14/09/2025
Primeira Leitura: Números 21,4b-9
Salmo Responsorial: 77(78) R-Das obras do Senhor, ó meu povo, não te esqueças!
Filipenses 2,6-11
Evangelho: João 3,13-17
Proclamação do evangelho de Jesus Cristo segundo João – Naquele tempo, disse Jesus a Nicodemos: 13“Ninguém subiu ao céu, a não ser aquele que desceu do céu, o Filho do homem. 14Do mesmo modo como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que o Filho do homem seja levantado, 15para que todos os que nele crerem tenham a vida eterna. 16Pois Deus amou tanto o mundo, que deu o seu Filho unigênito para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna. 17De fato, Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele”. – Palavra da salvação.
Jo 3,13-17
A festa da Exaltação da Santa Cruz nos coloca diante da razão da nossa alegria: Deus amou tanto o mundo, que entregou o seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna.
Deus nos ama! Esse é o dogma central da nossa fé; é a alma de toda a Bíblia; é a afirmação mais importante de toda a Sagrada Escritura! A frase tem um sujeito, um objeto e um verbo que contém o mistério mais vasto e profundo que podemos conhecer e receber: Deus e nós! E entre Deus e nós há o amor!
Não é um amor genérico. É um amor que entregou o Filho unigênito ao mundo, ou seja, a nós!
Como Jesus fala desse amor que se entrega? Do mesmo modo como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que o Filho do homem seja levantado...
É preciso reler Nm 21,4-9. O povo passa por dificuldades no deserto: a fome, a sede, os agressores... Ao mesmo tempo recebe de Deus proteção contra os inimigos, a água que brota da rocha e o maná que desce do céu. A cada adversidade enfrentada no deserto, Deus manifesta com sinais maravilhosos o seu amor pelo seu povo.
Muitos, porém, ainda acham que Deus não faz mais do que sua obrigação e murmuram contra Deus, dizendo que não há água e que estão enojados daquele alimento sem graça. Por isso, os culpados são atacados por serpentes de fogo e muitos morrem por isso. Ante o castigo, os pecadores se arrependem e recorrem à intercessão de Moisés. Deus manda que ele faça uma serpente de bronze e a eleve em uma haste. E todos os que eram picados pelas serpentes e olhavam para a imagem elevada no deserto ficavam curados.
Surpreende esse episódio! Deus manda fazer uma imagem de bronze! E essa imagem é de uma serpente! Sabemos que a serpente era uma divindade cultuada como símbolo da fertilidade das religiões pagãs. Além disso, para piorar, ela é também símbolo do tentador; símbolo do mal!
Jesus explica a sua morte e ressurreição como um ser elevado! Assim como a serpente de bronze foi elevada, Ele também será elevado! Olhando para Jesus somos salvos. Olhando para o amor feito carne, olhando para Jesus que se entrega na cruz para ressuscitar, temos a salvação dos pecados. Portanto, Jesus explica que com a sua morte e sua ressurreição ele cumpre o que foi prefigurado por Moisés no deserto. O que salvou o povo no deserto não foi a serpente. Tampouco foi o mal. Mas Jesus! Já no deserto, Jesus salvou os pecadores. Olhando para a serpente, eles estavam olhando, mesmo sem o saber, para Jesus.
Eles não estavam olhando para um ídolo nem para o símbolo do mal, mas para Jesus.
E por que, Deus mandou que a imagem fosse a de uma serpente? De novo, a palavra de Jesus nos explica o porquê disso. Jesus é a verdadeira serpente elevada no deserto! Ele é prefigurado na imagem da serpente por que, na cruz, ele foi feito pecado pela nossa salvação.
Àquele que não conheceu pecado, o fez pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus (2Cor 5,21).
Deus o fez pecado por nós: o perdão do meu pecado não é uma ação burocrática de Deus! Para que eu pudesse ser salvo, Deus fez recair sobre o seu Filho dileto todo o peso do pecado do mundo todo e ele foi esmagado. Jesus foi feito pecado no sentido de que ele assumiu voluntariamente sobre si o castigo que nós merecíamos pelos nossos pecados. Para que nós pudéssemos ser feitos justiça de Deus, Jesus foi feito pecado! Normalmente a serpente serve de símbolo do mal, representando o próprio Satanás. Na cruz, embora não pudesse ser acusado de pecado algum, Jesus é feito pecado por nós.
Jesus é a serpente levantada no deserto, no sentido de que para que eu pudesse ser perdoado, Ele foi feito pecado por mim. Ele não foi feito pecado em si mesmo. Ele foi feito pecado por nós, para que nós fôssemos nele feitos justiça de Deus...
Qual é a sua reação diante de tão grande amor?
O mundo de hoje faz com que seja difícil acreditar no amor. São tão numerosas as traições, são infinitas as decepções, são terríveis as violências provocadas e sofridas! Quando sofremos a violência e a traição, somos feridos e começamos ter medo de amar e de ser amados, porque não queremos mais ser enganados e feridos. Muitos são também os que acusam a religião e a fé de estar na origem da guerra, da discriminação, da opressão da liberdade individual. Desse modo vai engrossando sempre mais o número daquelas pessoas que não acreditam mais em Deus, porque não acreditam mais no amor de Deus. Não acreditam que o amor dos cristãos seja verdadeiro, de que amor de Deus seja realidade!
Dessa forma, entramos em uma nova era de gelo: sem acreditar que Deus nos ama, o mundo está destinado a se dissolver na escuridão e no frio cósmico. Se não há amor, estamos só nadando para o gelo escuro do fim cósmico. Nietzsche soube como ninguém exprimir o surgimento de uma nova era do gelo:
A compaixão contraria inteiramente a lei da evolução, que é a lei da seleção natural. A compaixão preserva tudo o que está maduro para perecer; luta em prol dos desterrados e condenados da vida... O homem perde poder quando se compadece... Nada é mais insalubre, em toda nossa insalubre modernidade, que a compaixão cristã.
Para enfrentar esse veneno, só há um antídoto: Deus nos ama e nós cremos no amor.
Hoje nós somos colocados diante da serpente elevada no deserto! Estamos diante de Jesus elevado na cruz, entre o céu e a terra, com os braços abertos. Estamos diante do amor que se derrama do seu lado perfurado. Esse é o momento decisivo:
Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado, porque não acreditou no nome do Filho unigênito!
c 24º DomTComum – Lc 15, 1-32 – Ano C – Exaltação da Cruz Jo 3,13-17 em 14-09-25
“Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo”.
Celebramos, neste domingo, a festa da “Exaltação da Santa Cruz”. Não exaltamos o sofrimento, a mortificação, as cruzes de cada dia... Nela mesma, a Cruz não tem sentido (instrumento de tortura), mas o que aconteceu nela: a fidelidade e a entrega radical de uma Vida em solidariedade com todos os crucificados da história.
Assim, à luz do Crucificado, vemos a Cruz como fonte de vida em um mundo de morte. A Cruz tem suas raízes no deserto em um momento de morte e como sinalo de vida (1ª. leitura). Agora, a Cruz é reveladora do Amor com que Deus ama o mundo e fonte de vida para que “todo o que n’Ele crer, tenha a vida eterna”.
No rosto desfigurado do Crucificado revela-se um Deus surpreendente, que rompe nossas imagens convencionais d’Ele e põe em questão toda prática religiosa que pretenda prestar culto a Ele, esquecendo o drama de um mundo que continua crucificando os mais indefesos e inocentes. Se Deus morreu identificado com as vítimas da maldade humana, sua crucifixão se apresenta como um desafio inquietante para os seguidores de Jesus. Não podemos separar Deus do sofrimento dos inocentes; Ele sofre nos seus filhos e filhas.
Deus não está de acordo com a Cruz, mas está a favor do Crucificado. Na Cruz de Jesus se revela, ao mesmo tempo, o que Deus não quer (o sofrimento das vítimas) e o que Deus quer: a vida e a felicidade para todos, o entendimento e a reconciliação entre as pessoas e os povos, o trabalho por um mundo mais justo, no qual seja possível a vida para todos os filhos e filhas d’Ele.
À luz do Crucificado, vemos a Cruz como fonte de vida em um mundo de morte – Adroaldo Palaoro
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Na vida e missão de Jesus encontramos duas paixões: a primeira, foi a paixão pela vida, pelo Reino, pelo compromisso em favor dos mais pobres e excluídos. Esta paixão foi expressão de uma opção, assumida fielmente por Ele até o fim.
A segunda paixão foi a da cruz (patíbulo), imposta pelos poderes religiosos e civis. Ela não foi fruto da opção de Jesus e nem fazia parte da vontade do Pai. Ela é a visibilização da violência, do ódio, do fechamento frente à proposta de vida revelada pelo mesmo Jesus.
Sabemos que a cruz só tem sentido quando é consequência de uma opção autêntica em favor da vida ou de uma verdade assumida: por exemplo, se sofremos por levar adiante uma causa justa, por defender pessoas, por evitar um mal ou denunciar uma injustiça... Jesus não morreu na cruz para buscar o sofrimento, mas por ser fiel até o final à sua mensagem: o amor incondicional ao Pai e o compromisso com os excluídos.
No grego, “cruz” é “staurós” e tem dois significados: de um lado, é patíbulo, instrumento de tortura imposta pelos romanos aos rebeldes do império; de outro, significa prontidão, estar preparado, mobilizado, firme, sólido, estar de pé, ser fiel até o fim...
Jesus não buscou a cruz do sofrimento, o patíbulo, a morte violenta... Ele buscou a cruz da fidelidade, da vida comprometida. Nesse sentido, a “staurós-cruz” é vida aberta, expansiva, oblativa, vida descentrada em favor dos outros. Ela não foi um evento, mas um modo de viver, pois perpassou toda a vida de Jesus.
“Cruz-staurós” foi vivida a partir de uma causa: o Reino.
Nesse sentido, a cruz de Jesus não foi um “peso morto” a ser suportado; ela foi consequência de uma opção radical em favor da vida; a cruz não significou passividade e resignação, pois ela brotou de uma vida plena e transbordante. Nesse sentido, a cruz resume, concentra, radicaliza, condensa o significado de uma vida vivida na fidelidade ao Pai, que quer que todos vivam intensamente.
A cruz, desligada de uma vida comprometida, não tem sentido; ela é salvífica quando é assumida e vivida em favor dos demais. Nunca é sofrimento buscado, como se Deus necessitasse de nossa dor para nos redimir. A Cruz liberta quando não acaba na cruz, mas na ressurreição. Enquanto a carregamos, ela se torna leve se temos diante de nós um horizonte de esperança. “Vinde a mim todos vós que estais fatigados e sobrecarregados, e eu vos darei descanso. Porque meu jugo é suave e meu peso é leve” (Mt 11,28-30). Infelizmente, a história da espiritualidade cristã confundiu “cruz-patíbulo” com “cruz-fidelidade” e acabou gerando uma espiritualidade do sofrimento, da mortificação, da renúncia... como se isso fosse agradável a Deus. A Paixão e Morte de Jesus foi “desconectada” de sua vida comprometida em favor dos pobres e sofredores, dando a impressão que só a “paixão de Jesus” é salvífica. Toda a vida de Jesus é salvação porque é vida que destrava vidas e abre para elas um novo sentido.
A cruz, desligada de uma vida comprometida, não tem sentido; ela é salvífica quando é assumida e vivida em favor dos demais – Adroaldo Palaoro
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Com isso, privilegiou-se a “cruz da dor” desligada da “cruz da vida”, do compromisso com o Reino. Tal concepção desembocou numa vivência cristã intimista, farisaica, alienada, descompromissada...
Sabemos que o(a) seguidor(a) de Jesus quando vive a fidelidade à “cruz-staurós”, por causa do Reino, pode encontrar a perseguição, oposição e morte, como o próprio Jesus (a cruz patíbulo). Mas Jesus também acolheu e integrou a “cruz patíbulo”, dando um sentido a ela e revelando sua máxima solidariedade com todos os crucificados da história. Por isso, na Cruz assumida o Crucificado se fez amigo dos crucificados.
A Cruz assumida por Jesus manifestou-se “expansiva” porque foi expressão de uma vida entregue; ao mesmo tempo, ela O projetou para a “margem” onde Ele revelou uma presença despojada, vulnerável, que se identificou com a dor do mundo, com a marginalização dos excluídos e com a desgraça de todos os miseráveis da terra. Sua Cruz manifestou que Deus é Compaixão porque continua do lado do inocente sofredor; Deus não apenas se solidariza, mas sofre “em sua pele” a dor de seus filhos e filhas.
Existem cruzes que são vazias, sem sentido, in-sensatas..., pois elas fecham a pessoa em si mesma, no seu sofrimento e angústia; não apontam para o futuro, para a vida.
São cruzes que nós mesmos colocamos sobre nossos ombros ou que os outros nos impuseram. São cruzes que nascem dos fracassos, dos traumas, das rejeições, das experiências frustrantes... Tornam-se um “peso morto” pois não abrem um horizonte de vida; elas nos fixam no passado, na morte... e nos deixam no túmulo. Fazer o caminho contemplativo junto a Jesus, que leva a Cruz da fidelidade, nos ajuda a romper com as cruzes que nos afundam no desespero.
Como diz o teólogo Jon Sobrino, não podemos crer no Crucificado de um modo coerente se não estamos dispostos a fazer descer da Cruz aqueles que estão dependurados nela – Adroaldo Palaoro
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A festa da “exaltação da Santa Cruz” nos faz “descer” com Jesus até à cruz da humanidade. A solidariedade com os pobres, a fidelidade à vida evangélica, o compromisso com a vida e com a causa do Reino, nos fazem descer aos porões das contradições sociais e políticas, às realidades inóspitas, aos terrenos contaminados e difíceis, às periferias insalubres das quais todos fogem e onde os excluídos deste mundo lutam por sobreviver. Ali nos encontramos com o Crucificado, o “Justo e Santo”, identificado com os crucificados da história.
Como diz o teólogo Jon Sobrino, não podemos crer no Crucificado de um modo coerente se não estamos dispostos a fazer descer da Cruz aqueles que estão dependurados nela.
É gratificante fazer memória de tantos homens e mulheres que são presença compassiva e, inspirados no Crucificado, consomem suas vidas em favor da vida; histórias silenciosas de tantas pessoas que com suas presenças ajudam os outros a viver; pessoas que revelam a paixão por viver em pequenas paciências cotidianas, que entregam suas vidas sem brilho algum, sem vozes que as proclamem; são como o fermento silencioso que se dissolve na massa para fazê-la crescer; pessoas solidárias que ajudam a carregar as cruzes de tantos que são rejeitados, incompreendidos, odiados, perseguidos...; pessoas que visibilizam a Cruz da fidelidade de Jesus.
Para meditar na oração:
Associar-se ao Crucificado em sua “descida” para “subir” com Ele significa, também, arrancar do próprio coração a cumplicidade com todo tipo de morte e deixar-se possuir pela glória de Deus.
- Quando levantamos nossos olhos até o rosto do Crucificado, contemplamos o Amor insondável de Deus; se O contemplarmos mais atentamente, logo descobriremos, nesse Rosto, o rosto de tantos outros crucificados, longe ou perto de nós, reclamando nosso amor solidário e compassivo.
- Diante do Crucificado, trazer à memória os crucificados de hoje: isto o afeta? O deixa inquieto? O incomoda?
Hoje celebramos a festa da Exaltação da Santa Cruz. Esta festividade remonta ao século IV d.C., onde a tradição faz referência à descoberta da “verdadeira cruz”, que seria a cruz de Cristo. Diz-se que Santa Helena, mãe do imperador Constantino, descobriu essa cruz, daí o seu nome: Vera Cruz. A cruz é um dos símbolos mais antigos e universais do mundo, e seu significado varia de acordo com a cultura, as tradições religiosas e o contexto histórico.
Para o Império Romano, não era um símbolo religioso e muito menos espiritual, era um dos instrumentos de punição mais cruéis e degradantes, aplicado a escravos, rebeldes, criminosos e inimigos do Estado. Os cidadãos romanos não podiam ser crucificados. A crucificação era o método de execução pública mais cruel. Os crucificados eram expostos fora da cidade, em estradas ou áreas movimentadas, como forma de humilhação pública, para prolongar seu sofrimento e gerar medo e terror naqueles que ousassem se rebelar contra o sistema imperial. Uma maneira de silenciar possíveis rebeldes e manter a ordem estabelecida pelo Império: a pax romana.
Jesus foi crucificado, morreu como um condenado, com a pior humilhação que uma pessoa poderia receber naquela época: como escravo, rebelde, acompanhado por um pequeno grupo e observado pelas multidões que passavam. Não foi fácil para o cristianismo do primeiro século assumir a cruz como símbolo da entrega amorosa de Deus, que nos oferece seu amor até o extremo. Para nossas culturas e tradições religiosas, a cruz é um símbolo de esperança, de salvação e do amor de Deus, que sempre privilegiou a verdade, a justiça e o amor a cada pessoa com sua originalidade e liberdade, mas não era assim nos primeiros tempos.
O cristianismo não é uma religião que exalta a dor, mas é um caminho onde o sofrimento adquire uma nova perspectiva, a cruz cristã não nega o sofrimento, abraça-o e transforma-o – Ana Maria Casarotti
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Na carta aos Filipenses, São Paulo diz: “Jesus Cristo, existindo em condição divina, não fez do ser igual a Deus uma usurpação, mas ele esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e tornando-se igual aos homens. Encontrado com aspecto humano, humilhou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz” (Fl 2,6-8). A cruz não é vista simplesmente como um instrumento de tortura, mas nela ressalta a entrega de Jesus que se humilha, “tornando-se igual aos homens”. Assim se redescobre o Amor de Deus que se faz homem em Jesus e toma o último lugar para se tornar semelhante em tudo a nós. Jesus transforma assim a dor em esperança e libertação. O cristianismo não é uma religião que exalta a dor, mas é um caminho onde o sofrimento adquire uma nova perspectiva, a cruz cristã não nega o sofrimento, abraça-o e transforma-o.
No evangelho deste domingo, Nicodemos dialoga com Jesus. Lembremo-nos que Nicodemos era um fariseu que foi ver Jesus à noite, reconhecendo-o como Mestre pelos sinais que realizava. Jesus o convida a nascer de novo para ver o Reino de Deus, mas ele não entende, pois interpreta esse nascimento de maneira biológica! Jesus o convida a deixar sua sabedoria, “mestre de Israel”, para reconhecer nele o filho de Deus e, por isso, diz-lhe:
"Ninguém subiu ao céu, a não ser aquele que desceu do céu, o Filho do Homem. Do mesmo modo como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que o Filho do Homem seja levantado, para que todos os que nele crerem tenham a vida eterna”.
Fazendo alusão ao texto de Nm 21,6ss, que traz a narrativa da serpente que foi levantada por Moisés para que, olhando para ela, todos fossem curados, quando caminhavam pelo deserto, o texto apresenta a cruz como o ápice da revelação, onde se encontra a salvação. Jesus morreu crucificado, mas esse “ser levantado” não se refere apenas à crucificação, mas também à nova vida, à exaltação espiritual: a cruz se torna o trono a partir do qual Jesus reina com amor. A cruz não é mais símbolo de morte ou castigo, mas a máxima expressão do amor de Deus.
Pois Deus amou tanto o mundo, que deu o seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna.
Em Jesus, a dor e o sofrimento não desaparecem, mas ganham um novo significado. Jesus não celebra a dor nem a coloca como algo bom por si só. O cristianismo não é uma religião que valoriza a dor ou nega sua existência, pois ela faz parte das limitações humanas. Através da sua Páscoa, com sua paixão, morte e ressurreição, Jesus trouxe um novo entendimento para o sofrimento humano. A cruz nos lembra que o sofrimento não é o fim, mas uma etapa de um caminho que pode ser iluminado pela esperança da ressurreição, que transforma e dá sentido até mesmo ao que dói no coração. Em Jesus, o símbolo da cruz adquire um novo sentido: o que era instrumento de opressão se torna libertação. A cruz cristã não nega o sofrimento, ela o abraça e o transforma. É sempre o lembrete de que mesmo na escuridão mais profunda pode surgir a luz.
O Papa Leão XIV expressou na catequese desta quarta-feira: “Na cruz, Jesus não morre em silêncio. Não se apaga lentamente, como uma luz que se consome, mas deixa a vida com um grito: «Jesus, dando um forte grito, expirou» (Mc 15, 37). Aquele brado encerra tudo: dor, abandono, fé, oferenda.
Não é apenas a voz de um corpo que cede, mas o último sinal de uma vida que se entrega”. E continua dizendo: “Estamos habituados a pensar no grito como algo descontrolado, a reprimir. O Evangelho confere ao nosso grito um valor imenso, recordando-nos que pode ser invocação, protesto, desejo, entrega. Pode ser até a forma extrema da oração, quando já não temos palavras. Naquele clamor, Jesus colocou tudo o que lhe restava: todo o seu amor, toda a sua esperança!”
Nesta Festa da Exaltação da Santa Cruz nos deixamos interpelar pelas suas palavras: “Quando tudo parecia acabado, na realidade a salvação estava prestes a começar. Se for manifestada com a confiança e a liberdade dos filhos de Deus, a voz sofrida da nossa humanidade, unida à voz de Cristo, pode tornar-se nascente de esperança, para nós e para quantos estiverem ao nosso lado (Audiência Geral 10 de setembro 2025)
(Confira com o texto em espanhol logo após o texto em português)
FESTA DA EXALTAÇÃO DA SANTA CRUZ 2025
“A Festa da Exaltação da Cruz é tão importante que interrompe o ciclo normal dos domingos, e para os nossos irmãos e irmãs, os cristãos do Oriente, é ainda mais importante; é praticamente uma segunda Páscoa. A festa teve origem entre eles em Jerusalém para comemorar a consagração da Basílica do Santo Sepulcro em 335, onde se venerava a madeira, que segundo a venerável tradição era a da cruz de Jesus. Quando, em 630, o Imperador Heráclio conseguiu recuperá-la, derrotando os persas que a haviam roubado, a memória da sua consagração juntou-se à da sua feliz recuperação. A partir daí, a festa espalhou-se pela Igreja Latina. Para nós, cristãos do hemisfério sul, esta festa, que se celebra às portas da nossa primavera, oferece uma excelente oportunidade para celebrar esta segunda Páscoa num momento em que a vida renasce com toda a sua força e, por assim dizer, 'ressuscita'…” (Max Alexander).
Primeira Leitura (Nm 21,4b-9)
A jornada de Israel pelo deserto é um caminho de provações, à medida que surgem necessidades básicas: fome e sede, devido à falta de pão e água. Esta leitura nos fala de um desses episódios de "crise" entre o povo, que se queixa contra Javé e Moisés, acusando-os de tê-los levado ao deserto para serem mortos: "Por que nos fizestes sair do Egito para morrermos no deserto? Aqui não há pão nem água, e já estamos fartos desta comida miserável!" (Números 21:5). Deus então puniu essa rebelião enviando "serpentes ardentes", uma expressão que pode aludir ao fato de as víboras serem de cor avermelhada, ou ao fato de a picada de suas mordidas ser ardente. E muitos morreram em consequência de suas mordidas. Quando o povo se arrepende e confessa seu pecado, Deus ordena a Moisés: "Faça uma serpente ardente e coloque-a em uma haste. Quem for mordido e olhar para ela viverá." Moisés fez uma serpente de bronze e a colocou em uma haste. Toda vez que alguém era mordido por uma serpente, se olhasse para a serpente de bronze, ficaria curado” (Números 21:8-9).
A mensagem seria que o gesto de olhar para a serpente de bronze experimentava a eficácia da salvação que Deus oferece àqueles que reconhecem seu pecado e têm fé nele. É pelo menos assim que o Livro da Sabedoria o entendeu, comentando esse fato, que diz: “Como advertência, eles foram afligidos por um pouco de tempo, tendo já o penhor da salvação, para que se lembrassem do mandamento da tua Lei; de fato, quem se voltava para ela era salvo, não pelaquilo que olhava, mas por ti, o Salvador de todos. Assim mostraste aos nossos inimigos que és tu que livras de todo mal: eles morreram da picada de gafanhotos e moscas, e nenhum remédio foi encontrado para suas vidas, pois mereciam ser punidos por aqueles animais. Mas contra os teus filhos, nem mesmo os dentes das serpentes venenosas puderam prevalecer, porque a tua misericórdia chegou até eles e os curou” (Sb 16,6-10).
Segunda lectura (Flp 2,6-11)
Este texto nos dá uma visão abrangente do mistério de Cristo, apresentando-o, em categorias espaciais, como um duplo movimento: primeiro descendente (vv. 6-8) e depois ascendente (9-11).
O primeiro momento, descendente, começa com a expressão: "existindo em forma divina" (6a), que implica uma profunda percepção da relação única e exclusiva de Jesus com Deus. Esse movimento descendente é caracterizado por duas ações de Cristo: "esvaziou-se a si mesmo" e "humilhou-se a si mesmo", que expressam as duas fases de um único abaixamento progressivo.
O esvaziamento ou kenosis é o primeiro passo da "condição de Deus" para a "condição de escravo ou servo" (vv. 6-7). À luz desse contraste entre a condição divina e a condição de escravo, entendemos que a kenosis de Cristo consiste no fato de que, durante sua vida terrena, ele não escolheu se manifestar com a glória própria de Deus, mas sim como servo, privado de toda dignidade, autoridade e poder; dedicou-se completamente ao humilde serviço aos outros, como um escravo.
A humilhação, o segundo passo, é "aceitar a morte em obediência, e morte de cruz" (v. 8). Essa autohumilhação de Jesus consiste em uma negação total de si mesmo por meio da obediência ao Pai. É uma obediência extrema, até o fim, equivalente ao amor extremo de João 13:1. É o oposto da desobediência de Adão (Gênesis 3), que deve ser reparada pela obediência filial.
A descrição desse movimento descendente de Jesus revela uma compreensão unitária das escolhas fundamentais feitas por Ele ao longo de Sua vida terrena.
Na segunda parte, temos o movimento ascendente, que envolve uma mudança no sujeito dos verbos, pois é Deus, o Pai, quem realiza a exaltação e a concessão do "Nome que está acima de todo nome" (v. 9). Em seguida, é apresentada a intenção ou motivação para essa exaltação de Jesus por Deus: que todos o adorem e o proclamem como Senhor.
O movimento de exaltação atinge seu ápice na dádiva divina do nome a Jesus; e este nome de Senhor (Ku,rioj) abrange o senhorio universal que o Antigo Testamento reconhecia em Javé. Portanto, os atos de adoração e confissão oferecidos a Jesus por todas as criaturas, incluindo as celestiais, são justificados e até mesmo exigidos. E tudo isso, em suma, é para a "glória de Deus Pai" (11c).
Evangelho (Jo 3,13-17)
O Evangelho também começa falando do duplo movimento para cima e para baixo. Especificamente, Jesus diz que somente Ele, que desceu do céu, pode ascender e permanecer ali. Ele então se refere à Sua Paixão como uma exaltação.
Ora, o texto deste domingo deve ser interpretado tendo em conta que se situa no contexto de Números 21,4-9, a primeira leitura de hoje. O Targum sobre Números 21,4-9 combina este texto com Gênesis 3,1, e assim a ambiguidade ou ambivalência da serpente é acentuada: por um lado, as "serpentes de fogo" são uma expressão da serpente original, a causa do pecado humano; por outro, a "serpente de bronze" é benéfica para o povo e um símbolo da vontade salvífica de Deus. E isto continua no Quarto Evangelho, onde a ambiguidade do símbolo da serpente serve para expressar a dupla face do Mistério Pascal: uma negativa, a morte; a outra positiva, a ressurreição. A morte está associada ao pecado, ao triunfo do mal e da serpente original. Mas esta negatividade é seguida pelo triunfo da vida através da exaltação ou elevação na cruz. A serpente erguida ao alto vence as serpentes de fogo. Jesus, erguido na cruz, vence a serpente do princípio. 1 E assim como aqueles que olharam para a serpente de bronze foram curados, agora aqueles que "crêem" em Cristo crucificado como a expressão suprema do amor de Deus têm a vida eterna.
Portanto, o Evangelho nos ensina que a salvação vem a nós através do sacrifício do Filho na cruz e é obra de Deus, que "amou o mundo de tal maneira". De fato, era dever de Deus fazer justiça punindo o pecado humano; mas, em vez disso, ele oferece a vida de seu Filho, que é a sua própria vida, em troca do pecado.
A cruz com Cristo, vista com fé, revela-nos o amor sublime de Deus e a sua realidade paterna: «Deus amou tanto o mundo que lhe deu o seu Filho único, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna» (Jo 3, 16).
Mas este texto de João 3,16 também nos revela algo muito importante que às vezes tem sido negligenciado: o amor do Pai. A fonte do amor que leva o Filho a se entregar e que dá sentido à sua Paixão é o Pai. “De fato, a Cruz não é apenas a história do Filho: ele é entregue à morte por Deus, seu Pai. É Ele quem segura em seus braços o madeiro da vergonha; a árvore do abandono. Deus não é imperturbável. Ele sofre por amor a nós. Ele é o Deus que João Paulo II, na Encíclica Dominun et Vivificantem, mostra como o Pai capaz de amor infinito, precisamente porque é capaz de sofrimento infinito.”2
Algumas reflexões:
Celebrar a exaltação da Cruz pode ser chocante para a nossa sensibilidade humana. Somente da perspectiva de Deus podemos compreender algo deste mistério central da nossa fé. 3 Não é algo que possamos deixar de lado. Negar ou esconder a Cruz nada mais é do que um engano temporário. Mas é importante notar que não é a Cruz nua e seca, mas Cristo crucificado, que exaltamos e celebramos, porque foi o próprio Pai quem O exaltou e glorificou.
As três leituras nos convidam a olhar para a obra de Deus, o que Deus faz e como o faz.
Na primeira leitura, vemos a infidelidade do povo, seu pecado de desconfiança e murmuração, que recebe um castigo justo de Deus. Mas, ao mesmo tempo, com uma imagem daquilo com que pune, Ele concede a salvação ao seu povo.
A segunda leitura nos oferece uma visão integrativa da obra de Jesus e do Pai. O movimento voluntário de abnegação e extrema obediência filial de Jesus, e a consequente elevação que o Pai lhe concede por isso mesmo.
O Evangelho, por sua vez, convida-nos a olhar e a crer no Filho elevado na cruz, causa da nossa salvação eterna e manifestação máxima do amor do Pai.
Vemos, então, que na Cruz de Cristo, ou melhor ainda, em Cristo crucificado e exaltado, se unem a punição do pecado e o perdão de Deus, a justiça divina e a misericórdia. A esse respeito, há uma frase muito profunda de João Paulo II: "A redenção do mundo — esse tremendo mistério de amor, no qual a criação se renova — está em sua raiz mais profunda 'a plenitude da justiça num coração humano': no coração do Filho Primogênito, para que a justiça seja feita no coração de muitos homens, que, precisamente no Filho Primogênito, foram predestinados desde a eternidade a ser filhos de Deus e chamados à graça, chamados ao amor. A Cruz do Calvário, pela qual Jesus Cristo deixa este mundo, é ao mesmo tempo uma nova manifestação da paternidade eterna de Deus, que n’Ele se aproxima novamente da humanidade, de cada pessoa, dando-lhe o três vezes santo 'Espírito da verdade'" (Redemptor Hominis, n. 9).
Segundo João 3:16, o Filho Unigênito foi dado à humanidade para que o homem não pereça, mas tenha a vida eterna. Este texto, sobre o qual João Paulo II meditou extensamente em Salvifici Doloris, indica claramente que é o amor que motiva a entrega do Filho, a entrega do próprio Jesus em sua Paixão. Vale a pena notar que o amor abraça a cruz como uma forma sublime de expressão: "Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida pelos seus amigos" (João 15:13).
Assim, o amor dá sentido à cruz, orienta-a para a entrega de si pelos outros e a torna redentora. A cruz, sinal de maldição e morte, transforma-se em meio de vida e fecundidade: “Em verdade vos digo: se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto” (João 12:24).
A este respeito, o Papa Francisco disse no Angelus de 14 de setembro de 2014: “No dia 14 de setembro, a Igreja celebra a festa da Exaltação da Santa Cruz. Alguns não cristãos podem nos perguntar: por que “exaltar” a cruz? Podemos responder que não exaltamos qualquer cruz, nem todas as cruzes: exaltamos a cruz de Jesus, porque nela o amor de Deus pela humanidade se revelou em plenitude. É o que nos recorda o Evangelho de João na liturgia de hoje: “Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito” (3,16). O Pai “deu” o Filho para nos salvar, e isso envolveu a morte de Jesus, e a morte na cruz. Por quê? Por que a cruz foi necessária? Por causa da gravidade do mal que nos escravizou. A cruz de Jesus expressa ambas: toda a força negativa do mal e toda a suave onipotência da misericórdia de Deus. A cruz parece determinar o fracasso de Jesus, mas na realidade manifesta a sua vitória. No Calvário, aqueles que zombavam dele disseram: "Se és Filho de Deus, desce da cruz" (cf. Mt 27,40). Mas o oposto era verdadeiro: precisamente por ser Filho de Deus, ele estava ali na cruz, fiel até o fim ao plano de amor do Pai. E precisamente por isso, Deus "exaltou" Jesus (Fp 2,9), conferindo-lhe a realeza universal.
E quando voltamos o olhar para a cruz onde Jesus foi pregado, contemplamos o sinal do amor, do amor infinito de Deus por cada um de nós e a raiz da nossa salvação. Dessa cruz brota a misericórdia do Pai, que abraça o mundo inteiro. Pela cruz de Cristo, o mal foi derrotado, a morte foi vencida, a vida nos foi dada, a esperança foi restaurada. A cruz de Jesus é a nossa única e verdadeira esperança. É por isso que a Igreja "exalta" a Santa Cruz, e nós, cristãos, abençoamos com o sinal da cruz. Em outras palavras, não exaltamos cruzes, mas a cruz gloriosa de Jesus, sinal do imenso amor de Deus, sinal da nossa salvação e caminho para a Ressurreição. E esta é a nossa esperança.
Ora, esse duplo movimento, descendente e ascendente, é o mesmo ritmo que caracteriza toda a vida cristã, onde a cruz tem o seu lugar.
Aparentemente, alguém se inclinaria a afirmar que o movimento descendente é realizado somente por Deus e que o movimento ascendente nos inclui. Mas, na realidade, tanto o movimento descendente quanto o ascendente são nossos. Pois devemos descer ao nosso próprio inferno ou abismo e ali aceitar nossa condição pecaminosa e a redenção de Cristo. Lá, nas profundezas, onde a misericórdia de Deus e a miséria do homem se encontram face a face e se beijam.
Este é o caminho da humildade. É único, pois não há outro que nos conduza a Deus. É por isso que esta virtude tem sido considerada, juntamente com a fé, a esperança e a caridade, quase como uma quarta virtude teologal. E isso só pode ser alcançado se se aceitar o caminho da cruz, o caminho do esvaziamento de si mesmo, da humilhação, da obediência filial... Em suma, trata-se, como diria São Paulo, de se deixar crucificar com Cristo, para com Ele ser glorificado.
Como nos é difícil aceitar a cruz, encontrar nela um sentido. Mas quanta fecundidade brota desse primoroso amadurecimento da vida cristã, como testemunham as vidas de tantos homens de Deus. Um deles, o Beato Cardeal Eduardo Pironio, escreveu em seu testamento: "Magnificat! Agradeço ao Senhor pelo privilégio da sua cruz. Sou muito feliz por ter sofrido tanto. Meu único arrependimento é não ter sofrido bem e nem sempre ter saboreado a minha cruz em silêncio."
PARA ORAÇÃO (RESSONÂNCIAS DO EVANGELHO EM UMA ORAÇÃO):
O Pão que desceu do céu
Seu caminho foi na noite, Nicodemos
Medo ou vergonha iluminaram o caminho
Conte-nos sobre esse encontro
Cara a cara com o Senhor e Mestre
Foi difícil entender aquela lição
Para um coração fechado não há opção
Deve ter sido seu jeito, seu tom de voz.
Cara a cara com o Filho de Deus
E assim ele explicou a você sobre sua morte e ressurreição
Do presente que seu Pai nos enviou
Hoje em dia, nós também não entendemos isso.
Face a face no Sacramento do Amor
É difícil suportar o fracasso e a dor
Linguagem dura do próprio Deus
Depois o crucificado foi a sua explicação
Face a face a Cruz e você
Irmãos em Cristo para a Glória de Deus
O céu se abriu e há um novo sol
O julgamento da vergonha e do medo expirou
Cristo se tornou o Pão do céu para nossa salvação. Amém.
1 Seguimos de perto o que foi afirmado por J. Asurmendi em seu artigo “As Mudanças da Serpente”, na Biblical Review 9 (1996) 63-64.
2 B. Forte. Intervenção por teleconferência publicada em clerus.org.
3 O mesmo se aplica do ponto de vista existencial ou psicológico. A esse respeito, A. Cencini afirma: "Todo ser humano precisa de um centro ao qual se referir e do qual depender, um centro de onde partir e ao qual retornar, como uma raiz da qual brotar e rebrotar a cada dia, ou como aquilo que dá a certeza absoluta da própria bondade e "positividade". Por isso, repetimos que nada como a cruz pode atuar como centro vital da vida, nem ser a raiz sadia e energética daquela árvore de vida nova que se abre ao projeto concebido pelo Pai. Porque a vocação, como a alegria, tem raízes em forma de cruz!" A Cruz, Verdade de Vida (Paulinas; Lima 2003) 56.
FIESTA DE LA EXALTACIÓN DE LA SANTA CRUZ 2025
“La fiesta de la exaltación de la Cruz es tan importante que interrumpe el normal ciclo de los domingos y para nuestros hermanos, los cristianos de Oriente, es más importante todavía, es prácticamente una segunda Pascua. La fiesta se originó entre ellos, en Jerusalén, para recordar la consagración de la basílica del Santo Sepulcro en el año 335, en la cual se veneraba el leño, que según venerable tradición, era el de la cruz de Jesús. Cuando en el 630 el emperador Heraclio logró recuperarlo, derrotando a los persas que lo habían sustraído, al recuerdo de la consagración se agregó el de su feliz recuperación. A partir de entonces la fiesta se extendió a la Iglesia latina. A nosotros, los cristianos del hemisferio sur, esta fiesta que cae en las puertas de nuestra primavera, nos brinda una excelente oportunidad de celebrar esta segunda Pascua en un momento en el que la vida rebrota con toda su fuerza y como que ‘resucita’…” (Max Alexander).
Primera lectura (Num 21,4b-9)
El camino de Israel por el desierto es un camino de pruebas porque surgen las necesidades primarias, el hambre y la sed, ante la carencia de pan y de agua. Esta lectura nos narra uno de estos episodios de “crisis” del pueblo que murmura contra Yavé y contra Moisés acusándolos de haberlos llevado al desierto para hacerlos morir: “¿Por qué nos hicieron salir de Egipto para hacernos morir en el desierto? ¡Aquí no hay pan ni agua, y ya estamos hartos de esta comida miserable!” (Nm 21,5). Entonces Dios castigó esta rebelión enviando unas “serpientes abrasadoras”, expresión que puede hacer alusión a que las víboras tenían color rojizo; o al hecho de que el ardor de sus mordeduras quemaba. Y muchos mueren a consecuencia de las mordeduras. Cuando el pueblo se arrepiente y confiesa su pecado, Dios manda a Moisés: “Hazte una serpiente abrasadora y ponla sobre un mástil. Todo el que haya sido mordido y la mire, vivirá. Moisés hizo una serpiente de bronce y la puso sobre una asta. Y cuando alguien era mordido por una serpiente, miraba hacia la serpiente de bronce y quedaba curado” (Nm 21,8-9).
El mensaje sería que en el gesto de mirar a la serpiente de bronce se experimentaba la eficacia de la salvación que Dios ofrece a quien reconoce su pecado y tiene fe en él. Así lo entendió, al menos, el libro de la Sabiduría pues comentando este hecho dice: “A manera de advertencia, fueron atribulados por poco tiempo, teniendo ya una prenda de salvación para que recordaran el mandamiento de tu Ley; en efecto, aquel que se volvía hacia ella era salvado, no por lo que contemplaba, sino por ti, el Salvador de todos. Así demostraste a nuestros enemigos que eres tú el que libra de todo mal: ellos murieron por la picadura de langostas y moscas, y no se podía encontrar un remedio para sus vidas, porque merecían ser castigados por esos animales. Pero contra tus hijos, ni siquiera pudieron los dientes de las serpientes venenosas, porque tu misericordia vino a su encuentro y los sanó” (Sab 16,6-10).
Segunda lectura (Flp 2,6-11)
Este texto nos brinda una mirada integral del misterio de Cristo presentándolo, en categorías espaciales, como un doble movimiento: primero descendente (vv. 6-8) y luego ascendente (9-11).
El primer momento, el descendente, comienza con la expresión: ‘existiendo en condición de Dios’ (6a) lo que supone una percepción profunda de las relaciones únicas y exclusivas de Jesús con Dios. Este movimiento descendente está caracterizado por dos acciones de Cristo: ‘se vació de sí mismo’ y ‘se humilló’ que expresan las dos fases de un único abajamiento progresivo.
El vaciamiento o kénosis es el primer paso de la ‘condición de Dios’ a la ‘condición de esclavo o siervo’ (vv. 6-7). A la luz de esta contraposición entre la condición divina y la condición de esclavo se comprende que la kénosis de Cristo consiste en que Él durante su vida terrena no quiso manifestarse con la gloria propia de Dios, sino como siervo, privado de toda dignidad, autoridad y poder; se dedicó completamente al humilde servicio de los demás, como un esclavo.
La humillación, el segundo paso, es "aceptar por obediencia la muerte y muerte de cruz" (v. 8). Esta autohumillación de Jesús consiste en una total negación de sí mismo por la obediencia al Padre. Es la obediencia extrema, hasta el fin, equivalente al amor extremo de Jn 13,1. Es la contracara de la desobediencia de Adán (Gn 3) que debe ser reparada por la obediencia filial.
La descripción de este movimiento descendente de Jesús revela una comprensión unitaria de las opciones fundamentales realizadas por El a lo largo de su vida terrena.
En la segunda parte tenemos el movimiento ascendente, que implica un cambio del sujeto de los verbos, pues es Dios, el Padre, quien obra la exaltación y la donación "del Nombre que está sobre todo nombre" (v. 9). Luego se presenta la intención o motivación de esta exaltación de Jesús por parte de Dios: que todos lo adoren y lo proclamen como el Señor.
El movimiento de exaltación tiene su cumbre en la donación del nombre hecha por Dios a Jesús; y este nombre de Señor (Ku,rioj) comprende el señorío universal que el AT reconocía a Yavé y, por tanto, los actos de adoración y confesión que le brindan a Jesús todas las criaturas, incluidas las celestiales, son justificados y hasta exigidos. Y todo esto, en fin, es para ‘gloria de Dios Padre’ (11c).
Evangelio (Jn 3,13-17)
También el evangelio comienza hablando del doble movimiento ascendente y descendente. En concreto Jesús dice que sólo Él, quien descendió del cielo, puede subir allí y permanecer allí. Y a continuación hace referencia a su pasión como una exaltación.
Ahora bien, el texto de este domingo hay que interpretarlo teniendo en cuenta que tiene como trasfondo el relato de Nm 21,4-9, primera lectura de hoy. El Tárgum de Nm 21,4- 9 combina este texto con Gn 3,1 y entonces queda acentuada la ambigüedad o ambivalencia de la serpiente: por un lado las "serpientes abrasadoras" son una expresión de la serpiente original, causante del pecado del hombre; por otro la "serpiente de bronce" es benéfica para el pueblo y símbolo de la voluntad salvífica de Dios. Y esto pasa al cuarto evangelio donde la ambigüedad del símbolo de la serpiente sirve para expresar la doble faceta del misterio pascual: una negativa, la muerte; otra positiva, la resurrección. La muerte está asociada al pecado, al triunfo del mal y de la serpiente originaria. Pero a esta negatividad le sucede el triunfo de la vida mediante la exaltación o elevación en la cruz. La serpiente levantada en alto vence a las serpientes abrasadoras. Jesús, al ser alzado en la cruz, vence a la serpiente de los orígenes1. Y así como los que miraban la serpiente de bronce quedaban curados, ahora los que "creen" en Cristo crucificado como expresión suprema del amor de Dios tienen vida eterna.
Por tanto, el evangelio nos enseña que la salvación nos viene por la entrega del Hijo en la cruz y que es obra de Dios que "tanto amó al mundo". En efecto, correspondía a Dios hacer justicia castigando el pecado de los hombres; pero en lugar de hacer esto ofrece la vida de su Hijo, que es su misma vida, a cambio del pecado.
La cruz con Cristo, mirada con fe, nos descubre el sublime amor de Dios y su realidad paterna: “Sí, Dios amó tanto al mundo, que entregó a su Hijo único para que todo el que cree en él no muera, sino que tenga Vida eterna” (Jn 3,16).
Pero también este texto de Jn 3,16 nos revela algo muy importante y que a veces se ha descuidado: el amor del Padre. La fuente del amor que lleva al Hijo a entregarse y que da sentido a su pasión es el Padre. “En efecto, la Cruz no es sólo la historia del Hijo: éste es entregado a la muerte por Dios, Su Padre. Es Él quien tiene entre los brazos el madero de la vergüenza; el árbol del abandono. Dios no es imperturbable. Él sufre por amor nuestro. Es el Dios que Juan Pablo II en la Encíclica Dominun et vivificantem, muestra como el Padre que es capaz de ejercer un infinito amor, justamente porque es capaz de tener un infinito dolor”2.
Algunas reflexiones:
Celebrar una fiesta a la exaltación de la cruz es un hecho que puede herir nuestra sensibilidad humana. Sólo desde la mirada de Dios, podemos comprender algo de este misterio central de nuestra fe3. No es algo que podemos dejar de lado. Negar u ocultar la cruz no es más que un engaño temporal. Pero importa notar que no se trata de la cruz desnuda y seca, sino que es a Cristo crucificado a quien exaltamos y festejamos porque ha sido el mismo Padre quien lo exaltó y glorificó.
Las tres lecturas nos invitan a mirar la obra de Dios, lo que Dios hace y cómo lo hace.
En la primera lectura vemos la infidelidad del pueblo, su pecado de desconfianza y murmuración, que recibe un justo castigo por parte de Dios. Pero al mismo tiempo con una imagen de aquello mismo con que castiga concede la salvación a su pueblo.
La segunda lectura nos ofrece una mirada integradora de la obra de Jesús y del Padre. El movimiento voluntario de despojamiento y obediencia filial extrema de Jesús y la consiguiente elevación que, por esto mismo, le concede el Padre.
El evangelio, por su parte, nos invita a mirar-creer en el Hijo levantado en la cruz, causa de nuestra salvación eterna y manifestación extrema del amor del Padre.
Vemos entonces que en la cruz de Cristo, o mejor en Cristo crucificado y exaltado, se conjugan el castigo por el pecado y el perdón de Dios, la justicia y la misericordia divinas. Al respecto hay una frase muy profunda de Juan Pablo II: "La redención del mundo - ese misterio tremendo del amor, en el que la creación es renovada - es en su raíz más profunda 'la plenitud de la justicia en un corazón humano': en el corazón del Hijo Primogénito, para que pueda hacerse justicia de los corazones de muchos hombres, los cuales, precisamente en el Hijo Primogénito, han sido predestinados desde la eternidad a ser hijos de Dios y llamados a la gracia, llamados al amor. La cruz sobre el calvario, por medio de la cual Jesucristo deja este mundo, es al mismo tiempo una nueva manifestación de la eterna paternidad de Dios, el cual se acerca de nuevo en El a la humanidad, a todo hombre, dándole el tres veces santo 'Espíritu de verdad'", (Redemptor Hominis n° 9).
Según Jn 3,16 el Hijo unigénito ha sido dado a la humanidad para que el hombre no muera, sino que tenga la vida eterna.Este texto, sobre el cual medita mucho Juan Pablo II en Salvifici Doloris, señala claramente que es el amor lo que motiva la entrega del Hijo, la propia entrega de Jesús en su pasión. Vale decir que el amor asume la cruz como forma sublime de expresión: “No hay amor más grande que dar la vida por los amigos” (Jn 15,13).
Así el amor da sentido a la cruz, la orienta en la entrega en favor de los demás, la vuelve redentora. La cruz, signo de maldición y de muerte, es transformada en medio de vida y fecundidad: “Les aseguro que si el grano de trigo que cae en la tierra no muere, queda solo; pero si muere, da mucho fruto” (Jn 12,24).
Al respecto decía el Papa Francisco en el ángelus del 14 de septiembre de 2014: “El 14 de septiembre la Iglesia celebra la fiesta de la Exaltación de la Santa Cruz. Alguna persona no cristiana podría preguntarnos: ¿por qué «exaltar» la cruz? Podemos responder que no exaltamos una cruz cualquiera, o todas las cruces: exaltamos la cruz de Jesús, porque en ella se reveló al máximo el amor de Dios por la humanidad. Es lo que nos recuerda el evangelio de Juan en la liturgia de hoy: «Tanto amó Dios al mundo que entregó a su Unigénito» (3, 16). El Padre «dio» al Hijo para salvarnos, y esto implicó la muerte de Jesús, y la muerte en la cruz. ¿Por qué? ¿Por qué fue necesaria la cruz? A causa de la gravedad del mal que nos esclavizaba. La cruz de Jesús expresa ambas cosas: toda la fuerza negativa del mal y toda la omnipotencia mansa de la misericordia de Dios. La cruz parece determinar el fracaso de Jesús, pero en realidad manifiesta su victoria. En el Calvario, quienes se burlaban de Él, le decían: «si eres el Hijo de Dios, baja de la cruz» (cf. Mt 27, 40). Pero era verdadero lo contrario: precisamente porque era el Hijo de Dios estaba allí, en la cruz, fiel hasta el final al designio del amor del Padre. Y precisamente por eso Dios «exaltó» a Jesús (Flp 2, 9), confiriéndole una realeza universal.
Y cuando dirigimos la mirada a la cruz donde Jesús estuvo clavado, contemplamos el signo del amor, del amor infinito de Dios por cada uno de nosotros y la raíz de nuestra salvación. De esa cruz brota la misericordia del Padre, que abraza al mundo entero. Por medio de la cruz de Cristo ha sido vencido el maligno, ha sido derrotada la muerte, se nos ha dado la vida, devuelto la esperanza. La cruz de Jesús es nuestra única esperanza verdadera. Por eso la Iglesia «exalta» la Santa Cruz y también por eso nosotros, los cristianos, bendecimos con el signo de la cruz. En otras palabras, no exaltamos las cruces, sino la cruz gloriosa de Jesús, signo del amor inmenso de Dios, signo de nuestra salvación y camino hacia la Resurrección. Y esta es nuestra esperanza”.
Ahora bien, este doble movimiento, descendente y ascendente, es el mismo ritmo propio de toda la vida cristiana donde la cruz tiene su lugar.
Aparentemente uno se inclinaría por afirmar que el movimiento descendente es protagonizado por sólo Dios y que el ascendente nos incluye a nosotros. Pero en realidad nos corresponde tanto el descendente como el ascendente. Porque debemos descender hasta nuestro propio infierno o abismo y allí aceptar nuestra condición pecadora y la redención de Cristo. Allí, en lo más profundo, donde la misericordia de Dios y la miseria del hombre se encuentran cara a cara y se besan.
Este es el camino de la humildad. Es único, pues no hay otro que nos lleve hasta Dios. Por eso se ha considerado a esta virtud junto a la fe, esperanza y caridad, casi como una cuarta virtud teologal. Y esto sólo puede lograrse si se acepta el camino de la cruz, el camino del vaciamiento de sí mismo, de la humillación, de la obediencia filial…En fin, se trata, como diría San Pablo, de dejarse crucificar con Cristo, para ser glorificado con Él.
Qué difícil se nos hace aceptar la cruz, encontrarle sentido. Pero cuanta fecundidad brota de esta maduración exquisita de la vida cristiana como lo testimonia la vida de tantos hombres de Dios. Uno de ellos, el Beato Cardenal Eduardo Pironio, escribió en su testamento: "¡Magnificat! Agradezco al Señor el privilegio de su cruz. Me siento felicísimo de haber sufrido mucho. Sólo me duele no haber sufrido bien y no haber saboreado siempre en silencio mi cruz".
PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):
El Pan que bajó del cielo
Tu camino fue en la noche, Nicodemo
El temor o la vergüenza alumbraron el sendero
Cuéntanos de ese encuentro
Frente a frente con el Señor y Maestro
Se complicaba entender esa lección
Para el corazón cerrado no existe opción
Habrá sido su modo, su tono de voz
Frente a frente con el Hijo de Dios
Y así te explicaba de su muerte y resurrección
Del regalo que su Padre nos envió
Tampoco lo entendemos hoy
Frente a frente en el Sacramento del Amor
Difícil se hace soportar el fracaso y el dolor
Lenguaje duro el del mismo Dios
Más tarde el crucificado fue tu explicación
Frente a frente la Cruz y vos
Hermanos en Cristo para la Gloria de Dios
El cielo se ha abierto y hay un nuevo sol
Ha caducado el juicio de la vergüenza y el temor
Cristo se hizo Pan del cielo para nuestra salvación. Amén.
1 Hemos seguido de cerca lo expuesto por J. Asurmendi en su artículo “Las mudas de la serpiente”, en Reseña Bíblica 9 (1996) 63-64.
2 B. Forte. Intervención en teleconferencia editada en clerus.org.
3 También lo es desde un punto de vista existencial o psicológico. Al respecto dice A. Cencini: "Todo ser humano necesita de un centro al cual referirse y del cual depender, un centro del cual partir y al cual volver, como raíz desde la cual florecer y volver a florecer cada día, o como lo que da la certeza absoluta de la propia amabilidad y "positividad". Entonces repetimos que nada como la cruz puede hacer de centro vital de la vida, o ser la raíz sana y rica de energía de aquel árbol de la vida nueva que se abre al proyecto pensado por el Padre. ¡Porque la vocación, al igual que la alegría, tiene las raíces en forma de cruz!", La cruz, verdad de la vida (Paulinas; Lima 2003) 56.