Síntese enantiosseletiva - 2

Caminhos de formação de moléculas químicas complexas em meio gasoso com síntese enantiosseletiva (homoquiral)

Seguidamente, vemos alegações de criacionistas e seus no fundo análogos D.I.stas de que estruturas moleculares de determinada complexidade não podem se formar por processos naturais.

Bom, pelos menos inicialmente, pois ninguém duvida, a não ser em insanidade, que somos agregações de estruturas moleculares que crescem por si, com nosso crescimento e antes disso reprodução, incluindo ai complexidade, como mostra, por exemplo, o aparecimento de certos mecanismos imunológicos, que são bioquímicos, e não celulares, como os anticorpos.

Nesse caminho de argumentação, são apresentados “milagres”, como no ramo o clássico flagelo bacteriano, sem jamais se aceitar que sua “construção” na história da vida relaciona-se com o “motor de ATP” (tratado por eles como outro argumento de design, mas nunca associado), e pulam-se questões bem perceptíveis que mesmo os seres vivos mais simples apresentam graduações de complexidade, como percebe-se não só entre micro-organismos como a Euglena e as cianobactérias, mas também entre as bactérias com e sem flagelo. Mesmo graduações da própria complexidade dos flagelos, e diferentes tipos destes com estruturações diversas são esquecidos. Noutras palavras, esquecem-se de qualquer graduação e foca-se num alegado “milagre”, e sempre com as falácias de costume, desde a óbvia apelo à ignorância até a irritante simples pura negação, ou incredulidade, o “não pode ter sido assim”.

Entre estas afirmações, inclui-se que as moléculas básicas da vida - pelo menos dentro de uma argumentação que é limitada sobre o tema, desprezando uma possível seleção química - tenham de ter a orientação geométrica, a quiralidade plenamente definida dentro de seus primordiais momentos, esquecendo-se ação enantiosseletiva das enzimas, então o que chamamos de protoenzimas, e qualquer mecanismo de reação química que promova as quiralidades específicas de aminoácidos e carboidratos.

Então vejamos alguns casos pitorescos de reações que nos levaram a um certo argumento por mostrar o erro de nossos “amigos”.

Inicialmente, apresentemos a relativamente violenta reação de “oxi-redução interna” (nome na verdade obsoleto), da síntese do orto-nitrotolueno (1) em meio alcoólico alcalino. Nitrotolueno torna-se antranil (2) e finalmente, o ácido antranílico. Observe-se que os hidrogênios “trocam de lugar” com os oxigênios.[ BAKKE, 1972 ]

O que queremos dizer com isso?

Que as moléculas seguem tendências, e essas são “fisico-químicas”, por assim dizer, e podemos dizer, por isso, naturais. Mas claro que pretendemos casos muito mais complexos, e que tenham relação com coisas típicas da vida, não a matéria prima de determinados corantes.

A chamada reação de Morita−Baylis−Hillman permite que os químicos formem novas ligações σ C-C de uma forma simples de um só passo e, assim, conduzam à construção de moléculas densamente funcionalizadas para posterior manipulação química.[ Amarante, 2009 ]

Esta reação utiliza ionização por eletropulverização para a transferência de íons de uma solução diretamente para a fase gasosa, obtendo intermediários decisivos.

Relendo o acima, percebemos algo relacionado à faíscas, algo como gotículas numa atmosfera e obviamente, a própria atmosfera, gasosa, óbvio, circundante.

Lembremo-nos do inferno que tem de ter sido a atmosfera primitiva da Terra. Em caso de dúvidas sobre isso, boa leitura sobre Vênus, logo ali, ao alcance de telescópios até bem comuns.

Não trataremos aqui de uma “dualidade” dessa reação, produzindo mais de um caminho e resultados, dependendo de catalisadores e outros fatores, como concentrações.

Imagem de [ Amarante, 2009 ].

Agora vejamos, para esta reação, no que tange à homoquiralidade, pela catálise assimétrica, o que nos diz a trivial Wikipédia em inglês:

en.wikipedia.org - Baylis - Hillman reaction - Implications on Asymmetric Catalysis

“No entanto, o modelo de Aggarwal lançou luz sobre a catálise assimétrica da reação MBH. Ele sugeriu que todos os quatro diastereômeros do alcóxido intermediário são formados na reação, mas apenas um tem o doador de ligação hidrogênio adequadamente posicionado para permitir a transferência rápida de prótons, enquanto os outros diastereômeros revertem para materiais de partida.”

Leia-se: Certas orientações permitem a reação, outras não.

“Estes estudos mecanicistas dirigem a atenção para a capacidade de doador de prótons (ácido de Brönsted) do catalisador. Se tanto o ácido de Brönsted ou a base de Lewis podem ser apropriadamente posicionados em uma molécula quiral, a base de Lewis irá reagir com o substrato (adição de Michael), enquanto o ácido em um ambiente assimétrico permite a transferência de prótons quiral. O ácido de Brönsted permanece para o enolato resultante na etapa de enolato de adição para o aldeído ligado ao hidrogênio e, finalmente, garante a transferência eficiente de protões no passo de abstração de protão no passo determinante da velocidade.”

Leia-se: Espécies químicas diferentes, até em natureza de ácido e base (dadas determinadas definições do que seja ácido e base, em Química Orgânica, muito mais complexas que o trivial) a reação se processará da mesma maneira, mantendo a quiralidade da reação.

Completando:

“A ação dos co-catalisadores de Brönsted, que são muitas vezes utilizados na reação MBH, não se limita a um papel de passo de transferência de prótons. É, em vez disso, promotora de conjugado ligando-se ao enolato zwitteriônico, e estabiliza estes intermediários.

Leia-se: Mesmo moléculas relativamente simples apresentam em reações papéis que vão além de exclusivamente reagentes ou catalisadores.

Qualquer semelhança com os sistemas químicos da vida, e seus “tamponamentos”, não é mera coincidência, mas nos concentremos na quiralidade.

Vejamos agora o que nos diz [ Todre, 2002 ], sobre íons distônicos.

Nota: Íons distônicos são espécies químicas que contêm tanto um radical e um sítio iônico em diferentes átomos da mesma molécula. Foram descobertos pela primeira vez em fase gasosa por Michael L. Gross. Nos últimos anos tem existido foi um tremendo esforço para identificar novas espécies distônicas, caracterizar a sua reatividade, e medir sua estabilidade. - en.wikipedia.org - Distonic ion

Radicais cátions diaminoalcanos (leia-se diaminas, como a [n-metil]diaminas) sofrem rearranjo intramolecular do átomo hidrogênio conduzindo a radicais cátions distônicos.

Entre as substâncias que sofrem este tipo de reação está a glicina, um característico aminoácido. A mudança de carga é encontrável na terminação em carbono (ácido) e na terminação em nitrogênio (amina).

Quanto á Física do processo, para o caso da glicina. a energia de ativação para esta separação é 0,4 elétron Volt no estado fundamental, sem qualquer barreira para o estado excitado. A força condutora é a alta afinidade para o próton do grupo amino (noutras palavras, seu caráter básico). Isso conduz à formação dos radicais cátions distônico estabilizados.

Uma explicação similar ajuda no entendimento da existência de formas convencionais e distônicas do radical cátion benzonitrila, (H5C6C≡N)+ e H4C6C=NH+ . Embora os radicais cátion distônicos sejam menos estáveis que os “clássicos” por energia de 45 a 50 kJ/mol, eles são protegidos de isomerização por uma barreira energética mais elevada.

O exemplo do radical cátion acetato de etila é também digno de nota. De acordo com estudo por ESR (electron spin resonance, ressonância por spin de elétron), esse cátion, sob oxidação de um elétron não resulta o convencional carbonil, mas o radical cátion ônium distônico (ver esquema abaixo), sendo que essa forma é mais estável que a forma carbonil por quase 50 kJ/mol, sendo as ligações OH mais fortes que as CH. O fragmento CH2 é estabilizado por uma ligação de três elétrons com a vizinhança do oxigênio na maneira de -O.’.CH2. A oxidação do grupo carbonil é muito difícil, enquanto a oxidação da moiety (“trecho”, “porção” da molécula) hidroxialquil é muito fácil. Por outro lado, o átomo de oxigênio pode preservar seus elétrons circundantes se convertido num estado ônium. Nesse caso, entretanto, um elétron não formante de par é localizado sobre o carbono metileno e separado do ônium com outros átomos mais pesados. Portanto, a estabilidade total do radical cátion distônico torna-se mais alta que a da forma convencional.

Nota: Percebe-se aqui seleção química das espécies envolvidas, claramente, com “vantagem” exatamente conduzida pelas energias de reação, levando a formas mais permanente, sobreviventes ao meio.

Radicais cátion distônicos com oxigênio ônium etéreo (no sentido de éter, R-O-R’) são também conhecidos. Por exemplo, a adição de radicais tert-bitóxi à compostos etil~enicos ou acetilênicos foi descrita, sendo que estes radicias são adicionados a suas formas protonadas, incluindo compostos halogenados como fonte de prótons.

Notas: Primeiro, perceba-se aqui que a oxidação, no sentido de reação com o oxigênio já não mostra-se como um empecilho para a disponibilidade de reagentes para essa reação, e em segundo, lembremo-nos que na natureza a disponibilidade de cloro e flúor pela decomposição vulcânica sobre os halogenetos, por exemplo, da água do mar é um fato.

Do ponto de vista químico, a grande utilidade dos radicais íons orgânicos distônicos é que eles podem permitir reações do tipo iônico no centro carregado e reações do tipo radical no centro radical.

Nota: Em termos mais didáticos, eles permitem a formação de moléculas mais complexas por dois caminhos distintos de reação.

Por exemplo, o radical ânion distônico de ciclopentadienilideno-trimetilenometano reage sob condições de um espectrômetro de massa em fase gasosa com dissulfeto de carbono por abstração do enxofre com óxido nítrico por adição do radical NO. A primeira reação caracteriza o radical ânion distônico mencionado como um nucleófilo conduzindo uma moiety negativamente carregada. A segunda reação descreve o mesmo ânion como uma espécie tendo um grupo com insaturação do radical.

Para outro exemplo da forte dualidade no comportamento químico de radicais cátions distônicos, devemos mencionar que na fase gasosa, radicais cátion meta e para-deidrobenzoíla reagem seletivamente tanto como radicais livres ou íons acílium, dependendo da escolha do parceiro neutro de reação. A transacetilação com 2-metil-1,3-dioxolano, cetalização com 2-metoxietanol e expansão do anel epóxido com epicloridrina demonstra sua reatividade de íon acílium. A abstração de SMe (sulfeto de metila) de MeSSMe (dissulfeto de dimetila) demonstra sua reatividade como radical livre.[ Chatgilialoglu, 2013 ] Em reações one-pot com misturas gasosas de epicloridrina e dissulfeto de dimetila, os radicais cátions deidrobenzoíla reagem seletivamente em ambos os sítios para formar os dois íons monoderivados. Posteriores reações tanto no radical remanescente ou no sítio íon acílium carregado conduzem a um único íon biderivado como produto final.

Mas há um antecedente destas reações em fase gasosa, com um comportamento seletivo, cuja descoberta se deu em 1993.

Íons acilium contendo uma variedade de substituintes foram submetidos à reação com 1,3-dioxolanos, dando origem a um composto cíclico, estabilizado em ressonância de íon oxônio, o produto de oxirano (C2H4O) e a adição do íon reagente. A estrutura para o produto molécula-íon foi suportada por espectrometria de massa de múltiplos estágios, mostrando a fragmentação pela perda esperada de C2H4O , produzindo os íons reagentes acilium originais. Os íons oxônio são formados em abundância relativamente elevada em muitos casos, e são observados, mesmo quando se espera que ocorram de forma competitiva, devido à acidez de alguns dos íons de acilium.

Esta reação íon-molécula é capaz de atuar em toda a classe de íon acilium e também sobre íons oxônio em fase gasosa. A reação com 1,3-dioxolano também é útil para distinguir o íon C2H3O mais estável, o cátion de acetilo, a partir dos seus dois isômeros estáveis, O-ceteno protonado e o cátion oxiranilo. O cátion tioacetilo também reage com dioxolano de modo a formar o produto de adição de oxirano correspondente, indicando que a reação de adição C2H4O ocorre e que pode ser útil para identificação da classe tioacilio e para a geração de fase gasosa de análogos de enxofre aos íons oxônio.

Esta reação, a acetalização e transacetalização polar na fase gasosa, é chamada de reação de Eberlin.

Referências

Giovanni W. Amarante, Humberto M. S. Milagre, Boniek G. Vaz, Bruno R. Vilachã Ferreira, Marcos N. Eberlin and Fernando Coelho; Dualistic Nature of the Mechanism of the Morita−Baylis−Hillman Reaction Probed by Electrospray Ionization Mass Spectrometry; J. Org. Chem., 2009, 74 (8), pp 3031–3037 - DOI: 10.1021/jo802578t - pubs.acs.org

JAN BAKKE, HARALD HEIKMAN and GUN NYSTRØN; Syntheses of Anthranilic Acid and Some Derivatives from o-Nitrotoluene. ACTA CHEMICA SCANDINAVICA 26 (1972) 355—364.

C. Chatgilialoglu, Klaus-Dieter Asmus; Sulfur-Centered Reactive Intermediates in Chemistry and Biology; Springer Science & Business Media, 2013 - pg. 49 - books.google.com.br

Marcos N. Eberlin and R. G. Cooks; Gas-phase oxirane addition to acylium ions on reaction with 1,3-dioxolanes elucidated by tandem and triple stage mass spectrometric experiments; Issue Organic Mass Spectrometry; Organic Mass Spectrometry, Volume 28, Issue 6, pages 679–687, June 1993 - DOI: 10.1002/oms.1210280605 - onlinelibrary.wiley.com

Zory Vlad Todre; Ion-Radical Organic Chemistry: Principles and Applications; CRC Press, 2002. - pag 151 - books.google.com.br

Glossário

Moiety, plural moieties, “trecho” ou “porção”, em Química Orgânica, é um termo usado para uma parte de uma molécula. Porções maiores são muitas vezes grupos funcionais.

Um grupo funcional é uma unidade que participa em reações químicas semelhantes na maioria das moléculas que os contenham. Por sua vez, as partes do grupo são denominadas moieties. Por exemplo, para-hidroxibenzoato de metilo (metilparabeno) contém um grupo funcional fenol dentro da moiety acilo, que por sua vez faz parte da moiety de parabeno. - en.wikipedia.org - Moiety (chemistry)

Dentro de certas limitações, pode ser usado o termo “unidade” como tradução, mas isso conduz, em inúmeros casos, a erros de interpretação.

Em química, uma síntese one-pot (aproximadamente “um só recipiente”) é uma estratégia para melhorar a eficiência de uma reação química em que um reagente é submetido a sucessivas reações químicas num só reator. Isto é muito desejado por químicos porque evita processos de separação demorados e purificação dos compostos químicos intermediários, permitindo poupar tempo e recursos enquanto aumenta o rendimento do produto químico final. - en.wikipedia.org - One-pot synthesis