Na terra do sol quem vive na sombra é rei. Com esse ditado popular abracei o caminho, tomado por nuvens de poeira levantadas por automóveis em alta velocidade. Entre um trecho e outro, poças d’água eram desafios vencidos por saltos à distância, uma provável nova modalidade de esporte da roça.
No limiar entre dois municípios interioranos, o córrego da Água Suja atravessa o sombrio bambuzal, águas carregadas por lendas e mitos de assombração. Corrente lenta vencendo os obstáculos do leito, desbarrancando as margens de terra vermelha, produtivas áreas de frutas, mudas e canaviais.
Fim de tarde, último do horário de verão do período, sol entre poucas nuvens e algum resquício da última semana de chuvas. Tudo estava diferente de alguns meses atrás, inclusive eu... Seriam as chuvas torrenciais que renovaram o ambiente ou a vida que rejuvenesceu o sentido dos dias?
Certeza mesmo que as perguntas ficariam pelo caminho, enquanto as respostas viriam com o tempo, algumas mais cedo, outras mais tarde. A conta cobrada da nossa parte foi a necessidade de viver o caminho, respirar os passos e libertar a visão, soltando os olhos pela paisagem, literalmente livres das amarras dos medos cotidianos.
O vazio dos canaviais foi substituído por latidos de cachorros de sítios próximos, lembrando o retorno a locais habitados de personagens diferentes dos mourões de madeira das plantações, gente com pensamentos, medos e opiniões.
Cansado pelo tempo e pelos pensamentos busquei abrigo na margem da estrada, numa enorme embaúba, com o chão forrado de folhas mortas. Sentado à sua sombra e tomado por sua energia, os pensamentos sumiram e o cansaço foi preenchido pela necessidade de continuar em frente.
Prometendo retorno à velha árvore, voltei à estrada tomada pelo sol de verão. Olhando para trás e sentindo sua refrescante sombra, entendi perfeitamente o significado daquele ditado popular... Foi um curto reinado!