2ª leitura: Efésios 3,2-3ª.5-6
Evangelho de Mateus 2,1-12 (Visita dos Magos).
Tendo nascido Jesus na cidade de Belém, na Judéia, no tempo do rei Herodes, eis que alguns magos do Oriente chegaram a Jerusalém, 2perguntando: 'Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo.' 3Ao saber disso, o rei Herodes ficou perturbado assim como toda a cidade de Jerusalém. 4Reunindo todos os sumos sacerdotes e os mestres da Lei, perguntava-lhes onde o Messias deveria nascer. 5Eles responderam: 'Em Belém, na Judéia, pois assim foi escrito pelo profeta: 6E tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor entre as principais cidades de Judá, porque de ti sairá um chefe que vai ser o pastor de Israel, o meu povo.' 7Então Herodes chamou em segredo os magos e procurou saber deles cuidadosamente quando a estrela tinha aparecido. 8Depois os enviou a Belém, dizendo: 'Ide e procurai obter informações exatas sobre o menino. E, quando o encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-lo.' 9Depois que ouviram o rei, eles partiram. E a estrela, que tinham visto no Oriente, ia adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava o menino. 10Ao verem de novo a estrela, os magos sentiram uma alegria muito grande. 11Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele, e o adoraram. Depois abriram seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra. 12Avisados em sonho para não voltarem a Herodes, retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho. Palavra da Salvação.
Mt 2,1-12
A narrativa de Mateus é uma história encantadora. Os magos vêm de longe em busca de Cristo, atraídos pela estrela. Eles são trazidos de longe e, por meio de muitas vicissitudes da vida, encontram e adoram a Cristo.
Deus pôs um sinal nos céus para guiar aqueles astrônomos/astrólogos do oriente que procuravam encontrar Deus. O sinal da estrela é a manifestação da misericórdia de Deus que quer ser encontrado pelos homens. Expressa a necessidade de ter que olhar para fora deste mundo para descobrir os segredos de Deus.
O sinal levou os magos a começar uma longa e difícil viagem: quando nos damos conta do valor do encontro com Cristo, lançamo-nos em uma longa jornada rumo a Deus.
As estrelas vistas daqui de baixo parecem distantes e frias; as informações que elas nos dão parecem distantes e difíceis, mas por meio delas, mais particularmente pelo Cristo, somos atraídos para uma viagem que será bem-sucedida, pois é o próprio Deus que quer ser encontrado.
A viagem dos magos passa por uma crise. Vão perguntar a Herodes: “Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer?” A história de Herodes é uma história de violência e de assassinatos provocados pela sua suspeita doentia e sua crueldade impiedosa, inclusive contra sua própria família. Sua ambição de poder o levou a eliminar possíveis pretendentes ao trono. Historiadores sabem hoje que ele mandou matar por suspeita de conspiração o sumo sacerdote Aristóbulo (irmão de sua segunda mulher), José (seu irmão), Hircano II (o avô de sua mulher); Mariana (sua segunda mulher); José e Costobar (seus cunhados); Alexandre e Aristóbulo (seus enteados); Antípater (filho do primeiro casamento). O assassinato dos meninos de Belém está de acordo com a violência do reinado de Herodes, especialmente em seus últimos anos, quando sua segurança no trono estava ameaçada.
Depois de ter se informado cuidadosamente com os sacerdotes e mestres da Lei sobre o lugar de nascimento do Messias, chama em segredo os magos para saber com exatidão sobre o tempo do aparecimento da estrela. Lugar e tempo: falta somente saber quem é esse menino. Com astúcia maligna pede que os magos o mantenham a par das buscas para poder também ele ir adorá-lo. A astúcia de Herodes, no entanto, é vencida pelo milagre da estrela, que reaparece somente depois que os magos deixam a corte, e pela fidelidade dos visitantes, que obedecem ao sonho de não voltarem a Herodes.
É impressionante o fato que Herodes, com a ajuda dos doutores da Lei, tenha interpretado corretamente a profecia (Mq 5,1), mas não tenha crido (aceitado, aderido) em Cristo. De que adianta conhecer, se esse conhecimento nos leva a buscar a morte de Cristo?
A visita a um soberano era sempre acompanhada de dádivas. Ouro indica a realeza; incenso, a divindade; mirra, os sofrimentos e a morte. São presentes caríssimos, demonstrando grande afeto por Cristo.
O Senhor deseja ser encontrado. Ele mesmo nos atrai e nos guia pela sua estrela. Ele não nos dá somente a luz da fé, mas o seu corpo e o seu sangue para nos transformar e nos fazer viver sempre mais em comunhão com Ele.
Celebramos hoje a Epifania ou Manifestação do Senhor a todos os povos. São Mateus é o único dos evangelistas que faz a narrativa da visita dos “magos”. Magos (do grego) significa grande, ilustre. Esta solenidade nos comunica que a salvação é para todos. Os magos vinham do Oriente à procura do Rei dos Judeus, indicado pela estrela. A estrela os conduz e eles encontram o menino com Maria, sua Mãe. Diz o texto que eles ficaram muito alegres! Oferecem de presente ao menino ouro, incenso e mirra. O ouro simboliza a realeza de Jesus, o incenso, a sua divindade, e a mirra, a sua humanidade.
2. Meditação (Caminho)
O que o texto diz para mim, hoje?
O texto me convida a respeitar culturas e raças diferentes, me ensina a procurar a Deus de coração sincero. Ensina-me ainda a não me deixar confundir por outros reinos.
Meditando
Todas as culturas já trazem dentro de si "as sementes do Verbo". Lembram isso os bispos em Aparecida, quando dizem:
O Evangelho chegou a nossas terras em meio a um dramático e desigual encontro de povos e culturas. As “sementes do Verbo” presentes nas culturas autóctones, facilitaram a nossos irmãos indígenas encontrarem no Evangelho respostas vitais às suas aspirações mais profundas: “Cristo era o Salvador que esperavam silenciosamente”. (DAp 4).
Uma visão que bem poderia ser compreendida como a mais comum para todos nós reveste-se de uma força que tem o poder de contagiar-nos e, dessa forma, conduzir-nos por caminhos de novas e melhores práticas: Maria está em casa com seu filho (cf. v. 11) – uma imagem que para muitos em nossa sociedade, sejam mães ou pais, se tornou fugidia. Ela está em casa e usa de seu tempo de forma sábia e com qualidade. Vive com qualidade ao lado do filho. Faz do espaço doméstico um lugar de formação continuada do caráter do pequeno Jesus. É bem apropriado dizer que Maria utiliza seu tempo com qualidade. No tempo, Maria vê possibilidades de gerar maior conhecimento e comunhão não somente entre ela e o filho, mas também entre eles e o projeto de Deus.
Hoje, dizemos: “Não temos tempo” e, com isso, vivemos com nossos filhos e filhas relações marcadas por profunda falta de qualidade. Vivemos mais fora do que dentro de casa. Muitos saem pela manhã, quando os filhos estão dormindo, e somente voltam à noite, quando aqueles já se recolheram. Não os veem e, consequentemente, comprometem a qualidade do relacionamento com seus filhos. Se administrarmos o tempo de forma inadequada, ele age contra nós. Disso decorre que, não raro, quando percebemos, nossos queridos filhos(as) cresceram sem que tivéssemos consciência de tal fato. Precisamos de tempo e, talvez muito mais do que isso, precisamos priorizar o que realmente possui valor para todos nós: os(as) filhos(as).
Não há nada que substitua o contato da mãe e do pai com seus filhos e filhas. Por isso, Maria se faz presente. Não é uma mãe ausente. Sua presença é forte, constante, carinhosa e fundamental para que seu filho cresça num ambiente sadio. O texto bíblico, ao ressaltar que “viram o menino com Maria”, deseja enfatizar que a qualidade dos relacionamentos bem construídos é constituída do tempo dedicado às pessoas que amamos. Maria ama e, por isso, faz questão de viver próxima do filho. “Não tenho tempo”, dizemos com muita facilidade, a fim de reduzir o senso de culpa. No entanto, as 24 horas do dia de Maria são também as 24 horas que temos. Assim, o problema não está na quantidade de horas, mas na maneira como as administramos e elegemos nossas prioridades.
É impossível amar com qualidade se não estamos presentes. O próprio Deus conhecia esse princípio ao escolher o nome para seu Filho: Emanuel, ou seja, “Deus conosco”. Para amar e continuar amando, precisamos nos encontrar e “gastar” o tempo juntos. Maria é “Emanuel” para seu filho e, da mesma forma, deveríamos ser “Emanuel” para nossos filhos e filhas.
III. Pistas para reflexão
– Para quem precisamos ser “Emanuel”, isto é, presença que ajuda, abençoa, partilha, vive e convive? A presença fala muito mais alto do que a ausência. Devemos nos inspirar na “estratégia de Deus”, que se fez presente junto a nós por meio de Jesus, e nos convencer de que podemos revitalizar a qualidade dos nossos relacionamentos com os que nos cercam e com nossa comunidade somente quando fazemos de nossa presença algo constante.
– Muitas vezes (para não dizer a maioria das vezes) nossas cidades são marcadas por muita religiosidade e pouca justiça social. Tente dimensionar a desproporção entre a totalidade das pessoas que se dirigem a alguma igreja nos fins de semana e o perfil da cidade onde elas vivem. Praticamente são as mesmas pessoas que estão em um e em outro lugar. No entanto, se um lugar parece o “céu”, o outro está mais parecido com o “inferno”, devido à prática da injustiça e ao descaso para com o ser humano. Como poderia um só povo produzir tão diferentes lugares? Thomas McGrath
“Por que é que os homens se deslocam em vez de ficarem quietos”? Esta pergunta do escritor Bruce Chatwin nos reconduz ao centro do mistério do próprio ser humano.
Somos seres de travessia. As viagens nunca são apenas exteriores. Não é simplesmente no espaço geográfico que o ser humano viaja. Isso significaria não perceber toda sua a profundidade; deslocar-se implica uma mudança de posição, uma ampliação do olhar, uma abertura ao novo, uma adaptação a realidades e linguagens diferentes, uma expansão da sensibilidade, um confronto, um diálogo tenso ou deslumbrado, que deixam necessariamente impressões muito profundas.
A experiência da viagem é a experiência de fronteira e do horizonte aberto, de que o ser humano precisa para ser ele mesmo.
Nesse sentido, a viagem é uma etapa fundamental da descoberta e da construção de sua própria identidade e do conhecimento do mundo que o cerca. É a sua consciência que perambula, descobre cada detalhe do mundo e olha tudo de novo como da primeira vez. A viagem é uma espécie de propulsor desse olhar novo. Por isso, é capaz de introduzir na sua vida elementos sempre inéditos que o incitam a uma mudança contínua. Nada mais anti-humano que uma vida estabilizada em posições fechadas, ideias atrofiadas, visões limitadas pelo medo do diferente...
Mais do que viajantes, aos poucos vamos nos descobrindo peregrinos. Quando fazemos uma peregrinação, muitas vezes nos interrogamos onde é que ela termina, porque uma das coisas que experimentamos é que, à medida que caminhamos, a realidade torna-se sempre mais aberta e nós nos enriquecemos muito mais. A peregrinação não tem propriamente um fim: tem uma extraordinária finalidade. No caso dos Magos é o encontro com o “Rei de Israel”.
Na noite de Natal, Jesus se manifestou aos pastores, homens pobres e humildes, que foram os primeiros a se deslocarem para levar um pouco de calor à fria gruta de Belém. Agora são os Magos que chegam de terras longínquas, também eles atraídos misteriosamente por essa Criança. Os pastores e os Magos são muito distintos entre si; mas uma coisa tem em comum: o céu.
Os pastores de Belém foram correndo para ver o menino Jesus não porque fossem particularmente devotos, mas porque velavam de noite e, levantando os olhos ao céu, viram um sinal e escutaram uma mensagem.
Assim também os Magos: investigavam os céus, viram uma nova estrela, interpretaram o sinal e se puseram a caminho. Os pastores e os Magos nos ensinam que para encontrar Jesus é necessário saber levantar o olhar para o céu, não fixar-nos em nós mesmos, ter o coração e a mente abertos ao horizonte de Deus, que sempre nos surpreende, saber acolher suas mensagens e responder com prontidão e generosidade.
O termo “magos” tem uma considerável gama de significados; mas, certamente, em Mateus são sábios cuja sabedoria religiosa e filosófica os põe em caminho; é a sabedoria que leva a Cristo. Somente homens de uma certa inquietude interior, homens de esperança, em busca da verdadeira estrela da salvação, seriam capazes de colocar-se em caminho e percorrer a longa distância entre Oriente e Belém.
Chama a atenção a prontidão da resposta dos Magos. Com simplicidade expressam como no preciso momento em que perceberam a indicação do céu, imediatamente reagiram e a seguiram.
A estrela que os guiava era uma estrela nova, superior, peregrina, que despertava assombro e atraía àqueles que a contemplavam. Os caminhos deste novo astro, orientam à salvação divina para toda a humanidade.
A experiência dos Magos nos exorta a não nos contentar com a mediocridade, a não permanecer adormecidos e estáticos, mas a buscar o sentido das coisas, a perscrutar com paixão o grande mistério da vida. Eles nos ensinam a não nos escandalizar frente à pequenez e à pobreza, mas a reconhecer a majestade na humildade e sabermos ajoelhar diante dela. O deslocamento dos Magos ajuda a nos deixar guiar pela estrela do Evangelho para encontrar Aquele que é Luz, e despertar a luz que nos habita. Assim, poderemos levar aos outros um raio de sua luz e compartilhar com eles a alegria do caminho.
Os Magos vêm do Oriente e caminham para a luz. Estão orientados. Oriente significa onde nasce o sol, a luz. A desorientação é a perda do sentido, do caminho, é viver na escuridão. A verdadeira luz está mais presente na gruta despojada que nos palácios e templos de Jerusalém.
Epifania, portanto, é abrir caminhos; Epifania é buscar e caminhar para a luz.
Mateus termina seu relato notando que, uma vez que os magos se encontraram com o Menino Jesus, “regressaram por outro caminho”. E não mudam de caminho para evitar Herodes, mas porque encontraram o Caminho: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”.
Deus, a Luz, não está presente nos caminhos e pretensões de Herodes (e existem muitos Herodes e faraós soltos pela história), mas naquele que é frágil e está deitado em um presépio.
Como os Magos, levantemos e voltemos à casa por outro caminho!
Quem se encontra com Jesus voltará à sua casa, ao seu trabalho, às suas ocupações, mas já não será o mesmo. Voltará de outra maneira, por outro caminho, com um coração dilatado e um espírito renovado. Quem se encontra com a Criança de Belém, dá-se conta de que os caminhos de Herodes, do poder, do prestígio, da riqueza, são caminhos que levam à morte. E Epifania é o caminho da vida, da acolhida e do encontro.
O itinerário espiritual, portanto, pode ser descrito como uma viagem da cabeça ao coração; é uma viagem longa, difícil, mas apaixonante.
Por diferentes motivos, também hoje vivemos uma grande mobilidade; precisamos ser espertos em mover-nos entre o diferente, o que nos confunde, o mistério, o que nos questiona... Sempre caminhando. Esta é a atitude daquele que segue um Deus sempre maior, sempre surpreendente, que está sempre mais além de onde estamos. Então, que sigamos, sempre adiante... mas façamos isso juntos, sem deixar ninguém fora!
Este e o dinamismo que deve perpassar nossa vida: da instalação ao crescimento, da acomodação ao deslocamento contínuo. Partimos da realidade de que a tendência natural é amparar-nos nas “zonas de conforto”; elas nos dão mais segurança; é mais cômodo; requer menos energias.
A inércia leva a viver o ordinário, o repetitivo; custa-nos admitir e saborear o excepcional, o extraordinário; muitas vezes nos movemos em meio a um certo ceticismo vital, sem paixão pela vida e pela missão. Mas o caminho da fé nos leva de assombro em assombro, de graça em graça, de alegria em alegria.
“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos” (Fernando Pessoa).
Para meditar na oração
Esse “outro caminho” é o caminho que deve direcionar para Deus nossa vida.
O que importa é pôr-se a caminho nas pegadas dos Magos, fazer escolhas e recusar desvios.
- Há alguma “estrela” abrindo horizontes para você?
- O que há de “herodiano” em sua realidade e em seu mundo interior? Quais são as causas, as manifestações e os efeitos das suas inseguranças, do fixismo em torno do próprio eu, dos seus medos?
- Conserve-se em movimento interior, sempre; nada de roteiros rígidos que sufocam o Espírito, matam a criatividade, prendem à rotina e empobrecem o dinamismo de uma vida em transformação.
Continuamos celebrando o nascimento do Filho de Deus na pequena cidade de Belém.
Jesus não nasce em Jerusalém, centro de poder político e religioso, senão na periferia, num lugar pobre, cujo único orgulho possível era ser a terra natal de Davi, algo que se perdia no tempo e jazia quase esquecido.
Dela o profeta Miqueias já falava: “Mas você Belém de Éfrata, tão pequena entre as principais cidades de Judá. É de você que sairá para mim aquele que há de ser o chefe de Israel” (5,1-2).
É sem dúvida questionador que Deus tenha escolhido para nascer entre os pobres, que a irrupção de Deus na história da humanidade tenha acontecido no silêncio e solidão de uma gruta, sendo testemunhas o céu e os pequenos da terra.
Por que o Deus escondido, que quis se dar a conhecer em Jesus, o faz de forma tão humilde, tão despercebida, tão humana? (Rom 16, 26).
Deseja que o busquemos, que saiamos ao seu encontro... Ele não impõe a sua Presença, só se apresenta de diferentes maneiras; a mais humilde, plena e terna é em seu Filho Jesus.
Deus nos criou para Si, toda pessoa humana leva dentro de si o desejo de Deus, de conhecê-lo, de se encontrar com Ele, de uma vida em plenitude, de um amor infinito. Todo ser humano leva a marca da eternidade que o impulsiona a sair de si em busca dela.
Essa sede de eternidade, essa busca, muitas vezes sem saber, de Deus, é a estrela que cada um de nós leva dentro. É a presença do Espírito que nos movimenta, que nos põe em caminho a Deus, como aqueles magos do Oriente que hoje Mateus cita no seu evangelho.
O importante não é saber se eles existiram ou não, e sim descobrir a riqueza de mensagens que este episódio quer transmitir.
Deus nos ama, vem ao nosso encontro na pessoa de Jesus e infunde seu Espírito em nós para que, iluminados pela sua presença, possamos livremente sair na sua busca e viver a alegria de ser encontrados por Ele!
Podemos perguntar-nos: como é possível reconhecer a presença do Espírito?
Uma das maneiras mais simples é através dos presentes que ele nos dá, e um deles é a alegria (Gl 5,22). Por isso é que o evangelho nos diz que “ao verem de novo a estrela, os magos ficaram radiantes de alegria”.
Reconhecemos a presença do Espírito em nós? Em que momentos? Façamos agora uma singela oração ao Espírito que nos habita, agradecendo a sua Presença e pedindo-Lhe que sejamos dóceis à sua condução!
É importante reconhecer a ação do Espírito, para poder colaborar com ele, se aderir a ele. Jesus mesmo, no evangelho de João, nos diz que o Espírito nos conduzirá à verdade plena (Jo 16,13), que é Ele! (Jo 14,6).
Ou seja, Deus atua em nós, mas requer nossa disponibilidade, cada um de nós pode optar entre seguir a voz do Espírito de liberdade ou seguir outras vozes que nos levam à escravidão do poder, do medo, do egoísmo, da infidelidade...
Os magos são fiéis ao caminho que sinaliza a estrela e descem de Jerusalém a Belém. Finalmente a estrela parou e eles são envolvidos no mistério de Deus que se fez presente numa criança: “viram o menino com Maria, sua mãe”.
Reconhecem nele o Messias esperado de todos os tempos, o Salvador de toda a humanidade. Ao vê-Lo, se ajoelham, o adoram, o amam!
Depois, não voltam para Jerusalém, senão que partem para suas terras para comunicar que tinham visto, encontrado o Salvador.
Junto com os magos tenhamos uma atitude de adoração e acolhida do mistério de Deus que se nos comunica na gruta de Belém, e assim “cheios” do Espírito Santo possamos exclamar olhando para o menino: É o Senhor! (1Cor 12,3).
O encontro com Jesus nos leva a partir para uma nova vida, no lugar onde cada um e cada uma vive, trabalha, estuda... ali ser comunicadores da ternura e do Amor de Deus que se faz presente na fragilidade de uma criança!
Lógica de Deus
Onde acaba a cidade
e começa o medo,
onde terminam os caminhos
e começam as perguntas,
perto dos pastores
e longe dos senhores,
no calor de Maria
e no frio do inverno,
vindo da eternidade
e gestando-se no tempo,
salvação poderosa para todos
atado a um edito do império,
rebaixado em um presépio de animais
aquele que a todos nos eleva até os céus,
nasceu o Filho do Pai,
Jesus, o filho de Maria.
Só abaixo está o senhor do mundo
que nós sonhamos no alto.
Aqui se vê a grandeza de Deus
contemplando a humildade deste pequenino
Aqui está a lógica de Deus,
rompendo o discurso dos sábios.
Aqui já está toda a salvação de Deus
que plenificará todos os povos e os séculos.
Benjamin González Buelta SJ
Salmos para sentir e saborear as coisas internamente
SITUANDO
O motivo que levou José e Maria a viajar para Belém foi o recenseamento decretado pelo imperador de Roma (Lc 2,1-7). Periodicamente, as autoridades romanas decretavam tais recenseamentos nas várias regiões do seu imenso império. Era para recadastrar a população e saber quanto cada pessoa tinha que pagar de imposto. Os ricos pagavam imposto sobre a terra e sobre os bens que possuíam. Os pobres pagavam pelo número de filhos. Às vezes, o imposto total chegava a mais de 50% dos rendimentos da pessoa.
COMENTANDO
1 – Lucas 2,8-9: Os primeiros convidados - Os pastores eram pessoas marginalizadas, pouco apreciadas. Viviam junto com os animais, separados do convívio humano. Por causa do contato permanente com os animais, eram considerados impuros. Ninguém jamais os convidava para vir visitar um recém-nascido. É a estes pastores que aparece o anjo do Senhor para transmitir a grande notícia do nascimento de Jesus. Diante da aparição dos anjos, eles ficam com medo.
2 – Lucas 2,10-12: O primeiro anúncio da boa-nova - A primeira palavra do anjo é: “Não tenham medo!” A segunda é: “Alegria para todo o povo!” A terceira é: “Hoje!” Em seguida, vêm três nomes para identificar quem é Jesus: Salvador, Cristo e Senhor! SALVADOR é aquele que liberta todos de tudo que os amarra! Os governantes daquele tempo gostavam de usar o título de Salvador (Soter). CRISTO significa ungido ou messias. Era um título dado aos reis e aos profetas. Era também o título do futuro libertador. Significa que esse menino recém-nascido veio realizar as esperanças do povo. SENHOR era o nome que se dava ao próprio Deus! São os três maiores títulos que se possa imaginar. A partir deste anúncio do nascimento de Jesus como Salvador, Cristo e Senhor, você imagina alguém da mais alta categoria. E o anjo lhe diz: “Atenção! Tem um sinal! Você vai encontrar um menino deitado num barraco no meio dos pobres!” Você acreditaria? O jeito de Deus é diferente mesmo!
3 – Lucas 2,13-14: Glória no mundo de cima, Paz no mundo de baixo - Uma multidão de anjos aparece e desce do céu. É o céu desabando sobre a terra. As duas frases do refrão que eles cantam dão o resumo do que Deus quer com o seu projeto. A primeira diz o que acontece no mundo lá de cima: “Glória a Deus nas alturas”. A segunda diz o que vai acontecer no mundo cá de baixo: “Paz na terra aos seres humanos por ele amados”. Se a gente pudesse experimentar o que significa realmente ser amado por Deus, então tudo mudaria e a paz viria morar na terra. E isto seria a maior glória para Deus que mora nas alturas.
4 – Lucas 2,15-20: A palavra vai sendo acolhida e encarnada - A Palavra de Deus não é apenas um som que a boca produz. Ela é, sobretudo, um acontecimento! Os pastores dizem, literalmente: “Vamos ver esta palavra que aconteceu e que o Senhor nos deu a conhecer!” Em seguida, Lucas diz que “Maria conservava estas palavras (acontecimentos) em seu coração” e as ruminava. São duas maneiras de se perceber e acolher a Palavra de Deus: 1) Os pastores se levantam para ir ver os fatos e verificar neles o sinal que foi dado pelo anjo; 2) Maria conserva os fatos na memória e as confere no coração. Ou seja, ela conhece a Bíblia e tenta entender os fatos novos iluminando-os com a luz da Palavra de Deus.
ALARGANDO
Novamente, ao longo da descrição do nascimento de Jesus, Lucas sugere que as profecias se realizaram! Eis algumas delas:
Apareceu a luz das nações, anunciada por Isaías! (Is 9,1; 42,6; 49,6).
Nasceu o menino, prometido pelo mesmo profeta (Is 9,5; 7,14).
O menino que devia nascer para dar alegria ao povo e trazer a salvação de Deus (Is 9,2).
Ele nasceu em Belém. Por isso é o Messias prometido, conforme anunciou Miqueias (Mq 5,1).
Chegou o tempo da paz anunciada por Isaías, em que animais e seres humanos vão se reconciliar e farão desaparecer da terra toda a violência assassina (Is 11,6-9).
O imperador romano pensava ser o dono do mundo. Na realidade, ele não passava de um empregado. Sem saber e sem querer, ele executava os planos de Deus, pois o decreto imperial fez com que Jesus pudesse nascer em Belém e realizar a profecia (Lc 2,1-7).
O QUE CHAMA A ATENÇÃO NESTE TEXTO SÃO OS CONTRASTES:
Na escuridão da noite brilho uma luz (2,8-9).
O mundo lá de cima, o céu, parece desabar e envolver nosso mundo cá de baixo (2,13).
A grandeza de Deus se manifesta na fraqueza de uma criança (2,7).
A glória de Deus se faz presente numa manjedoura de animais (2,16).
O medo provocado pela aparição do anjo dá lugar à alegria (2,9-10).
Pessoas que vivem marginalizadas são as primeiras convidadas (2,8).
Os pastores reconheceram Deus presente numa criança (2,20).
Epifania do Senhor, é uma festa de luz: a Epifania estende o projeto salvador de Deus a toda a humanidade, a toda a criação.
O convite que lhes faço é de nos apropriarmos do sentido mais profundo desta luz e da missão que ela cumpriu junto aos magos, cumpre hoje, e continuará cumprindo junto às pessoas que buscam, de coração, um encontro pessoal com Jesus.
De pé, Jerusalém! Deixa-te iluminar! Chegou a tua luz! É a glória do SENHOR que te ilumina!
É intensa, convidativa esta profecia de Isaías, ouvida na primeira leitura de hoje. Somos convidados a deixar-nos iluminar pela irradiação que nos foi presenteada no Natal! JESUS, o Filho de Deus.
Queridas irmãs, queridos irmãos desta significativa comunidade virtual: a festa de hoje –Epifania do Senhor, é uma festa de luz: a Epifania estende o projeto salvador de Deus a toda a humanidade, a toda a criação.
O convite que lhes faço é de nos apropriarmos do sentido mais profundo desta luz e da missão que ela cumpriu junto aos magos, cumpre hoje, e continuará cumprindo junto às pessoas que buscam, de coração, um encontro pessoal com Jesus.
Estrela-guia: com certeza, ela é o símbolo primeiro da Epifania. Muito já se discutiu sobre o tipo de estrela que guiou os Magos. Pensa-se numa conjunção de planetas, numa daquelas estrelas que, na sequência duma explosão interna, irradia por algum tempo um imenso esplendor, pensa-se num cometa, etc. Deixemos que os cientistas continuem esta interessante discussão. A grande estrela que nos guia não é um símbolo; é o próprio Jesus. Ele é, por assim dizer, a explosão do amor de Deus, que faz brilhar sobre o mundo o grande fulgor de seu coração.
Ouçamos agora a frase de Mateus, ouvida no Evangelho: Onde está Aquele que é nascido rei dos judeus? Porque nós vimos a sua estrela no oriente, e viemos adorá-lo.
Vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-Lo”. (Mt 2, 2).
Eles conheciam a promessa sobre o Messias. Eram pessoas de coração inquieto, que não se satisfaziam com aparências ou com a rotina da vida. Eram pessoas à procura da promessa, à procura de Deus. Eram pessoas vigilantes, capazes de discernir os sinais de Deus, no seu tempo.
Nunca saberemos se eles primeiro se puseram a caminho para adorar o Messias nascido, ou se primeiro viram a estrela porque desejavam, de coração, vê-la. Recordemos uma breve reflexão do Papa Francisco: este símbolo – a estrela-guia, fala diretamente ao coração da pessoa que acredita, que tem sede de Deus; reflete a imagem de todos os seres humanos que não deixaram, na sua vida, anestesiar o próprio coração.
Esta nostalgia santa de Deus brota no coração que acredita, porque sabe que o Evangelho não é um acontecimento do passado, mas do presente. A nostalgia santa de Deus permite-nos manter os olhos abertos contra todas as tentativas de restringir e empobrecer a vida. A nostalgia santa de Deus é a memória fiel que se rebela contra tantos profetas de desgraça. É esta nostalgia que mantém viva a esperança da comunidade fiel que implora, semana após semana, com estas palavras: «Vinde, Senhor Jesus!».
O segundo símbolo se constitui no resumo dos três presentes oferecidos a Jesus: ouro, incenso e mirra. Ao meu salvador, eu entrego tudo: o que de mais precioso eu possuo (ouro), dou-me a mim mesma (mirra, o perfume que penetra até misturar-se a mim mesma) e realizo meu ato de adoração ao único Deus que eu reconheço, e que acaba de encarnar-se por amor (incenso).
Mas… nem a estrela-guia, nem os magos com seus dons, ocupam o centro deste cenário. O centro é ELE, JESUS! Que, ao ser manifestado por este grandioso conjunto de sinais, continua se mostrando pequeno como os pequenos deste mundo, pobre como os pobres deste mundo.
Grande, muito grande, é o resultado desta festa. Jesus não veio somente para um povo, uma nação. Ele é o salvador de todos, sem qualquer exclusão.
Basta ver a estrela-guia, e vir encontrá-lo.
Hoje, nosso coração pode ouvir também um convite à conversão de nossas atitudes, diante de tantas manifestações. Hoje, a manifestação visa, quase sempre, apontar para os problemas e não para as soluções. Hoje, quase sempre a manifestação não é conduzida por uma estrela-guia, mas por uma guerra de poderes, de egoísmos, de concorrências. Quem deseja brilhar são as pessoas.
É muito bom, é importante participar de manifestações, com um diferencial cristão na mente, nos olhos e no coração.
Nós vimos a estrela e adoramos o Senhor! Este Senhor é Jesus, Ele mesmo um grande manifestante, instaurando um novo Reino, o Reino de seu e nosso Pai, Reino de Justiça, de Paz, de Solidariedade!
Que a festa da estrela-guia, a festa da Epifania, a manifestação do Senhor, nos capacite para essa atitude fundamental de manifestar e concretizar o sonho de Jesus: vida plena para todos.
AMBIENTE
Na Solenidade da Epifania do Senhor, a liturgia apresenta-nos a visita dos Magos ao menino de Belém. Trata-se de um episódio que, ao longo dos séculos, tem provocado um impacto considerável nos sonhos e nas fantasias dos cristãos … No entanto, não estamos diante de uma reportagem jornalística que faz a cobertura da visita oficial de três chefes de Estado a outro país; estamos diante de uma catequese sobre Jesus, destinada a apresentar Jesus como o salvador/libertador de todos os homens.
MENSAGEM
Os numerosos detalhes do relato demonstram, claramente, que o propósito de Mateus não é de tipo histórico, mas catequético.
Notemos, em primeiro lugar, a insistência de Mateus no facto de Jesus ter nascido em Belém de Judá (cf. Mt 2,1.5.6.7). Para entender esta insistência temos de recordar que Belém era a terra natal do rei David. Afirmar que Jesus nasceu em Belém é ligá-lo a esses anúncios proféticos que falavam do Messias como o descendente de David que havia de nascer em Belém (cf. Miq 5,1.3; 2Sam 5,2) e restaurar o reino ideal de seu pai. Com esta nota, Mateus quer aquietar aqueles que pensavam que Jesus tinha nascido em Nazaré e que viam nisso um obstáculo para O reconhecerem como Messias.
Notemos, em segundo lugar, a referência a uma estrela “especial” que apareceu no céu por esta altura e que conduziu os “Magos” para Belém. A interpretação desta referência como indicação histórica levou alguém a cálculos astronómicos complicados para concluir que, no ano 6 a.C., uma conjunção de planetas explicaria o fenómeno luminoso da estrela refulgente mencionada por Mateus; outros andaram à procura do cometa que, por esta época, devia ter sulcado os céus do Médio Oriente … Na realidade, não podemos entender esta referência como histórica, mas antes como catequese sobre Jesus. Segundo a crença popular, o nascimento de uma personagem importante era acompanhado da aparição de uma nova estrela. Também a tradição judaica anunciava o Messias como a estrela que surge de Jacob (cf. Nm 24,17). É com estes elementos que a imaginação de Mateus, posta ao serviço da catequese, vai inventar a “estreia”. Mateus está, sobretudo, interessado em fornecer aos cristãos da sua comunidade argumentos seguros para rebater aqueles que negavam que Jesus era o Messias esperado.
Temos, ainda, as figuras dos “Magos”. A palavra grega “magos”, usada por Mateus, abarca um vasto leque de significados e é aplicada a personagens muito diversas: mágicos, feiticeiros, charlatães, sacerdotes persas, propagandistas religiosos … Aqui, poderia designar astrólogos mesopotâmios, entrados em contato com o messianismo judaico. Seja como for, esses “Magos” representam, na catequese de Mateus, esses povos estrangeiros de que falava a primeira leitura (cf. Is 60,1-6), que se põem a caminho de Jerusalém com as suas riquezas (ouro e incenso) para encontrar a luz salvadora de Deus que brilha sobre a cidade. Jesus é, na opinião de Mateus e da catequese da Igreja primitiva, essa luz.
Além de uma catequese sobre Jesus, este relato recolhe, de forma paradigmática, duas atitudes que se vão repetir ao longo de todo o Evangelho: o povo de Israel rejeita Jesus, enquanto que os “Magos” do oriente (que são pagãos) O adoram; Herodes e Jerusalém “ficam perturbados” diante da notícia do nascimento de Jesus e planeiam a sua morte, enquanto que os pagãos sentem uma grande alegria e reconhecem-no como o seu Senhor.
Mateus anuncia, aqui, que Jesus vai ser rejeitado pelo seu povo; mas vai ser acolhido pelos pagãos, que entrarão a formar parte do novo Povo de Deus. O itinerário seguido pelos “Magos” reflete o processo que os pagãos seguiram para encontrar Jesus: estão atentos aos sinais (estrela), percebem que Jesus traz a salvação, põem-se decididamente a caminho para O encontrar, perguntam aos judeus – que conhecem as Escrituras – o que fazer, encontram Jesus e adoram-no. É muito possível que um grande número de pagano-cristãos da comunidade de Mateus descobrisse neste relato as etapas do seu próprio caminho em direção a Jesus.
ATUALIZAÇÃO
Considerar as seguintes questões:
* Em primeiro lugar, meditemos nas atitudes das várias personagens que Mateus nos apresenta em confronto com Jesus: os “Magos”, Herodes, os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo … Diante de Jesus, eles assumem atitudes diversas que vão desde a adoração (os “Magos”) até à rejeição total (Herodes), passando pela indiferença (os sacerdotes e os escribas: nenhum deles se preocupou em ir ao encontro desse Messias que eles conheciam bem das Escrituras). Identificamo-nos com algum destes grupos? Não é fácil “conhecer as Escrituras”, como profissionais da religião e, depois, deixar que as propostas e os valores de Jesus nos passem ao lado?
* Os “Magos” são apresentados como os “homens dos sinais”, que sabem ver na “estrela” o sinal da chegada da libertação. Somos pessoas atentas aos “sinais” – isto é, somos capazes de ler os acontecimentos da nossa vida e da história do mundo à luz de Deus? Procuramos perceber nos “sinais” a vontade de Deus?
* Impressiona também, no relato de Mateus, a “desinstalação” dos “Magos”: viram a “estreia”, deixaram tudo, arriscaram tudo e vieram procurar Jesus. Somos capazes da mesma atitude de desinstalação, ou estamos demasiado agarrados ao nosso sofá, ao nosso colchão, à nossa televisão, à nossa aparelhagem, à nossa internet? Somos capazes de deixar tudo para responder aos apelos que Jesus faz através dos irmãos?
* Os “Magos” representam os homens de todo o mundo que vão ao encontro de Cristo e que se prostram diante d’Ele. É a imagem da Igreja, essa família de irmãos, constituída por gente de muitas cores e raças, que aderem a Jesus e que O reconhecem como “o Senhor”.
O relato da visita dos Magos do Oriente faz parte do Evangelho da Infância de Jesus segundo Mateus (capítulos 1 e 2). Mais do que informar dados biográficos, essas narrativas querem fazer uma profunda reflexão teológica para compreender a vida de Jesus e servir de luz na caminhada das comunidades daquele tempo e ainda hoje. Aproximemo-nos do texto em três momentos.
1. JESUS ATUALIZA A MEMÓRIA PROFÉTICA
Numa perspectiva, percebemos a comunidade de Mateus mostrando que em Jesus se cumpre a esperança de seu povo na vinda do libertador. Por isso, já situara sua origem humana (1,1-17) e divina (1,18-25), conforme tinha dito o profeta Isaías (1,22-23; Isaías 7,14).
Em nosso relato, mais elementos vêm confirmar essa perspectiva da esperança profética. Vejamos!
A estrela esperada, que sairia da linhagem do pai Jacó (Números 24,17), é Jesus de Nazaré, descendente de Davi, outra estrela da estirpe de Jacó. Jesus é a estrela que tem a verdadeira luz para todos os povos. Ele é o “sol da justiça”, esperado pelo profeta Malaquias (3,20). Davi é da tribo de Judá e Belém é sua aldeia de origem. Por isso, os autores deste relato fazem memória da esperança do profeta Miqueias (5,1-3). Ele não acreditava mais nas autoridades de Jerusalém, a capital, mas em um governante que viria desde a periferia, como Davi, quando era um pobre pastor de ovelhas antes de se tornar rei em Hebron e, depois, também em Jerusalém.
É como hoje, quando os mais pobres confiam nas lideranças que saem do seu meio e que dão o melhor de suas vidas para garantir os direitos fundamentais do povo, como trabalho digno, moradia, saúde e educação.
Outro aspecto dessa memória da esperança do povo é o fato de lembrar vários textos que anunciam a vinda do rei justo para todos os povos, enquanto do Oriente e do Ocidente eles viriam trazendo-lhe presentes (Salmo 72,10-15; Isaías 49,23; 60,5-6). Os presentes anunciam que Jesus é rei (ouro) divino (incenso), que veio trazer libertação para muitos. Por isso, é uma ameaça para outros, que ficam alarmados (Mateus 2,3) e o matam (a mirra era usada nos sepultamentos – cf. João 19,39-40).
Ainda hoje, “os Herodes” de nossos tempos continuam perseguindo, criminalizando e prendendo as lideranças que nascem do meio do povo e permanecem a seu lado. Os instrumentos que “u$am” hoje são a mídia, o parlamento e os tribunais do judiciário. Também “os chefes dos sacerdotes com seus escribas” de hoje em dia ficam alarmados com o novo que está nascendo no meio do povo. Por isso, o combatem e se aliam aos Herodos de nossa época.
2. A ESTRELA DO REI QUE VEM DA PERIFERIA
Em outra perspectiva, convém identificar as figuras de Herodes, dos sumos sacerdotes e dos escribas do povo.
Em 37 a.C., Herodes Magno foi proclamado, por Roma, rei sobre toda a Palestina com o título de rei sócio e amigo do povo romano. Esse título nos mostra que Herodes representava, de fato, os interesses do imperador na região e cobrava os impostos para o império. Era tarefa sua reprimir toda e qualquer resistência popular. De fato, era um poder dependente e subserviente aos interesses do império colonialista. Herodes, o Grande, morreu no ano 4 a.C. É como hoje, quando os “Herodes” fazem continência diante da bandeira imperialista e entregam as nossas riquezas e a vida do povo.
Os sumos sacerdotes eram o grupo dos sacerdotes ricos e, junto com os escribas, representavam o poder religioso judaico. Os escribas, também conhecidos por legistas ou doutores da lei, eram os intérpretes das Escrituras. Isso lhes dava prestígio e influência em meio ao povo. Junto com os grandes sacerdotes e os anciãos (representantes dos bem situados economicamente), os escribas faziam parte do Sinédrio ou Grande Conselho. O Sinédrio era a autoridade máxima dos judeus e foi nele que se decidiu entregar Jesus aos romanos (João 11,45-54). Da mesma forma como Herodes, também os sumos sacerdotes, chefes do Sinédrio, eram poder dependente de Roma, uma vez que, no tempo de Jesus, eram nomeados pelos interventores romanos, os procuradores.
É importante que tenhamos clareza sobre isso, a fim de entender o que a comunidade de Mateus nos quis dizer em nosso texto. Não é por acaso que Herodes (poder político) e cidadãos de Jerusalém vissem seus privilégios ameaçados com o novo projeto de vida trazido por Jesus, o rei justo que nasce pobre no meio do povo, em uma casa da periférica aldeia de Belém. É por isso que Herodes busca, através da mentira, enganar os magos a fim de colocar em prática seu plano perverso de matar o Messias (Mateus 2,8.13). E também não é por acaso que grandes sacerdotes e escribas (autoridades religiosas) se aliem ao poder político na identificação do lugar onde devia nascer Jesus, pois percebiam que, há séculos, sua religião oficial deixara de brilhar como luz profética na defesa da vida, do amor e da liberdade.
Os magos nos convidam a abrirmos nosso olhar e nossas mentes, a fim de não deixar-nos enganar pelas mentiras dos poderosos através da mídia e, como eles, buscar caminhos alternativos para garantir a vida do rei que vem do meio do povo.
Agora, Jesus é a estrela da justiça que brilha para a vida de todos os povos. Sua luz não é perceptível em Jerusalém, o centro do poder religioso judaico e dependente dos interesses romanos. Por isso, ali a sua estrela não é visível aos magos. Sua luz vem da periferia, de Belém, que significa “casa do pão”. O encontro com o Deus Emanuel acontece lá onde está quem não tem vez nem voz nos centros de poder, acontece na periferia. E mais. É significativo Jesus nascer na “casa do pão”. É que “pão repartido” é o coração de sua boa-nova. Cotidianamente, promove a partilha do pão ao redor da mesa ou em regiões desérticas. Não é por acaso que colocou o pedido pelo pão no centro dos assuntos preferências de suas conversas com o Pai. E nos pediu que os mesmos assuntos fossem também o conteúdo básico de nossa busca de intimidade com o Pai (Mateus 6,9-13; Lucas 11,2-4). Por fim, deixa-nos o gesto da partilha do pão como o maior sinal de sua presença entre nós (Mateus 26,26-29).
3. NOS MAGOS, OS POVOS ACOLHEM O MESSIAS
O evangelho segundo Mateus é o único a relatar a vinda dos sábios do Oriente. Aqui, oriente não é somente um lugar determinado, como o antigo Irã, onde os sacerdotes eram conhecidos por magos. Mas, sobretudo, é uma referência ao lado em que nasce o sol, símbolo da luz e da vida, tal como o anjo que vem do nascente e anuncia a marca do Deus vivo em todos os seus servos (Apocalipse 7,2-3). Nos magos, os povos acolhem o messias, que se manifesta a todas as nações. E, hoje, poderíamos dizer que é nos migrantes que vêm do oriente e do ocidente que acolhemos o Emanuel, a presença de Deus entre nós.
A este texto do evangelho da infância, foram acrescentadas, pela tradição, inúmeras lendas. Um delas afirma que os magos teriam vindo da Pérsia, por ser uma cultura versada na astrologia. Outra fixa o número de magos. Seriam três. Esse número é deduzido da quantidade de presentes dados ao menino, como gesto de solidariedade para com a criança pobre que não nasce em berço de ouro. No entanto, o texto não afirma quantos eram os magos.
O texto também não diz que eles eram reis. Aliás, o rei a serviço do império era quem buscava perseguir, caluniar e matar a criança recém-nascida (Mateus 2,1.13). Esta, nascida no meio do povo e que foge da fome, era, na verdade, o verdadeiro rei libertador (Mateus 2,2).
As informações sobre os magos enquanto “reis”, com “nomes” e “cores” são inseguras. Alguns atribuem a São Leão Magno (papa de 440 a 461) o título de “reis” para os magos. De um lado, isso se deve à influência do cântico de Isaías 60, no qual se espera que todos os reis reconheçam a glória de Deus em Jerusalém. De outro, deve-se ao contexto de aliança entre a Igreja e os reis de Roma, numa época em que não somente o Império estava sendo cristianizado, mas também o Cristianismo fora cooptado pelos poderes imperiais. Foi a partir dessa aliança que reis e sumos sacerdotes passaram a andar juntos a fim de legitimar, em nome da cruz de Jesus, as conquistas alcançadas pela espada romana. Nesse contexto, nada mais natural do que transformar os magos em reis. Em outras palavras: é possível ser parte do império que oprime e fazer de conta que se é de Jesus, cuja missão é ser uma boa notícia para os pobres (Lucas 4,18-19).
No século VII, os magos teriam recebido “nomes” populares: Baltazar, Melchior e Gaspar. E, no século XV, lhes teriam sido atribuídas as “cores”: Melquior representaria as etnias brancas, Gaspar as amarelas e Baltazar as negras, a fim de simbolizar o conjunto da humanidade que acolhe e reconhece a manifestação do Messias.
Que nesta festa da epifania, se manifeste, na frágil criança de Belém, a ternura do Emanuel, Deus conosco que liberta de todas as formas de violência e de exclusão.
(NÃO TEMOS O TEXTO DE DOM DAMIÁN PORQUE NA ARGENTINA A EPIFANIA SE COMEMORA NO DIA PRÓPRIO, DIA 06 DE JANEIRO)