Solenidade.
Primeira Leitura: Ester 5,1b-2;7,2b-3
Salmo Responsorial: 44(45)R- Escutai, minha filha, olhai, ouvi isto: que o Rei se encante com vossa beleza!
Evangelho: João 2,1-11 (Bodas de Caná)
Proclamação do evangelho de Jesus Cristo segundo João – Naquele tempo, 1houve um casamento em Caná da Galileia. A mãe de Jesus estava presente. 2Também Jesus e seus discípulos tinham sido convidados para o casamento. 3Como o vinho veio a faltar, a mãe de Jesus lhe disse: “Eles não têm mais vinho”. 4Jesus respondeu-lhe: “Mulher, por que dizes isso a mim? Minha hora ainda não chegou”. 5Sua mãe disse aos que estavam servindo: “Fazei o que ele vos disser”. 6Estavam seis talhas de pedra colocadas aí para a purificação que os judeus costumam fazer. Em cada uma delas cabiam mais ou menos cem litros. 7Jesus disse aos que estavam servindo: “Enchei as talhas de água”. Encheram-nas até a boca. 8Jesus disse: “Agora tirai e levai ao mestre-sala”. E eles levaram. 9O mestre-sala experimentou a água, que se tinha transformado em vinho. Ele não sabia de onde vinha, mas os que estavam servindo sabiam, pois eram eles que tinham tirado a água. 10O mestre-sala chamou então o noivo e lhe disse: “Todo o mundo serve primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho melhor até agora!” 11Este foi o início dos sinais de Jesus. Ele o realizou em Caná da Galileia e manifestou a sua glória, e seus discípulos creram nele. – Palavra da salvação.
Jo 2,1-11
O relato das bodas (comemoração do casamento) de Caná é comovente. Nelas está presente Maria, a Mãe de Jesus. Sua presença é cheia de atenção. Por isso ela é a primeira a perceber que o vinho começava a faltar. O amor sabe se antecipar aos pedidos. O olhar amoroso de Maria percebe o que outros não percebem.
Mas ela não fica somente na constatação. Ela faz um pedido ao Filho de maneira delicada e indireta: “eles não têm mais vinho”.
Devemos entender bem: a transformação da água em vinho não é somente um milagre, mas, no evangelho de João, é um “sinal”, ou melhor é o início dos sinais.
No evangelho de João sinal é a revelação do projeto de Deus. O episódio de Caná é um grande sinal, é uma grande revelação da pessoa de Cristo e da sua missão. O que veio fazer Cristo? Qual é sua missão?
Ele veio para nos transmitir seu amor, para suscitar em nós o amor e estabelecer a nova Aliança. Na linguagem simbólica: Jesus veio trazer o vinho novo.
Deus deseja fazer Aliança com seu povo. Ele escolhe um povo para que seja seu, com o qual quer estabelecer uma relação de predileção. Deus escolheu o povo hebreu, entre tantos, e fez aliança com ele. Foi amor à primeira vista. Um amor que elege, independente dos méritos desse povo. Infelizmente nessa Aliança veio a “faltar vinho”: Deus queria contrair as núpcias com seu povo, mas infelizmente a aliança foi quebrada pela infidelidade do povo. Israel, amado por Deus, não esteve à altura dos desejos de Deus, o pacto de amor foi quebrado várias vezes. Deus, porém, não é infiel a si mesmo, à sua decisão de amar e de estabelecer aliança.
O episódio de Caná anuncia que esse tempo se antecipa. Jesus celebrará a nova aliança, colocando no casamento o vinho novo. Observemos que o sinal de Caná não é realizado para indicar o presente, mas o futuro: “não chegou ainda a minha hora”. Será na Cruz que Jesus derramará o sangue para transformar a humanidade pecadora em comunidade de salvação.
Maria está sempre presente nesse mistério da Aliança. No início, ela pronunciou o seu “fiat” e se declarou serva do Senhor; em Caná ela solicita que também os outros façam como ela (“fazei tudo o que ele vos disser”); na cruz ela receberá João como filho e este a receberá em sua casa.
Também as palavras do mestre-sala são iluminadoras. “Todo o mundo serve primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho melhor até agora”.
Na nossa vida temos a impressão de que os momentos mais belos sejam os do início: o dia mais bonito de um casamento é o do namoro e das núpcias: depois vêm as preocupações, as desilusões, as dificuldades. O tempo mais bonito da vida de padre são os primeiros anos de entusiasmo. Depois vêm as tristezas e as frustrações. E assim por diante.
Mas Jesus reserva para nós todos o vinho melhor para o fim. Ele já nos deu tantas graças, mas, se formos fiéis, ele nos dará outras ainda maiores e melhores. Ele demonstra amor crescente.
Por isso Nossa Senhora Aparecida quer hoje nos fazer uma promessa de esperança. O seu Filho Jesus nos tornará cada vez mais livres do pecado que nos separam dele, nos fará viver as dificuldades com mais coragem e confiança, fará nos progredir cada vez mais na vida cristã. Ela continua dizendo: fazei tudo o que ele vos disser.
Viva a Mãe de Deus e nossa! A Senhora Aparecida!
FESTA DE NOSSA SENHORA APARECIDA –
Jo 2,1-11; Ester 5,1b-2; 7,2b-3; Sl 45; Ap 12,1.5.13a.15-16a;
“Eles não têm mais vinho” (Jo 2,1)
Celebramos, neste domingo, a festa da Padroeira do Brasil: Virgem Maria da Conceição Aparecida.
A liturgia da Igreja no Brasil nos propõe, para esta festa, o relato joanino do “casamento em Caná”, onde Maria “estava presente”: presença inspirada que fez a diferença; presença solidária, marcada pela atenção, prontidão e sensibilidade, próprias de uma mãe; presença expansiva que mobilizou os outros, assim como mobilizou seu Filho a antecipar sua “hora”.
A “boda em Caná” é o ícone evangélico que melhor revela a situação atual da Igreja e do cristianismo. Por todos os lados pede-se renovação e em muitos lugares surgem experiências ousadas e renovadoras. É o frescor de uma espiritualidade que abre passagem entre os caminhos quase desertos de uma religião em agonia. É o vinho novo que se faz presente para brindarmos o amor e celebrar a vida.
No entanto, insistimos em pôr vinho novo em odres velhos. Esse é o drama da Igreja: aferrada aos odres da doutrina e suas obsoletas estruturas, não sabe aproveitar nem desfrutar do vinho novo. Com frequência, não sabe o que fazer com este vinho novo e o desperdiça.
Precisamos de odres novos para este vinho espumante e gracioso, um vinho cheio de vida e de sabor, um vinho encorpado e robusto, um vinho com tanta força que vai rompendo sem piedade os odres desgastados e rachados. É o vinho novo que exige reformular a vida cristã e a Igreja.
Segundo o evangelista João, Jesus realizou “sinais” para dar a conhecer o mistério de sua pessoa e para convidar os seus seguidores e seguidoras a acolherem a força salvadora que Ele trazia consigo.
Insistimos em pôr vinho novo em odres velhos. Esse é o drama da Igreja – Adroaldo Palaoro
Qual foi o primeiro “sinal”? O que primeiramente devemos encontrar em Jesus?
O evangelista fala de uma “boda em Caná da Galileia”, uma pequena aldeia de montanha, a 15 km de Nazaré. No entanto, a cena tem um caráter claramente simbólico. Nem a esposa ou o esposo tem rosto: não falam, nem atuam. O mais importante é um “convidado” especial que se chama Jesus.
Na Galileia, as festas de casamento eram as mais esperadas e desejadas entre os camponeses. Durante vários dias, familiares e amigos acompanhavam os noivos, comendo e bebendo com eles, bailando danças de casamento e cantando canções de amor.
O vinho era indispensável em um casamento. Para aquelas pessoas, o vinho era o símbolo mais expressivo do amor e da alegria. Já dizia a tradição judaica: “o vinho alegra o coração”. A noiva cantava para seu amado um lindo canto de amor: “Teus amores são melhores que o vinho”.
O início do relato joanino apresenta Jesus sendo apenas um convidado; como anônimo, Ele vem de fora, não pertence por si mesmo ao espaço do casamento. Ele e seus discípulos parecem formar um mundo à parte, estão como que de passagem. Logicamente, não se preocupam com as questões da organização da festa, ao menos no primeiro momento. Esta é a surpresa da cena: Jesus vem como por casualidade e, no entanto, logo atua como responsável verdadeiro diante das velhas e das novas “bodas” da terra.
Neste contexto, tornam-se centrais as relações entre a mãe (que é sinal da humanidade anterior, ou seja, do judaísmo da lei, da esperança messiânica) e Jesus (que será o iniciador das novas bodas do Vinho do Reino).
A mãe é a mulher que introduz a nova páscoa de Jesus. Ela marca a diferença entre as antigas e as novas bodas, a passagem da água ao vinho. É a mulher de dois mundos, dois tempos, duas bodas.
Parece que ninguém tinha descoberto a carência de vinho. Só a Mãe de Jesus notou a falta e se moveu a buscar uma solução para um problema que parecia sem saída.
De imediato, a mãe de Jesus lhe avisou: “eles não têm mais vinho”. Como vão continuar cantando e bailando? Que significa um casamento sem alegria e sem amor? O que se pode celebrar com o coração triste e vazio de amor?
No pátio da casa havia “seis talhas de pedra”. Eram enormes. Estavam colocadas ali, de maneira fixa. Nelas se guardava a água para as purificações. Representavam a piedade religiosa daqueles camponeses que procuravam viver “puros” diante de Deus.
A Mãe de Jesus conhece e compartilha por dentro os problemas e preocupações dos homens e mulheres que não conseguem saborear o verdadeiro matrimônio da vida – Adroaldo Palaoro
A Mãe de Jesus é, por um lado, uma mulher do mundo antigo: pertence ao espaço das velhas bodas; conhece e compartilha por dentro os problemas e preocupações dos homens e mulheres que não conseguem saborear o verdadeiro matrimônio da vida. Ela se encontra no lugar onde a alegria deveria se manifestar: não é luto de morte, mas fonte de vinho, isto é, de esperança criadora, de Bodas de Deus. É mulher da vida prazerosa: está a serviço gratuito da festa. Seu desejo verdadeiro é o banquete (quer que os homens e mulheres bebam, dancem, vivam), não o ritual das purificações e abluções.
Nesse sentido, a Mãe de Jesus é mulher do mundo novo, mulher de bodas: ela sabe que há um vinho de “bodas” diferentes, sabe que já chegou quem pode proporcioná-lo. Por isso, ela não se contém: a impaciência do novo Reino de Deus pulsa no centro de sua vida e procura expressá-la.
Assim, aproxima-se e diz a Jesus, de maneira sóbria e reverente: “eles não têm mais vinho!”.
Jesus que, num primeiro momento, parecia ter-se distanciado de sua mãe (“Mulher, porque dizes isto a mim?”), cumpre logo, de maneira diferente e por sua própria vontade, o que ela lhe pediu; e faz isso de maneira transbordante, muito mais que aquilo que ela lhe pedira. Oferece vinho abundante e de excelente qualidade aos convidados das “bodas”. Dessa forma realiza e transborda o desejo mais profundo de Maria.
Sua intervenção vai introduzir amor e alegria naquela religião. Este é seu primeiro “sinal”.
O evangelho indicado para este domingo nos revela esta grande notícia: Deus se manifesta em todos os acontecimentos que nos convidam a viver com mais sentido e prazer. Deus não quer que renunciemos a nada do que é verdadeiramente humano; Ele quer que vivamos o divino naquilo que é cotidiano e normal. A ideia do sofrimento e da mortificação como exigência divina é ante evangélica.
A mensagem para nós hoje é muito simples, mas demolidor. Nem ritos, nem abluções podem purificar o ser humano. Só quando ele saboreia o vinho-amor, no encontro e na comunhão com o outro, ficará ele todo limpo e purificado. Quando descobrirmos Deus dentro de nós e nos outros, seremos capazes de viver a imensa alegria que nasce da unidade-amor. Que ninguém nos engane: o melhor vinho está sem estourar, escondido na adega de nosso interior.
“Eles não têm mais vinho!”
Esta é uma das expressões mais fortes do NT e do conjunto da Bíblia. Em primeiro lugar, ela é proferida pela Mãe ao seu Filho, mas logo podemos e devemos aplicá-la a diferentes situações de nossa vida. São palavras que, quando escutadas, têm profundas ressonâncias em nós, sobretudo quando estamos comprometidos na nobre missão de “despertar o sabor da vida”.
O evangelho indicado para este domingo nos revela esta grande notícia: Deus se manifesta em todos os acontecimentos que nos convidam a viver com mais sentido e prazer – Adroaldo Palaoro
Precisamente ali onde podemos nos sentir satisfeitos, ali onde pensamos que as coisas se encontram já resolvidas, tudo em ordem, se eleva com mais força a voz da Mãe de Jesus dizendo: “Eles não têm mais liberdade, estão cativos!” “Não têm mais saúde, estão enfermos!” “Não tem mais pão, estão famintos!” Não tem mais família, estão abandonados!” “Não tem paz, encontram-se deprimidos, em guerras sem fim!” ...
Já não podemos mais responder como Jesus em um primeiro momento: “que importa a mim e a ti? Não é nossa hora!” Sabemos que, em Jesus e por Jesus, chegou a hora da Mãe que nos mostra as necessidades de seus filhos, os humanos sofredores. Sobre um mundo onde falta o vinho das bodas da liberdade/amor/justiça, sobre um mundo que sofre a opressão e o forte vazio da vida, sobre um mundo onde continua acontecendo guerras, ódios, intolerâncias..., a voz da Mãe de Jesus ressoa como uma recordação ativa das necessidades das pessoas; por isso, é princípio de forte compromisso.
Para meditar na oração:
Como podemos pretender seguir a Jesus sem cuidar mais da alegria e do amor entre nós? O que pode ser mais importante que isto na Igreja e no mundo? Até quando poderemos conservar em “talhas de pedra” uma fé triste e enfadonha? Para que servem nossos esforços, se não somos capazes de introduzir amor e alegria em nossa religião?
Nada pode ser mais triste do que dizer de uma comunidade cristã: “eles não têm mais vinho!”.
- Sua presença na comunidade cristã desperta o sabor do bom vinho da vida e da amizade?
Hoje celebramos a festa da nossa mãe, Nossa Senhora Aparecida, e o lema deste ano é: Com Maria Mãe da Esperança, conhecer Jesus e cuidar da vida. Há vários dias, em diferentes lugares do país, começaram novenas, peregrinações, caminhadas, onde se manifesta a fé e o amor do povo agradecido a Nossa Senhora Aparecida, que deixa em suas mãos suas súplicas, sua fé, sua esperança. São diferentes formas de reconhecer a presença amorosa de Maria que se manifesta na vida do povo brasileiro em geral. Neste domingo, pedimos de maneira especial que ela seja Mãe da Esperança, que nos ajude a conhecer Jesus e a cuidar da vida.
Neste domingo, a liturgia medita sobre a presença de Maria em um banquete de casamento em Caná, que inicia o ciclo dos sete sinais narrados no Evangelho. Diz o texto: “Naquele tempo, houve um casamento em Caná da Galileia. A mãe de Jesus estava presente”. Não sabemos quem são os noivos, mas o importante é que se celebra um casamento, símbolo do amor entre duas pessoas e, biblicamente, símbolo do amor entre Deus e seu povo, como é narrado em diferentes passagens do Antigo Testamento, especialmente através das profecias de Oséias. A Aliança de Deus com seu povo era representada como um casamento, uma união esponsal.
Há vários dias, em diferentes lugares do país, começaram novenas, peregrinações, caminhadas, onde se manifesta a fé e o amor do povo agradecido a Nossa Senhora Aparecida, que deixa em suas mãos suas súplicas, sua fé, sua esperança. São diferentes formas de reconhecer a presença amorosa de Maria que se manifesta na vida do povo brasileiro – Ana Maria Casarotti
Durante uma celebração de casamento, Maria, mãe de Jesus, está presente. Ela intervém nesse momento para trazer alegria e festa, ajudando a transformar a falta de vinho em alegria desbordante. Sua presença é importante porque ela é quem “conduz” até Jesus. O casamento acontece e Maria está lá, junto com Jesus e seus discípulos. Chama a atenção essa presença silenciosa, mas firme, de Maria: ela está lá, não está apenas como uma visitante qualquer, mas seu papel é destacado pelo texto, que mostra como ela participa ativamente do evento. É uma presença que se destaca de forma intencional, ela está como quem “habita” esse espaço festivo e, dessa forma, participa desse banquete.
Jesus e os discípulos também foram convidados a participar desse casamento que se celebra em Caná da Galileia. “Como o vinho veio a faltar, a mãe de Jesus lhe disse: "Eles não têm mais vinho". Ao estar no casamento, Maria percebe que falta o vinho da festa. Como dizia o Papa Francisco, comentando este texto do Evangelho de João: “Jesus começa seus sinais e ‘manifesta-se como esposo do Povo de Deus e nos une a ele com uma nova aliança de amor, que nós, sua família, temos que cuidar e estender a todos’. Maria avisa Jesus de que falta o vinho, este é um elemento típico do banquete messiânico e simboliza a abundância do banquete e a alegria da festa”, acrescentou. “Uma festa na qual falta vinho, os recém-casados se envergonham disso. Imaginem vocês terminar uma festa de casamento bebendo chá”. Texto completo: “Uma festa sem vinho não é festa”, diz Papa Francisco".
O vinho é um símbolo de celebração e alegria, sendo o resultado de um processo longo que envolve várias etapas e o trabalho de pessoas. Vamos pensar nas diferentes fases produção do vinho: primeiro, plantar e cuidar das vinhas; depois, chega a época da colheita, conhecida como vindima. Após isso, ocorre a separação dos grãos de uva dos engaços, chamada de desengace. Em seguida, vem a moagem ou esmagamento para extrair o mosto, seguido pela maceração e fermentação, que transformam o açúcar em álcool. Depois, o vinho é colocado em barris para estabilizar, antes de passar pelo engarrafamento. Todo esse processo exige trabalho em equipe, atenção especial e cuidado em cada etapa, pois todas são essenciais para chegar ao vinho final.
Chama a atenção essa presença silenciosa, mas firme, de Maria – Ana Maria Casarotti
Nos evangelhos, Jesus faz referência à videira, aos sarmentos, ao cuidado da vinha, à colheita como necessidade fundamental para obter um vinho de qualidade, e também fala da necessidade de odres novos para um vinho novo, para que a fermentação não rompa o odre velho! Vemos assim que o vinho e todo o processo que envolve sua elaboração é uma realidade próxima a Jesus e àqueles que recebem suas palavras. Eles sabem reconhecer um bom vinho e conhecem o longo processo de elaboração que está por trás dele. Podemos dizer que é um longo trabalho em “equipe”, com um objetivo bem claro e definido.
O vinho é sinônimo de alegria e não pode faltar em uma festa de casamento. Nas núpcias o vinho é servido em abundância e junto com o trigo e o óleo constitui um dos três víveres essenciais da vida humana (Dt 7, 13; 11,14). Maria percebe que não é possível que a festa continue, ela se dá conta de que é preciso uma intervenção de seu filho e confia nele.
Maria está lá e toma a iniciativa para que a festa continue. Ela é uma presença silenciosa até o momento em que percebe que a festa deixará de ser festa. Ela dialoga com Jesus, “dizendo-lhe” que não há mais vinho. É como um convite para se apresentar publicamente, quase como se dissesse: é preciso agir e, de alguma forma, ela introduz a hora messiânica de Jesus, trai-o para as bodas para que a alegria não se perca e diz aos que estão servindo: "Fazei o que ele vos disser". No meio daquele casamento que estava ficando sem vinho, Maria, a mãe de Jesus, intervém, “aparece” para indicar quem eles devem seguir e obedecer.
Maria nos convida a nos enxergar como parte de uma Igreja em movimento, onde cada um age de acordo com as palavras de Jesus, e assim todo o grupo pode experimentar a maravilha de ver a água se transformar em vinho! – Ana Maria Casarotti
A história deste domingo, embora cheia de símbolos, não conta exatamente como Jesus transformou a água em vinho. Em vez disso, ela mostra uma sequência de atitudes: as pessoas que obedecem às palavras de Maria e depois às de Jesus — enchendo os jarros com água e levando-os ao mestre-sala que depois de “experimentar a água que se tinha transformado em vinho” sem saber “de onde vinha”, comenta ao noivo que deixou o melhor vinho para o final. Em esta narrativa esse é um momento principal, aquele em que quem conhece vinhos consegue reconhecer o mais especial. A narrativa descreve as ações que acontecem até o momento em que o mestre-sala percebe a qualidade do vinho e informa ao noivo.
Neste domingo em que celebramos Nossa Senhora Aparecida, somos convidados a reconhecer sua voz que “aparece” em nossas vidas e comunidades para nos dizer “façam o que Ele lhes disser”. E ela nos convida a nos enxergar como parte de uma Igreja em movimento, onde cada um age de acordo com as palavras de Jesus, e assim todo o grupo pode experimentar a maravilha de ver a água se transformar em vinho!
Somos assim uma Igreja peregrina que, junto com Maria, Mãe da Esperança, conhecemos Jesus e cuidamos da vida!
O evangelho a ser refletido na liturgia deste domingo é tradicionalmente conhecido como “as bodas de Caná”. Essa narrativa leva-nos a perguntar sobre o papel da religião, da vivência da aliança entre Deus e as pessoas. A função da religião é petrificar o coração humano ou é gerar novas criaturas no amor de Deus?
De corações empedernidos...
No texto, há vários elementos que revelam a antiga aliança, que foi aprisionada pela religião oficial.
O primeiro é a referência a um casamento. Em Israel, o casamento, desde o profeta Oséias, é uma imagem da aliança de Deus com o seu povo. Portanto, a narrativa nos conduz para dentro da aliança.
Um segundo elemento é a ausência de vinho. “Eles não têm mais vinho”. O amor, representado pelo vinho, e que a aliança deveria revelar, já não existe mais. As estruturas mataram o amor, o petrificaram. Aqui, “eles” é uma referência às autoridades religiosas que transformaram a lei, que deveria gerar vida e liberdade no amor, em um peso para o povo, em um ritualismo vazio de água, vazio de vida e de sentido.
Um terceiro elemento, que revela uma religião que entorta as pessoas em vez de levantá-las, é a referência aos tanques. “Havia ali seis talhas de pedra para a purificação dos judeus, cada uma contendo mais ou menos cem litros”. O simbolismo é muito forte. Elas representam a prática oficial da religião de Jesus, pois serviam para a “purificação dos judeus”. São seis justamente para mostrar a diferença em relação aos sete dias da criação, quando Deus viu que tudo era muito bom. Seis revela incompletude, imperfeição. Nas talhas, não há água. O ritualismo vazio de sentido e de amor transforma qualquer religião em pedra. Eram “seis talhas de pedra”. E uma religião empedernida, petrifica os corações dos seus fiéis em vez de torná-los sempre mais humanos, mais de carne, na linguagem do profeta Ezequiel (Ezequiel 36,26). Além de a antiga aliança ter sido esvaziada do amor de Deus, além de ter se tornado pedra, ela ainda é muito pesada, sufocando as pessoas e toda comunidade. Engessa-a com seu ritualismo desligado da vida e com suas normas mais voltadas para o moralismo individualista. Numa instituição que endurece corações, até é possível encontrar água. Porém, não é mais possível encontrar amor, simbolizado pelo vinho. O vinho aparece somente fora das talhas e não dentro delas.
Por fim, mais um elemento da narrativa representa a antiga aliança. É o mestre-sala que representa a instituição que não contém mais vinho. Por ter transformado a antiga aliança, que deveria gerar vida, em uma estrutura a petrificar mentes e corações, ele não está aberto para a nova aliança, para a novidade do amor de Deus vivido por Jesus em sua plenitude. Ele não aceita a novidade. A lei lhe basta. Por isso, ele recusa a novidade da nova aliança.
... a corações recriados...
Temos também vários sinais que apontam para a nova aliança que vem recriar a vida.
Iniciemos com a referência ao “terceiro dia”, que indica para duas novidades. A primeira é para a criação da vida em sete dias (Gênesis 1,1-2,4). Convém notar que, neste evangelho, o 1º sinal acontece no sétimo dia. Tendo presente as informações de João 1,29.35.43 e 2,1, as bodas em Caná da Galileia acontecem justamente no sétimo dia da criação, o sábado. Com isso, os autores deste evangelho nos apresentam Jesus como aquele que vem fazer de nós criaturas novas, com base no vinho do amor e não mais nas talhas da lei, cuja letra obscurece o amor. A segunda novidade é que o terceiro dia lembra a vida nova de Jesus no terceiro dia depois da cruz. É a vida em plenitude que derrota as forças de morte e diz sim à vida. A vida ressurge no jardim e recria o novo homem ressurgido da morte, a fim de que participemos de sua vida pelo batismo como pessoas recriadas, como novas criaturas conduzidas pelo amor.
O segundo elemento é a presença da mãe de Jesus nesse casamento. A celebração do casamento revela duas alianças. A primeira é a aliança “deles”, dos judeus que, neste evangelho, são as autoridades judaicas que, por não terem mais vinho, perseguiram Jesus. É interessante perceber que a mãe de Jesus estava com um pé nesta aliança. Ela “estava lá”.
No entanto, ela também estava com um pé na nova aliança, representando o resto fiel da antiga aliança. Ela percebeu a falta de vinho. Buscava o sentido que a religião petrificada havia matado na antiga aliança. Se o mediador da antiga aliança no Sinai foi o homem Moisés, agora, na nova aliança, quem faz a mediação é uma mulher. No texto, ela não tem nome. É que ela é mais que a mãe de Jesus. Representa também a comunidade da nova aliança. Nesse sentido, é a noiva desse casamento. Jesus é o noivo dessa aliança. Em mais. A mãe de Jesus, por ser a noiva da nova aliança, é a amada que segue no amor o seu amado, tal como os jovens enamorados do livro de Cântico dos Cânticos.
Um terceiro elemento é o nome do lugar. Não é por acaso que as comunidades joaninas escolheram Caná como nome para o lugar da festa do casamento. É que Caná significa adquirir. Naquela sociedade patriarcal, o noivo adquiria, pelo dote, a sua noiva. Dessa forma, Jesus adquiriu para si as comunidades que fazem tudo o que ele disse. As comunidades fiéis ao seu amor pertencem a Jesus e por ele se tornam a nova criação gerando, promovendo e defendendo a vida.
Uma quarta questão é que, diferentemente de sua mãe, Jesus com os discípulos não estavam lá. Foram “covidados”, vieram de fora. Como judeu, Jesus entrou na história de seu povo. Mas deixou claro que não está comprometido com a instituição petrificada que fez da lei um peso para o povo. Por isso, quando sua mãe percebeu a falta de vinho na antiga aliança, diz que ela e Jesus mesmo não têm mais nada a ver com essa aliança. “Que tenho eu e tu com isso?” (João 2,4). Em outras palavras, Jesus diz que ele e o resto fiel da antiga aliança não têm nada a ver com o ritualismo que não promove mais amor e vida.
Um quinto elemento é que a água se transforma em vinho fora das talhas. As estruturas envelhecidas não permitem mais a mudança. Ao contrário, dificultam-na e até a impedem, perseguindo quem busca o novo. A novidade, a mudança está lá onde estão os serventes da festa, lá junto aos que, muitas vezes, não são percebidos nos banquetes. Nem lhes é permitido comer as migalhas que caem das mesas que eles servem. Ali, junto às pessoas excluídas, Jesus revelou o amor de Deus. Tal como na aliança do passado, quando Deus fizera aliança com pessoas escravas do faraó, agora libertas, da mesma forma, na fidelidade de Jesus, mais uma vez Deus revela seu amor pleno a toda a humanidade, e preferencialmente aos pequeninos.
Por fim, a nova aliança em Jesus de Nazaré manifesta a “glória”, isto é, a presença plena do amor de Deus. Em Jesus, Deus se tornou palpável. Porém, o ponto alto do amor fiel de Deus foi revelado na fidelidade de Jesus até a cruz. Por isso, nas bodas de Caná, a sua “hora ainda não chegara”. Virá mais tarde, na cruz imposta pelos príncipes deste mundo (1Cor 2,8). O seu amor sem limites, a sua fidelidade aos pobres, à missão de promover a vida com dignidade revela a glória de Deus, isto é, a sua presença amorosa em nosso meio.
... para uma missão movida pelo amor
E como nós revelamos a glória de Deus em nossas vidas? Fazer parte da nova aliança, como novas criaturas, é servir como os diáconos, os servidores a quem a mãe de Jesus disse: “Fazei tudo o que ele vos disser”.
Fazer tudo o que Jesus nos pediu é acreditar como os discípulos que nele creram. Crer é abrir-se à Palavra que se tornou humano, é acolher o seu amor e corresponder com ele como pessoas recriadas no serviço à vida.
Ildo Bohn Gass é biblista, assessor do CEBI e autor de diversos livros.
Introdução geral
Celebrar a festa de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, padroeira do Brasil, significa contemplar aquela que soube orientar sua vida na fidelidade ao projeto de Deus, defendendo e promovendo a vida do povo sofredor. O seu protagonismo está explicitado nas três leituras da liturgia de hoje. A primeira apresenta Ester. Atenta à difícil situação na qual se encontrava o povo, com sua originalidade e ousadia, ela se propõe ser mediadora eficaz para salvá-lo da opressão e da morte. O Evangelho de João revela que o primeiro sinal público de Jesus foi realizado com a mediação de Maria, atenta às necessidades dos convidados de uma festa de casamento. O livro do Apocalipse apresenta a mulher como geradora de vida nova num contexto de perseguição violenta. A mulher, nos textos de hoje, retrata a comunidade de fé que se mobiliza a favor do povo em situação de necessidade, proporcionando-lhe condições de vida com paz e alegria. Tudo a ver com a celebração de Nossa Senhora Aparecida, a nossa Mãe negra, que apareceu a pobres pescadores em 1717 num contexto de escravidão dos negros. O povo brasileiro guarda-lhe profunda veneração. A solidariedade de Maria com as pessoas necessitadas e excluídas é importante indicativo para todos os que desejam caminhar na vida como discípulos e missionários de Jesus.
Comentário dos textos bíblicos
1. I leitura (Est 5,1b-2; 7,2b-3): A mulher que salvou um povo
O livro de Ester, em sua forma atual, situa-se pelo II século a.C. Os judeus encontram-se sob o domínio grego. Os autores, porém, fazem uso de personagens da época da dominação persa (538-333 a.C.), como Assuero (ou Xerxes), rei da Pérsia no séc. V a.C. Na verdade, o livro é uma novela bíblica que reflete a situação do povo judeu num contexto de opressão estrangeira. A identidade da nação judaica está sob ameaça de destruição. Sabemos que a influência da ideologia grega no interior do judaísmo foi grande e provocou resistências radicais, até com métodos violentos como o da guerrilha dos macabeus. Também provocou grande dispersão de judeus para fora da Palestina, obrigados a conviver num mundo com valores estranhos à sua tradição de fé.
A história de Ester atualiza a proposta do Êxodo. O povo oprimido pode mudar a história. Existem caminhos de libertação que precisam ser abertos com inteligência e organização. Deus age por meio das pessoas aparentemente fracas. Ester é uma das mulheres que, ao longo da história de Israel, foram protagonistas de movimentos populares capazes de transformação social: as parteiras do Egito, Míriam, Débora, Judite… Leve-se em conta que, na época da redação do livro de Ester, as mulheres eram oficialmente excluídas de qualquer instância decisória. Pertenciam à categoria das pessoas impuras, conforme estabelecia o sistema sacerdotal de pureza. No entanto, por essas pessoas, Deus suscita projetos de vida e salvação para o povo.
Ester, fazendo uso de seus atributos femininos, com sabedoria e coragem, toma a iniciativa de enfrentar o poder que mata. O que a move não são interesses pessoais, mas a libertação do povo. Sua estratégia demonstra maturidade e consciência. Mesmo após conquistar a simpatia e a confiança do rei, a ponto de tornar-se rainha, não se deixa arrastar pelas tentativas de cooptação da parte de quem domina. Não aceita a oferta de riquezas; pelo contrário, usa agora de seu poder para garantir a vida de seu povo. Ester encarna a liderança que não trai o seu povo. Doa-se por inteiro e arrisca a vida para salvá-lo.
2. Evangelho (Jo 2,1-11): A mulher da nova aliança
O relato das bodas de Caná constitui uma releitura da aliança que Deus realizou com o povo de Israel. O compromisso de amor mútuo foi rompido por sucessivas infidelidades por parte de Israel, desde a opção pela monarquia até a organização do sistema sacerdotal de pureza. Não é por acaso que, logo após as bodas de Caná, Jesus se dirige ao Templo, onde, profeticamente, denuncia a exploração ali instalada e anuncia um novo Templo, que é ele próprio.
Na festa de casamento, Jesus é apresentado como o esposo da nova humanidade. O sistema judaico, organizado segundo os interesses de uma elite religiosa, esvaziou o sentido da antiga aliança; já não respondia ao amor de Deus. A imposição de um legalismo excludente criou imenso vazio no coração do povo. Os seis potes vazios representam as festas judaicas (o Evangelho de João apresenta seis delas), que deveriam ser expressão de plena alegria pela presença amorosa e salvadora de Deus. No entanto, estão vazias, perderam o verdadeiro conteúdo que saciaria a sede que o povo tem de Deus.
A comunidade de João manifesta sua fé em Jesus como Deus-esposo que vem resgatar (Caná significa “adquirir”) sua esposa e oferecer-lhe o vinho do amor e da alegria. Essa festa de casamento, portanto, é a celebração da nova aliança. A esposa é o novo povo de Deus, formado pelas comunidades cristãs. A esposa é representada pela mãe de Jesus. Por isso Jesus se dirige a ela chamando-a de “mulher”. Ela executa um papel muito especial: percebe que naquela festa falta o essencial. Dirige-se a Jesus, pois sabe que dele vem a solução: “Eles não têm mais vinho”. Jesus lhe responde que sua hora ainda não chegou. O texto supõe que aquela mãe-mulher-comunidade entendeu perfeitamente e, por isso, confia em Jesus: “Fazei tudo o que ele disser”. Na cena seguinte, vemos Jesus-esposo dizendo de modo imperativo aos que serviam: “Enchei os potes de água”, e depois: “Tirai e levai ao mestre-sala”. Este provou sem saber de onde viera o melhor vinho. Porém, “os que serviam estavam sabendo”. O vinho em abundância simboliza o dom do amor de Deus para a humanidade. É a volta da plena alegria oferecida por Deus, que celebra com seu povo a aliança definitiva.
João faz questão de dizer que “esse foi o princípio dos sinais… e os discípulos acreditaram nele”. Até a “hora de Jesus” – o momento de sua morte e glorificação –, vários outros sinais serão por ele realizados. O tema da aliança contemplado no primeiro sinal serve como chave de interpretação para todos os demais. No final do evangelho, João vai dizer: “Esses sinais foram escritos para que vocês acreditem que Jesus é o Messias, o Filho de Deus. E para que, acreditando, vocês tenham a vida em seu nome” (20,31). Nesse mesmo evangelho, Jesus declarou: “Eu vim para que todos tenham vida e vida em abundância” (10,10).
A mãe de Jesus, que aparece nas bodas de Caná como representante do novo povo de Deus, indica como podemos ser fiéis à aliança com Deus: permanecendo atentos às necessidades do povo, contando com a graça de Jesus presente no meio de nós e pondo-nos a serviço do seu projeto de vida em abundância para todos.
3. II leitura (Ap 12,1.5.13a.15-16a): A mulher geradora de vida nova
O capítulo 12 do Apocalipse apresenta a situação de sofrimento pela qual passam as comunidades cristãs no final do século I, sob a opressão do imperador Domiciano. A mulher e o dragão representam dois projetos antagônicos: o de Jesus com as comunidades cristãs e o do império romano. Percebe-se aqui uma evocação do texto de Gênesis: “Porei hostilidade entre ti e a mulher, entre tua descendência e a descendência dela. Ela te esmagará a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar” (3,15).
A mulher é descrita como “um grandioso sinal no céu, vestida com o sol, tendo a lua sob os seus pés e, sobre a cabeça, uma coroa de doze estrelas”. São símbolos com profundo significado. A mulher aparece no céu, irradiando a gloriosa luz divina, revestida de grande poder cósmico. A coroa de doze estrelas tem relação com as tribos de Israel e o novo povo de Deus nascido da fé em Jesus Cristo. A mulher também representa Maria, a mãe de Jesus, o verdadeiro rei de toda a humanidade que subiu ao céu e está junto do trono de Deus.
O dragão é a antiga serpente, isto é, aquele que introduz o mal e a morte no mundo. Persegue a mulher e procura matá-la. O vômito do dragão atrás da mulher, tentando afogá-la, é o império romano, que, com força e poder, faz submergir todo o povo com sua ideologia. Não admite outros projetos. Por isso persegue especialmente os seguidores de Jesus. A terra, porém, engole o vômito do dragão, salvando a mulher. É a própria história que “engole” os impérios. Eles não são eternos; não são absolutos. Dentro de si carregam o germe da própria destruição.
A mulher, portanto, representa os pequeninos e fracos pelos quais Deus se manifesta ao mundo, oferecendo vida e salvação. Maria de Nazaré gerou o Filho de Deus, nosso salvador. As comunidades cristãs, seguidoras de Jesus, têm a missão de gerar vida e dignidade no mundo. Essa missão contrapõe-se aos projetos de morte impostos pelos poderosos. A mulher que, na fé e confiança em Deus, vence o dragão é símbolo de todas as pessoas empenhadas na defesa e promoção da vida contra todo tipo de opressão e exclusão.
III. Pistas para reflexão
– Maria-mulher-mãe-esposa promotora da vida. Os textos bíblicos que a Igreja apresenta nessa liturgia especial em homenagem a Nossa Senhora Aparecida revelam o protagonismo da mulher na defesa e promoção da vida do povo. Contra toda submissão e passividade diante dos sistemas que oprimem, as mulheres se posicionam, agindo em favor das vítimas do poder e abrindo caminhos de libertação. Elas representam as comunidades cristãs e todas as pessoas de boa vontade que se entregam pela causa da justiça, da fraternidade e da paz no mundo contra toda opressão, mentira, corrupção… É oportuno refletir sobre os projetos antagônicos no Brasil, caracterizando a ação do “dragão” e da “mulher” hoje.
– Deus se revela aos pequeninos e age por meio deles… Nossa Senhora apareceu em 1717 a humildes pescadores, num tempo de escravidão dos negros. Solidária com os escravos, ela assumiu sua cor, sua dor e sua causa. Mãe de Deus, nossa mãe e companheira de caminhada, Maria continua indicando a missão que devemos assumir para que não venha a faltar o vinho do amor, do pão e da plena alegria a todas as famílias brasileiras: “Fazei tudo o que ele vos disser”. O que esse apelo de Nossa Senhora significa para nossas comunidades eclesiais?
Celso Loraschi
Mestre em Teologia Dogmática com Concentração em Estudos Bíblicos pela Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, São Paulo, professor de Evangelhos Sinóticos e Atos dos Apóstolos na Faculdade Católica de Santa Catarina (Facasc) e assessor do Cebi, SC. E-mail: loraschi@facasc.edu.br
Neste dia de Nossa Senhora Aparecida, festa da Padroeira do Brasil, o evangelho descreve a festa das bodas de Canã da Galiléia. A mãe de Jesus estava na festa, Jesus e seus amigos também foram convidados. Tem festas que a gente guarda na memória. Parece que, com o passar dos anos, elas tomam um sentido mais profundo... A festa das bodas de Canã cresceu na memória do povo de ontem e de hoje. Vamos meditar
Jo. 2,1-2: Três dias depois houve um casamento em Caná da Galiléia, e aí estava a mãe de Jesus. Também Jesus foi convidado para o casamento, junto com seus discípulos.
No Evangelho de João, o início da vida pública de Jesus acontece numa festa de casamento, que é sempre um momento de muita alegria e de muita esperança. Por isso mesmo, o casamento de Caná tem um sentido simbólico muito forte.
Na Bíblia, a festa de casamento era um símbolo do amor de Deus para com seu povo. Foi o profeta Oséias (cerca de 750 a.C.) quem, pela primeira vez, apresentou a esperança deste casamento quando conta sua parábola da infidelidade do povo diante das propostas de Javé. “Eu me casarei com você para sempre. Eu me casarei com você na justiça e no direito, no amor e na ternura. Eu me casarei com você na fidelidade, e você conhecerá Javé”. (Os. 2,21-22)
Jo. 2,3-5: Faltou vinho, e a mãe de Jesus lhe disse: “Eles não tem mais vinho!” Jesus respondeu: “Mulher, que temos a ver com isso? Minha hora ainda não chegou”. A mãe de Jesus disse aos que estavam servindo: “Façam tudo o que ele disser”.
Apesar de não ser chamada pelo nome, a mãe de Jesus aparece duas vezes no Evangelho de João: no começo, nas bodas, e no fim, ao pé da cruz (Jo. 19,25-27). Nos dois casos ela representa o Antigo Testamento que aguarda a chegada do Novo e, nos dois casos contribui para que o Novo chegue. Maria é o elo entre o que havia antes e o que virá depois.
Na festa de casamento em Caná da Galiléia, é ela, a mãe de Jesus, símbolo do Antigo Testamento, que percebe os limites do Antigo, e dá os passos para que o Novo possa chegar.
Jo. 2,6-8: Tinham sido deixados aí seis jarros de pedra, com cerca de cem litros cada um, e que serviam para as purificações que os judeus costumavam fazer. Jesus disse aos que serviam: “Encham esses jarros com água”. Eles os encheram até a borda. Depois Jesus disse: “Agora tirem e levem ao chefe da cerimônia”. Eles assim o fizeram.
A recomendação da Mãe de Jesus aos empregados é o último grande recado do Antigo Testamento: “Façam tudo o que ele lhes disser!” O Antigo Testamento aponta para Jesus. Daqui pra frente, são as palavras e gestos de Jesus que vão dar rumo à vida. Quanta gente dos nossos dias justifica seus atos incoerentes com o Antigo Testamento!
Jesus chama os empregados e manda encher de água os seis potes vazios. Em seguida, manda tirar e levar ao mordomo. As iniciativas de Maria e de Jesus acontecem sem consentimento dos donos da festa. Nem Jesus, nem sua mãe, nem os empregados eram os donos. Nenhum deles foi pedir licença aos donos da festa. A renovação passa por pessoas que não pertencem ao centro do poder!
Jo. 2, 9-10: Quando o chefe provou da água transformada em vinho, sem saber de onde vinha (os serventes sabiam), chamou o noivo e disse: “Qualquer um serve primeiro o vinho bom e, quando os convidados já estão embriagados, aí serve o menos bom.Você, porém, guardou o vinho bom até agora”.
O simbolismo da água tornada vinho é muito importante. Os jarros era água para purificação. Com essa história o evangelista quer mostrar que doravante os ritos de purificação estão superados, pois a verdadeira purificação vem através de Jesus.
Podemos entender isso como mudança de uma prática religiosa baseada no medo do pecado, uma prática que excluía muita gente considerada impura, para uma nova relação entre Deus e a humanidade, a partir de Jesus.
Jo. 2, 11: Este foi o princípio dos sinais, e Jesus o fez em Caná da Galileia. Manifestou a sua glória, e seus discípulos acreditaram nele.
Este é o primeiro sinal. No evangelho de João, o primeiro sinal acontece para reconstrução da família, da comunidade, para refazer as relações básicas entre as pessoas. Os discípulos acreditaram nele porque a fé não era somente intelectual ou teórica, mas no seguimento concreto do Mestre, na formação de novos relacionamentos de amor.
Passo por passo o autor do evangelho vai revelando Jesus através de sinais para que nós possamos “acreditar que Jesus é o Messias, o Filho de Deus. E para que, acreditando, tenhamos a vida em seu nome” (Jo. 20,31)
Que na festa da Mãe Aparecida aprendamos cada vez mais o seu recado: “Fazei tudo o que Ele vos disser”.
NÃO TEMOS O TEXTO DE DOM DAMIÁN NANNINI POR ELE SER DA ARGENTINA, EM QUE SE CELEBRA O 28º DOMINGO DO TEMPO COMUM.