O custo fundamental na operação de empresas

Inoperacionalidade e Colapsos de caixa

Uma série de observações sobre processos que levam empresas à falência

Ponto de Equilíbrio para Empresas Multiproduto

Uma metodologia matemática simples para chegar-se ao ponto de nivelamento.