Mês de outubro com ruas perfumadas por magnólias-amarelas, cheiro de flor adocicado como garapa. O coração estava calmo, assim como o tempo no sertão. As roças ainda não haviam sido plantadas, ausência de chuvas emperrava o trabalho rural.
Procissões carregavam a imagem de Nossa Senhora Aparecida de um lado para outro, a fé era forte, mas o povo parecia um monte de gafanhotos desorientados, pra lá e pra cá. Era estranho, formava nuvem e trovejava, mas não chovia. Uns achavam que São Pedro estava bravo, outros que era punição por tanto pecado.
Como vento na campina, a seca era o assunto que se espalhava na região. Pelas ruas da cidade não se falava outra coisa, nem os falecimentos tiravam a atenção de moradores locais.
Ao esconder da lua e de estrelas companheiras, o orvalho da manhã cobriu resistentes flores, abrindo-se para os primeiros raios de sol do dia. Pires, Carvalhos, São Lourenço, Paiol Queimado, Dúvida, Azevedo, Bonifácio, Vargem Grande, Barrocão, Pico e Mosquito são bairros que cercam este lugar, conhecido como um dos mais antigos currais da região bragantina.
Mas estava decidido a ir embora daqui... Relutava aborrecido, a coisa estava feia: Pior lá velho amigo, disse meu camarada. Dei-lhe razão, longínqua cidade grande tinha muito asfalto, calor e perigo. Desisti... A pé cruzei de sul a norte, rumo à divisa.
Como bom caminheiro, simplesmente seguia, abandonada a ideia de cidade grande. Um dia após o outro, uma luta por vez. Nessa vida, cumprindo a sina de viver, a sós, acompanhado, não importava... A solidão estaria sempre por perto.
Findado o dia, alcancei a casinha branca do alto da serra. Do quintal e da janela observava o por do sol, vermelho como fogo na imensidão do horizonte. Sem querer, havia compreendido a marcha dos dias, simplesmente seguindo em frente!
“Escasseiam-nos as observações às coisas desta terra, com uma inércia cômoda de mendigos fartos”.
“Desce a noite, sem crepúsculo, de chofre um salto da treva por cima de uma franja vermelha do poente – e todo este calor se perde no espaço numa irradiação intensíssima, caindo a temperatura de súbito, numa queda única, assombrosa...”.
“Em roda uma elipse majestosa de montanhas...”.
“Atravessamo-lo no prelúdio de um estio ardente e, vendo-o apenas nessa quadra, vimo-lo sob o pior aspecto. O que escrevemos tem o traço defeituoso dessa impressão isolada, desfavorecida, ademais, por um meio contraposto à serenidade do pensamento, tolhido pelas emoções da guerra”.
“De fato, os seus ciclos – porque o são no rigorismo técnico do termo – abrem-se e encerram-se com um ritmo tão notável que recordam o desdobramento de uma lei natural, ainda ignorada”.
Euclides da Cunha. Os sertões (1901).
Por Diego de Toledo Lima da Silva
Data: 17 de Outubro de 2015