12/01/2025
Primeira Leitura: Isaías 42,1-4.6-7
Salmo Responsorial 28(29) R- Que o Senhor abençoe, com a paz, o seu povo.
Segunda Leitura: Atos 10,34-38
Evangelho: Lucas 3,15-16.21-22
15.Ora, como o povo estivesse na expectativa, e como todos perguntassem em seus corações se talvez João fosse o Cristo, 16.ele tomou a palavra, dizendo a todos: “Eu vos batizo na água, mas eis que vem outro mais poderoso do que eu, a quem não sou digno de lhe desatar a correia das sandálias; ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo."
"21.Quando todo o povo ia sendo batizado, também Jesus o foi. E estando ele a orar, o céu se abriu 22.e o Espírito Santo desceu sobre ele em forma corpórea, como uma pomba; e veio do céu uma voz: “Tu és o meu Filho bem-amado; em ti ponho minha afeição”.
Lc 3,15-16.21-22
O Evangelho de hoje fala de dois batismos: o batismo que Jesus recebe e o batismo que Jesus promete. Com efeito, um é o batismo que Jesus recebe, outro é o batismo que nós recebemos. Do primeiro fala-se como um evento histórico: “No décimo quinto ano do império de Tibério César, sendo Pôncio Pilatos governador da Judeia; Herodes, tetrarca da Galileia; seu irmão Filipe, tetrarca da Itureia e da Traconítide; e Lisâneas, tetrarca de Abilene; sob o sumo sacerdócio de Anás e Caifás” (Lc 3,1-2). Do segundo, se fala do futuro, como uma promessa: “Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo”.
O batismo que Jesus recebe é ainda o batismo velho, com água, de João Batista, mas o fato de que desceu sobre Ele o Espírito Santo em forma de pomba fez daquele batismo um batismo novo, o primeiro batismo no Espírito Santo! E não só o primeiro, mas o modelo e a fonte de todo batismo posterior.
No Jordão não foi a água que purificou e santificou Jesus. Foi Jesus que purificou e santificou a água, todas as águas! Cada batismo cristão só prolonga o mistério daquele dia: o Espírito Santo desce sobre uma criatura humana e a torna filho predileto no qual o Pai se compraz. Também para nós aconteceu da mesma forma como aconteceu com Jesus.
Mas o que sabemos desse grandioso evento que é o batismo? O batismo continua sendo para muitos de nós como um presente que foi recebido, mas permanece embrulhado no papel. Temos o pacote, mas não o abrimos nem conhecemos o presente que está dentro dele. Por não conhecer o conteúdo do pacote, desconhecemos a sua riqueza e preciosidade. Nós somos ricos e não sabemos disso! E por isso não agradecemos a Deus pelo grande presente que nos foi dado.
Somos filhos amados de Deus e não o sabemos. Vivemos como se fôssemos escravos ou empregados na casa do Pai (nunca me destes sequer um cabrito!). Somos filhos, mas não conseguimos ouvir a voz dulcíssima do Pai que nos fala: “Tu és o meu filho amado, em ti eu me agrado”.
Na festa de hoje, devemos abrir decididamente o pacote do nosso presente e contemplar o que está dentro. Hoje é dia propício para agradecer e louvar ao Pai por tão grande dom do batismo. Tomando consciência do nosso tesouro e o acolhendo na fé, todos os dons de Deus se tornam operantes e nós somos iluminados pelo Espírito Santo!
O batismo que recebemos não é batismo com água, mas batismo com o Espírito Santo. Ora, o Espírito não escorre e desaparece como a água, mas permanece em nós e em nós habita como num templo. Reavivando a consciência desse dom, o Espírito como que reaviva a chama do amor que estava recoberta pela cinza.
O nosso batismo é novo nascimento. O nascimento natural é somente um dado recebido passivamente de outros. ninguém de nós escolheu nascer: nós fomos gerados e trazido para esta vida sem nosso consentimento. Mas para renascer no batismo é preciso escolher. O próprio renascimento é uma escolha. É por isso que hoje é um dia oportuno para fazer a renovação das promessas do batismo.
O batismo não é um ato fechado, aprisionado naquele dia distante de nossa infância. O batismo é, pelo contrário, uma inauguração de um novo ser e de um mundo novo. Ele é o primeiro momento de um processo que dura a vida toda até o momento final em que nós acabaremos de nascer para Deus. Jesus chamou a sua morte de “seu batismo”. Em comunhão com Ele, a nossa morte será o momento vocacional por excelência, será o momento em aparecerá claramente e sem véus o que agora somos de modo escondido, isto é, filhos de Deus.
Nós não somos filhos de Deus já formados, mas o batismo iniciou esse processo de nos tornar filhos de Deus. Nesta vida, estamos como que em gestação. Ainda não nascemos plenamente, mas o batismo já iniciou nossa gestação para Deus. O batismo deu início a esse dinamismo maravilhoso de nossa filiação divina. Por isso é preciso que nos esforcemos em ser o que já somos em mistério e o que seremos um dia na plenitude da luz. Não podemos nos contentar em permanecer no estado infantil, como raquíticos espirituais, como não nascidos.
Nós só nos tornaremos filhos de Deus maduros se todos os dias nós aceitarmos Jesus e nos esforçarmos seriamente em crescer na vida cristã. Só nos tornaremos filhos de Deus plenamente formados se fizermos a fé nosso elemento vital, o critério de julgamento, o motivo das nossas escolhas. Assim fazendo seremos semelhantes ao Filho Jesus e viremos a luz.
“Quando todo o povo estava sendo batizado, Jesus também recebeu o batismo” (Lc 3,21)
Terminado o “tempo natalino”, começamos o tempo litúrgico conhecido como “tempo comum” (Ano C), ou seja, a vida pública de Jesus, sua missão como Filho em favor dos filhos. Toda a liturgia deste ano (2025) deve estar iluminada pelo tema do “Ano Jubilar: Peregrinos de esperança”.
O relato do batismo – que marca a passagem da vida em Nazaré para a vida peregrina – faz referência a uma experiência fundante de Jesus: confirmado pelo Pai, impulsionado pelo Espírito, Ele descobre o sentido de sua vida e a missão que devia realizar.
Com o seu Batismo, Jesus “começa algo novo”, um movimento de vida, fora das estruturas religiosas de seu tempo. É a primeira coisa que os evangelistas deixam claro. Todo o anterior pertence ao passado. Jesus é o começo de um caminho novo e, com uma presença inconfundível, reacende a esperança nas pessoas, sobretudo naquelas mais excluídas.
O relato do evangelho deste domingo afirma que Jesus deixou Nazaré, sua casa e sua comunidade, e se dirigiu para as margens do Jordão, onde fora batizado por João. Começa sua vida itinerante.
A estrada é a vida e a missão de Jesus, enviado para revelar o rosto misericordioso de Deus à humanidade. A sua estrada é marcada pela solidariedade e cuidado para com os mais excluídos e sofridos.
Ele é o “autor” da estrada; Ele é a estrada do cumprimento da vontade de amor e de salvação do Pai; Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida. Essa estrada deverá ser a mesma também dos discípulos, a do seguimento, a que conduz à plena bem-aventurança. Um Caminho que faz viver e realiza a comunhão em plenitude.
Com os itinerantes Jesus dá início a um movimento a serviço do Reino e Ele mesmo é um itinerante. Não permanece numa casa, não se fecha em um lugar, não fundou uma instituição vinculada a um tipo de templo, sinagoga ou santuário, mas percorre, com um grupo de discípulos(as)/amigos(as), também itinerantes, os povoados e aldeias da Galileia, anunciando e realizando o Reinado do Pai.
Ele é o inspirador de toda itinerância; com sua peregrinação Ele abre possibilidade de outros caminhos. Ele convoca a todos a um seguimento que está profundamente conectado com o seu próprio destino.
“Fazer caminho” não significa apenas deslocamento geográfico. As travessias nunca são apenas exteriores. Não é simplesmente na cartografia do mundo que o ser humano anda. Isso significa não perceber a profundeza do seu ser; “deslocar-se”, querendo ou não, implica uma mudança de posição, uma expansão do próprio olhar, uma abertura ao novo, uma alteração do ângulo habitual, uma adaptação a realidades, tempos e linguagens, um encontro com o diferente, um diálogo inspirador ou deslumbrado, que deixa necessariamente impressões muito profundas.
Seguir Jesus Cristo é aderir a Ele incondicionalmente, é “entrar” no seu caminho, recriá-lo a cada momento e percorrê-lo até o fim. Seguir é deixar-se “configurar”, isto é, movimento pelo qual cada um vai sendo modelado à imagem d’Ele.
Para entrar em sintonia com o Peregrino, é preciso sair dos lugares estreitos, das posições fechadas, das ideias fixas..., e “fazer estrada” com Ele. Aqui está a verdadeira identidade dos(as) seguidores(as) de Jesus: o(as) “adeptos(as) do caminho”.
De fato, em seus inícios, o cristianismo era conhecido como “o Caminho” (At 18,25-26). Tornar-se cristão não era simplesmente entrar numa nova religião; era encontrar o caminho acertado da vida, caminhando sob as pegadas de Jesus, para viver com sentido e esperança. A fé cristã não era entendida como um “sistema religioso” (leis, ritos, doutrinas, hierarquias...), mas um “caminho novo e vivo” que fora inaugurado por Jesus, um caminho que era percorrido com os olhos fixos n’Ele. Ser cristão significava, para eles, “seguir” a Cristo. Isto era o fundamental, o decisivo.
Por isso, não é estranho que ainda hoje podemos encontrar muitas pessoas que se sentem cristãs simplesmente porque foram batizadas e cumprem alguns deveres religiosos, embora nunca tenham considerado a vida como um seguimento de Jesus Cristo. Este fato, bastante generalizado, seria inimaginável nos primeiros tempos do cristianismo.
Então, qual o sentido do batismo de Jesus? Trata-se de um acontecimento que traz uma mensagem nova e que supera radicalmente o Batista. Os evangelistas cuidaram com esmero desta cena. O céu, que permanecia fechado e impenetrável, se abre para mostrar seu segredo. Ao abrir-se, não descarrega a ira divina que João Batista anunciava, mas revela o amor de Deus, o Espírito, que pousa pacificamente sobre Jesus. Do céu se escuta uma voz: “Tu és o meu Filho amado”.
A alusão aos céus que se abrem definitivamente é a expressão de uma esperança de todo o AT: “Quem dera rasgasses o céu e descesses!” (Is 63,19). A comunicação entre o divino e o humano, que havia ficado interrompida por culpa da infidelidade do povo, é, a partir de agora, possível graças à total fidelidade de Jesus. A distância entre Deus e o ser humano fica superada para sempre. Jesus ouviu a voz dentro de si mesmo e esta lhe deu a garantia absoluta de que Deus estava com Ele para levar a missão a bom termo.
A mensagem é clara: com Jesus Cristo o céu permanece aberto; de Deus só brota amor e paz; podemos viver com confiança. Apesar de nossas limitações e de nossa mediocridade, também para nós “o céu se abre”. Também nós podemos escutar com Jesus a voz do Pai: “tu és para mim um filho amado, uma filha amada”. De agora em diante podemos assumir nossa história de vida como a marca da dignidade de filhos(as) de Deus, e que devemos cuidar com zelo e agradecimento.
Para quem vive a fé no Deus que “rasga os céus e desce”, a vida se revela cheia de momentos de graça: o nascimento de uma criança, o encontro com uma pessoa cheia de bondade, o serviço gratuito, a experiência de um amor oblativo, o cuidado com a criação..., que põem em nossa vida uma luz e um calor novos. De imediato nos parece ver “o céu aberto”. Algo novo começa em nós: sentimo-nos vivos, desperta-se o melhor que há em nosso coração, reacende-se uma nova esperança, novas relações interpessoais são vividas.
Talvez aquilo que sonhávamos secretamente, agora nos é presenteado de forma inesperada: um início novo, uma vida diferente, um “batismo de Espírito”. Por detrás dessas experiências está Deus nos amando como Pai, está seu Amor e seu Espírito, doador de vida.
Recebemos o batismo gratuitamente; talvez, por isso mesmo, não damos o devido valor.
Efetivamente, não fomos consultados para ser batizados, mas tampouco fomos consultados para nascer, nem na família que temos. Tampouco nos pediram opinião para amanhecer em determinado lugar do mapa, nem para ser de uma determinada raça. E, no entanto, tudo isso é decisivo e nos constitui como pessoas.
Por que não damos o devido valor ao nosso batismo? Por que não somos mais humildes e nos coloquemos na fila dos demais? Por que não somos mais agradecidos e, com Jesus, mergulhemos nas águas do Jordão para sermos rebatizados?
Esquecemos que “ser cristão” é “seguir” Jesus Cristo: mover-nos, dar passos, caminhar, construir nossa vida seguindo suas pegadas. Nossa vivência cristã, às vezes, permanece numa fé teórica e inoperante, ou se reduz a uma prática religiosa rotineira, estéril, sem maiores compromissos; não transforma nossa vida em seguimento. “Batiza-nos, Senhor, com teu fogo!”
Para meditar na oração:
Nutramos nosso “ser peregrino” que carregamos dentro de nós! Deixemos que ele se submerja nas águas da vida, para um novo renascimento.
Despertemos a esperança adentrando-nos em “nosso Jordão”! E desfrutemos da paisagem externa, descobrindo assim a paisagem de dentro. Deixemos emergir nosso mapa interior. Contemplemo-lo e agradeçamos... tudo. O bom. O boníssimo e o difícil ou tortuoso. Assim é o caminho da vida.
- Sua vivência batismal se reduz a algumas práticas religiosas egóicas? Ou ela tem a marca de Jesus que, após seu batismo, viveu o compromisso com os pobres e excluídos até a radicalidade?
«Espiritualidade» é uma palavra desafortunada. Para muitos só pode significar algo inútil, afastado da vida real. Para que pode servir? O que interessa é o concreto e prático, o material, não o espiritual.
No entanto, o «espírito» de uma pessoa é algo valorizado na sociedade moderna, pois indica o mais profundo e decisivo da sua vida: a paixão que a anima, a sua inspiração última, o que contagia os outros, o que essa pessoa vai colocando no mundo.
O espírito alenta os nossos projetos e compromissos, configura o nosso horizonte de valores e a nossa esperança. Segundo o nosso espírito, assim será a nossa espiritualidade. E assim será também nossa religião e a nossa vida inteira.
Os textos que nos deixaram os primeiros cristãos mostram-nos que vivem a sua fé em Jesus Cristo como um forte «movimento espiritual». Sentem-se habitados pelo Espírito de Jesus. Só é cristão quem foi batizado com esse Espírito. «O que não tem o Espírito de Cristo não lhe pertence». Animados por esse Espírito, vivem-No todo de forma nova.
O primeiro que muda radicalmente é a sua experiência de Deus. Não vivem já com «espírito de escravos», cansados pelo medo a Deus, mas com «espírito de filhos» que se sentem amados de forma incondicional e sem limites por um Pai. O Espírito de Jesus faz gritar-lhes do fundo do seu coração: Abbá, Pai! Esta experiência é o primeiro que todos deveriam encontrar nas comunidades de Jesus.
Muda também a sua forma de viver a religião. Já não se sentem «prisioneiros da lei», das normas e dos preceitos, mas libertos pelo amor. Agora conhecem o que é viver com «um espírito novo», escutando a chamada do amor e não com «a letra velha», ocupados em cumprir obrigações religiosas. Este é o clima que entre todos temos de cuidar e promover nas comunidades cristãs, se queremos viver como Jesus.
Descobrem também o verdadeiro conteúdo do culto a Deus. O que agrada ao Pai não são os ritos vazios de amor, mas que vivamos «no espírito e na verdade». Essa vida vivida com o espírito de Jesus e da verdade do Seu evangelho é para os cristãos o seu autêntico «culto espiritual».
Não temos de esquecer o que Paulo de Tarso dizia às suas comunidades: «Não apagueis o Espírito». Una igreja apagada, vazia do espírito de Cristo, não pode viver nem comunicar a sua verdadeira Natividade. Não pode saborear nem contagiar a sua Boa Nova. Cuidar da espiritualidade cristã é reavivar a nossa religião.
A liturgia deste final de semana propõe abrir-nos a Deus, da mesma forma como Jesus o fez ao acolher o dom do Espírito enquanto estava em oração logo após o seu batismo.
Em Lucas, a narrativa a respeito do batismo de Jesus vem depois do Evangelho da Infância. Entre as narrativas da infância (Lucas 1-2) e o início da missão de Jesus (Lucas 4,14 em diante), os autores deste Evangelho inserem o relato da preparação do caminho do Senhor feita por João Batista (Lucas 3,1-20) e o relato da preparação de Jesus para sua missão (Lucas 3,21-4,13). Como dobradiça que liga as duas partes, está a narrativa a respeito do batismo de Jesus (Lucas 3,21-22). Temos, assim, um paralelo entre dois batismos: o de João com água e o de Jesus com o Espírito e com o fogo.
João aponta para o Messias
A comunidade de Lucas faz questão de situar historicamente o início da atividade de João (Lucas 3,1-2). Do ponto de vista político, foi no tempo de Tibério, imperador romano de 14 a 37 d.C., e de Herodes Antipas, governador da Galileia desde 4 a.C. até 39 d.C. Do ponto de vista religioso, foi na administração do sumo sacerdote Caifás (sumo pontífice no templo de 18 a 36 d.C.), genro de Anás (6-15 d.C.), nomeado sumo sacerdote por Herodes Antipas em nome do imperador.
Por um lado, João denuncia profeticamente o reino da opressão representado por Tibério e por Herodes, em aliança com o templo de Jerusalém. Diante de tanto sofrimento, o povo esperava ansiosamente a vinda de um libertador. João Batista faz fortes críticas aos poderosos, anunciando um juízo severo para eles (Lucas 3,17). Por isso, o povo começou a ver em João a esperança da vinda do messias, o rei ungido por Deus que viria para libertar o seu povo.
Por outro lado, João anuncia a vinda do Reino de Deus para breve (Lucas 3,9.17), chamando à conversão, à mudança de mentalidade e de vida, convocando à partilha e à vivência de relações fraternas (Lucas 3,11-14). Em consequência dessa prática profética, ele foi preso e encarcerado pelos poderosos de seu tempo (Lucas 3,19-20). Assim, João cumpriu sua missão como profeta que faz a ponte entre a Aliança de Deus com Israel e a Aliança em Jesus com toda humanidade.
Para Lucas, a tarefa de João é fazer com que as pessoas se convertam e se abram ao Reino de Deus presente no novo agir de Jesus. Lucas o apresenta mostrando para Jesus. João não é o Messias, o Cristo, o Ungido. Seu batismo era somente com água, sinal de purificação e de conversão para acolher Jesus de Nazaré, mais forte do que João. Sua atitude é de estar a serviço, menor ainda que os servos, de quem também era tarefa desatar as sandálias de seus senhores.
As sandálias também lembram a lei do levirato (Deuteronômio 25,5-10). Segundo esta lei, quando um marido morria sem deixar filhos, um parente próximo devia assumir a viúva para gerar um herdeiro para o falecido. Assim, além de dar continuidade à vida do falecido, resgatava sua terra, de modo que ela permanecesse no clã. Quando o parente mais próximo se negava a assumir a tarefa do resgate para seu irmão falecido, outro parente devia cumprir a lei. Era então que o parente mais próximo dava uma de suas sandálias ao novo resgatador, o novo "noivo". Era o sinal que este passava a ter o direito de resgate, de gerar descendência para o falecido. Ao não desatar a correia das sandálias de Jesus, João reconhece nele o resgatador, o messias libertador de todas as formas de opressão. João é o último representante da Antiga Aliança. Jesus, porém, é o noivo da Nova Aliança.
O Messias assume a sua missão
Jesus é batizado com água junto ao povo, em meio ao povo. Em seu batismo, Jesus é investido para a sua missão, guiado pelo Espírito de Deus. É somente Lucas quem faz referência à atitude orante de Jesus no seu batismo. E é esta atitude de intimidade de Jesus com o Pai que faz com que o Espírito o transforme e o envie para evangelizar os pobres (Lucas 4,18-19). Também para nós Jesus pediu que tivéssemos essa atitude orante durante a vida toda, abrindo-nos ao Espírito de Deus. Ele é fruto da oração, da acolhida, é dom (Lucas 11,13).
João batiza Jesus com água. No entanto, Jesus batiza com o Espírito e com o fogo. Por isso, o seu batismo é superior ao de João. É no Espírito Santo, representado pelo fogo de Pentecostes (Lucas 3,15-16; Atos 2,1-13). Neste Evangelho, ainda antes do batismo de Jesus, há uma ênfase muito grande na apresentação de pessoas abertas à ação do Espírito Santo. Lembramos João Batista, Maria, Zacarias e Simeão (Lucas 1,15.41.67; 2,26-27). E o fogo recorda a presença de Deus no êxodo, na libertação do povo oprimido pelo sistema faraônico (Êxodo 3,2-3; 13,21; 19,18). É o mesmo fogo de Pentecostes, o dinamismo do Espírito, que entusiasma os discípulos e as discípulas de Jesus para o anúncio e a vivência da boa-nova até os confins da terra (Atos 1,8; 2,1-13).
Uma vez preso João, Jesus dá um novo rumo à sua missão. Diferentemente do Precursor, que anuncia a vinda do Reino de Deus para breve e como um juízo severo, Jesus vive o Reino já presente no seu jeito de se relacionar especialmente com as pessoas mais discriminadas, revelando a misericórdia do Pai (Lucas 7,22; 11,20; 17,20-21).
Lucas apresenta o batismo de Jesus depois da prisão de João como o ato em que o Espírito de Deus vem confirmar o Nazareno enquanto Messias, ungindo-o para a missão do serviço, da mesma forma como fora ungido o servo de Deus em Isaías 42,1 e 61,1. Nesse momento, Jesus estava em oração, isto é, em íntima comunhão com a fonte da vida, com o projeto do Reino. Tão íntima é essa comunhão que, em Jesus, Deus e a humanidade se encontram. Esse é o significado da abertura do céu (Lucas 3,21), realizando a esperança do povo (Isaías 63,19b). Em Jesus, céu e terra estão tão próximos que é possível perceber a presença materializada ("em forma corpórea") do Espírito de Deus nas atitudes de Jesus. Se em Gênesis 8,8-11 a pomba foi a mensageira da vida recriada depois de submersa pelas águas do dilúvio, agora a presença da pomba anuncia que o Espírito de Deus impulsiona Jesus a realizar a nova criação, mulheres e homens recriados a partir das águas do batismo. No batismo, morremos com Cristo e ressuscitamos com ele para uma vida nova (Romanos 6,1-14). Viver como pessoa renovada e ressuscitada é, portanto, missão de todos nós.
Ao lembrar a entronização do rei que vem libertar o povo (Salmo 2,7: "Tu és o meu filho"), a comunidade de Lucas apresenta Jesus como o verdadeiro Rei e Messias, que veio governar com justiça e no serviço ao povo. Por isso, lembra também a missão do servo em Isaías 42,1 ("em ti está o meu agrado"). No batismo de Jesus, temos uma epifania, ou seja, uma manifestação do filho de Deus ao mundo, gerado como o messias que vem libertar o povo.
No batismo, Jesus assume publicamente o seu compromisso com as novas relações do Reino de Deus já presente em seu agir. Batizar-se em seu nome, na linguagem paulina, é revestir-se de Cristo, ou seja, é agir como o próprio Cristo agia, superando todas as formas de discriminação (Gálatas 3,27-28).
*Ildo Bohn Gass é biblista, assessor do CEBI e autor de diversos livros, dentre eles a coleção Uma Indrodução à Bíblia, Quatro retratos do apóstolo Paulo e O Pão nosso de cada dia dá-nos hoje.
É com esta festa que encerramos o tempo do Natal. A Palavra de Deus que nos é dirigida nos traz ricos elementos de reflexão.
A primeira leitura nos traz um texto de Is 42, 1-4.6.7, que pertence ao primeiro dos quatro cânticos do Servo.
Este texto escolhido na celebração do Batismo do Senhor coloca-nos na revelação da pessoa de Jesus Cristo e da sua Missão. Ele é o Filho de Deus a quem o Pai apresentou, consagrou e ungiu com o Espírito Santo.
“Eis o meu servo”. Em primeiro plano, não está claro se é uma personalidade individual (um rei de Judá, o profeta, ou o messias), ou uma coletividade (todo o povo de Israel ou parte dele), ou um indivíduo como símbolo de todo povo. O texto anuncia um misterioso “Servo”, escolhido por Deus, que seria enviado aos homens, para instaurar um mundo de paz sem fim.
Esse “Servo” é nosso Senhor Jesus Cristo, que veio para concretizar a vontade de Deus Pai, na missão salvífica de todo ser humano. Jesus realiza-a na humildade e simplicidade, não recorrendo ao seu poder divino. O seu estilo é de profunda mansidão, paz, comunhão com Deus e com todos por quem se faz doação e construção de um mundo novo e livre. O seu agir é de benção, de oferta de vida e de plena humanidade.
O salmo responsorial (Sl 28/20, 1ª.2.3ac-4.3b.9b-10) nos mostra que o Senhor desceas águas para nos fazer ressurgir pessoas novas, transformar a nossa vida. “O Senhor abençoará seu povo na paz”.
A segunda leitura (At 10,34-38) nos fala do anúncio proclamado por Pedro para os companheiros pagãos do centurião Cornélio (At 10,34-43). Pedro anuncia a missão de Jesus como Messias e Filho de Deus a partir de seu batismo por João. Por meio de Cristo, o Pai restabelece o reinado da justiça, que os apóstolos e os mártires, com a Igreja testemunham. Deus não faz distinção de pessoas, nação, raça ou cor, mas todos são chamados a fazerem parte do seu Reino, na prática da justiça e do temor do Senhor.
Esse evento é de suma importância, pois significa a investidura de Jesus para sua missão messiânica. Jesus é o Messias, o “ungido” com o Espírito Santo.
No Evangelho de hoje (Lc 3,15-16.21-22), o Senhor traz como boa notícia o batismo do Senhor, revelando para nós quem é Jesus, o que Ele fez, quem são os seus seguidores, quem são chamados a realizar na sociedade, o compromisso com Deus na construção de um mundo justo e igualitário. É preciso vivê-lo no compromisso com o Evangelho, como verdadeiros cristãos, em prol da Igreja e dos irmãos, que padecem injustiças, e não conhecem Jesus.
O batismo por João era o batismo de conversão, provavelmente um rito de iniciação à comunidade messiânica. João era a última testemunha do tempo da antiga aliança. O batismo de Jesus por João marca o começo de um novo tempo, o tempo em que Deus vem ao mundo feito gente, trazendo vida e salvação para a humanidade. João estava batizando o povo no Rio Jordão, para preparar o povo, a chegada do Messias. Ele anunciava: “Depois de mim virá alguém mais forte que eu.”(Lc 16) “E eu nem sou digno de desamarrar as suas sandálias”. Jesus Cristo é o ungido, das promessas de Deus, que chegou, apresentado como o “forte” por João Batista.
Toda esta narrativa é um convite para reconhecer quem é Jesus e para avaliar o valor do batismo, semelhante ao de Jesus, mas diferente do de João.
A celebração de hoje deve fazer-nos vivenciar e comprometer com o nosso batismo. Pois pelo batismo fomos “enxertados” em Cristo e com Ele somos identificados como sacerdotes, profetas e reis. O batismo é uma realidade dinâmica. Ele cria relações intensas e dinamismos vitais com Deus e com os irmãos.
Além de mergulharmos na comunhão trinitária, mergulhamos na comunhão com toda a igreja e com a humanidade inteira. E impele-nos a prosseguirmos um caminho comprometido com o projeto de Jesus Cristo: Caminho, Verdade e Vida.
No batismo, Jesus inicia oficialmente sua missão. Ele reza e é confirmado pelo Espírito Santo e pelo Pai. Isso quer dizer nele se realiza a vontade do Pai. Jesus, pela oração, sintoniza-se com o Pai e sua missão se inicia. O povo pode confiar, pois ele agrada ao Pai. Na primeira leitura, Is 40,1-5.9-11 aponta para uma grande novidade. O povo que estava no Exílio é consolado e vai voltar para sua pátria. Deus já perdoou seu pecado.
Como pastor, carinhosamente cuida de seu rebanho. Deus agraciou seu povo. O profeta, de forma poética, descreve a volta de forma pitoresca: os vales serão aterrados. A ação de Deus a favor dos pecadores sofridos é pura graça. A segunda leitura (Tt 2,11-14; 3,4-7) mostra que esse agraciamento de Deus ao seu povo se plenificou na pessoa de Jesus. Não foi mérito dos discípulos, mas pura misericórdia dele, dando o banho da regeneração e o Espírito Santo.
Em Cristo, o povo é agraciado, como outrora o povo na volta do Exílio. No evangelho (Lc 3,15-16.21-22) se ilustram as expectativas messiânicas do povo. Lucas, valendo-se do pano de fundo do AT, esclarece que João não é o Messias esperado, mas que ele aponta para o verdadeiro realizador da nova aliança. Em Dt 25,5ss se fala da lei do levirato (o homem que não quer assumir como sua mulher a cunhada viúva de seu irmão, terá a sandália tirada).
Jesus, o que está por vir, não renuncia ao direito de ser o esposo da nova aliança; por isso, João não pode desamarrar a sandália (Dt 25,9). Ele vai batizar com o Espírito Santo e com fogo (cf. Is 4,4; Jr 4,11-12). Em outras palavras, o realizador das esperanças messiânicas é Jesus, não João. O batismo de Jesus, na versão de Lc 3,21-22, difere um pouco da de Mt 3,13-17 e de Mc 1,9-11. Não se narra o diálogo de Jesus e de João. Jesus está anônimo entre o povo. Ele se esvaziou e assumiu a vida do povo (Fl 2,6-11). O testemunho que recebe do Pai e do Espírito confirma sua missão. O Espírito em forma de pomba lembra a esperança do fim do dilúvio (Gn 8,12) e o amor (Ct 2,10).
Muita gente desconhece a grandeza e a dignidade que o batismo lhe conferiu. O batismo de Jesus no Jordão revela sua identidade e sua missão. Ele é o servo de Deus, o Senhor de todos, o Filho amado do Pai. O sacramento do Batismo também revela nossa identidade e nossa missão de cristãos. Em nosso batismo, celebramos o grande amor do Senhor Jesus que se entregou em nosso favor, alcançando-nos o perdão dos pecados por sua morte redentora. Pelo derramamento do Espírito, no batismo, o Senhor nos faz novas criaturas, filhos e filhas de Deus. Nós somos servos de Deus, cidadãos do Reino, filhos amados do Pai. No batismo, nasce nossa responsabilidade na missão de Cristo e da Igreja.
De qualquer forma, a pessoa que recebe o batismo, a exemplo de Jesus, recebe o Espírito Santo e é vocacionada pelo Pai para a missão. Ninguém deve receber o batismo por tradição ou por qualquer outro motivo. Batismo é inserção na comunidade de fé. Batismo é o início da missão de Jesus, é também o início da missão dos discípulos.
O que acontece no Rio Jordão?
O que significam as palavras: “Este é o meu Filho amado; nele está o meu agrado”.
(Traduzido automaticamente pelo Tradutor Google sem nossa correção)
FESTA DO BATISMO DO SENHOR - CICLO C
Primeira leitura (Is 40,1-5,9-11)
Dentro do livro de Isaías temos os capítulos 40 a 55 que são atribuídos a um profeta do exílio que se chama Segundo Isaías e que é, sem dúvida, o profeta do amanhecer, do despertar após a longa noite de exílio na Babilônia (51,17; 52,1)1. Foi precisamente a missão deste profeta anunciar aos exilados uma mensagem de consolação porque Deus considera que o povo já cumpriu o castigo pelos seus pecados e, portanto, decidiu devolvê-los à terra de Judá (Is 40,1-2).
“Conforte meu povo”(Is 40, 1) é a frase que abre o livro e que será repetida à medida que verificação da ação divina (“eO Senhor consola..." em É 51, 12; 52, 9). A consolação não se esgota nas palavras, é nas próprias obras do Senhor. A consolação é reconciliação e perdão, manifestação da misericórdia de Deus. Trata-se da consolação do povo exilado, mas também da consolação de Jerusalém que voltará a brilhar para receber os exilados que a ela regressarem. A justiça divina que puniu o pecado de Israel com o exílio foi cumprida e agora é superada pela sua misericórdia que oferece uma nova possibilidade que permite o regresso dos deportados a Jerusalém.
Para este profeta eO tempo do exílio é considerado uma purificação, um cadinho onde o povo, como a prata, foi purificado. (48,9-10). Vale ressaltar que a mensagem deste profeta está tão centrada na ação de Deus que quem vai retornar à terra é sobretudo o próprio Senhor, presidindo e encerrando a procissão dos deportados: “Uma voz proclama: Prepare o caminho do Senhor no deserto, abra um caminho para o nosso Deus na estepe!” (É 40,3).
A sua mensagem é antes de tudo uma Boa Nova ou evangelho (a LXX expressa-o com o verbo euaggelizw) porque ao povo que estava exilado na Babilônia (sem terra, sem autogoverno, sem adoração, sentindo-se abandonado até por Deus) o profeta anuncia que Deus vem com poder para resgatá-los (Is 40:9-10). A ação salvadora de Deus é comparada com o cuidado de um pastor com suas ovelhas: “Como um pastor, ele apascenta o seu rebanho, ajunta-o com o braço; “Ele carrega os cordeiros no peito e orienta cuidadosamente aqueles que deram à luz.” (É 40,11).
Evangelho (Lucas 3:15-16, 21-22):
O texto do evangelho que nos oferece a liturgia da Palavra apresenta duas perícopes juntas: a primeira corresponde ao final da pregação de João Batista (3,15-16); e a segunda é propriamente a narrativa lucana do batismo de Jesus (3:21-22).
Com relação aos dois primeiros versículos podemos dizer que o fim da pregação do Batista está claramente orientado para Jesus e procura diferenciar e subordinar o batismo e a figura de João ao batismo cristão e à figura de Cristo (Messias). Seu propósito é corrigir as expectativas errôneas das pessoas sobre o Messias, já que João declara abertamente que não é o messias e que este virá atrás dele. A este respeito, L. H. Rivas comenta2: "No final da sua missão, João Baptista reconheceu-se inferior a Jesus, dizendo que não era digno nem de desamarrar a tira das sandálias. Antigamente, essa tarefa era considerada tão humilhante que só era executada por escravos. Recorrendo a esta figura, o Baptista diz que diante de Jesus é tão inferior que se sente menos escravo diante do seu senhor. Esta diferença responde à função que cada um cumpre: Juan Bautista batizar, isto é imergir apenas na água. Mas Jesus é quem tem o poder de batizar (imergir) no Espírito Santo, dando vida divina a todos os que nele crêem (1:16; Atos 2:38-39)".
A ação do Messias que João anuncia ao futuro – “ele os batizará com o Espírito Santo e com fogo”- Será realizada por Jesus ressuscitado quando enviar o Espírito Santo no Pentecostes (cf. Hb 2,33). Posteriormente, este Espírito será dado no batismo realizado pelos apóstolos, um batismo que, como o de João, é também para a conversão dos pecados, mas que, ao contrário disso, concede o que João só poderia anunciar para o futuro (Hb 2,38). ).
Quanto à narração do batismo de Jesus, recordemos que em Lucas ela tem uma importância particular porque com ela começa o “tempo de Jesus”, que vai até a Ascensão (cf. Lc 24,51; Hb 1,9-11). ). É o tempo do cumprimento de promessas e profecias. É o tempo da misericórdia.
No evangelho de Lucas, uma vez que Jesus aparece, o Baptista desaparece, razão pela qual narra a sua prisão antes do baptismo (cf. Lucas 3,19-20 em comparação com Mc 6,17-29 e Mt 14,3-12). onde, por outro lado, o nome de João Batista é silenciado. Além disso, depois do batismo, Lucas coloca a genealogia de Jesus (cf. Lucas 3,23-38), que em Mateus está no início do seu evangelho.
A descrição do batismo de Jesus, como em Mc 1:9, é muito breve, o que indica que este fato não é o mais importante, mas teofania isso segue. Além disso, como dissemos, Lucas nem sequer menciona o nome de João Batista, ele apenas diz que "Quando todo o povo foi batizado, Jesus também foi batizado” (3:21).
Outra peculiaridade de Lucas é que a manifestação do Espírito ocorre enquanto Jesus está orando; e foi então que o “céu se abriu”. Esta abertura ou rasgamento dos céus poderia serhá uma referência a Is 63,19: “Eu gostaria que você rasgasse o céu e descesse”; dado que no contexto desta súplica Deus é chamado Pai (cf. Is 63,16; 64,7) e o Espírito é mencionado três vezes (cf. Is 63,10.11.14). Assim, este apelo do profeta para que Deus rompa o seu silêncio e se manifeste também vê o seu cumprimento em Jesus. E podemos ver aqui o cumprimento do que foi dito por Is 61,1 que o Messias seria aquele ungido pelo Espírito: “O espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu". A unção profética de Jesus e a sua missão messiânica são aqui evidentes (cf. Lc 4, 15-22).
O Espírito de Deus é claramente invisível; mas Lucas especifica aqui que ela assumiu a “forma corporal” de uma pomba quando desceu sobre Jesus. Não é fácil precisar o porquê da imagem da pomba, mas é certamente frequente nas Escrituras (cf. Gn 1,2; 8,8; Is 38,14; Os 7,11; Sl 55,7). Possivelmente diferentes textos foram unidos para dar origem a este valor simbólico da pomba. Entre todas as possibilidades, parece-nos importante a referência a Gn 1,2, onde diz que o Espírito de Deus “vibrou”. Daí surgiria a relação simbólica do Espírito com um pássaro.
A voz do céu não pode ser outra senão a voz de Deus, do Pai. E a voz do Pai dirige-se diretamente a Jesus, a quem reconhece como seu Filho amado: “Você é meu filho muito querido, em quem tenho toda a minha predileção" (3,22). Alusões ao Sl 2,7 como investidura real e messiânica são geralmente reconhecidas nesta expressão ("Proclamarei o decreto do Senhor: Ele me disse: “Tu és meu filho, hoje te gerei"); e a Is 42,1 que fala do Servo sofredor como amado e objeto de prazer da parte de Deus ("Este é o meu Servo, a quem sustento, o meu escolhido, em quem a minha alma se compraz. "Coloquei meu espírito sobre ele para trazer justiça às nações."), com a qual a figura de Jesus se funde com a do Servo de Javé.
O título filho de deus É um título messiânico segundo o oráculo de Natã (cf. 2Sm 7,14; Sl 2,7; 89,27-28). Mas a voz do céu mais do que conferir uma missão como em Sl 2:7, nos revela o relacionamento estável que une Jesus a Deus.
Em suma, no batismo o Pai nos revela a identidade de Jesus como Filho de Deus.
Algumas reflexões:
A festa do Batismo do Senhor encerra o tempo do Natal e, por isso, deve ser entendida e celebrada em continuidade com a solenidade do nascimento de Jesus. É precisamente no sacramento do Baptismo onde se realiza a “troca admirável” celebrada no Natal: o Verbo de Deus, que ao manifestar-se na realidade da nossa carne se tornou semelhante a nós por fora, transforma-nos interiormente – diz o segundo coleção de festa-; Jesus entrando na água, Ele queria lavar os pecados do mundo -diz a oração sobre as ofertas- e fomos feitos filhos adotivos pela água e pelo Espírito Santo3. De fato, “No Batismo, Deus entra em nós, purifica, cura os nossos corações, torna-nos seus filhos para sempre, seu povo, sua família, herdeiros do Paraíso (cf. Catecismo da Igreja Católica, n.1279). E Deus se torna íntimo de nós e não sai mais” (Papa Francisco, Angelus de 7 de janeiro de 2024).
A continuidade com o Natal deve referir-se também à mensagem da Palavra de Deus. Na missa do dia de Natal ouvimos o testemunho do evangelho de João: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós" (Jo 1,18). O Verbo Eterno do Pai assumiu a condição humana e veio habitar em nosso mundo. Com esta obra de amor infinito Deus cumpriu e superou o que havia anunciado ao seu povo Israel: Jesus é a Palavra pessoal do Pai, ele é o Filho de Deus. Isto é solenemente declarado pelo Pai que, através da sua voz celestial, nos testemunha a identidade de Jesus: é Seu Filho amado. Aqui ele supera tudo o que Israel esperava porque não é um homem simples a quem Deus considera seu filho pelo amor que tem por ele, como seria o caso de Davi e seus descendentes. Ele é o Filho eterno do Pai feito homem.
João Batista havia anunciado que aquele que vier depois dele batizará com o Espírito, pois é alguém que será cheio – ungido – do Espírito e o guia na sua missão. Precisamente o prefácio deste festival o proclama assim: “Quisestes expressar, com sinais admiráveis no rio Jordão, o mistério do novo batismo, para que, pela tua voz celestial, se manifestasse que o teu Verbo habitou entre os homens, e, pelo Espírito, que desceu na forma de uma pomba, seria reconhecer que Cristo, seu servo, foi ungido com o óleo da alegria e enviado para evangelizar os pobres".
A teofania que se segue ao batismo liga-nos, de certa forma, ao mesmo Mistério da Santíssima Trindade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. As Três Pessoas divinas estão presentes aqui. A relação da pessoa de Jesus como Filho com o Pai e o Espírito é eterna, mas desde a Encarnação entrou no tempo e se manifesta no tempo agora incluindo a humanidade de Jesus. No Natal, juntamente com o Menino Jesus, vimos a sua Mãe e São José, a sua família humana. Hoje nos é revelada a sua Família Trinitária, o Pai e o Espírito em comunhão com o Filho feito homem em Jesus.
Finalmente, o dia do Batismo do Senhor, que encerra o tempo do Natal, lembra não apenas o batismo de Jesus, mas também o batismo do cristão. Assim como sublinhamos a importância de reviver em nós mesmos o nascimento do Senhor como parte essencial do mistério do Natal celebrado na liturgia; por isso também somos convidados a reviver o nosso próprio batismo na festa do batismo do Senhor.
Nós, ao sermos batizados, recebemos a filiação adotiva pela qual o Pai nos ama como seus filhos em seu Filho Jesus; e Ele se agrada de nós como se agradou Dele. Trata-se da vida dos Filhos de Deus que. "Foi-nos transmitida no dia do Baptismo, quando «participando na morte e ressurreição de Cristo» começou para nós «a alegre e emocionante aventura do discípulo» (Bento XVI, Homilia na festa do Batismo do Senhor, 10 de janeiro de 2010).
Uma das contribuições do próprio Lucas é nos mostrar Jesus orando quando é batizado: “Todas as pessoas foram batizadas, e Jesus também foi batizado. E enquanto eu estava orando, o céu se abriu” (Lucas 3:21). A este respeito, o Papa Francisco disse no Angelus de 9 de janeiro de 2022: “A oração – para usar uma bela imagem do Evangelho de hoje – “abrir os céus” (cf. v. 21). A oração abre o céu: dá oxigênio à vida, dá trégua mesmo no meio da angústia e faz com que as coisas pareçam mais amplas. Acima de tudo, permite-nos fazer a mesma experiência de Jesus no Jordão: faz-nos sentir filhos amados do Pai. Também a nós, quando rezamos, o Pai diz, como Jesus no Evangelho: “Tu és meu filho, tu és o amado” (cf. v. 22). O nosso ser filhos começou no dia do Batismo, que nos imergiu em Cristo e, como membros do povo de Deus, nos tornou filhos amados do Pai”.
Do ponto de vista litúrgico assinala-se também a importância de unir esta festa com a Epifania: “O Batismo do Senhor é festa de Epifania, isto é, de manifestação. No Oriente, o ícone do Batismo do Senhor, que é um dos ícones de culto bem definidos, é o ícone da Grande Teofania, pois no Batismo é proclamada a divindade de Cristo e, portanto, dá testemunho da Trindade. Na Natividade, Cristo manifesta-se no ambiente humilde de Belém. A Epifania é a manifestação aos gentios. O Batismo é a manifestação da unção de Cristo, a manifestação absoluta da divindade de Cristo na Trindade”4.
No nosso batismo recebemos também o Espírito Santo que nos ungiu como apóstolos e testemunhas de Jesus, como seus discípulos e missionários. Esta unção e consagração batismal deve ser notada, manifestada: somos epifania do Senhor.
PARA ORAÇÃO (RESSONÂNCIAS DO EVANGELHO EM ORAÇÃO):
Filhos no Filho
Oh expectativa mais real e verdadeira
Espere pelo Messias que vem habitar a terra!
Eles perguntaram e comentaram com curiosidade saudável
Os pobres e marginalizados: - A liberdade está próxima!
Juan recebeu todas as pessoas
E o Jordão agitou-se em silêncio
Você sabia reconhecer os passos daquele rio
De quem ele trouxe dentro de si o Único Batismo?
E assim no anonimato humano
O Senhor entrou no rio, como tantos outros...
E o espelho das suas águas refletiu o seu rosto
E chegou ao céu, trespassou o coração do Pai...
Que força poderosa olhar para o Filho
Pronuncie sua afiliação e identidade
Sem salvar mais nada, para uma cidade
Cansado e oprimido pela injustiça e pelo mal!
Meu Pai, Pai Nosso… Oração do Filho Único
Canção do coração de cada homem e de cada criança
Declare sua paternidade sobre nós
Por Sua Graça, faça-nos filhos no Filho. Amém
[1] En general hay aceptación en datar la acción de este profeta al final del exilio, cerca del año 540 a.C. cuando el imperio babilónico comienza a colapsar habiendo surgido los persas capitaneados por Ciro.
[2] La obra de Lucas I. El evangelio (Ágape; Buenos Aires 2012) 47.
[3] Cf. A. Bottoli, "Navidad. Historia. Teología. Espiritualidad. Pastoral", para uso de los estudiantes.