A dúvida e a certeza são aspectos que se cruzam nos caminhos de terra, movidas pelo sopro do vento gelado das manhãs de agosto da Serra da Mantiqueira. Para delírio do olhar, as matas estão enfeitadas pelas flores de ipês e mulungus, vestígios rurais do sertão.
Das curvas da estrada de chão, entre inclinados morros afastados do impacto da urbanização, o Bairro da Dúvida leva o caminheiro por belezas naturais, histórias curiosas e eternos conflito, banhado pelo córrego da Bocaina, com límpidas águas claras que em dias de sol refletem o infinito do céu.
Palco para o show de grandes araucárias, verdadeiras guardiãs do tempo e da antiga São João do Curralinho. Dos verdadeiros sonhos desta terra, os velhos campos bragantinos assumem seu espaço na paisagem, guardando a velha fazenda, o terreiro de café e a artística capelinha rural. Santos e representações são lembradas pelo tocar do sino de ferro, enferrujado pelo tempo.
Na memória, pesadelos com cobras corais e sonhos da casinha branca no alto da serra lutam contra os trinta e nove graus de febre, no suor do longínquo caminho sem movimento de veículos. Apenas um tropeiro sobe e desce estas bandas todos os dias, cuidando do gado, guardando a natureza e coletando saborosos pinhões.
Lá no alto, a natureza exalta a eterna guerra entre campos e matas, jequitibás e mamicas-de-porca, xaxins e alecrins. A verde paisagem se abre rente à cerca de arame farpado até as secas bandas da represa, sofrida estiagem na estrada de sonhos, deserto de terra vermelha.
Na trilha tomada por mato, o desafiante trecho leva até uma pequena barragem, presente na história da água da velha cidade. Atravessando sua crista, mais de trezentos anos de história e dezenas de metros de altura, o grande pinheiro-bragantino demonstra em verso e prosa a riqueza local, ao som de exaltados jacus, protegendo as geladas águas do local, seus ninhos e escassos alimentos da fria estação.
Voltando à estrada, um caminho lateral leva ao antigo sítio e lá está ela: a casinha branca, de varanda e sapê, como no sonho. As portas se abrem para o fogão à lenha, restos de madeira, móveis simples e lembranças de pessoas que se foram... Viajaram antes do combinado, velhos camaradas com marcantes passagens nesta vida.
Lágrimas correm dos olhos viajantes, ríspido da vivência urbana, com o chapéu nas mãos e o coração em conflito, alegria e tristeza, dúvida que persiste como o curioso nome do bairro.
Sem explicação, o destino é uma dúvida, trilhado um passo por vez, como o retorno à cidade e suas luzes. Sentimentos exaltados como as belas flores do manacá do alto da serra, rodeado de gente, fé e música na Festa do Divino.
Nos braços da amada, entre um gole e outro de café, histórias do Bairro da Dúvida invadem o tempo, voos rasantes pelas histórias da região, abraçado pelo Gigante Adormecido, guardião da Mantiqueira por maioria de votos!
Por Diego de Toledo Lima da Silva Data: 23 de Agosto de 2015