Artesanalmente esculpida e cuidadosamente pintada, detalhes da imagem colocada na mesa ao lado do leito hospitalar, onde o rapaz aguardava a cirurgia. Não o acompanharia nos próximos dias, pois na noite do dia seguinte iniciaria a romaria à Aparecida.
Carregava agradecimentos, ofertas e intenções, nada mais que poucas coisas num embornal. Não pensava na chegada, apenas no caminho e seus muitos percalços. É de sonho e de pó, o destino de um só... Andarilho e caminho, dia e noite, frio e fome, dor e alegria, alguns dos termos, sensações e sentimentos que a jornada ensina.
Aliás, tolerância e aceitação são ensinamentos relembrados no trecho, afastado da dureza do cotidiano das cidades. Andarilhos marginais livres de sua própria identidade, mensageiros de um tempo que não passou e que esculpiu suas verdades na paisagem imortal da serra e do vale, histórias cortadas por rios e ribeirões tão vivos quanto os próprios andantes.
Vencidos os últimos quilômetros pelos trilhos do velho trem, o sol de primavera reinava absoluto na marcha dos desapegados, tomado por sentimentos livres de qualquer rancor deixado pelo caminho. Alcançando a rampa do santuário, arrepios repentinos tomam o corpo, o silêncio dos passos sobem aos ouvidos, lágrimas dominam os olhos e a emoção liberta o coração, num ato simples encenado por gente comum feita de carne e osso, além de sonhos.
Sonhos tão diferentes, dos quais os motivos não importam, estes são apenas fatos que lembram que estamos vivos, fortes e com fé, seguindo para outro lugar.
Outro dia já vem e no cruzamento dos caminhos as imagens se unificam num vestígio de lembrança replicada no silêncio de um final de tarde, de qualquer lugar...