JESUS, MARIA E JOSÉ
29/12/2024
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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO
1ª Leitura: Eclesiástico 3,3-7.14-17a (grego: 2-6.12-14)
Salmo 127(128)-R- Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!
2ª Leitura Colossenses 3,12-21
Evangelho de Lucas 2,41-52
"41.Seus pais iam todos os anos a Jerusalém para a festa da Páscoa. 42.Tendo ele atingido doze anos, subiram a Jerusalém, segundo o costume da festa. 43.Acabados os dias da festa, quando voltavam, ficou o menino Jesus em Jerusalém, sem que os seus pais o percebessem. 44.Pensando que ele estivesse com os seus companheiros de comitiva, andaram caminho de um dia e o buscaram entre os parentes e conhecidos. 45.Mas não o encontrando, voltaram a Jerusalém, à procura dele. 46.Três dias depois o acharam no templo, sentado no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os. 47.Todos os que o ouviam estavam maravilhados da sabedoria de suas respostas. 48.Quando eles o viram, ficaram admirados. E sua mãe disse-lhe: “Meu filho, que nos fizeste?! Eis que teu pai e eu andávamos à tua procura, cheios de aflição”. 49.Respondeu-lhes ele: “Por que me procuráveis? Não sabíeis que devo ocupar-me das coisas de meu Pai?”.* 50.Eles, porém, não compreenderam o que ele lhes dissera. 51.Em seguida, desceu com eles a Nazaré e lhes era submisso. Sua mãe guardava todas essas coisas no seu coração. 52.E Jesus crescia em estatura, em sabedoria e graça, diante de Deus e dos homens. (= Mt 3,1-12 = Mc 1,1-8)"
Todos nós estamos ligados necessariamente a uma família. Nela nós encontramos as raízes de nossa existência e nossa formação como pessoa humana. Ser pessoa humana é ser de outros. Somos como um tecido de fios de muitas outras vidas. Somos provenientes de homem e de mulher, ambos tecidos de duas outras famílias. São duas correntes da humanidade que se uniram, e, num dado momento, se uniram e geraram uma nova vida. Portanto, estar ligado a uma família, dela receber a existência é algo próprio de nossa condição humana.
A festa de hoje é também celebração do Natal. Ao se encarnar o Filho de Deus quis viver em uma família humana. Ele teve uma família. Isto para nós parece banal. Quem é que não está ligado a uma família? Não existe nada mais natural e normal do que este fato.
O que nos causa admiração e espanto é que o Filho de Deus teve uma família. Deus levou a sério a encarnação. Assumiu todas as consequências de seu ato: tornou-se homem como nós e não apenas a aparência humana: se fez carne. Ele tornou-se verdadeiro homem sem deixar de ser Deus.
O Filho de Deus não se contenta apenas em entrar na história humana através de uma família, mas também participou de todo o processo de crescimento e amadurecimento dentro da família como qualquer um de nós. Jesus aprendeu na família a arte de ser homem e de responder aos problemas de seu meio. É na família que Jesus se relaciona com o mundo e com os homens, e, a partir dela, foi ampliando seu círculo até dimensões mais vastas.
No evangelho ouvimos que Jesus “crescia, ficava forte e cheio de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele”. Muitos, às vezes, se escandalizam com esta afirmação, pois pensam que Jesus devia saber tudo desde criança. Sob o pretexto de que Cristo é Deus, muitos acham que Jesus devia saber tudo sobre o mundo, sobre seu destino e sobre os acontecimentos futuros. Assim ele não poderia em absoluto ter adquirido nada pela educação.
Esta concepção esquece de confessar a verdadeira humanidade de Jesus. A perfeição do conhecimento para uma pessoa humana não consiste em saber tudo. O conhecimento divino de Jesus não consiste num conhecimento enciclopédico universal, mas no conhecimento sem escuridão de dúvidas da vontade do Pai. Tal conhecimento da vontade do Pai se deu num processo humano de discernimento, descoberta e fidelidade. Jesus não era um computador universal, mas um homem historicamente situado e limitado, que aprendeu, desde a infância, a colocar seu crescente saber humano totalmente a serviço da vontade divina.
Festa da Sagrada Família
O Evangelho da Festa da Sagrada Família, é tirado dos primeiros capítulos de Lucas. Mais uma vez, encontramos um tema muito importante para esse Evangelho – o encontro entre a Antiga e a Nova Aliança. Durante Advento, Lucas fazia paralelo entre Isabel, Zacarias e João Batista, e Maria, José e Jesus. No texto de hoje, os justos da Antiga Aliança são representados pelas figuras de Simeão e Ana, profeta e profetisa. Outros dois temas de Lucas também se destacam nesse relato – o Espírito Santo e a opção pelos pobres.
Lucas destaca que os pais de Jesus foram ao Templo conforme a Lei (cf. Lv 12,8), para oferecer o sacrifício de dois pombinhos pela purificação. Na Lei, esse sacrifício era permitido aos pobres. Mais uma vez, continuando a lição da manjedoura e dos pastores, Lucas sublinha o amor especial de Deus pelos pobres. Deixa bem claro que Maria, José e Jesus eram contados entre eles como, aliás, era toda a população do Nazaré de então.
Simeão e Ana representam, quase nos mesmos termos de Zacarias e Isabel, os justos que esperavam a salvação de Deus – o grupo conhecido no Antigo Testamento como os anawim, ou “pobres de Javé”. É de notar que, no seu canto, Simeão proclama que ele pode “ir em paz”, simbolizando que as esperanças dos justos da Antiga Aliança agora estavam se realizando em Jesus. Tal como, na visitação, a idosa Isabel, símbolo também dos justos, acolhia com alegria a chegada de Maria com Jesus, agora Simeão e Ana recebem com a mesma alegria a novidade da Nova Aliança, concretizada em Jesus. Mais uma vez, Lucas coloca juntos homem e mulher, um tema comum nos seus escritos (cf. Lc 4,25-28; 4,31-39; 7,1-17; 7,36-50; 23,55–24,35; At 16,13-34). Assim, Lucas insiste que mulher e homem se colocam juntos diante de Deus. São iguais em dignidade e graça, recebem os mesmos dons e têm as mesmas responsabilidades.
Como já fez em Lc 2,19 e fará de novo em Lc 2,50, novamente o evangelista frisa que os seus pais ainda não entenderam plenamente o alcance do mistério de Jesus. O v. 33 insiste que “o pai e a mãe do menino estavam admirados do que se dizia dele”. Mais uma vez, apresenta-nos José e, especialmente, Maria como modelos de fé. Apesar de qualquer revelação que tivessem, José e Maria também caminharam na escuridão da fé, descobrindo, passo a passo, o que significava ser discípulo de Jesus.
Jesus “crescia e se fortalecia, cheio de sabedoria, e o favor de Deus estava com ele”. Como acontece com todos nós, esse crescimento foi gradual, e a sua família tinha um papel importantíssimo no seu crescimento. Se, como adulto, ele podia revelar-nos a imagem de Deus como o amoroso Pai – tema tão caro a Lucas – era porque também aprendeu isso através da experiência com José. Se cresceu na espiritualidade dos anawim, era porque aprendeu isso desde o berço, junto com os seus pais. Se foi fiel na busca da vontade de Deus, era porque assim aprendeu no ambiente familiar.
Nossa sociedade desvaloriza a vida familiar, especialmente por seu consumismo desenfreado e seu materialismo. Diante disso o texto de hoje anima-nos e desafia-nos, tal como Maria e José, na claridade ou na escuridão da caminhada, a que criemos um ambiente onde o amor possa florescer e onde a nossa juventude possa aprender a importância do amor nutrido em uma fé viva.
Ninguém ignora que hoje a família tradicional enfrenta enormes dificuldades. Diante dos problemas, respostas fáceis não servem. Nem sempre é óbvio o caminho a seguir. Novas dificuldades e novas perguntas exigem um novo olhar da parte das Igrejas. Nesse sentido, há pouco, presenciamos algo inédito na Igreja Católica em Roma: a realização de um sínodo sobre a família onde todos os participantes foram convidados pelo Papa a expressarem as suas opiniões abertamente e sem medo. Houve divergências, obviamente, pois nem tudo está claro. Há quem prefere ignorar a realidade, fechar os olhos diante de problemas reais que causam, muitas vezes, sofrimento no seio das famílias, e refugiar-se em chavões legalistas em lugar de procurar descobrir o que Jesus faria em tais situações. O Espírito Santo ilumina as Igrejas e as famílias que realmente buscam juntas as maneiras evangélicas de como responder aos novos desafios.
Rezemos pelas famílias, pelas que estão bem firmes e pelas desestruturadas. Rezemos também pelas lideranças de nossas Igrejas, para que tenham força e saúde, a fim de testemunharem, nos nossos tempos, a missão de Jesus compassivo e misericordioso.
Tomas McGrath
“E Jesus crescia em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e diante dos homens” (Lc 2,52),
Toda família é raiz, escola, mestra, origem, destino, referência, refúgio, desafio, criatividade... A família tem a missão de proteger e ativar a semente de grandeza que pulsa no interior de todo ser humano: o amor, os valores, o conhecimento, a liberdade, os sonhos... Quando a semente humana não recebe os nutrientes emocionais, intelectuais e espirituais que necessita, a vida se torna estéril, o sentido se esvazia e a felicidade perde o vigor.
“Cada família é um mundo” e dentro desse pequeno “mundo” a vida se expande em diferentes direções, fazendo emergir os traços originais de cada um, os gestos, os pensamentos, as atitudes, a personalidade, a cultura... Mas, é ali, entre os mais próximos e íntimos, que cada pessoa se faz mais humana; é ali onde cada um é reconhecido em sua identidade. Por isso, ser-estar-pertencer a uma família são dimensões que não podem estar separadas.
Jesus fez a experiência de pertencer a uma família concreta; Ele teve uma família e, apaixonado e profundo como era, viveu intensamente neste ambiente instigante e humanizador. Tal ambiente vai determinar sua futura missão.
Sua permanência em Nazaré foi um longo aprendizado. Jesus foi um aprendiz da vida e foi no espaço familiar que Ele encontrou o terreno propício para ativar os seus recursos internos, sua imaginação fértil, sua criatividade encantadora, suas relações oblativas. Foi no pequeno mundo em Nazaré que Jesus aprendeu a ter um coração universal.
Quando falamos da infância de Jesus, muitas vezes nos limitamos a afirmar que temos pouquíssimo relatos sobre ela nos evangelhos. Mas, sob outra perspectiva, podemos afirmar que temos muitíssimos elementos, revelados pelo próprio Jesus; de fato, quem modelou a natureza humana de Jesus, foi a família de Nazaré.
Lendo o Evangelho como um todo podemos encontrar, com facilidade, uma descrição muito aproximada de quem era Jesus no seu espaço familiar. Quem, senão José, poderia ensinar a Jesus tudo o que conhecia sobre o trabalho, o campo, as colheitas, o tempo, as aves e o mundo que os rodeava? Quem, senão Maria, poderia ensinar Jesus a tratar as pessoas, a servir o seu próximo, a olhar, a falar, a sorrir...? Ela, certamente, lhe ensinou muitas coisas da vida doméstica, conforme percebemos os exemplos que o Mestre usou em seus ensinamentos: a imagem do candil, do fermento na massa, do remendo novo em roupa velha...
Em cada gesto de Jesus, revelou-se um ensinamento do Pai e de seus pais; em cada parábola havia uma expressão da natureza e da terra com o selo de José, e uma mensagem espiritual inspirada a partir do alto. Em cada cura que Jesus realizou havia um modo e uma sensibilidade de tratar o enfermo, o desvalido, herdados da sensibilidade feminina de Maria; e, à hora de orar havia um hábito alimentado na casa de seus pais, fiéis cumpridores da lei mosaica e abertos à novidade e ao mistério que seu filho Jesus deixou transparecer. Enfim, Jesus recebeu de sua família um modo de ser e de viver, de acordo com a sociedade de seu tempo.
“E Jesus crescia em sabedoria...” Sabedoria é conhecimento global, por meio do coração e de todos os sentidos, que permite “saborear” tudo em profundidade; é experiência constante, não ocasional, que abrange a vida inteira, de uma nova identidade, escondida no interior, mais rica e mais verdadeira, mais estável e positiva; é contemplação e memória das coisas que permanecem, gosto pela beleza e olhar poético, conversão e formação contínuas, harmonia de significados e de vivências existenciais, humorismo e otimismo, sentido do mistério e do eterno, sabor do divino e simpatia pelo humano...
Sabedoria, sobretudo, é unidade de vida e síntese; significa ter chegado ao coração da vida, onde está o tesouro de cada ser humano e onde se concentra o que é mais nobre e original de cada um.
Em Nazaré, Jesus não fez coisas extraordinárias; era um lugar onde todos se conheciam e foi ali, nos costumes e na vida diária deste lugar, onde Ele descobriu a presença do Pai: ali o menino crescia em idade, em sabedoria e em experiência de Deus. Nazaré é o tempo do crescimento e da maturação humana.
Jesus pregou o que viveu no espaço familiar. Se pregou o amor, a entrega, o serviço, a solicitude pelo outro, quer dizer que primeiramente Ele viveu isso. O espaço familiar foi o seu primeiro campo de aprendizagem como todo ser humano. Com a presença inspiradora e ajuda de seus pais, Jesus foi alargando seus horizontes e discernindo seu caminho e sua missão. Seu lar em Nazaré foi rampa de lançamento para sua vida pública.
Como aprendiz da vida, foi ali, na casa e na oficina de Nazaré que Jesus se exercitou na Redenção. Não lhe foi difícil passar de “artesão de coisas” a “artesão da humanidade”, passar da “oficina de Nazaré” à “oficina do Evangelho”.
Custa-nos muito descobrir a “espiritualidade da vida cotidiana”, a vida de cada dia nos parece sem sentido, sem muito destaque e sem muitos fatos extraordinários; temos ainda muito que aprender da vida cotidiana do artesão de Nazaré.
Na família de Nazaré nos inspiramos para viver também uma presença inspiradora em nossa existência cotidiana. Nazaré se revela também como espaço e tempo do “coração”. Por isso, Maria “conservava no coração todas estas coisas”. “Maria guardava tudo isto e meditava-o em seu coração” (Lc. 2,19).
Trata-se de um contemplar e meditar vivencial, realizado no centro afetivo-emocional de sua personalidade, simbolizado no termo “coração”. Na língua portuguesa a palavra “coração” designa a sede da afetividade, dos sentimentos... Ao passo que na cultura oriental e bíblica, o “coração” é o lugar da interioridade, ou seja, designa uma faculdade espiritual pela qual o ser humano pode entrar em contato com Deus.
O “coração” representa o núcleo mais íntimo e mais secreto do nosso ser; ali é o lugar das “manifestações vitais”; trata-se de um “lugar” e um princípio de direção que não cessa de nos impulsionar, a partir do nosso interior, para nossa realização pessoal e transpessoal. Podemos considerá-lo também a raiz e o ápice da nossa existência onde se elaboram as concepções mais finas do nosso espírito.
Meditar um assunto em nosso coração significa “auscultar” as “moções interiores”, significa ouvir o que o coração nos tem a dizer. Quando auscultamos nosso coração nos deparamos com algo decisivo que fará toda diferença para nossa existência. Pois, por “coração” entendemos o núcleo central da nossa personalidade humana, o ponto exato onde se encontram e se reúnem a inteligência e todas as potencialidades dinâmicas e vitais, as energias inconscientes e simbólicas do nosso ser profundo.
Contemplar seu espaço familiar: é ambiente instigante, provocativo, inspirador... Onde todos se sentem livres para expressar sua identidade e originalidade? Ali educa-se para viver uma consciência moral responsável, sadia, coerente com a fé cristã? Ou favorece um estilo de vida superficial, consumista, sem metas nem ideais, sem critérios e valores evangélicos?
- Em que dimensões você sente que sua família pode e deve crescer mais, tendo como referência a Família de Nazaré?
Os homens acabam por se habituar a quase tudo. Frequentemente, o hábito e a rotina vão esvaziando de vida a nossa existência. Dizia Ch. Péguy que «há algo pior do que ter uma alma perversa, é ter uma alma habituada a quase tudo». É por isso que não podemos nos surpreender que a celebração do Natal, envolta em superficialidade e consumismo louco, dificilmente diga algo novo ou alegre para tantos homens e mulheres de «alma acostumada».
Estamos acostumados a ouvir que «Deus nasceu num portal de Belém». Já não nos surpreende nem comove um Deus que se oferece como uma criança. A. Saint-Exupéry diz no prólogo de seu delicioso Principezinho: «Todas as pessoas crescidas foram crianças antes. Mas poucos se lembram». Esquecemos o que é ser criança. E esquecemos que o primeiro olhar de Deus ao se aproximar do mundo foi o olhar de uma criança.
Mas essa é precisamente a grande novidade do Natal. Deus é e continua sendo Mistério. Mas agora sabemos que não é um ser tenebroso, inquietante e temível, mas alguém que nos é próximo, indefeso, afetuoso, a partir da ternura e da transparência de uma criança.
E esta é a mensagem do Natal. Há que sair ao encontro desse Deus, devemos mudar o coração, tornar-nos crianças, nascer de novo, recuperar a transparência do coração, abrir-nos com confiança à graça e ao perdão.
Apesar da nossa terrível superficialidade, do nosso ceticismo e desencanto, e acima de tudo, o nosso inconfessável egoísmo e mesquinhez de «adulto», sempre há nos nossos corações um recanto íntimo onde ainda não deixamos de ser crianças.
Atrevamo-nos por uma vez a olhar-nos com simplicidade e sem reservas. Façamos um pouco de silêncio ao nosso redor. Apaguemos a televisão. Esqueçamos a nossa pressa, os nervosismos, as compras e os compromissos.
Escutemos dentro de nós esse «coração de criança» que ainda não se fechou à possibilidade de uma vida mais sincera, bondosa e confiante em Deus. É possível que começássemos a ver a nossa vida de outra forma. «Não se vê bem senão com o coração. O essencial é invisível aos olhos» (A. Saint-Exupéry).
E, acima de tudo, é possível que escutemos uma chamada para renascer para uma nova fé. Uma fé que não seja estagnada, mas rejuvenesça; que não nos encerre em nós mesmos, mas nos abra; que não separe mas una; que não tem medo, mas que confia; que não entristeça, mas que ilumine; que não tema mas que ame.
No domingo seguinte ao Natal, a Igreja nos convida a celebrar a Festa da Sagrada Família. Por quê?
Esta festa é a prolongação da festa do Natal, celebrada na semana passada. Quando o Filho de Deus se fez homem, nasceu como filho de Maria, se fez irmão de toda a humanidade.
Ao contemplar hoje a Sagrada Família, podemos "incluir" nela todos os homens, todas as mulheres de todos os tempos, raças e línguas. Como disse Enzo Bianchi: "Jesus nascera de uma família comum: um pai artesão e uma mãe dona de casa como todas as mulheres da época. A sua família tinha irmãos e irmãs, isto é, parentes, primos, uma família numerosa e ligada por fortes laços de sangue, como ocorria no Oriente".
É a festa da família humana que pela encarnação, vida, morte e ressurreição de Jesus é adotada como família de Deus.
Ao olhar hoje o menino Jesus, rodeado por Maria e José, somos convidados a sentir-nos filhos e filhas do Pai e da Mãe celestes e irmãos e irmãs uns dos outros.
A família de Nazaré nos desafia a viver o mandamento do amor, que leva a exercitar valores essenciais que foram esquecidos ou abafados na lógica do mercado que vigora em nosso tempo, como os valores da hospitalidade, da acolhida, da solidariedade, da cortesia e do respeito à alteridade.
Olhando agora para a nossa família, a nossa comunidade, perguntamo-nos em que precisamos crescer para nos assemelharmos à família de Nazaré.
O evangelho de hoje nos revela, em primeiro lugar, a simplicidade e a historicidade da família de Nazaré, que vivia sua religiosidade como toda a família judia daquele tempo.
Como disse Enzo Bianchi, "Sim, Jesus era um homem como os outros, apresentava-se sem traços extraordinários, parecia frágil como todo ser humano. Tão cotidiano, tão modesto, sem qualquer coisa que, na sua forma humana, proclamasse a sua glória e a sua singularidade, sem um “cerimonial” composto de pessoas que o acompanhassem e o tornassem solene e munido de poder ao aparecer no meio dos outros. Não, demasiadamente humano! Mas se não há nada de “extraordinário” nele, por que acolher a sua mensagem? (Texto completo: Jesus, demasiadamente humano)
No evangelho lemos que: "Os pais de Jesus iam todos os anos a Jerusalém, para a festa da Páscoa".
Essa Páscoa é especial porque Jesus tem doze anos. Então seguindo a lei de Moisés é a idade para realizar a cerimônia bar mitzvah. Por meio desse rito, o menino entra no mundo adulto. Alcançou sua maturidade religiosa e civil.
O evangelista situa Jesus no início da sua maturidade no templo, falando com os doutores da lei, e "todos que ouviam o menino estavam maravilhados com a inteligência de suas respostas".
No final da vida de Jesus encontramos uma cena semelhante: "Ao amanhecer, os anciãos do povo, os chefes dos sacerdotes e os doutores da Lei se reuniram em conselho e levaram Jesus para o Sinédrio" (Lc 22,66).
Mas a admiração inicial já não existe na maioria dos ouvintes, ao contrário, as palavras que pronuncia Jesus, em consonância com sua vida, são as que o condenam à morte.
Enquanto isso, Maria e José buscam angustiados seu Filho, até que, depois de três dias de incessante busca, o acham no templo.
A resposta serena que dá Jesus à pergunta de sua mãe: "Por que me procuravam? Não sabiam que eu devo estar na casa do meu Pai?", nos transporta ao dia da sua Ressurreição, "por que vocês estão procurando entre os mortos aquele que está vivo?"(Lc 24, 5b).
Pelo qual as primeiras palavras que Lucas coloca na boca de Jesus já revelam o sentido e o fim de sua vida e missão, estar no Pai, viver para Ele e suas coisas.
A maturidade dos 12 anos deste menino judeu continuará crescendo ao longo de sua vida, atingindo seu auge em outra Páscoa, a de sua morte e ressurreição!
Dessa maneira, Jesus revela a toda a família humana o caminho para viver e crescer na casa do Pai e Mãe comum, até chegar aos seus firmes e ternos braços.
Na entrevista Jesus: um apaixonado por Deus e pelas pessoas, concedida à revista IHU On-Line nº 336, o teólogo biblista Francisco Orofino disse que "temos que entender que a formação de Jesus começa em casa, e sob forte influência materna. Jesus viveu muito tempo neste ambiente familiar e comunitário".
Vivendo deste jeito estaremos contribuindo com a recriação permanente da família humana e divina!
Oração pela família
“Ó Deus Trindade, comunhão perfeita no amor. Nossas famílias vos louvam e agradecem,
por serem chamadas a realizar as maravilhas do vosso amor, no aconchego de seus lares.
Que nelas aconteça a desejada paz e a constante reconciliação, mesmo em meio a tantos limites humanos.
Vos pedimos, Trindade Santíssima, que a família seja reconhecida como patrimônio da humanidade,
um dos tesouros mais preciosos dos nossos povos, lugar e escola de comunhão,
fonte de valores humanos e cívicos, lar onde a vida humana nasce e se acolhe, generosa e responsavelmente.
Torne-se escola de fé, fazendo dos pais os primeiros catequistas de seus filhos,
começando em casa o processo da iniciação à vida cristã.
Possa a família ser considerada santuário da vida e Igreja doméstica.
Livrai a família do egoísmo, que fere de morte o amor e o compromisso com a vida,
destruindo o lar e causando consequências indeléveis para os filhos.
Ó Deus Trindade, por intercessão da Família de Nazaré, santuário da vida divina,
abençoai cada lar para que possa tornar-se, à vossa imagem, novo sacrário de amor. Amém”.
Na Igreja Católica, hoje é celebrada a festa da Sagrada Família. Portanto, o trecho de Lucas põe em relevo os três membros da família de Nazaré, embora o seu tema principal seja um ensinamento sobre quem é Jesus, a sua relação com o Pai e com a sua família humana.
A história começa enfatizando a identidade da família humana de Jesus como judeus piedosos. Os regulamentos sobre as peregrinações ao Templo de Jerusalém, para a festa de Páscoa, se encontram em Êxodo 23,17; 34,23 e em Levítico 23,4-14. Como consequência, entendemos que o ambiente em que Jesus cresceu, e em que descobriu a sua vocação e missão, é aquele dos “pobres de Javé”, os devotos que esperavam a libertação de Israel, através da vinda do Messias davídico prometido. Esta viagem prefigura a grande viagem de Jesus a Jerusalém em Lucas 9,51 a 19,27, que ele fará com os seus discípulos, e onde ele revelará, por palavras e ações, o seu relacionamento com o Pai, prefigurado no versículo 49 de nosso texto.
A narrativa salienta certas atitudes de Jesus. É bom prestar bem atenção aos verbos. Lucas diz que Jesus estava no templo entre os doutores, “escutando e fazendo perguntas” (v. 46). A atitude de Jesus é a de um discípulo muito inteligente e não de um mestre. Ele não está “ensinando no Templo”, como muitas vezes dizemos em nossas tradições. Aqui, Lucas antecipa para os doze anos de Jesus o que realmente ocorrerá mais tarde, quando Jesus realmente ensina no Templo e sofre a rejeição e a perseguição por parte de doutores da Lei e Sumos Sacerdotes (Lucas 19,47-48; 21,37-38; 22,53).
Encontramos o ponto central do texto no versículo 49: “Porque me procuravam? Não sabiam que eu devo estar na casa do meu Pai?”.
Aqui, Lucas relata as primeiras palavras de Jesus no seu Evangelho. Agora, não é Gabriel, nem Zacarias, nem Maria quem diz quem é Jesus, mas ele mesmo. A palavra que nós traduzimos como “devo”, em grego dei, transmite o tema de “necessidade”, que aparece no Evangelho 18 vezes e nos Atos dos Apóstolos 22 vezes. Essa palavra “expressa um senso de compulsão divina, frequentemente visto como obediência a uma ordem da escritura ou profecia, ou na conformidade de eventos com a vontade de Deus. Aqui, a necessidade consiste no relacionamento inerente de Jesus em relação a Deus, que exige obediência.” (Marshall, “The Gospel of Luke”).
No versículo 50, fica claro que os seus pais não entenderam que o seu relacionamento com o Pai celeste tomava precedência sobre a sua relação com eles: “Eles não compreenderam o que o menino acabava de lhes dizer”.
A “espada” sinaliza a dor de sentir este distanciamento sem poder compreendê-lo e que já começa a aparecer. Também o velho Simeão a ela se refere em Lucas 2,35. Maria não compreende plenamente, retomando o tema de v. 19, e continua a sua caminhada de fé, meditando sobre o sentido da missão e da identidade de seu filho. Essa experiência de Maria é encorajadora para nós. Quantas vezes acontecem coisas nas nossas vidas que não compreendemos e nelas não conseguimos ver a vontade de Deus? A exemplo de Maria e José, com atitude orante e contemplativa, aceitemos esta escuridão, continuemos a caminhada. Nunca, porém, deixemos de “conservar no nosso coração todas essas coisas”.
Lc 2,41-52
O autor, no v. 41, apresenta uma informação geográfica importante, por se tratar do Evangelho segundo Lucas: o deslocamento da família de Jesus de Nazaré (ou da Galileia) para Jerusalém. Esse movimento perpassará todo esse evangelho e será a direção tomada por Jesus durante seu ministério público, até sua morte em Jerusalém.
A peregrinação anual a Jerusalém fazia parte dos costumes judaicos. A Lei prescrevia que cada judeu deveria peregrinar três vezes ao ano a Jerusalém para celebrar as grandes festas: da Páscoa, das Cabanas e das Semanas (Pentecostes). No entanto, aqueles que morassem longe (a distância de um dia) eram dispensados dessa lei. A família de Jesus peregrina a Jerusalém para ter a oportunidade de estar no Templo e cumprir algumas prescrições religiosas, pelo menos uma vez por ano, ainda que morasse distante, como nos informa o relato.
No judaísmo, o jovem, a partir dos 13 anos, adquiria a maturidade religiosa e tinha o direito de ler a Torá na sinagoga. Não temos, porém, dados para saber se realmente isso era realizado no tempo de Jesus, apesar de esse ritual nos ajudar a compreender a permanência de Jesus no Templo entre os mestres da Lei e a ver nele não somente alguém pleno de sabedoria, mas também aquele que revela a sabedoria do Pai. Jesus também é identificado como Mestre, como aquele que fala com autoridade (cf. Lc 4,32).
O evangelista não nos oferece nenhum detalhe sobre o que realmente ocorreu ou como foi possível não notar a ausência do filho na caravana de volta para Nazaré (vv. 43-45), dado que, provavelmente, a intenção do autor era realçar a preocupação dos pais ao perceberem a perda do filho.
Nos vv. 46-50, o narrador expõe a cena do encontro de Maria e José com Jesus e enfatiza a resposta deste diante da angústia dos pais. A indicação de tempo, após “três dias” (v. 46), é muitas vezes interpretada como uma alusão à morte e à ressurreição de Jesus, apesar de isso não ser uma característica de Lc. No entanto, tal aspecto pode ser considerado quando se sublinham as afinidades existentes entre esse relato e as narrativas da paixão, morte e ressurreição de Jesus.
No diálogo, nos vv. 48b-50, Jesus apresenta sua identidade e missão, ao se revelar como Filho de Deus (cf. Lc 4,43) e ao exprimir sua total disponibilidade à vontade do Pai. A cena do encontro de Maria com o filho é descrita de maneira simples, com um tom semelhante ao daquelas situações em que pais aflitos encontram os filhos supostamente perdidos, nas quais há uma mistura de preocupação, angústia, cuidado, “raiva”, como forma de desabafar o desespero que os sufocavam. Percebe-se, porém, que se trata de família que vive as exigências de sua vocação específica e, dialogando, tenta discernir a vontade de Deus diante dos acontecimentos cotidianos.
Apesar da incompreensão da atitude de Jesus, Maria não fica indiferente a esse mistério e o guarda no coração. Note-se que o Evangelho de Lucas permanece fiel à sua finalidade de revelar a verdadeira identidade de Jesus somente depois da ressurreição.
Os vv. 51-52 apresentam Jesus novamente submisso aos seus pais, vivendo conforme a Lei de Deus e cumprindo os mandamentos, sobretudo o de “honrar pai e mãe” (cf. Dt 5,16 e o texto da I leitura). Apesar do contraste com a cena precedente e da consciência de Jesus de sua filiação divina, estes versículos nos mostram que realmente o Filho de Deus assume a condição humana e o processo normal de crescimento. De fato, Lucas descreve Jesus adolescente, que progride em sua maturidade humana, física e espiritual. Também confirma o que é dito na I leitura, ou seja: aquele que é obediente aos pais e os trata com respeito receberá as bênçãos de Deus. O termo “graça” pode ser também traduzido por “amor”, “caridade”, ou bondade, que, conforme a II leitura, é o vínculo da perfeição.
Pistas para reflexão
A Sagrada Família, que se desloca para Jerusalém, convida-nos a percorrer caminhos novos, a escutar a Palavra de Deus e sua vontade. A escuta da Palavra nos faz romper com nossa mentalidade fechada, nossos esquemas preestabelecidos, nossas convicções absolutas, nosso modo fechado de viver, e nos insere na aventura de buscar novos horizontes e acolher essas realidades em nosso coração, como fez Maria.
Os textos bíblicos escolhidos para esta festa da Sagrada Família também nos apontam grandes desafios, a saber: a humanização de nossas relações familiares, a sensibilidade para com os pais (I leitura), o discernimento nas situações difíceis (evangelho), o acolhimento das diferentes etapas dos membros de nossas famílias, o amor mútuo nas relações conjugais (II leitura). Inspirando-se na Família de Nazaré, nossas famílias são chamadas a gerar vida, alimentar e sustentar os laços humanos e promover a solidariedade, tornando o ambiente familiar num lugar onde prevaleça a paz, o amor, a fraternidade, o respeito.
(Traduzido automaticamente pelo Tradutor Google sem a nossa correção)
Primeira Leitura (1Sm 1,20-22,24-28):
Para entender esta história devemos lembrar que Ana, esposa de Elcana, era estéril e havia peregrinado com o marido ao santuário de Siló e lá pediu desesperadamente um filho, jurando consagrá-lo a Deus se ele o concedesse. para ela. Testemunha deste voto foi o padre Elí. A parte da história que lemos hoje conta-nos que Deus ouviu a oração de Ana, que concebe e dá à luz Samuel, cujo nome expressa precisamente que ele foi um dom de Deus. Então Ana cumpre religiosamente seu voto e deixa o menino Samuel no Santuário como consagrado a Deus. Existe um certo paralelismo entre 1 Sam 1:22 e Lucas 2:22-24. Vale destacar o destaque da mulher, de Ana, nesta história. Ela dá um nome à criança; decide quando deve ser apresentado a Yahweh; e é Ela quem o oferece ao Senhor diante do sacerdote Eli, em Siló.
No contexto da história de Israel, é importante notar que naquela época houve um período de clara decadência religiosa e crise institucional, uma vez que o período dos juízes está a chegar ao fim. Como bem salienta JL Sicre[1], a primeira unidade de 1Sam, que abrange os três primeiros capítulos, destaca a erosão do antigo regime de juízes e prepara o advento de uma nova ordem. Como representantes da velha ordem temos Eli e seus filhos; enquanto a novidade e a esperança andam de mãos dadas com um nascimento onde a intervenção de Deus e a tenacidade da mulher são decisivas . Com efeito, perante esta situação de declínio, Deus põe em marcha o seu plano de renovação do seu povo através da angústia e da fé de uma mulher estéril: Ana Ela e o seu filho Samuel são os instrumentos escolhidos por Deus para reverter esta fase sombria. a história de Israel.
Evangelho (Lucas 2:41-52):
A família de Nazaré cumpriu a Lei de Deus que determinava uma peregrinação a Jerusalém pelo menos para a principal festa da Páscoa. Foi um evento e tanto para o povo do interior, eles foram em caravana rezando e cantando. Há precisamente uma série de salmos que se chamam “ascensão” porque eram cantados especialmente quando “subiam” em peregrinação a Jerusalém (por exemplo, os Salmos 15 e 122).
Nota-se que Jesus completou 12 anos. Possivelmente era a idade da maturidade e ele poderia então participar da peregrinação e da festa da Páscoa em Jerusalém de forma mais ativa. Portanto, Lucas situa este episódio no Templo de Jerusalém durante uma das peregrinações que a sagrada família, como toda família judia piedosa, fazia todos os anos à cidade santa para a Páscoa.
A festa em Jerusalém transcorreu sem problemas, mas quando o grupo começa a retornar, incluindo Maria e José, Jesus fica na cidade santa sem avisar seus pais. Depois de três dias de busca agonizante, encontram-no: “encontraram-no no Templo, entre os doutores da Lei, ouvindo-os e fazendo-lhes perguntas” (2,46).
A grande questão é por que Jesus fez isso , ou seja, ficou sem contar aos pais. A própria Virgem Maria o expressa em sua pergunta, com um tom de compreensível desgosto: “Quando o viram, ficaram surpresos e sua mãe lhe disse: “Filho, por que você fez isso conosco? Olha, eu e seu pai, angustiados, estávamos te procurando” (2.48).
A resposta de Jesus a esta pergunta de sua Mãe é um tanto enigmática, pois sugere que seus pais não deveriam tê-lo procurado sabendo que ele deveria cuidar das coisas de seu Pai (Deus). Com efeito, a resposta de Jesus é desconcertante para Maria e José, mas através dela o evangelista deixa claro que o único Pai de Jesus é Deus , tal como o anjo tinha anunciado a Maria. A palavra “ devo ” expressa em Lucas a necessidade que impele Jesus a cumprir a vontade histórico-salvífica de Deus (cf. 4,43; 13,33; 19,5; 22,37; 24,44). Por isso, em 2,49 ele manifesta a vocação e missão fundamental de Jesus de ser Filho, cumprindo o plano de seu Pai, cuidando de seus assuntos. Algumas Bíblias traduzem: “Estar na casa de meu Pai”, em referência ao templo; mas o texto grego não usa o termo “casa”. A expressão “ estar envolvido nas coisas ou cuidar dos assuntos do meu Pai ” é melhor porque reflete uma atitude existencial de Jesus que brota da sua profunda identidade como Filho enviado pelo Pai; Não se reduz à sua permanência no templo, mas é um modo de ser que o acompanha em todos os lugares, é o seu modo de viver. A este respeito, J. Ratzinger[2] comenta: «Ele deve estar com o Pai, e por isso é claro que o que pode parecer uma desobediência, ou uma liberdade irrefletida em relação aos pais, é na realidade precisamente uma expressão da sua obediência filial. Ele “não está no templo por rebelião contra seus pais, mas precisamente como alguém que obedece, com a mesma obediência que o levará à cruz e à ressurreição”. Portanto, nas primeiras palavras de Jesus que nos são relatadas no evangelho de Lucas, ele se dirige a Deus chamando-o de “ meu Pai ” e revelando que esta relação Pai-Filho tem um caráter transcendente e único que ultrapassa a simples compreensão humana, inclusive de Maria. , sua mãe.
Por outro lado, pensamos que a intenção da resposta de Jesus foi, de certa forma, “educar” os seus pais na aceitação da primazia absoluta de Deus, do Pai. Segundo a interpretação de muitos Padres da Igreja, Jesus quis conduzi-los desta forma ao verdadeiro Pai. A verdade é que Maria e José, como todos os pais, tiveram que “aprender a entregar” o seu Filho a Deus, para reconhecer a Sua soberania sobre cada ser humano.
A este respeito, diz o Card. Martini[3]: «Talvez agora compreendamos porque é que Jesus não disse nada aos seus pais, porque propositadamente causou um “choque” que permitiria a José e Maria darem o salto qualitativo, para compreenderem melhor quem era o seu filho. assim para anunciar a primazia do Reino , a primazia absoluta da Vontade do Pai, ele quis dizê-lo de forma paradoxal, porque o Reino é um bem tão grande, tão novo, tão inédito, tão impensável, que ele coloca em prática; prática Questiono até o mais óbvio. A vontade de Deus nunca se apresenta como uma continuidade tranquila com o que se vive, mas tem sempre uma função “tremente”: não se entra no Reino sem uma conversão, sem uma mudança, sem uma mudança; E no Reino todo o amor humano é purificado, recomposto e recuperado, incluindo o amor aos pais e à família.
Passado esse “incidente”, tudo volta ao “normal” porque Jesus volta para casa com Maria e José e permanece submisso a eles. E ali, na vida escondida e familiar de Nazaré, «ele cresceu em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens» (2,52).
Não foi, portanto, um ato de rebelião e desprezo pela sua família. Foi um momento de “revelação” da identidade profunda de Jesus que ultrapassa a percepção natural e exige a sua aceitação pela fé, também para Maria e José.
Algumas reflexões:
Esta Festa da Sagrada Família é celebrada no domingo seguinte ao Natal como prolongamento deste mistério de amor e de ternura divinos através do qual Deus entrou na nossa história. – Jesus é Emmanuel “Deus conosco” – para santificar a vida dos homens. Mas não só o homem considerado individualmente, mas o homem com os seus laços mais profundos e vitais. E é aí que entra a realidade da família, com razão. Jesus nasceu, cresceu e viveu com a sua família; e é por isso que chamamos isso “Sagrada Família”. E a partir dela podemos e devemos iluminar a vida de todas as famílias, destacando especialmente o lugar primordial da família no plano de Deus que inclui todos nós.
A este respeito, o Papa Francisco disse: “Família é a história da qual viemos. Cada um de nós tem a sua história, ninguém nasceu num passe de mágica, com uma varinha mágica, cada um de nós tem uma história e a família é a história da qual viemos. O Evangelho da liturgia de hoje recorda-nos que Jesus é também filho de uma história familiar. Nós o vemos viajar para Jerusalém com Maria e José para a Páscoa; então ele preocupa a mãe e o pai, que não conseguem encontrá-lo; uma vez encontrado, ele volta para casa com eles (cf. Lucas 2:41-52). É lindo ver Jesus inserido na rede de afetos familiares, nascendo e crescendo no abraço e na preocupação dos seus entes queridos. Isto também é importante para nós: viemos de uma história entrelaçada de laços de amor e a pessoa que somos hoje nasce, não tanto dos bens materiais que desfrutamos, mas do amor que recebemos, do amor dentro do família. Podemos não ter nascido numa família excepcional e sem problemas, mas é a nossa história - cada um deve pensar: é a minha história -, são as nossas raízes: se as cortarmos, a vida seca! Deus não nos criou para sermos cavaleiros solitários, mas para caminharmos juntos. Agradeçamos-lhe e rezemos pelas nossas famílias. Deus pensa em nós e quer que estejamos juntos: gratos, unidos, capazes de proteger as nossas raízes. E temos que pensar sobre isso, sobre a própria história” (Angelus de 26 de dezembro de 2021).
Agora, neste ano jubilar, 2025 importa descubra famílias como “casas de esperança” para a humanidade. E é por isso que devemos ouvir o forte apelo do Papa Francisco a toda a humanidade para este ano jubilar: “Olhar para o futuro com esperança equivale também a ter uma visão de vida cheia de entusiasmo para partilhar com os outros. No entanto, devemos constatar com tristeza que em muitas situações esta perspectiva falta. A primeira consequência disso é a perda do desejo de transmitir a vida. Devido aos ritmos frenéticos de vida, aos receios quanto ao futuro, à falta de garantias de emprego e de proteções sociais adequadas, aos modelos sociais cuja agenda é ditada pela procura de lucros e não pelo cuidado das relações, verifica-se uma diminuição preocupante das taxas de natalidade em vários países. Pelo contrário, noutros contextos, “culpar o aumento da população e não o consumismo extremo e seletivo de alguns é uma forma de não enfrentar os problemas”.
A abertura à vida com maternidade e paternidade responsáveis é o projeto que o Criador inscreveu nos corações e nos corpos dos homens e das mulheres, uma missão que o Senhor confia aos maridos e ao seu amor. É urgente que, além do compromisso legislativo dos Estados, haja um apoio convicto por parte das comunidades crentes e da comunidade civil, tanto no seu conjunto como em cada um dos seus membros, porque o desejo dos jovens de gerar novos filhos e filhas, como fruto da fecundidade do seu amor, dá uma perspectiva de futuro a cada sociedade e é motivo de esperança: porque depende da esperança e produz esperança” (A esperança não decepciona, 9).
Não se trata de idealizar a família, mas de nunca perder o ideal de uma vida familiar pacífica e fecunda como Deus quer; e isso nos move a dar passos nessa direção diariamente. O Papa Francisco disse a este respeito: “Aprendemos a ser uma família todos os dias. No Evangelho vemos que mesmo na Sagrada Família nem tudo vai bem: há problemas inesperados, angústias, sofrimentos. A Sagrada Família das cartinhas não existe. Maria e José perdem Jesus e procuram-no angustiados, mas depois de três dias o encontram. E quando, sentado entre os professores do Templo, ele responde que deve cuidar dos assuntos de seu Pai, eles não o compreendem. Eles precisam de tempo para aprender a conhecer seu filho. O mesmo acontece conosco: todos os dias, em família, devemos aprender a ouvir e a compreender-nos, a caminhar juntos, a enfrentar os conflitos e as dificuldades. É o desafio diário, e se vence com a atitude certa, com pequenas atenções, com gestos simples, cuidando dos detalhes das nossas relações. E isso também nos ajuda muito a conversar em família, a conversar à mesa, o diálogo entre pais e filhos, o diálogo entre irmãos, ajuda-nos a viver esta raiz familiar que vem dos avós, o diálogo com os avós.” (Angelus de 26 de dezembro de 2021).
Observemos também que o evangelho de hoje nos apresenta a Sagrada Família como cumpridora da lei do Senhor, porque não se sentiam isentos de cumprir a vontade de Deus manifestada na sua Lei e que obrigava todos os israelitas à peregrinação anual a Jerusalém para a Páscoa. Temos aqui mais um ponto de contacto com o ano jubilar, desde o peregrinación É um dos sinais mais importantes disso e, de certa forma, a peregrinação da Sagrada Família a Jerusalém pode servir-nos de modelo. O Papa Francisco disse isso na Bula que convoca o Ano Jubilar.: “Não é por acaso que a peregrinação exprime um elemento fundamental de cada acontecimento jubilar. Partir é um gesto típico de quem busca o sentido da vida. A peregrinação a pé favorece muito a redescoberta do valor do silêncio, do esforço, do essencial. Também no próximo ano, os peregrinos da esperança percorrerão caminhos antigos e modernos para viver intensamente a experiência jubilar.” (5).
Por fim, recordemos que o jubileu é, antes de tudo, um “ano da graça do Senhor”. e recebe o “graça do senhor” quem reconhece que precisa, procura e pede. Referindo-nos especificamente à família podemos afirmar, especialmente hoje, que a Graça é necessária para salvá-la; que deve aceitar Jesus pela fé para continuar sendo uma verdadeira família, uma comunidade de vida e de amor, com pai (homem), mãe (mulher) e filhos. É muito importante substituir a pedra angular, o alicerce, a rocha sólida: Jesus. É Ele quem perdemos e é Ele quem devemos sair e procurar., como Maria e José.
Em suma, a família deve procurar Jesus para encontrar Nele o seu Salvador e a sua salvação; fonte de toda esperança que não decepciona.
PARA ORAÇÃO (RESSONÂNCIAS DO EVANGELHO EM ORAÇÃO):
Pais e Filho
Em uma cidade esquecida no mundo
Pais como os meus e os seus
Eles planejaram uma viagem para adorar
Bagagem de peregrinos, entusiasmo
Aventuras, desafios… alegria do filho
Como um passeio de verão!
Foi a visita ao santuário.
Lá os viajantes se inclinaram
Eles adoravam o verdadeiro Deus
Mas apenas um deles trazia o Selo
Secretamente sua dignidade
Longo caminho para meditar
Uma missão desconhecida, mas amada
Desde a mais tenra idade.
Eles queriam que eu obedecesse, me adaptasse
Siga as regras humanas
Mas ele é o Senhor, ele fez o céu e a terra.
Para Maria e José foi perceber
Lição que eles nos ensinam hoje
O Messias, o Salvador, nasceu para nós
Reconheçamos a sua realeza. Amém.
[1] El primer libro de Samuel (Herder-Ciudad Nueva; Barcelona 1997) 43-45.
[2] La infancia de Jesús (Planeta; Buenos Aires 2012) 129.
[3] Estar en las cosas del Padre (Sal Terrae; Santander 1992) 72-73.
[4] J. Ratzinger – H. U. v. Balthasar, María, primera iglesia (Narcea; Madrid 1980) 65-69.
[5] J. Ratzinger, La infancia de Jesús (Planeta; Buenos Aires 2012) 129.