(em 2024 coincidiu com a Imaculada Conceição)
Primeira Leitura: Baruc 5,1-9
Salmo Responsorial: 125(126)R- Maravilhas fez conosco o Senhor, exultemos de alegria!
Segunda Leitura: Filipenses 1,4-6.8-11
Evangelho: Lucas 3,1-6
"1.No ano décimo quinto do reinado do imperador Tibério, sendo Pôncio Pilatos governador da Judeia, Herodes, tetrarca da Galileia, seu irmão Filipe, tetrarca da Itureia e da província de Traconites, e Lisânias, tetrarca da Abilina, 2.sendo sumos sacerdotes Anás e Caifás, veio a palavra do Senhor no deserto a João, filho de Zacarias. 3.Ele percorria toda a região do Jordão, pregando o batismo de arrependimento para a remissão dos pecados, 4.como está escrito no livro das palavras do profeta Isaías (40,3ss): Uma voz clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas. 5.Todo vale será aterrado, e todo monte e outeiro serão arrasados; se tornará direito o que estiver torto, e os caminhos escabrosos serão aplainados. 6.Todo homem verá a salvação de Deus."
A conversão a Deus não é um tema moderno ou na moda. Diante dos problemas da fome, dos refugiados, das guerras, da destruição da natureza, da inflação, as pessoas mobilizam as forças para as mudanças de vida. É uma conversão do homem para si mesmo, mas a conversão a Deus não entra na pauta das mudanças necessárias de nossa vida.
O cristão tem consciência de que deve contribuir para a solução dos problemas atuais, dando o melhor de si mesmo, mas, em tudo isso, onde se encontra a conversão a Deus? Se o cristão perder o senso da conversão a Deus, privará o mundo de um dom divino.
Por isso a pregação de João Batista é tão atual. Converter-se a Deus significa: preparar os caminhos do Senhor, endireitar suas veredas; aterrar o vale; rebaixar toda montanha e colina; endireitar os caminhos tortuosos e aplainar os caminhos acidentados.
A pregação de João Batista no deserto é chamamento à conversão a Deus. Trata-se de não se iludir com práticas religiosas puramente exteriores, mas de conversão do coração. Trata-se de renúncia de toda forma de orgulho e de obedecer a Deus. Trata-se de se encontrar com Cristo e mais concretamente de viver esse encontro na eucaristia. Participar da eucaristia significa fazer tornar-se pão para os outros, como Cristo o é para nós. significa dar a vida para fazer crescer o amor e a justiça, o sorriso e a esperança.
“Esta é a voz daquele que grita no deserto: ‘preparai o caminho do Senhor’” (Lc. 3,4).
Estamos no tempo do Advento, alimentando uma esperança ousada; para isso, é preciso fazer descer ao nível do chão o orgulho de nossos montes elevados, a presunção de nosso ego inflado, a altura de nossa vaidade...
O pano de fundo deste tempo litúrgico é a experiência bíblica do deserto, lugar onde podemos nos sintonizar com Deus, escutar melhor o seu chamado para sermos presenças inspiradoras neste velho mundo.
O pano de fundo deste tempo litúrgico é a experiência bíblica do deserto, lugar onde podemos nos sintonizar com Deus, escutar melhor o seu chamado para sermos presenças inspiradoras neste velho mundo - Adroaldo Palaoro
Deserto passa a ser tempo de purificação e de vida em marcha: somos povo peregrino deixando-nos conduzir somente por Deus. O deserto é território da verdade, o lugar onde vivemos do essencial. Ali não há lugar para o supérfluo; ali não podemos viver acumulando coisas sem necessidade; ali não é possível o luxo nem a ostentação. O decisivo é discernir e buscar o melhor caminho para orientar nossa vida em direção à “Terra Prometida”.
De maneira solene, o Evangelho deste domingo apresenta o início da atividade de João Batista, situando nas coordenadas concretas de tempo e lugar, os acontecimentos que marcarão a história da humanidade. O evangelista Lucas tem interesse em destacar os nomes dos personagens que controlavam, naquele momento, as diferentes esferas do poder político e religioso; são aqueles que planejam e dirigem tudo.
No entanto, o acontecimento decisivo de Jesus Cristo foi preparado e aconteceu fora dos espaços de influência política e religiosa, sem que os poderosos percebessem o que estava acontecendo nas periferias da história. Assim, a Graça e a Salvação de Deus banham a história a partir de baixo, dos últimos. O essencial não está nas mãos dos poderosos; eles que controlam as diferentes esferas do poder político e religioso, aqui não decidem nada.
É nesse contexto que Lucas afirma com toda firmeza que “a Palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto”. Não em Roma, nem no recinto sagrado do Templo de Jerusalém, mas no deserto. João Batista não é um funcionário do Templo, é um profeta. As instituições e o poder não querem profetas em suas fileiras: homens que pensem, que anunciem, deem ânimo ao povo, ou que denunciem as mazelas do poder desumanizador.
Por isso, muitos profetas aspiravam tanto o deserto, símbolo de uma vida mais despojada e melhor enraizada no essencial, uma vida ainda sem estar “distorcida” por tantas infidelidades a Deus e tantas injustiças com o povo. Neste marco do deserto, o Batista anuncia o símbolo grandioso do “batismo”, ponto de partida de conversão, purificação, perdão e início de vida nova.
Voltar ao deserto: esta é a mensagem chave deste segundo domingo do Advento - Adroaldo Palaoro
Voltar ao deserto: esta é a mensagem chave deste segundo domingo do Advento. Trata-se de aprender a simplificar, centrando-nos no essencial, pois só com o essencial podemos viver no deserto, sem adornos falsos, sem complexos de superioridade. Esta é a maior graça que Deus pode nos comunicar: conduzir-nos de novo ao deserto, para simplificar, para dialogar, para partilhar... Voltar ao deserto para renunciar as comodidades falsas, para sermos nós mesmos, esvaziar-nos e assim poder viver simplesmente como humanos. É do deserto que surge uma nova “voz”: desafiante, mobilizadora, que nos traz para o essencial; voz que tem forte ressonância em nosso coração.
Estamos imersos numa confusão de vozes que nos distraem, nos saturam e nos fazem viver na superficialidade. As vozes barulhentas que procedem dos grandes centros de poder e dos meios de comunicação são vozes ocas, estéreis, sem consistência, e que se dispersam no ar. Com isso vamos perdendo a sensibilidade para captar as vozes delicadas que procedem do mais profundo de nós mesmos.
A realidade na qual vivemos clama por vozes corajosas, que despertem a vida, as consciências e apontem para um horizonte de sentido. Estamos saturados de vozes carregadas de morte, de ódio, de intolerância...
O Tempo do Advento é um forte apelo de retorno ao coração. Só a voz que vem “lá das quebradas do deserto” é capaz de sintonizar-se com as tênues vozes que brotam do nosso ser profundo; “Voz divina” que desperta nossas vozes. Só ela é capaz de ativar nosso ser original, mobilizar nossos recursos, desbloquear nossa vida, desencadeando um movimento inovador que nos faz entrar em comunhão com todos e com o Todo.
Estamos imersos numa confusão de vozes que nos distraem, nos saturam e nos fazem viver na superficialidade. (...) O Tempo do Advento é um forte apelo de retorno ao coração - Adroaldo Palaoro
Para ouvir a desafiante voz do Batista é preciso deslocar-nos para o deserto, sair dos espaços fechados e atrofiados. O lugar determina nossa maneira de pensar, de sentir, de amar. A voz que vem dos amplos espaços do deserto tem um impacto rompedor nos nossos espaços rotineiros (físicos, afetivos, psicológicos, sociais, religiosos...); assim, somos impulsionados a sair daquilo que nos dá a sensação de segurança e conforto. Advento não é para acomodados! É para os(as) inquietos(as).
Só o encontro com a “voz” do Precursor pode quebrar o modo arcaico e petrificado de pensar, viver e amar. Só o encontro das duas vozes reacende em nós o desejo de uma transformação contínua. Sabemos que a “voz” não é só expressão de uma interioridade, articulando sentimentos, pensamentos, sonhos...; toda voz particular também carrega em si a dimensão comunitária; a voz de cada um é caixa de ressonância da voz da humanidade.
Nesse sentido, o Advento é um tempo privilegiado para unir nossas vozes, para fazer emergir uma voz solidária, que assume a voz sufocada de tantos sofredores e excluídos. São tantas as vozes travadas nas gargantas de muitos e que não encontram meios para se expressar. Com isso, a “voz” que nos chama à Vida acaba caindo “no deserto”, ou seja, não encontra destinatários, porque nos encontramos dispersos, distraídos em mil ocupações, vivendo na superficialidade.
Somos chamados ao deserto onde a voz da Vida ressoa com mais intensidade, sem ser sufocada pelo “vozerio crônico”. Com sua austeridade e simplicidade, o deserto não é lugar de experiências superficiais.
Advento não é para acomodados! É para os(as) inquietos(as) - Adroaldo Palaoro
A profundidade da identidade de uma pessoa é testada e experimentada no deserto. O deserto é o grande auditório para ouvir Deus; “solidão” cheia de presença. Ainda que sozinhos, sentimo-nos solidários, em comunhão com todos. A proximidade de Deus vai ser sentida e percebida.
Ao tomar distância do estressante ritmo cotidiano, teremos a possibilidade de reconhecer a voz de Deus em nós com outra intensidade e com outra força. Assim, a experiência de deserto passa a ser “tempo e lugar” de decisão, de orientação da vida, de enraizamento de nossos valores, de consciência maior da nossa identidade pessoal e da nossa missão... O mestre do deserto é o silêncio; o deserto tem valor porque revela o silêncio, e o silêncio tem valor porque nos revela Deus e a nós mesmos.
“Preparem o caminho do Senhor, endireitem suas estradas...”
- O que está “torto” em minha vida pessoal, relacional, espiritual... que precisa ser endireitado?
- Quais são os grandes caminhos tortos, presentes na sociedade de hoje, que clamam por minha presença e meu compromisso, para endireitá-los?
- Que caminhos posso ajudar a construir para despertar uma nova esperança nestes tempos tão sombrios? Como endireitar os caminhos para que chegue mais rápido o Reinado de Deus?
Há pessoas que, mais do que acreditarem em Deus, acreditam naqueles que falam dele. Só conhecem Deus por «ouvir falar». Falta-lhes experiência pessoal. Assistem, talvez, a celebrações religiosas, mas nunca abrem seus corações a Deus. Jamais se detêm a perceber a sua presença no interior do seu ser.
É um fenômeno frequente: vivemos girando em torno de nós mesmos, mas fora de nós; trabalhamos e desfrutamos, amamos e sofremos, vivemos e envelhecemos, mas nossa vida passa sem mistério e sem um horizonte final.
Mesmo aqueles que nos dizemos crentes não sabemos muitas vezes «estar ante Deus». Nos é difícil reconhecermo-nos como seres frágeis, mas infinitamente amados por Ele. Não sabemos admirar sua grandeza insondável nem gostar da sua presença próxima. Não sabemos invocar ou louvar.
Que pena dá ver como Deus é discutido em certos programas de televisão. Fala-se «de ouvir falar». Debate-se o que não se conhece. Os convidados ficam acalorados a falar do Papa, mas a ninguém se ouve falar com um pouco de profundidade sobre esse Mistério a que nós crentes chamamos «Deus».
Para descobrir Deus não servem as discussões sobre religião e os argumentos dos outros. Cada um tem de fazer a sua própria viagem e viver a sua própria experiência. Não basta criticar a religião nos seus aspetos mais deformados. É necessário procurar pessoalmente o rosto de Deus. Abrir caminhos na nossa própria vida.
Quando durante anos se viveu a religião como um dever ou como um peso, só esta experiência pessoal pode desbloquear o caminho para Deus: poder comprovar, ainda que seja de uma forma germinal e humilde, que é bom acreditar, que Deus faz bem.
Este encontro com Deus nem sempre é fácil. O importante é procurar. Não fechar nenhuma porta; não descartar nenhuma chamada. Continua a procurar, talvez com o último resto das nossas forças. Muitas vezes, o único que podemos oferecer a Deus é o nosso desejo de nos encontrar com ele.
Deus não se esconde dos que o procuram e perguntam por Ele. Mais cedo ou mais tarde, recebemos a sua «visita» inconfundível. Então tudo muda. Pensávamos que estava longe, e está perto. Sentíamos ameaçador, e é o melhor amigo. Podemos dizer as mesmas palavras que Job: «Até agora falava de ti por ouvir falar; agora os meus olhos viram-te».
Neste texto, Lucas fala da grande expectativa que se criou no povo ao redor da pregação de João Batista. Ele anunciava um batismo de conversão para o perdão dos pecados. Hoje também existe uma grande expectativa de conversão e de reconciliação com Deus que se manifesta de muitas maneiras.
Situando
Lucas situa a atividade de João Batista no 15º ano do governo de Tibério, imperador de Roma. Tibério foi imperador de 14 a 37 depois de Cristo. No ano 63 antes de Cristo, o império romano tinha invadido a Palestina, impondo ao povo uma dura escravidão. As revoltas do povo sucediam-se, uma depois da outra, sobretudo na Galileia, mas foram duramente reprimidas. De 4 antes a 6 depois de Cristo, durante o governo de Arquelau, a violência estourou na Judeia. Este fato levou José e Maria a voltarem para Nazaré na Galileia e não para Belém na Judeia (Mt 2,22). No ano 6, Arquelau foi deposto e a Judeia foi transformada numa província romana com procurador diretamente nomeado pelo imperador de Roma.
Pilatos foi um destes procuradores. Governou do ano de 26 a 36. Esta mudança no regime político trouxe certa calma, mas as revoltas esporádicas, como aquela de Barrabás (Mc 15,7) e a imediata repressão romana (Lc 13,1), lembravam a extrema gravidade da situação. Bastava alguém soprar na brasa e o incêndio da revolta explodia.
A calma era apenas uma trégua, uma ocasião oferecida pela história, por Deus, para o povo fazer uma revisão do rumo da caminhada e, assim, evitar a destruição total. Pois Roma era cruel. Em caso de uma revolta, viria e acabaria com o Templo e a Nação. É nesse contexto que, em torno do ano 28 depois de Cristo, João Batista aparece anunciando um batismo de arrependimento para o perdão dos pecados.
Comentando
1. Lucas 3,1-2: Lembrando os antigos profetas
Lucas tem a preocupação de situar os acontecimentos no tempo e no espaço. Ele informa os nomes dos governantes e descreve os lugares onde João atua. É que a história da salvação não é uma história distinta da nossa. Ela é a nossa história. A maneira como Lucas introduz a pregação de João é semelhante ao início dos livros dos antigos profetas. Eles costumavam indicar quem era o rei na época em que o profeta exercia a sua atividade. Veja, por exemplo, Isaías (Is 1,1), Jeremias (Jr 1,1-3), Oseias (Os 1,1), Amós (Am 1,1) e outros. Lucas faz o mesmo para dizer que, após quase 500 anos sem profeta, aparece novamente um profeta. Ele se chama João, o filho de Isabel e Zacarias.
2. Lucas 3,3: Arrependimento e perdão
João percorre a região do Jordão, pregando um batismo de arrependimento para o perdão dos pecados. Arrependimento (em grego: metanoia) significa mudança não só de comportamento, mas também de mentalidade. O povo devia tomar consciência de que o seu modo de pensar, marcado pela propaganda do Governo e do Templo, estava errado. Perdão traz consigo a reconciliação com Deus. João anuncia uma nova maneira do povo se relacionar com Deus.
3. Lucas 3,4-6: Definindo a missão de João
Lucas cita o seguinte texto de Isaías para ajudar os leitores e as leitoras a entenderem melhor o significado da pregação de João: “Voz que clama no deserto! Preparem os caminhos do Senhor!” (Is 40,3). Neste texto, Isaías anunciava a volta do povo do exílio e a descrevia como se fosse um novo Êxodo. Era como se o povo, voltando do cativeiro da Babilônia, saísse do Egito e entrasse novamente no deserto. Para Lucas, Jesus inicia um novo Êxodo que estava sendo preparado pela pregação de João Batista no deserto.
Os Evangelhos de Mateus (Mt 3,3) e de Marcos (Mc 1,3) também citam a mesma frase de Isaías. Porém, citam apenas o começo (Is 40,3). Lucas a cita por inteiro até onde Isaías diz: “E toda a carne verá a salvação de Deus” (Is 40,5). A expressão “toda a carne” significa todo o ser humano. Esta pequena diferença mostra a preocupação de Lucas em mostrar para as comunidades que a abertura para os pagãos já estava prevista pelos profetas! Jesus não veio só para os judeus, mas para que “toda a carne” pudesse ver a salvação de Deus.
Atrás das informações históricas deste texto, que se refere às autoridades seculares e religiosas que teriam influência nos primórdios do cristianismo, jaz a realidade trágica da resposta negativa deles à Palavra de Deus e aos seus mensageiros, João o Batista e Jesus, o Cristo. Na pessoa de Pôncio Pilatos, a autoridade romana vai agir na decisão de assassinar o Messias. Entre os governantes da Palestina, Herodes Antipas aparece diversas vezes no Evangelho, sempre com juízo negativo.
Ele será o responsável pela morte de João, além de estar presente no sofrimento de Jesus na Semana Santa. Anás (Sumo Sacerdote de 6 a 15 d.C.) e o seu genro Caifás (Sumo Sacerdote de 18 a 37 d.C.) formam indicados pelos romanos. Eram, portanto, um poder dependente do império a quem realmente estavam a serviço. Os Sumos Sacerdotes sempre serão hostis a Jesus e à sua pregação.
No meio deste elenco de poderosos corruptos e perseguidores, Deus manda João Batista, como arauto do novo tempo de graça e salvação. Deus não permite que a perversidade e a maldade tenham a palavra final na história da humanidade. Essa será mais tarde a mensagem básica do Apocalipse: o mal já é um derrotado. E, embora possa parecer diferente, é Deus e não a maldade quem controla a caminhada da história. É uma mensagem de conforto às comunidades sofridas do fim do primeiro século. Mas esta vitória não se concretiza sem que haja luta, sacrifício e cruz!
Lucas põe na boca de João um trecho de Isaías:
“Esta é a voz daquele que grita no deserto: preparem o caminho do Senhor, endireitem suas estradas. Todo vale será aterrado, toda montanha e colina serão aplainadas. As estradas curvas ficarão retas, e os caminhos esburacados serão nivelados. E todo homem verá a salvação de Deus” ( v. 4-6).
Sem dúvida, podemos entender este trecho com sentido metafórico, como descrição de uma mudança radical no modo de pensar e no estilo de vida de quem quer aceitar o convite à penitência e ao arrependimento. Os vales a serem aterrados, as montanhas e colinas a serem aplainadas, os caminhos esburacados a serem nivelados, simbolizam os empecilhos em nossas vidas a um seguimento mais radical e coerente de Jesus. Quem aceita a sua mensagem terá que mudar a sua vida radicalmente, isto é, na raiz. Advento, embora não seja tempo de penitência no sentido que a Quaresma é, torna-se tempo oportuno para uma revisão de vida, para descobrir quais são as “curvas”, as “montanhas”, os “vales” e os “buracos” que teremos que superar para que o Senhor realmente possa habitar nos nossos corações.
O versículo 6 (“E todo homem verá a salvação de Deus”) faz eco a um tema caro para Lucas, isto é, a universalidade da salvação. Convém notar que essa frase não se encontra nos textos paralelo de Marcos e de Mateus. Nenhuma pessoa é excluída da mensagem e oferta da salvação. Porém, a resposta depende de nós!
É uma decisão nossa!
Domingo passado (1º domingo do Advento = presença, chegada, vinda), as leituras nos remetiam ao fim dos tempos:Cristo virá! Hoje e no domingo próximo, levam-nos à nossa vida de cada dia: Cristo vem hoje! Se, de verdade, colocamos mãos à obra e preparamos o caminho do Senhor, Deus passará pelo coração do ser humano.
João, modelo de transparência
Os dois primeiros capítulos do Evangelho de Lucas narram a teologia da infância de Jesus. Formam como que um Evangelho à parte. Já este terceiro capítulo inicia um novo relato, comparável ao Evangelho de Marcos.
Lucas começa enumerando os poderosos que governavam a região e também o Império. O contraste é marcante: a palavra de Deus, que faz o universo existir, não se dirige a nenhum destes importantes personagens, mas sim ao filho de Zacarias, de quem sequer se diz ser sacerdote, nem mesmo um dentre tantos, em Israel.
Este João, que Mateus e Marcos descrevem como um asceta, de qualquer modo é uma pessoa transparente. Voz que clama no deserto é a voz de outrem, pois o que é falado por ele é a palavra de Deus. Assim, João desaparece diante daquele a quem anuncia. Com seu dedo apontado, não atrai os olhares e a atenção de todos para si mesmo, mas para quem ele está indicando.
Em nossos desertos de ausência de Deus, podemos encontrar o Cristo através de qualquer desconhecido, seja ele quem for, e não necessariamente através dos que, em nossas sociedades, são pessoas importantes. O Cristo nos alcança através de todos estes de quem nos tornamos o próximo, através do menor desses pequeninos de que fala Jesus, em Mateus 25. Deus não economiza a sua Palavra. Ele nos fala sempre, através de todos os nossos irmãos. Assim, João Batista não desapareceu, mas encontra-se revivido em cada um de nós, desde que renunciemos a atrair para nós mesmos o olhar dos outros e orientemos a sua atenção para aquele que vem; ou seja, desde que, para eles, abramos um futuro.
Atualidade de João Batista
E João, mesmo assim, conserva toda a sua personalidade histórica. O papel que desempenha foi comunicado a muitas pessoas, sem que nelas se desfaça. Encarnada em João está toda a primeira Aliança. João, desta Antiga Aliança, é de qualquer forma o resultado e a recapitulação. Por isso, sem dúvida, a respeito dele, os evangelistas citam Isaías. Porém, o texto escolhido anuncia o retorno do exílio da Babilônia, mas com imagens que, vindas do Êxodo, referem-se à libertação da escravidão no Egito. Será agora, com o Cristo, que irá produzir o verdadeiro retorno do exílio: o Êxodo definitivo.
Outro paradoxo é que este “agora” está no futuro: João anuncia alguém que vem depois de si próprio. Este que vem é que vai dar valor ao nosso presente. O Cristo nos possui já, enquanto esperamos a sua presença (parusia/advento). Sua vinda é permanente, mas está sempre por se fazer, até que seja “tudo em todos”.
Daí ser necessário que, de nossa parte, nos mantenhamos sempre abertos, constantemente, sem cessar. Sempre completos, mas nunca satisfeitos. Esta é a nossa situação. Podemos estar certos de que, aconteça o que acontecer, por pior que seja, Cristo virá nos alcançar através disto mesmo. De qualquer tipo de madeira, Deus faz as suas flechas. Para nos conduzir até a terra prometida, usa tudo quanto a Ele nós mesmos impomos. João Batista está, portanto, sempre atual, uma vez que estamos sempre aquém de uma nova vinda de Deus. Temos necessidade de que nos seja indicado quem, com certeza, está no meio de nós, mas que não reconhecemos.
Abrir-nos à alegria
Não gostamos muito de ouvir falar em conversão, penitência, perdão dos pecados. Preferimos as metáforas de Isaías que são menos desagradáveis: preparar o caminho, endireitar as veredas, aterrar os vales…
De que se trata? De abrirmo-nos para Deus, deixar que ele nos recrie à sua imagem, deixar sermos gerados. Mas temos medo de ter que mudar. Não gostamos de pontos de interrogação. Preferimos ficar sentados no conforto de nossas certezas. Conversão consiste em nos interrogarmos sobre os nossos hábitos, sobre o valor de nossos desejos. Consiste em sair de nosso sono para voltar os nossos olhos para aquele que vem, sempre novo. Só então ficaremos curados de nossas paralisias, ao ouvir o Cristo nos dizer: “Levanta-te e anda”. Vem andando até mim, vem me seguir.
O batismo que João propõe, “em remissão dos pecados”, significa um novo nascimento, um novo começo de vida, em direção à vida. De fato, o “pecado” não é a princípio transgressão a alguma proibição ou alguma lei, mas é o que se atravessa frente à nossa criação, à nossa liberdade e nos escraviza. O batismo de João não nos oferece a plenitude da vida nova, mas nos leva a fazer o deserto dentro de nós mesmos: a “tabula rasa” de tudo o que nos impede de dar lugar, por inteiro, àquele que vem.
Os textos da liturgia de hoje nos anunciam a boa nova: temos que superar as nossas ilusões e a vida errante, a fim de nos abrir à alegria (Baruc 5,9; Filipenses 1,11; Lucas 3,4-6). Depois de atravessar o deserto, a terra prometida…
2000 anos após o evento da Páscoa, somos convidados a entrar no deserto e a caminhar, pois a nossa libertação ainda não está concluída. Não é por nada que a cada ano vivemos o tempo do Advento, que nos prepara para celebrar o Natal, a festa por excelência de Cristo Ressuscitado que quer renascer ainda hoje, através de nós, a fim de nos libertar definitivamente.
Na semana passada começamos o Advento C com as palavras de Jesus, do final do evangelho de Lucas, sobre a sua vinda (Lc 21). Hoje, neste 2º Domingo de Advento, voltamos ao começo do evangelho de Lucas, onde o autor nos anuncia uma Boa Nova: “E todo homem verá a salvação de Deus” (Lc 3,6). Contudo, há uma condição: para ser acolhido, a salvação pede a conversão. Mas em que consiste essa conversão? Vamos vê-la, na semana próxima, no 3º domingo de Advento. Mas, hoje, como vamos nos preparar a partir dos textos bíblicos que nos são propostos?
Os evangelistas Marcos, Mateus e Lucas nos convidam a ir ao deserto para compreender a palavra do profeta João Batista, que anuncia a vinda de um novo mundo, através de Jesus de Nazaré, que conhecemos como Cristo e Senhor na Páscoa, porque os três evangelhos foram escritos após a Páscoa. Por outro lado, cada um o faz de forma diferente. Marcos diz simplesmente: “João Batista apareceu no deserto, pregando um batismo de conversão para o perdão dos pecados” (Mc 1,4). Mateus diz somente: ”Naqueles dias, apareceu João Batista, pregando no deserto da Judeia. ‘Convertam-se, porque o Reino do Céu está próximo’” (Mt 3,1-2). Lucas, por sua vez, situa o personagem de João Batista na história mundial, pois é a história do mundo que está em jogo: “Fazia quinze anos que Tibério era imperador de Roma. Pôncio Pilatos era governador da Judeia; Herodes governava a Galileia; seu irmão Filipe, a Itureia e a Traconítide; e Lisânias, a Abilene. Anás e Caifás eram sumos sacerdotes. Foi nesse tempo que Deus enviou a sua palavra a João, filho de Zacarias, no deserto” (Lc 3,1-2).
O que quer dizer que, para Lucas, a palavra de Deus se exprime não através dos grandes deste mundo, sejam eles chefes políticos ou religiosos, nem pelo burburinho das grandes cidades, mas através de um desconhecido, um pobre profeta, no silêncio do deserto. Nomeando todos os dirigentes do mundo da sua época, Lucas quer nos dizer também que o chamado do Batista se dirige a todos, e não somente aos judeus. Ali temos um aceno para a universalidade da salvação oferecido pelo Cristo da Páscoa.
E se ele vai para o deserto, é para ouvir o profeta proclamar um batismo de conversão. É preciso entrar no deserto, esse lugar de silêncio e de nudez, para tomar consciência da necessidade de se converter, tomando um caminho novo: “Esta é a voz daquele que grita no deserto: preparem o caminho do Senhor, endireitem suas estradas” (Lc 3,4). No fundo, para que haja encontro, precisamos assumir o risco da estada e caminhar...
Após o Exílio Babilônico, o profeta Isaias convidava o povo de Deus a tomar o caminho da libertação (Is 40,3-5). Num poema escrito em torno de 539 a.C, ele pedia que preparassem o caminho do Senhor no deserto; ele próprio encabeçaria a procissão a Jerusalém a todos os judeus exilados a Babilônia. Na primeira leitura de hoje, o profeta Baruc releu essa passagem de Isaias, três séculos mais tarde, a fim de anunciar novamente a libertação do Povo de Deus, porque ela não se cumpriu ainda, e, como o povo começa a se desesperar, Baruc lembra com força da promessa de libertação que tinha sido anunciada pelo profeta Isaías, três séculos antes: “Levante-se, Jerusalém, tome posição em lugar alto, olhe para o nascente e contemple os seus filhos, reunidos do nascente e do poente pela voz do Santo, que invocam alegremente a Deus” (Br 5,5).
Quando os evangelistas releem, por sua vez, essa profecia de Isaias retomada por Baruc, eles constatam também que a promessa da libertação ainda não se cumpriu, e é por isso que eles convidam todos os homens e todas as mulheres, através do profeta João Batista, a caminhar no caminho que Jesus tomará, para conduzi-los a uma libertação definitiva. Caso contrário, como a liberdade não é sempre alcançada, mesmo antes da Páscoa, São Paulo, na sua Carta aos Filipenses, da qual hoje temos um trecho, diz: “Este é o meu pedido: que o amor de vocês cresça cada vez mais em perspicácia e sensibilidade em todas as coisas. Desse modo, poderão distinguir o que é melhor, e assim chegar íntegros e inocentes ao dia de Cristo” (Fil 1,9-10). E hoje, será que devemos continuar esperando?
2000 anos após o evento da Páscoa, nós somos sempre convidados a entrar no deserto e a caminhar, pois a nossa libertação ainda não está concluída. Não é por nada que a cada ano vivemos este tempo do Advento que nos prepara para celebrar o Natal, a festa por excelência de Cristo Ressuscitado que quer renascer ainda hoje, através de nós, a fim de nos libertar definitivamente. Não é na tristeza e no medo que nós devemos andar; o profeta Baruc nos repete hoje: “Jerusalém, tire a roupa de luto e de aflição e vista para sempre o esplendor da glória que vem de Deus” (Br 5,1). É também na alegria e na esperança que nós devemos caminhar: “porque Deus, com sua justiça e sua misericórdia, conduzirá festivamente Israel à luz da sua glória” (Br 5,9). Meu Deus! Como estamos ainda longe disso...Contudo, como Deus precisa de nós para expressar a sua misericórdia e a sua justiça, cada vez que causamos situações de violência, de injustiças e de iniquidade na sociedade e na Igreja, todas as vezes em que despojamos as mulheres e os homens da sua dignidade e do seu direito de viver a sua diferença, e quando condenamos à exclusão aos marginais, aos pequenos e aos feridos da vida, impedimos que Deus seja Deus, nós retardamos a nossa libertação e impedimos que Cristo nasça hoje. É o que fazia que Gandhi, esse mestre da paz, falasse: “Lendo a história do mundo, me parece que o cristianismo tem ainda bastante para fazer. Com efeito, mesmo se nós cantamos: Glória a Deus no céu e paz na terra, hoje não há nem glória de Deus nem paz sob a terra. Contanto que reste fome ainda insatisfeita, e que não tenhamos erradicado a violência da nossa civilização, Cristo ainda não nasceu”.
Segundo domingo de Adviento. Ciclo C
Abrir el corazón para que el Señor obre su salvación en nosotros
Primera Lectura (Bar 5,1-9):
El texto comienza con una exhortación dirigida a la ciudad de Jerusalén para que se cambie de vestimenta, para que deje las ropas de luto y se vista de fiesta con ornamentos divinos: "el manto de la justicia de Dios y la diadema de la Gloria del Eterno". El motivo de este cambio es porque Dios le devolverá a la ciudad santa sus habitantes, hará regresar a ella a los desterrados. Y Dios mismo regresará a ella, como lo indica la imagen de la Gloria, que había abandonado la ciudad de Jerusalén para irse con los desterrados (cf. Ez 10,18-22).
Esta nueva situación de Jerusalén se expresa también en la imposición, por parte de Dios, de un nombre para siempre: "Paz en la justicia" y "Gloria en la piedad". La paz (Shalom) es fruto de la justicia, es decir, de la realización por parte de los hombres de la voluntad de Dios. La gloria, la manifestación de la presencia de Dios, se da en la piedad que es el religioso respeto por el Señor. Por apartarse de la voluntad de Dios manifestada en los mandamientos, por obrar la injusticia, Jerusalén perdió la paz y la gloria que vienen de Dios. Ahora Dios se las regala gratuitamente, y para siempre.
Todo debe disponerse para este regreso triunfal: Jerusalén debe engalanarse y los caminos allanarse. El mismo Señor es quien da la orden para que las montañas y colinas sean aplanadas y rellenados los valles con el fin de que Israel vuelva a Jerusalén por un camino seguro. Todo debe favorecer la obra de Dios con los hombres.
En síntesis, este poema de Baruc nos recuerda la obra de Dios, el nuevo éxodo, que devuelve a los desterrados a Jerusalén. Toca a Jerusalén vestirse de fiesta, llenarse de alegría y subir a lo alto para contemplar la obra de Dios.
Esta lectura nos invita a confiar y esperar la obra transformadora de Dios en nosotros. Y también nos ayuda a no perder de vista la dimensión comunitaria en el itinerario del Adviento ya que es posible aplicar esta profecía a la Iglesia, nueva Jerusalén, a donde los “hijos” de oriente y occidente son convocados. Toda la comunidad, y cada corazón, deben disponerse a recibir la “Paz en la justicia y la Gloria en la piedad”.
Salmo Responsorial (Sal 125,1-6):
Este hermoso salmo canta y celebra la acción de Dios quien cambió la suerte de Sión. Las últimas dos estrofas, con la metáfora de los sembradores, resaltan el cambio de ánimo de los hombres: se siembra entre lágrimas y se cosecha entre canciones. Se aproxima el tiempo de la cosecha por ello Navidad es tiempo de alegría y de canciones.
Este salmo es una inmejorable respuesta a lo anunciado en la primera lectura.
Segunda Lectura (Flp 1,4-11):
Este texto, al igual que 1Tes 3,12-4,2 que leímos el domingo pasado, muestra que en la primitiva predicación de San Pablo la venida del Señor constituye un elemento esencial de la fe cristiana que debe marcar la orientación fundamental de la vida del creyente. La diferencia está en que mientras en el domingo pasado la Venida del Señor servía de motivación para el esfuerzo en el camino de la santificación, aquí aparece más bien como el punto culminante de la obra que Dios está realizando en los Filipenses por cuanto el mismo Señor que la inició la irá completando hasta el día final.
En el texto de hoy, que es la "acción de gracias" de la carta, por dos veces se menciona el "Día de Cristo (Jesús)" (1,6.10) y, de este modo, anticipa uno de los temas de la carta sobre el que volverá en 3,12-21. Vista esta insistencia en el tema escatológico se sospecha que uno de los problemas de la comunidad era justamente la pérdida de confianza en la venida del Señor con el consiguiente decaimiento del fervor cristiano y la renuncia a comportamientos mundanos[1].
Al final Pablo pide a Dios algo en favor de los filipenses: "que vuestro amor abunde aún más y más en conocimiento y en todo discernimiento (ἐν ἐπιγνώσει καὶ πάσῃ αἰσθήσει)" (1,9). Pablo considera que el crecimiento en el amor (agápe) lleva a un mayor conocimiento y capacidad de discernimiento, para poder valorar lo mejor y así llegar puros e irreprochables en el día de Cristo (1,10). Algo semejante le aconsejará Pablo a los Romanos (cf. 12,2).
La consecuencia de este obrar con conocimiento y discernimiento es dar fruto de justicia (καρπὸν δικαιοσύνης), por medio de Cristo y para gloria y alabanza de Dios (1,11). Como bien dice Ramírez Fueyo[2]: "no es sólo que la salvación da frutos, sino que la salvación (o la justicia) es un fruto que se ve, es el modo de comportarse del creyente en Cristo. Dicho de otro modo, quien actúa siguiendo los criterios del evangelio, produce justicia a su alrededor, salva la realidad".
Este texto es una buena actualización cristiana de la primera lectura del Antiguo Testamento. Lo fundamental y decisivo sigue siendo la obra de Dios en la comunidad y en los corazones. Él la comenzó y Él la terminará. Pero ahora con la novedad que aporta Jesucristo de quien proviene la justicia y quien nos hace obrar la voluntad de Dios.
Evangelio (Lc 3,1-6):
Lucas manifiesta una gran preocupación por situar los acontecimientos salvíficos en el contexto de la historia universal. Por ello comienza con la mención de las autoridades civiles reinantes en el Imperio romano, en Israel y en Siria; a las que suma la autoridad religiosa: los sumos sacerdotes[3]. Según L. Monloubou[4] "situando estos acontecimientos en la historia universal, el autor sugiere que tales acontecimientos interesan a la humanidad entera".
A continuación añade: "Dios envió su palabra a Juan, hijo de Zacarías, en el desierto (ἐν τῇ ἐρήμῳ)". La localización de Juan en el desierto (allí residía según Lc 1,80) le sirve a Lucas para vincular este hecho con la profecía de Isaías que citará a continuación ("voz que grita en el desierto" - ἐν τῇ ἐρήμῳ- en 3,4). A su vez deja en claro que ninguno de los grandes y poderosos recién nombrados, que habitan en ciudades principales, es destinatario de la Palabra de Dios.
La expresión "fue dirigida la palabra de Dios…" nos recuerda el inicio de la mayoría de los libros proféticos del Antiguo Testamento. Es posible que Lucas quiera presentar la actividad de Juan Bautista como el regreso de la profecía a Israel para anunciar los tiempos mesiánicos. De hecho era fuerte, por entonces, la creencia en que el Espíritu y la profecía habían cesado en Israel, pero esperaban que la venida de los últimos días estaría estrechamente vinculada con la reaparición de la profecía[5]. En efecto, la tradición rabínica enseñaba que la redención final vendría acompañada por el retorno de la profecía. Incluso según un texto rabínico el mismo Mesías tendría el don de profecía (b. Sanh 93). Siguiendo a Mal 3,22-24 muchos textos afirmaban que la venida del Mesías sería acompañada o precedida por el retorno del profeta Elías y de la misma profecía (cf. Eclo 48,1-12; Mt 17,9-13; He 2,14-36; Gen. Rab. 71,9; 99,11).
En este contexto Lucas afirma que la Palabra de Dios se dirige otra vez a un profeta, a Juan el Bautista, quien la recibe en el desierto, “lugar de penitencia y de apertura a la Palabra de Dios”[6]. Y enseguida se describe su misión: "comenzó a recorrer la región del Jordán anunciando un bautismo de conversión para el perdón de los pecados (κηρύσσων βάπτισμα μετανοίας εἰς ἄφεσιν ἁμαρτιῶν)". Como bien nota A. Rodríguez Carmona[7] “la predicación se presenta como kerigmática – keryssón, proclamando -, es decir, hacer pública la decisión divina de ofrecer el perdón de los pecados a los que se acojan a la invitación con una actitud de conversión”.
La llegada u ofrecimiento de la salvación de Dios en Cristo supone una preparación o disposición por parte de los hombres; entonces la misión del precursor es invitar a la conversión, esto es, a redescubrir las exigencias de la Alianza con el Señor y a ponerlas en práctica. Al respecto nos dice F. Bovon[8]: "el bautismo de agua de Juan sella la decisión personal de poner toda la vida bajo el juicio de Dios y no esperar más que su perdón".
La cita de Is 40,3-5 que sigue nos remite, al igual que la primera lectura, al regreso del exilio como obra de Dios, como consolación para los desterrados. Los caminos deben prepararse, todo debe predisponerse para la magnífica obra redentora de Dios, para un nuevo éxodo. La novedad está en que el Señor (ku,rioj) que viene es Jesucristo, en quien todos verán (que aquí se entiende como “tomar parte”, “participar de”) la salvación de Dios.
A la luz de esta cita del profeta, Juan Bautista no anuncia un juicio condenatorio de Dios, sino la posibilidad de una salvación ofrecida a todos. Aparece aquí una particularidad de la teología de Lucas quien prolonga la citación de Isaías para incluir la perspectiva de la salvación universal: “todos los hombres verán la salvación de Dios".
El tema de la salvación es propio y frecuente en San Lucas, quien ya antes de nuestro texto presentaba al anciano Simeón quien viendo Jesús-niño oraba a Dios diciéndole: "Ahora, Señor, puedes dejar que tu servidor muera en paz, como lo has prometido, porque mis ojos han visto la salvación que preparaste delante de todos los pueblos: luz para iluminar a las naciones paganas y gloria de tu pueblo Israel" (2,29-32). Por tanto, en Jesús Dios ofrece a todos, no sólo a los judíos, la posibilidad de la salvación. Más adelante, al iniciar Jesús su ministerio con la predicación en la sinagoga de Nazareth (cf. Lc 4,16-30), dejará bien en claro la orientación preferencial de su misión a los más alejados, a los pecadores. Por fin, Lucas concluye el segundo volumen de su obra afirmando que ante el rechazo de Israel "esa salvación de Dios va a ser anunciada a los paganos. Ellos sí que la escucharán" (He 28,28).
ALGUNAS REFLEXIONES:
Mientras el domingo pasado la mirada creyente se orientaba al futuro, al Señor que vendrá al fin de los tiempos, ahora se vuelve al pasado para reconocer la "venida" redentora de Dios sobre Jerusalén y la preparación de la "venida" histórica de Jesús. Sin embargo, todavía la segunda lectura hace clara referencia a la Parusía o venida definitiva del Señor por lo que no podemos perder de vista del todo la esperanza escatológica.
Importa mantener la tensión entre estas "dos venidas" del Señor por cuanto la primera, en la historia, es la que nos permite esperar confiados la segunda y definitiva al fin de los tiempos. Esta es la tensión propia del adviento entre las dos venidas del Señor: la Encarnación y la Parusía. No podemos dejar de lado ninguna de las dos sin desfigurar la esencia del mensaje cristiano. Como dice el Card. Danielou: “La esperanza se apoya en el pasado para esperar el futuro a través de la paciencia del presente”.
Además, miramos hacia lo que ya pasó para saber cómo esperar en el presente lo que vendrá. En efecto, ante el anuncio del Señor que viene a nosotros en Navidad, la liturgia del adviento nos invita a prepararnos para recibirlo. Y qué mejor forma de hacerlo que siguiendo las indicaciones de aquel a quien Dios envió para que prepare al pueblo de Israel para recibir la venida histórica de Jesús: Juan el Bautista. Por esto hemos escuchado en el evangelio la predicación de Juan el Bautista que nos invita a la conversión del corazón para recibir la acción salvadora de Dios que viene.
No sólo el evangelio de hoy, sino las tres lecturas tienen como tema común y propio de este segundo domingo la preparación o conversión del corazón para recibir la acción salvadora de Dios que viene. En las lecturas se describe la eficacia de esta acción divina que puede trasformar nuestra situación de lágrimas y duelo en situación de alegría y cantos. Es lo que resaltan la primera lectura y el salmo. Y en cierto modo también San Pablo quien invita a la alegría y señala la acción continuada de Dios por Cristo a favor de los cristianos, a quien Él mismo prepara para el día final.
En breve, la esperanza en Dios, en su venida, despierta alegría y entusiasmo. Él puede cambiar lo que para nosotros es imposible. Él y sólo Él puede traernos la salvación. De este modo la esperanza del adviento encuentra su sentido pleno: se trata de poner nuestra confianza en Dios, tan seguros de su amor misericordioso que, aunque vivimos en el "ya pero todavía no", nuestro corazón se llena de alegría.
La predicación de Juan Bautista nos precisa con claridad el objeto de nuestra esperanza: la salvación de Dios. El Señor viene a restaurarnos, a devolvernos la “Paz en la justicia” y la “Gloria en la piedad”, que anunciaba la primera lectura. Esto es lo que, ante todo, debemos creer y esperar. Es el desafío de la fe: creer en la acción de Dios, en su misericordia. La medida de esta fe será la medida de los frutos del adviento y de la navidad en nosotros, pues como decía Sta. Teresita: "se obtiene de Dios cuanto de él se espera".
Así como en el primer domingo de Adviento se nos invitaba a despertar nuestro deseo de Dios; ahora se trata de poner en Jesús todas nuestras expectativas de Salvación. Esperamos a aquel que nos salvará; creemos que Él viene a salvarnos. Hay que abrir el corazón por la FE a la SALVACIÓN que obrará JESÚS en nosotros.
Y el rostro misericordioso de Jesús que viene a nosotros para salvarnos podrá provocar en nosotros el proceso de conversión que anunciaba el Bautista. En efecto, mientras la conversión propuesta en el tiempo de cuaresma acentúa más el paso del pecado a la gracia, de la vuelta a Dios (en griego es el sentido de epistrefo); en el adviento la conversión es más existencial, invita a una revisión de actitudes entre lo transitorio y lo definitivo. A la luz de lo definitivo (redescubierto el domingo pasado) se nos invita a ordenar nuestra escala de valores, a distinguir entre lo esencial y lo secundario, entre lo importante y lo urgente. Se trata de discernir lo que es mejor (San Pablo en la 2a. lectura).
En fin, se nos pide un cambio de mentalidad (en griego metanoesis como en Lc 3,3) pues "la fe es un "cambio de mentalidad", porque el Dios que se ha revelado en Cristo y ha dado a conocer su plan de amor, nos toma, nos atrae a sí mismo, se convierte en el sentido que sostiene la vida, la roca sobre la que se puede encontrar la estabilidad" (Benedicto XVI, Cat. del miércoles 5 de diciembre de 2012).
El primer paso en este camino de conversión es ir al desierto para escuchar la Palabra de Dios como el Bautista. La Palabra de Dios vino a Juan en el desierto, y “decir desierto significa silencio, búsqueda de la esencialidad, lucha contra la propia soberbia y contra los múltiples enemigos del alma, escucha atenta de la Palabra, distancia crítica de las “modas” y juicios demasiados precipitados”[9] . Y la Palabra de Dios de hoy “es una apremiante invitación a abrir el corazón y acoger la salvación que Dios nos ofrece incesantemente, casi con terquedad, porque nos quiere a todos libres de la esclavitud del pecado” (Francisco, Ángelus del 6 de diciembre de 2015).
No se trata tanto de lo que nosotros debemos hacer (a esta pregunta responderá explícitamente Juan el Bautista el próximo domingo) sino de disponernos para lo que Dios quiere hacer en nosotros.
Por tanto, en este segundo domingo se nos pide particularmente una actitud de conversión entendida como apertura a la Gracia, entendida como fe firme en la obra de Dios en nosotros, en su querer realizarla y en su poder llevarla a cumplimiento. Si disponemos nuestro corazón y nuestra comunidad, todos podremos ver/gustar la salvación de Dios.
En fin, escuchemos y aceptemos el testimonio de Juan el Bautista para convertirnos también nosotros en testigos de Esperanza. Al respecto decía el Papa Francisco: “El testimonio de Juan el Bautista, nos ayuda a ir adelante en nuestro testimonio de vida. La pureza de su anuncio, su valentía al proclamar la verdad lograron despertar las expectativas y esperanzas del Mesías que desde hace tiempo estaban adormecidas. También hoy, los discípulos de Jesús están llamados a ser sus testigos humildes pero valientes para reencender la esperanza, para hacer comprender que, a pesar de todo, el reino de Dios sigue construyéndose día a día con el poder del Espíritu Santo. Pensemos, cada uno de nosotros: ¿cómo puedo cambiar algo de mi actitud, para preparar el camino al Señor? La Virgen María nos ayude a preparar día tras día el camino del Señor, comenzando por nosotros mismos; y a sembrar a nuestro alrededor, con tenaz paciencia, semillas de paz, de justicia y de fraternidad”, (ángelus del 9 de diciembre de 2018).
PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):
San Juan
Santo eres Juan, profeta de estas tierras
Anúncianos la Salvación, Tú que oías del cielo, la Voz.
Sordos, aturdidos por un ritmo veloz
La humanidad nuestra, ignorante, inquieta
De la poca fe, reniega. Sin esperar, espera.
Háblanos también del desierto
Del lugar temido, en la soledad hundido
Allí en el silencio sopla el viento del Espíritu.
Abandonados de la casa paterna
Huérfanos sin serlo. En este mundo, perdidos.
Inquieto estás otra vez, alma en vilo
Resistes las demoras, urge el tiempo, es el momento
Distraídos, ¡no nos sorprenda el Señor!
Vagamos por estos rumbos, asustados
Indefensos protegidos. Es el tiempo prometido.
¿Se aplanará lo elevado, se encauzará lo torcido?
¿Tantos malos animales serán buenos y mansitos?
Endulzado el corazón nos descubras Jesús
Abriendo un sendero Divino y te veamos
Tan indefenso y tan pequeño como un niño. Amén
[1] Cf. F. Ramírez Fueyo, Gálatas y Filipenses (Verbo Divino; Estella 2006) 121.-
[2] Gálatas y Filipenses (Verbo Divino; Estella 2006) 122.-
[3] Sólo del primero de estos seis nombrados se ofrece una fecha concreta que se suele fijar en el año 28/29 d.C., cf. A. Rodriguez Carmona, Evangelio según san Lucas, BAC, Madrid, 2014, 57.
[4] Leer y predicar el Evangelio de Lucas. Ciclo C (Sal Terrae; Santander 1982) 111.
[5] Entre los escritos rabínicos se repite con cierta frecuencia una frase que indica cómo en el judaísmo se fue dejando de lado la acción del Espíritu en los profetas: "Los rabinos Tannaítas enseñaban: después de la muerte de los últimos profetas, Ageo, Zacarías y Malaquías, el Espíritu Santo ha cesado en Israel", T. Sota, 13,2; citado por L. H. Rivas, El Espíritu Santo en las Sagradas Escrituras (Bs. As. 1998) 29.
[6] A. Rodriguez Carmona, Evangelio según san Lucas, BAC, Madrid, 2014, 56.
[7] Evangelio según san Lucas, BAC, Madrid, 2014, 57-58.
[8] F. Bovon, El Evangelio según San Lucas. Lc 1-9. Vol I, Salamanca 1995, 245.
[9] G. Zevini – P. G. Cabra (eds.), Lectio Divina para cada día del año. Vol. 1. Tiempo de Adviento, 110.