LINK AUXILIAR:
1ª Leitura: Gênesis 2,18-24
Salmo Responsorial 127(128)-R- O Senhor te abençoe de Sião, cada dia de tua vida.
2ª Leitura: Hebreus 2,9-11
Evangelho Marcos 10,2-16 (ou 2-12)
"2.Chegaram os fariseus e perguntaram-lhe, para o pôr à prova, se era permitido ao homem repudiar sua mulher. 3.Ele respondeu-lhes: “Que vos ordenou Moisés?”. 4.Eles responderam: “Moisés permitiu escrever carta de divórcio e despedir a mulher”. 5.Continuou Jesus: “Foi devido à dureza do vosso coração que ele vos deu essa Lei; 6.mas, no princípio da Criação, Deus os fez homem e mulher. 7.Por isso, deixará o homem pai e mãe e se unirá à sua mulher; 8.e os dois não serão senão uma só carne. Assim, já não são dois, mas uma só carne. 9.Não separe, pois, o homem o que Deus uniu”. 10.Em casa, os discípulos fizeram-lhe perguntas sobre o mesmo assunto. 11.E ele disse-lhes: “Quem repudia sua mulher e se casa com outra, comete adultério contra a primeira. 12.E se a mulher repudia o marido e se casa com outro, comete adultério”. (= Mt 19,13ss = Lc 18,15ss) 13.Apresentaram-lhe então crianças para que as tocasse; mas os discípulos repreendiam os que as apresentavam. 14.Vendo-o, Jesus indignou-se e disse-lhes: “Deixai vir a mim os pequeninos e não os impeçais, porque o Reino de Deus é daqueles que se lhes assemelham. 15.Em verdade vos digo: todo o que não receber o Reino de Deus com a mentalidade de uma criança, nele não entrará”. 16.Em seguida, ele as abraçou e as abençoou, impondo-lhes as mãos.
Gn 2,18-24
Deus é apresentado como um pai que educa sem forçar os ritmos de amadurecimento do filho, mas, que ao mesmo tempo, não deixa de incentivar e favorecer esse amadurecimento. Deus já tinha decidido: “vou providenciar um auxílio que lhe corresponda” (2,18). Antes, porém, de criar a mulher, Deus modelou do solo todos os animais selvagens e todas as aves do céu, e os trouxe ao homem para ver que nome lhes daria.
Ao dar nome, o homem exerce a sua vocação de dominar “sobre os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos”. O homem como que toma posse do reino mineral, vegetal e animal. Dar nome é também organizar e determinar o lugar de cada ser criado em relação ao homem. Se Deus criou para pôr tudo a serviço do homem-adam, ao impor nomes aos animais, o ser humano toma consciência de sua primazia em relação a tudo e tudo ordena em função de sua soberania.
Depois de ter tomado consciência de sua ligação com os seres criados – uma vez que é também criatura entre criaturas –, o homem percebe que se eleva sobre eles e se sente só. O homem designou com nomes todos os animais domésticos, todas as aves dos céus e todos os animais ferozes; contudo não encontrou para si uma auxiliar adequada (Gn 2,20).
Ao levar os animais formados do pó da terra ao homem, Deus como que desperta na sua consciência a questão da sua própria identidade. A solidão original tem um significado negativo: o ser humano é criatura em meio ao mundo material, mas, ao mesmo tempo, é mais do que a criação. O ser humano está só, diante de Deus e, ao mesmo tempo, é diverso e distinto de todas as criaturas. Com esta consciência, ele, em certo modo, sai para fora de si mesmo para se tornar ciente da peculiaridade do seu ser. A consciência de si é o que o torna um ser solitário.
A solidão original é o que possibilita ao ser humano se distinguir, de um lado, do Criador e, de outro, de todos outros seres. Com essa solidão original, o ser humano se afirma como “pessoa”: além de Deus, só ele é pessoa. Ele não é algo, mas alguém. É capaz de se conhecer, de se possuir e de se doar livremente a outra pessoa. É exatamente isso que o homem percebe quando não encontra entre os animais uma auxiliar que lhe corresponda: não há outra pessoa a quem possa se doar e dela receber uma resposta.
Somente depois que o homem constata a própria solidão, Deus cria a mulher: Então, o Senhor Deus fez vir um sono profundo sobre o homem, o qual adormeceu. Tomou um lado (costela) dele e fechou a carne no seu lugar. E do lado (costela) que tomara do homem, o Senhor Deus formou a mulher e a trouxe ao homem (Gn 2,21-22).
O homem (adam) caiu em um sono profundo para acordar varão e mulher. De fato, a primeira vez que aparece a distinção ish-ishá é em Gn 2,23. O termo hebraico adam exprime o coletivo da espécie humana, isto é, o ser humano. A contraposição ish-ishá sublinha a diversidade sexual.
Ao sono relacionamos quase espontaneamente o sonho: o homem sonha encontrar um “segundo eu”, “um outro eu distinto de mim”, “um tu” pessoal e igualmente marcado pela solidão original. O homem cai no sono com o “sonho” de encontrar um ser semelhante a si.
Sono é o termo que aparece na Sagrada Escritura, quando durante o sono ou imediatamente depois dele ocorrem fatos extraordinários (Gn 15,12; 1Sm 26,12; Is 29,10; Jó 4,13; 33,15). Na teologia javista, o sono em que Deus fez cair o primeiro homem, sublinha a exclusividade da ação de Deus na obra da criação da mulher: o homem não teve nela nenhuma participação consciente. O homem parece ter assistido à formação dos animais do pó da terra, mas ao mistério da criação da mulher, o homem não é admitido. Como o homem é mistério para si mesmo, pois está marcado pela solidão original, assim a mulher é mistério que fascina e assombra o homem.
Deus serve-se da sua “costela” porque o homem e a mulher têm a mesma natureza. A mulher é feita “com a costela” (tomou um lado dele.) que Deus tinha tirado do homem. Esse é o modo arcaico e imaginoso de exprimir a homogeneidade (de mesma natureza) do ser homem e mulher.
Essa homogeneidade diz respeito sobretudo ao corpo. Ela é confirmada pelas primeiras palavras do homem à mulher recém-criada: Esta é realmente o osso dos meus ossos e a carne da minha carne (Gn 2,23). Essas palavras devem ser entendidas no contexto das afirmações feitas antes da criação da mulher, nas quais ela é definida como “auxiliar semelhante a ele” (Gn 2,18 e 2,20): a mulher foi criada sobre a base da mesma humanidade. O termo auxiliar que lhe corresponde sugere a ideia não tanto de “complementaridade”, mas mais de “correspondência” e de “reciprocidade”.
A homogeneidade entre homem e mulher é tão evidente que o homem, despertando do sono, imediatamente a exprime: Esta é realmente osso dos meus ossos e carne da minha carne. Chamar-se-á mulher, visto ter sido tirada do homem. Mesmo que a diferenciação sexual e corporal seja igualmente evidente, o homem não deixa de manifestar a sua alegria e exultação: agora sim ele encontrou alguém que, como ele, se autoconhece, se autopossui e se autodoa. As palavras são poucas e essenciais, mas cada uma tem grande peso. A mulher, feita com “o lado do homem” é imediatamente aceita como auxiliar semelhante a ele.
“Desde o início da Criação, Deus os criou homem e mulher” (Mc 10,6)
Os fariseus apresentam a Jesus uma pergunta para pô-lo à prova. Desta vez não é uma questão sem importância, mas uma situação que alimenta muito sofrimento às mulheres da Galileia e é motivo de acaloradas discussões entre os seguidores de diferentes escolas rabínicas: “É lícito o marido separar-se de sua mulher?”.
Não se trata do divórcio moderno que conhecemos hoje, mas da situação em que vivia a mulher judia dentro do casamento, controlado absolutamente pelo homem. Segundo a Lei de Moisés, o marido podia romper o contrato matrimonial e expulsar sua esposa de casa. A mulher, pelo contrário, submetida em tudo ao homem, não podia fazer o mesmo.
A resposta de Jesus surpreende a todos. Não entra nas discussões dos rabinos. Convida a descobrir o projeto original de Deus, que está acima de leis e normas. Esta lei “machista”, em concreto, se impôs no povo judeu pela dureza do coração dos homens, que controlavam as mulheres e as submetiam à sua vontade.
Jesus aprofunda no mistério do ser humano a partir de sua origem, quando Deus “os criou homem e mulher”. Os dois foram criados em igualdade. Deus não criou o homem com poder sobre a mulher. Não criou a mulher submetida ao homem. Entre homens e mulheres não deve haver dominação por parte de ninguém.
A partir desta visão do ser humano, já presente na origem, Jesus oferece uma visão do matrimônio que vai mais além de tudo o que foi estabelecido pela Lei. Mulheres e homens se unirão para “serem uma só carne” e iniciar uma vida compartilhada na mútua entrega, sem imposição nem submissão.
Este projeto matrimonial é para Jesus a suprema expressão do amor humano. O homem não tem direito algum para controlar a mulher como se fosse seu dono. A mulher não deve aceitar viver submetida ao homem. É Deus mesmo que os atrai a viver unidos por um amor livre e gratuito. Jesus conclui de maneira clara: “O que Deus uniu, o homem não separe”.
Com esta posição, Jesus está destruindo na raiz o fundamento do patriarcado e do machismo, sob todas as suas formas de controle, submissão e imposição do homem sobre a mulher. Não só no matrimônio, mas em qualquer instituição, civil ou religiosa.
O evangelho de hoje nos convida a retornar ao início da criação do ser humano, homem e mulher, chamados a viver a vocação da união mútua. O homem deve deixar seu pai e sua mãe, deve abandonar o sistema patriarcal e empreender um novo caminho, não já em solidão, mas na união maior imaginável: “se unirá à sua mulher e serão os dois uma só carne”. A identidade não é uma soma, mas a comunhão crescente que busca a unidade.
Esta proposta original de Deus é vivida sempre entre os casais, de ontem e dos tempos atuais?
Hoje descobrimos, talvez com mais claridade que em outros tempos, o quão difícil para muitos casais manter a unidade amorosa, que no princípio de sua relação parecia ser tão forte.
São muitos os fatores dissonantes que impedem o “concerto amoroso”, são muitos os distanciamentos, as incompatibilidades, as divisões..., que esfriam o romance entre os casais. Hoje também, mais conhecedores da biologia e da psicologia humana, somos mais sensíveis e compreensivos para com aqueles que vivem profundos conflitos na relação matrimonial e, no entanto, sentem o chamado para a unidade.
A partitura que o Criador nos oferece de comunhão entre o homem e a mulher é belíssima, é “imagem e semelhança do mesmo Deus”, mas também é difícil interpretá-la como projeto de vida e de aliança sem volta atrás.
Jesus, na sua vida oculta e pública, encontrou uma realidade de muitos casais que não correspondia àquela desejada por seu Abbá Criador: “no princípio não foi assim!”. Ele que tem palavras de vida (transmissoras de vida), afirma taxativamente: “O que Deus uniu, o homem não separe”.
Estas palavras não são uma lei fria, mas uma promessa, uma realidade possível. O ser humano pode bloquear, com sua falta de fé e seu compromisso, o dom que lhe foi concedido. É preciso deixar o protagonismo para Deus na relação de casal.
Jesus convida a deixar-se unir por Deus, a descobrir aquela pessoa, na qual cada ser humano encontra sua “ajuda semelhante”. É preciso saber discernir que é “o que Deus uniu”. Bendizer aquilo que Deus “não uniu” é uma profanação. A beleza do Sacramento do Matrimônio está precisamente em deixar transparecer a benção de Deus diante daquele casal que Ele foi unindo através da aventura e do romance amoroso.
Ou seja, “serão uma só carne” quando realizam essa união ao longo da vida; tal realidade não se revela de forma automática ou mágica no instante de dizer “sim, quero”. Demora toda uma vida em realizá-la; às vezes não se consegue, o vínculo se interrompe ou se fragiliza. Requer, em alguns casos, sanação; em outros, refazer o caminho da vida.
O Evangelho de Jesus Cristo não é um código canônico, mas a Boa Nova da misericórdia. Deus nos ama também e, sobretudo, em nossas falhas e fracassos. A Igreja não é alfândega, mas casa paterna-materna onde há lugar para cada um com sua vida, carregada de recursos e de fragilidades.
Não se trata de pôr em discussão a visão cristã do matrimônio, mas de ser fiéis a esse Jesus que, ao mesmo tempo que defende o matrimônio, se faz presente a todo homem ou mulher, oferecendo-lhes sua compreensão e sua graça. Nunca se deixa determinar pela lei que julga e condena; mas, deixa transparecer um coração compassivo e acolhedor para com aqueles(as) que fracassaram em seu projeto de amor mútuo.
O próprio Jesus, que condena o adultério, se apresenta como defensor de uma mulher surpreendida em adultério, quando se encontra com ela cara a cara, cuja vida as autoridades religiosas queriam eliminar, Jesus, com sua atitude misericordiosa, longe de destruí-la, a perdoa e lhe oferece um novo futuro: “Nem eu te condeno. Vai e de agora em diante não peques mais”. Esta é a atitude mais humana e humanizadora: crítica exigente frente a uma sociedade que chama “amor” a qualquer coisa. E toda a compreensão do mundo diante de quem tem que viver situações de dor e de sofrimento, porque seu amor se rompeu ou fracassou.
Os fracassos matrimoniais não são sempre e nem fundamentalmente um problema jurídico que se possa resolver com determinadas leis. São problemas pessoais, emocionais, psíquicos, de raízes e consequências muito profundas, que as leis não podem nunca solucionar.
Temos de redescobrir atitudes mais próximas para com os casais rompidos, independentemente de soluções jurídicas, civis ou eclesiais. Como cristãos, não podemos fechar os olhos diante de um fato profundamente doloroso. Os(as) divorciados(as), geralmente, não se sentem compreendidos pela Igreja, nem pelas comunidades cristãs. A maioria só escuta a aplicação de leis e disciplinas que não conseguem entender. Abandonados(as) em seus problemas e sem a ajuda de que necessitam, não encontram na Igreja o lugar da acolhida.
É precisamente nestas circunstâncias quando deveríamos nos perguntar o que podemos fazer, como cristãos, para ajudar tantos homens e mulheres que vivem situações de profundas dores, provocadas por conflitos e incompatibilidades na vivência matrimonial. Não basta defender teoricamente a indissolubilidade matrimonial e impor mais pesos sobre os ombros dos casais católicos que não podem carregar.
Temos de nos perguntar: que ajudas as comunidades cristãs podem oferecer a tantas pessoas que fracassaram em seu matrimônio, devido a uma opção não amadurecida, a uma falta de conhecimento mais profundo do(a) parceiro(a), a uma deterioração em sua comunicação, a incompatibilidades psicológicas, ou simplesmente por uma atitude egoísta?
É injusto que, levados por um rigorismo e legalismo excessivo, marginalizemos e esqueçamos muitos homens e mulheres que se esforçaram por salvar seu matrimônio, e que já não tem mais forças para enfrentar sozinhos(as) seu futuro.
Mais misericórdia e menos rigorismo!
Para meditar na oração:
Fazer memória de muitas pessoas que sofrem por causa do fracasso matrimonial e que não encontram apoio na comunidade cristã.
- Qual sua atitude diante delas? Rigidez na aplicação de leis ou acolhida misericordiosa?
Os fariseus colocam a Jesus uma pergunta para o pôr à prova. Desta vez não é uma questão sem importância, mas um fato que faz sofrer muito as mulheres da Galileia e é motivo de vivas discussões entre os seguidores de diversas escolas rabínicas: «É lícito ao marido separar-se da sua mulher?».
Não se trata do divórcio moderno que conhecemos hoje, mas da situação em que vivia a mulher judia dentro do matrimônio, controlado absolutamente pelo homem. Segundo a Lei de Moisés, o marido podia quebrar o contrato matrimonial e expulsar de casa a sua esposa. A mulher, pelo contrário, submetida em tudo ao homem, não podia fazer o mesmo.
A resposta de Jesus surpreende a todos. Não entra nas discussões dos rabinos. Convida a descobrir o projeto original de Deus, que está acima das leis e normas. Esta lei «machista», em concreto, impôs-se no povo judeu pela dureza de coração dos homens, que controlam as mulheres e as submetem à sua vontade.
Jesus aprofunda o mistério original do ser humano. Deus «criou-os homem e mulher». Os dois foram criados em igualdade. Deus não criou o homem com poder sobre a mulher. Não criou a mulher submetida ao homem. Entre homens e mulheres não tem de haver domínio por parte de ninguém.
A partir desta estrutura original do ser humano, Jesus oferece uma visão do matrimônio que vai mais além de tudo o que é estabelecido pela Lei. Mulheres e homens se unirão para «ser uma só carne» e iniciar uma vida partilhada numa mútua entrega, sem imposição nem submissão.
Este projeto matrimonial é para Jesus a suprema expressão do amor humano. O homem não tem direito algum de controlar a mulher como se fosse o seu dono. A mulher não deve aceitar viver submetida ao homem. É Deus mesmo quem os atrai a viver unidos por um amor livre e gratuito. Jesus conclui de forma rotunda: «O que Deus uniu que não o separe o homem».
Com esta posição, Jesus destrói pela raiz o fundamento do patriarcado em todas as suas formas de controle, submissão e imposição do homem sobre a mulher. Não só no matrimônio, mas em qualquer instituição civil ou religiosa.
Temos de escutar a mensagem de Jesus. Não é possível abrir caminhos para o reino de Deus e da sua justiça sem lutar ativamente contra o patriarcado. Quando reagiremos na Igreja com energia evangélica contra tanto abuso, violência e agressão do homem sobre a mulher? Quando defenderemos a mulher da «dureza de coração» dos homens?
ABRIR OS OLHOS PARA VER
No texto de hoje, Jesus continua dando conselhos sobre o relacionamento entre homem e mulher, e sobre o relacionamento com as mães e as crianças. Naquele tempo, no relacionamento entre homem e mulher, havia muito machismo. Com os pequenos e excluídos Jesus pede o máximo de acolhimento. No relacionamento homem-mulher ele pede o máximo de igualdade. Com as crianças e suas mães, o máximo de ternura. Vamos conversar sobre isso.
COMENTANDO
Marcos 10,2: A pergunta dos fariseus: "o marido pode mandar a mulher embora?"
A pergunta é maliciosa. Ela pretende colocar Jesus à prova: "É lícito a um marido repudiar sua mulher?" Sinal de que Jesus tinha uma opinião diferente, pois do contrário os fariseus não iriam interrogá-lo sobre este assunto. Não perguntaram se é lícito a esposa repudiar o marido. Isto nem passava pela cabeça deles. Sinal claro da forte dominação masculina e da marginalização da mulher.
Marcos 10,3-9: A resposta de Jesus: o homem não pode repudiar a mulher
Em vez de responder, Jesus pergunta: "O que diz a lei de Moisés?" A lei permitia ao homem escrever uma carta de divórcio e repudiar sua mulher. Esta permissão revela o machismo. O homem podia repudiar a mulher, mas a mulher não tinha este mesmo direito. Jesus explica que Moisés agiu assim por causa da dureza de coração do povo, mas a intenção de Deus era outra quando criou o ser humano. Jesus volta ao projeto do Criador e nega ao homem o direito de repudiar sua mulher. Tira o privilégio do homem frente à mulher e pede o máximo de igualdade.
Marcos 10,10-12: Igualdade de homem e mulher - Em casa, os discípulos fazem perguntas sobre este assunto. Jesus tira as conclusões e reafirma a igualdade de direitos e deveres entre homem e mulher. Ele propõe um novo tipo de relacionamento entre os dois. Não permite o casamento em que o homem pode mandar a mulher embora, nem vice-versa.
O evangelho de Mateus (cf. Mt 19,10-12) acrescenta uma pergunta dos discípulos sobre este assunto. Eles dizem: "Se a gente não pode dar uma carta de divórcio, é melhor não casar". Preferem não casar do que casar sem o privilégio de poder continuar mandando na mulher. Jesus vai até o fundo da questão. Há somente três casos em que ele permite a uma pessoa não casar: (1) impotência, (2) castração e (3) por causa do Reino. Não casar só porque o fulano se recusa a perder o domínio sobre a mulher, isto a Nova Lei do Amor já não o permite! Tanto o casamento como o celibato, ambos devem estar a serviço do Reino e não a serviço de interesses egoístas. Nenhum dos dois pode ser motivo para manter o domínio machista do homem sobre a mulher.
Marcos 10,13-16: Receber o Reino como uma criança
Trouxeram crianças para que Jesus as tocasse. Os discípulos tentaram impedir. Por que impediram? O texto não diz. Os discípulos não gostam de gente sem importância perto de Jesus. Além disso, conforme as normas rituais da época, crianças pequenas com suas mães viviam quase constantemente na impureza legal. Tocando nelas, Jesus ficaria impuro! Mas a reação de Jesus ensina o contrário. Ele diz: "Quem não receber o Reino como uma criança não vai poder entrar nele!" O que significa essa frase? 1) A criança recebe tudo dos pais. Ela não consegue merecer o que recebe, mas vive no amor gratuito. 2) Os pais recebem a criança como um dom de Deus e cuidam dela com todo o carinho. A preocupação dos pais não é dominar a criança, mas sim amá-la e educá-la para que cresça e se realize!
LMarcos 10, 2 – 16 (ou abreviada Mc 10, 2 – 22 - Nova lei do matrimônio)
1-Situando-nos
O evangelho de Marcos é uma obra catequética que animou a vida missionária da Igreja, desde as primeiras comunidades cristãs. Aos que se iniciavam no caminho da fé, essa catequese consistia em apresentar-lhes quem é Jesus e o que significa comprometer-se com Ele e a radicalidade do reino. O Capítulo décimo de Marcos traz alguns ensinamentos de Jesus aos seus discípulos sobre o matrimônio cristão assumido no contexto diverso da sociedade romana.
Na segunda parte desse capítulo, Jesus se dedica, quase que exclusivamente, a instrução dos discípulos, mostrando-lhes mais de perto, as exigências do discipulado radical. Isso porque ele está a caminho de Jerusalém, onde será morto e depois de três dias ressuscitará.
Estes ensinamentos são: a radicalidade do seguimento a Jesus, a fidelidade ao outro, sobretudo na vida conjugal, a opção pelos pobres, simbolizada pelo acolhimento às crianças, e o alerta sobre os perigos das riquezas, enquanto impedimento para entrar no reino. O texto compreende a vida cristã na perspectiva do reino, na qual, o matrimônio é indissolúvel. Ele adota o esquema dos diálogos didáticos:
1. Interpela-se o mestre com uma pergunta difícil;
2. O mestre responde perguntando;
3. Os interlocutores se sentem obrigados a responder, revelando seus pontos fracos;
4. O mestre corrige a resposta dos interlocutores, apresentando-lhes a novidade.
É o modelo catequético para os que pretendem seguir a Jesus, no confronto com a sociedade permissiva e discriminadora, representada pelos fariseus, que impõem suas próprias leis. De fato, os fariseus, ajudados pelos doutores da lei, ditavam as regras do jogo.
O que Jesus tem a dizer a essa sociedade?
Como se posicionou diante dela?
Como deverão reagir os que o seguem?
O texto de hoje mostra que a práxis da comunidade cristã, em relação ao matrimônio, distanciou-se bem depressa da legislação farisaica. A Interpretação farisaica da Lei não põe em discussão o direito que o homem tinha de se divorciar da esposa, discutia-se em que circunstâncias e por quais razões seria possível fazê-lo. Por qualquer razão? Por isso, os fariseus, respondendo à pergunta de Jesus sobre o que Moisés ordenou, afirmam que ele permitiu ao homem dar à mulher o documento de divórcio (cf Deuteronômio 24,13). É necessário ressaltar que a legislação romana permitia também à mulher se divorciar de seu esposo.
Na perspectiva do Deuteronômio, o documento de divórcio visava proteger a mulher, coibindo o arbítrio machista. Para assinar o documento eram necessárias testemunhas e razões válidas. Isso impediria que a mulher fosse mandada embora sem maiores motivos, até por caprichos ou mau humor do marido. Recebendo o documento de divórcio a mulher estava livre para casar-se com outro homem sem ser acusada de adultério. Essa perspectiva, porém, aos poucos, foi sendo esquecida e o divórcio passou a ser mais uma demonstração do arbítrio e do machismo.
A resposta de Jesus é carregada de respeito e de uma profunda humanidade. Para os fariseus, nada poderia ser superior à Lei de Moisés, no entanto, Jesus a supera, indo para além da Lei, evocando a sacralidade da criação, afirmando que “no princípio Deus os criou...”. Portanto, a sacralidade do amor conjugal está no coração do próprio Deus. Ao celebrar o sacramento matrimonial, os ministros autorizados pela Igreja o assistem, quem o celebra são os próprios cônjuges, que se dão em matrimônio, em nome do Pai, do qual recebem a bênção da fecundidade, do Filho, no qual alcançam a força da fidelidade e do Espírito Santo, do qual recebem o dom da indissolubilidade.
2- Recordando a Palavra
Primeira leitura - Gênesis 2, 18- 24. O projeto inicial de Deus é a harmonia da criação que permanece no horizonte da história e se perpetua na consumação de tudo fica sempre válido. Portanto, falando do primeiro casal humano, o autor de Gênesis fala de todos os casais humanos. Entre todas as criaturas só a mulher é ‘ajuda adequada’ para o homem. O amor matrimonial é mais forte que qualquer outro amor humano, mesmo da família de origem. Por sua natureza é um amor único. Os dois formam uma só carne, uma única realidade humana. (Cf 1 Coríntios 11,8-9; 1Timóteo 2,3; Efésios 5, 31; 1 Coríntios 6,16).
Segunda leitura - Hebreus 2, 9-11. Na glorificação de Cristo que morreu por nós, o autor da carta aos hebreus encontra o critério fundamental para confirmar os cristãos provenientes do judeu-helenismo em sua fé e esperança, que estão sendo abaladas pelas controvérsias dos não cristãos e pela protelação da parusia de Cristo.
A carta destaca a grandeza de Cristo, descrevendo amplamente a plenitude do seu sacerdócio, fundamento do sacerdócio comum dos fieis leigos e de ministério, que consiste em duas credenciais imprescindíveis: ser misericordioso e digno de confiança de Deus e do povo. Embora, por um tempo, foi colocado um pouco abaixo dos anjos é ele agora elevado acima deles e de todos os personagens bíblicos que se tornaram modelos de fé.
Na humildade de Jesus, que assumiu nossa condição humana até a morte, fazendo-se nosso irmão, para quebrar o domínio da morte, está sua grandeza e a plenitude da glória de Deus, manifestada não somente em seu Cristo, mas em todos que dele fomos revestidos. (Salmo 8,5-7; Filipenses 2, 6 -11; Romanos 11, 36; 1 Coríntios 8,6; Hebreus 4, 15; 5, 2; 3, 9-10; Hebreus 2, 17 18; Salmo 22, 23).
Evangelho - Marcos 10, 2 – 16 (ou abreviada Mc 10, 2 – 22). Em continuidade com as questões da vida em comunidade apresentadas no capítulo nove, Marcos 10, 1- 12 apresenta a visão cristã do matrimônio, em conformidade com os princípios da criação divina. O homem e a mulher são vocacionados a formar uma unidade pessoal inseparável. A legislação mosaica concernente ao divórcio veio depois do projeto original. É um remendo para consertar a vestimenta original que se desfazia por causa da ‘dureza do coração’ humano. Considerando que o casamento nem sempre é o que deveria ser, Jesus assume a autoridade de restaurá-lo, entrando dentro desse túnel escuro para iluminá-lo com a luz original da criação divina. Ele não se coloca no nível da casuística, mas da vontade inicial e final de Deus mesmo. O que se deve fazer quando o ser humano não corresponde a esta vocação originante é outra questão que merece cuidado e atenção.
Em Marcos 10,13-16 Jesus ensina aos discípulos sobre a radicalidade do reino, mediante um gesto paradigmático: que o reino de Deus é dado a pessoas menos consideradas, como às crianças, que não podem nada por si mesmas, mas são capazes de receber tudo do outro como dádiva e dom.
3- Atualizando a Palavra
Terminada a catequese sobre o matrimônio cristão, Marcos insere, em seguida, uma cena, na qual são apresentadas as crianças a Jesus, a fim de que as tocasse. O texto quer mostrar o que fazer na comunidade com os pobres, os simples e os pecadores.
Ao falar das crianças, Marcos as apresenta como símbolo de todos os empobrecidos e marginalizados da sociedade, por serem indefesas, sem poder de decisão, sem voz e sem vez.
Doutro lado, aparecem os discípulos que, no evangelho de Marcos, se caracterizam pela lentidão em aderir a Jesus, pela incapacidade de compreender a lógica do reino e pelo medo do compromisso. E procuram afastar as crianças da presença de Jesus.
Ao perceber tal atitude a reação de Jesus foi de ira. É a única vez no evangelho de Marcos em que Jesus se irrita contra os discípulos. É a ira santa de Javé tão presente no Antigo Testamento ao ver que os pobres, seus preferidos, aos quais pertencem o reino, são excluídos de sua presença.
Este fato permitiu a Jesus oferecer aos seus discípulos seu mais genuíno ensinamento: que o reino é dos pobres, simbolizado pelas crianças, porque a graça de Deus foi destinada a eles.
A cena se situa também entre os três anúncios da Paixão de Jesus e as três reações opostas dos discípulos. É oportuno lembrar que na segunda parte do evangelho de Marcos (8, 31 em diante) Jesus ensina os discípulos, mostrando assim o perfil das pessoas que ele procura para serem, com Ele, construtores do reino.
O Versículo 15 traz a declaração solene de Jesus: em verdade digo a vocês quem não receber o reino de Deus como uma criança nele não entrará. Esta é condição para acolher o reino e entrar nele, o despojamento. Este é o requisito básico para implantação do projeto de Deus, como dom e acolhimento. É outra forma de dizer: quem não renunciar a si mesmo... Portanto, os que buscam prestígio, poder, riqueza ou segurança correm um sério risco de se colocar fora do reino.
Marcos apresenta Jesus abraçando e abençoando as crianças e evangelizando os adultos. Isso serve de alerta para os discípulos de hoje que, muitas vezes acabam fazem o contrario, como nos alertava o Irmão Nery: muitas vezes nos pegamos abençoando os adultos sem anunciar-lhes o evangelho e gastamos nossas energias evangelizando as crianças sem abençoá-las.
4- Ligando a Palavra com a ação litúrgica
A primeira leitura e o evangelho podem se tornar excelentes momentos de catequese sobre o matrimônio cristão, à luz do projeto de Deus, que criou os seres humanos para igualdade, comunhão e união.
Este deve ser o conteúdo permanente da catequese para crianças, jovens e adultos. É uma grande contribuição para acabar com o machismo e as discriminações. Pode-se convidar casais para testemunharem sobre a vida matrimonial e familiar, suas cruzes e glórias.
Torna-se também oportuno refletir sobre a carta do Papa Francisco às famílias, Amoris Laetitia:
“Temos dificuldade em apresentar o matrimônio mais como um caminho dinâmico de crescimento e realização do que como um fardo a carregar a vida inteira. Também nos custa deixar espaço à consciência dos fiéis, que, muitas vezes, respondem o melhor que podem ao Evangelho, no meio dos seus limites e são capazes de realizar o seu próprio discernimento, perante situações onde se rompem todos os esquemas. Somos chamados a formar as consciências, não a pretender substituí-las” (n. 37).
“Desejo, antes de tudo, reafirmar que cada pessoa, independentemente da própria orientação sexual, deve ser respeitada na sua dignidade e acolhida com respeito, procurando evitar ‘qualquer sinal de discriminação injusta’ e particularmente toda forma de agressão e violência” (n. 250).
“Trata-se de integrar a todos, deve-se ajudar cada um a encontrar a sua própria maneira de participar na comunidade eclesial, para que se sinta atraído por uma misericórdia ‘imerecida, incondicional e gratuita’. Ninguém pode ser condenado para sempre, porque essa não é a lógica do Evangelho! Não me refiro só aos divorciados que vivem numa nova união, mas a todos seja qual for a situação em que se encontrem” (n. 297).
É bom recordar a tríade estabelecida pelo papa Francisco: acompanhar, discernir e integrar.
Outra questão é a opção preferencial pelos pobres e pelas crianças. Que lugar ocupam em nossa comunidade as crianças e os pobres? Estaria Jesus irritado conosco? Ou estaria feliz?
A segunda leitura traz o tema da solidariedade de Jesus que não se envergonha de chamar-nos seus irmãos. Como anda a solidariedade na comunidade? Discriminamos ou acolhemos?
Gênesis 2:18-24 –
A leitura de hoje, Gênesis 2:18-24, parte do segundo relato da história da criação, é um texto provavelmente escrita uns 1000 anos antes do nascimento de Cristo, e portanto mais de 3000 anos atrás. Parece ser obra de um catequista popular, que ensina usando imagens sugestivas, coloridas e fortes. Não podemos ver o texto como se fosse uma reportagem jornalística de acontecimentos passados no amanhecer da humanidade. A finalidade do autor não é científica ou histórica, mas religiosa: ele/a não quer ensinar como o mundo e o homem apareceram, mas afirmar que na origem da vida e do homem está Javé. Portanto é uma catequese e não uma explicação cientifica das origens do mundo e da vida.
Essa catequese utiliza elementos simbólicos das histórias de outros povos, dando-lhes um novo significado, uma nova interpretação para servir a catequese e a fé do povo que acreditava em Javé que que o tinha tirado da escravidão do Egito.
O trecho de hoje situa-nos no "jardim do Éden", um mundo ideal onde Deus colocou o homem que criou, um ambiente de felicidade material onde todas os elementos da vida humana estavam satisfeitas. Um lugar com água abundante e com árvores frutíferas e comida para todos as criaturas.
Mas o homem ainda não tinha tudo para ser feliz. Na perspectiva do catequista o homem não estava plenamente realizado, porque precisava de outra pessoa com quem compartilhar a vida e a felicidade. O homem não foi criado para viver sozinho, mas para viver em comunidade.
Depois de criar o homem e de o colocar no "jardim" da felicidade, Deus partiu para resolver a solidão da sua criatura. Num primeiro momento, Deus fez desfilar diante do homem "todos os animais do campo e todas as aves do céu", a fim de que o homem os chamasse "pelos seus nomes". Naquela época e naquela cultura "dar um nome" era um ato de estabelecer pertence ou companheirismo. Por outro lado, o fato de Deus trazer os animais para o homem lhes dar um nome era, para a catequista, o reconhecimento na parte de Deus da liberdade do homem e a sua ligação com o restante da criação de Javé, dando para os seres humanos uma participação ativa no trabalho criativo de Javé.
Ainda faltou algo essencial para a felicidade do homem. Além de se relacionar com a natureza e o mundo animal, precisava de uma companheira igual a ele - "uma auxiliar semelhante a ele". Deus vai intervir de novo.
A nova ação de Deus começa com um "sono profundo" do homem. Depois, Deus tirou parte do corpo do homem – a "costela" - e com ela fez a mulher. A mulher é aqui apresentada como uma noiva conduzida à presença do noivo e Deus é o "padrinho" desse casamento! O homem acolhe a mulher como a companheira, "mulher" (em hebraico 'ishah, quer dizer mulher, e 'ish é homem – os dois é um só!). A proximidade das duas palavras indica a proximidade entre o homem e a mulher, a sua igualdade.
O nosso texto termina com um comentário do/a catequista: "É por isso que o homem deixa o seu pai e a sua mãe para se unir com a sua mulher, e os dois se tornam uma só pessoa". O amor vem de Deus, que fez o homem e a mulher de uma só carne; por isso, homem e mulher buscam essa unidade e estão destinados, fatalmente, a viver em comunhão um com o outro.
CONCLUINDO
"Não é bom que o homem esteja só". Estas palavras afirmam que a realização plena do ser humano só acontece no relacionar, compartilhar, e não na solidão. O eu sozinho ou com a minha família pequena, com um coração virado para dentro, não traz a felicidade. O catequista de 3000 anos atrás usa imagens e símbolos para descrever a missão humana. Adão e Eva vivem num jardim bonito (Gn, 2,8.15), em harmonia consigo mesmos, com os outros seres vivos, com a natureza e com Deus. Uma das imagens mais eloquentes desta harmonia é o texto que lembra como na brisa da tarde Deus descia para passear com eles no jardim - “o homem e a sua mulher ouviram a voz do Senhor Deus, que estava passeando pelo jardim” (Gn3,8). Eles são felizes e livres, despreocupados e inocentes. Não existe a mentira, nem malícia nem maldade.
No decorrer deste mês da Bíblia, lemos a Carta de Paulo aos Gálatas. Em nosso estudo vimos que ele afirma categoricamente que o essencial da mensagem do Evangelho é: “por meio da fé em Cristo Jesus, todos vocês são filhos de Deus .... Desse modo não existe diferença entre judeus e não-judeus, entre escravos e pessoas livres, entre homens e mulheres: todos vocês são um só por estarem unidos com Cristo Jesus”. (Gálatas 3,26-28).
Na Comunidade dos seguidores do Jesus crucificado, morto e vivo, não existe nem preto nem branco, nem homem nem mulher, nordestino mineiro, brasileiro ou migrante, porque “todos são um só por estarem unidos com Cristo Jesus”. Na Comunidade dos seguidores do Jesus não existe nem rico nem pobre, nem latifundiário nem sem-terra, nem sem-teto nem proprietário, “pois todos vocês são um só”, e por isso tudo é dividido de acordo com a necessidade de cada um/a.
A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 10,2-16 que corresponde ao 27 Domingo do Tempo Comum, ciclo B do Ano Litúrgico. O comentário é elaborado por Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
Alguns fariseus se aproximaram de Jesus. Queriam tentá-lo e lhe perguntaram se a Lei permitia um homem se divorciar da sua mulher. Jesus perguntou: «O que Moisés mandou vocês fazerem?» Os fariseus responderam: «Moisés permitiu escrever uma certidão de divórcio e depois mandar a mulher embora.»
Jesus então disse: «Foi por causa da dureza do coração de vocês que Moisés escreveu esse mandamento. Mas, desde o início da criação, Deus os fez homem e mulher. Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe, e os dois serão uma só carne. Portanto, eles já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não deve separar.»
Quando chegaram em casa, os discípulos fizeram de novo perguntas sobre o mesmo assunto. Jesus respondeu: «O homem que se divorciar de sua mulher e se casar com outra, cometerá adultério contra a primeira mulher. E se a mulher se divorciar do seu marido e se casar com outro homem, ela cometerá adultério.»
Depois disso, alguns levaram crianças para que Jesus tocasse nelas. Mas os discípulos os repreendiam. Vendo isso, Jesus ficou zangado e disse: «Deixem as crianças vir a mim. Não lhes proíbam, porque o Reino de Deus pertence a elas. Eu garanto a vocês: quem não receber como criança o Reino de Deus, nunca entrará nele.» Então Jesus abraçou as crianças e abençoou-as, pondo a mão sobre elas.
Jesus abandona definitivamente a Galileia e inicia o caminho a Jerusalém. Continua ensinando aos seus discípulos e os que estão ao seu lado sobre o mistério do reino, como é viver na comunidade que ele está lhes-convidando a participar. Jesus apresenta assim diferentes ensinamentos catequéticos. Os discípulos e discípulas de Jesus não somente devem conhecer seus ensinos; é preciso que saibam distinguir perguntas capciosas, mal-intencionadas. No texto deste domingo um grupo de “fariseus se aproximaram de Jesus”. Mas sua intenção era bem clara e precisa: “Queriam tentá-lo e lhe perguntaram se a Lei permitia um homem se divorciar da sua mulher”.
Na sua vida e no seu agir, Jesus permitia que as mulheres o acompanhem, faziam parte da comunidade e ele oferecia um lugar importante para a mulher. Isto não era bem visto para algumas pessoas e entre eles os fariseus que procuram colocar Jesus a cruz e a espada. Na sociedade machista desse momento todos os homens sabiam que podiam separar-se da sua mulher e particularmente os fariseus conheciam a Lei. Por isso a pergunta é capciosa e eles tem astucia para introduzir Jesus num erro.
O diálogo com Jesus é sobre o matrimônio, porém não sob o ângulo da casuística, mas sob o ângulo da vontade de Deus. E um encontro “catequético” que se desenvolve em forma de diálogo.
Na história do povo de Israel, esta vontade inicial de Deus nem sempre se realizou, porque os homens achavam legítimo despedir suas mulheres. Para protegê-las, a legislação deuteronomística previu que as mulheres repudiadas recebessem um certificado de divórcio e, desta forma, a mulher estaria livre para casar com outro homem, sem ser acusada de adultério. Mas esta intenção também foi esquecida, e o divórcio passou a ser uma demonstração do arbítrio e do machismo.
Tendo em conta este panorama, podemos entender melhor a resposta de Jesus, que em primeiro lugar mostra que a legislação do divórcio foi feita para enfrentar a maldade humana: “Foi por causa da dureza do coração de vocês que Moisés escreveu esse mandamento”.
E em segundo lugar, Jesus restaura o sentido inicial do matrimônio dentro do projeto de Deus: “o que Deus uniu, o homem não deve separar”. Jesus insiste na fidelidade ao pacto de amor, ao compromisso mútuo que está por cima das leis estabelecidas pelos homens. O matrimônio é um projeto de amor que implica equidade de direitos, dignidade e obrigações. Não pode existir uma relação de dominação, porque isso estaria indo contra os direitos pessoais e sociais.
Jesus veio para fazer possível o sonho de Deus referente ao amor humano. Em outra passagem evangélica, vemos como ele mesmo se coloca no meio da festa de bodas para cuidar que o vinho do amor não se acabe, oferecendo-se ele mesmo como a fonte do Amor (Jo 2,1-12).
Qual é a visão de matrimônio da sociedade de hoje? Alimentamos ainda hoje a utopia do matrimônio? A proposta evangélica é para aqueles que, querendo abraçar o ideal cristão de vida, e sendo conhecedores de suas limitações e fraquezas, buscam em Jesus a fonte e o Mestre para viver o caminho do amor. Fomos feitos por amor e para o amor, e vivê-lo é um processo, uma arte que se aprende na família, com os amigos, na comunidade. Fazendo referência ao matrimonio o Papa Francisco lembra que “A preparação para o matrimônio deve tornar-se parte integral de todo o procedimento do matrimônio sacramental, como um antídoto para evitar a proliferação de celebrações matrimoniais nulas ou inconsistentes”, escreve, ao introduzir os “Itinerários catecumenais para a vida matrimonial” (Papa Francisco quer transformar preparação do Matrimônio na Igreja Católica, para evitar uniões “nulas ou inconsistentes”)
Depois disso, alguns levaram crianças para que Jesus tocasse nelas. Mas os discípulos os repreendiam.
No texto evangélico, logo a seguir da explicação de Jesus sobre o matrimônio, este novo desentendimento dele com seus discípulos. Lembramos que Jesus já lhes tinha explicado a centralidade das crianças no Reino de seu Pai, mas eles continuam sem entender. As crianças são um sinal de vida e ao mesmo tempo de fragilidade, de dependência, de um ser humano em crescimento, com um futuro pela frente. Jesus não só quer que as crianças vão a Ele, mas ainda acrescenta uma sentença muito importante: “quem não receber como criança o Reino de Deus, nunca entrará nele”.
É um convite que o Senhor nos faz para reconhecer nossa realidade humana mais profunda, somos finitos, limitados, mas com sede de infinito, de plenitude! A vida é o presente que recebemos de Deus para percorrer esse caminho entre o finito e o infinito, entre o amor limitado e a plenitude do amor.
Nesse peregrinar não estamos sozinhos/as como as crianças do evangelho, Jesus pega-nos no colo, abraça-nos, isto é, está conosco, desde já nos concede viver sua amizade, sua companhia amorosa. É por isso que podemos, apesar das dificuldades da vida pessoal e a dos outros, continuar apostando no matrimônio, no amor duradouro, sabendo que nesse caminho a dois, é preciso deixar entrar, renovar, agir um Terceiro! Fazemos nossas as palavras de Adroaldo Palaoro no seu comentário sobre este texto evangélico: O homem e a mulher são um lugar privilegiado de revelação e de experiência do Amor de Deus. Eles são a encarnação e a visibilização desse Amor Ágape que tem sua fonte no próprio Deus. Cada pessoa jamais deixa de ter suas raízes plantadas no coração do Criador (Matrimônio: Amor de Deus que se faz carne)
DOMINGO XXVII DO ANO – CICLO “B”
Primeira leitura (Gn 2,4b.7a.18-24):
A criação do homem ocorre em duas etapas. Primeiro se diz que “Formou o homem do pó da terra”. Num segundo momento Deus “soprou em suas narinas o fôlego de vida (nišmat hayyim); e o homem tornou-se um ser vivente (não cante ḥayyāh)» (v.7b). Não há distinção entre corpo e alma, mas entre corpo e vida.
A criação da mulher é precedida por uma autodeliberação divino como em Gênesis 1:26. A iniciativa do Criador surge da solidão original do homem que é julgado como não é bom. A conveniência de estar acompanhado, em contraste com os perigos da solidão, é um tema comum na reflexão dos sábios (cf. Ec 4,9-10; Pr 31,10-31). A expressão 'ajuda' (o lago) geralmente refere-se à assistência divina; embora às vezes apareça também como ajuda militar (Is 30,5; Ez 12,14; Os 13,9). Mas aqui é salientado que é “adequado ou correspondente” e, portanto, trata-se de complementação e apoio mútuos.
Na história, depois de ter falado do homem como pessoa humana (como o sentido genérico de para peles), uma especificação particular é agora adicionada porque a diferenciação sexual aparece pela primeira vez, como uma pessoa humano-masculina (é) e pessoa humana-mulher ('îššāh). Então, esta pessoa humana atinge a sua plenitude autêntica no momento em que aceita a alteridade, o outro que é a sua ajuda adequada, o seu companheiro de vida.
A expressão 'ossos...carne...' indica um relacionamento próximo devido ao parentesco (cf. Gn 29.14; Jz 9.2); ou por aliança (cf. 2 Sm 5,1; 19,13-14). Aqui a expressão coloca a mulher num patamar de igualdade da natureza com o homem e acima dos animais que não conseguiam preencher a solidão original do homem. Os verbos do versículo 24 (abandonar e apegar-se) aparecem referindo-se ao povo de Israel que não deveria abandonar ou sair aos pobres, ao levita ou à aliança (Dt 12,19; 14,27; 29,24) e deve cole ou junte-se a Deus (Dt 10,20; 11,22; 13,5). Este uso no contexto da aliança de Israel com o Senhor sugere que o casamento é visto no AT como uma espécie de aliança. Sugere-se também que o ideal do casamento que responde à intenção do Criador é monogâmico e indissolúvel (cf. Mt 19, 5-6). Portanto, esta história começa levantando a questão da solidão original do homem porque lhe falta ajuda adequada. Isto não se encontra nos animais, mas nas mulheres, que partilham a mesma natureza do homem. O forte vínculo do casamento é destacado -uma só carne-, ainda maior do que aquela que liga o homem aos seus pais, tão importante na cultura oriental.
Resumindo, “A finitude e a grandeza caracterizam, portanto, a visão que os autores bíblicos têm do ser humano, reconhecido como criatura – isto é, não criador de si mesmo – sujeito ao pó e à terra, frágil e ameaçado de morte, e ainda assim, ligado à seu Criador através de um relacionamento especial e único. Criatura entre outras criaturas, o ser humano goza, no entanto, de uma relação de responsabilidade para com os outros seres que fazem parte do seu mundo: esta é também a sua grandeza.”1
Evangelho (Mc 10,2-12):
O evangelho trata do mesmo tema – o divórcio e a indissolubilidade do casamento – em dois contextos diferentes. Em 10:2-9 temos o debate de Jesus com os fariseus diante do povo; e em 10,10-12 o diálogo de Jesus com seus discípulos em particular.
A história começa apresentando-nos Jesus que ensina o povo da região da Judeia, do outro lado do Jordão (cf. 10,1), onde alguns fariseus se aproximam dele e lhe fazem uma pergunta: “É lícito ao homem divorciar-se da sua mulher (repudiá-la, despedi-la = você é demitido)?". O texto especifica que a intenção dos fariseus é “coloque-o à prova, tente-o para Jesus, usando o mesmo verbo provocar que aponta a ação do diabo nas tentações do deserto (cf. Mt 4,1.3; Lc 4,2)”.
Por que a pergunta é “complicada”? Aparentemente, no tempo de Jesus a questão debatida não era tanto a questão da legalidade do divórcio – que era comummente aceite – mas antes as motivações ou causas do mesmo. Conhecemos as opiniões de dois rabinos notáveis da época: Hillel e Shammai. A primeira era mais ampla porque justificava, por qualquer motivo, por mais trivial que fosse, que um homem repudiasse a sua esposa. Em contraste, Shammai foi mais rígido em sua interpretação da Torá e só justificou o divórcio por uma causa séria. É possível que os fariseus estivessem divididos entre essas duas opiniões escolares e tenham pedido a Jesus que tomasse partido de uma delas.
B. Malina2, por sua vez, tem uma opinião diferente e nos convida a levar em conta o grande papel das famílias no casamento dos filhos daquela época e cultura, por isso “O divórcio trouxe consigo a dissolução dos laços das duas famílias extensas. Representou um desafio para a família da primeira esposa e certamente terminaria em confrontos perpétuos.”. Isto é, dado que a questão do divórcio era uma fonte de conflito naquela época, ele sustenta que a pergunta dos fariseus a Jesus é diretamente sobre a sua legalidade.
Jesus, segundo o estilo argumentativo da época, responde a uma pergunta com outra pergunta: “O que Moisés lhe ordenou?". Observemos que enquanto os fariseus perguntam sobre a possibilidade ou legalidade (ἔξεστιν) do divórcio; Jesus pergunta sobre o que foi "ordenado" (ἐντέλλομαι) por Moisés a esse respeito.
A resposta dos fariseus está correta porque Moisés permite efetivamente que o marido elabore um ato de divórcio e repudie a esposa. A referência é sem dúvida a Dt 24,1-4 onde na versão grega do AT encontramos o termo “certidão de divórcio” (bíblia, em um vpostasi, ou o mesmo que em Mc 10,4): "Se um homem se casa com uma mulher, mas depois passa a não gostar dela porque descobre algo nela que o desagrada, e é por isso que ele escreve um certidão de divórcio, ele a entregará a ela e se despedirá de sua casa. Quando você estiver fora de casa, se a mulher se casar com outra e esta também a rejeitar, escreva um certidão de divórcio e a manda embora, ou morre; seu primeiro marido não poderá tomá-la novamente por esposa, pois ela foi contaminada".
Jesus então interpreta este “mandamento” de Moisés como um dado relativamente e ocasionalmente em vista da "dureza de coração" (sklhrokardi,a) da cidade. Como diz J. Gnilka3: "O sklhrokardi,a – Termo do Antigo Testamento – indica na Bíblia Grega o coração humano insensível às instruções divinas como consequência da sua contínua desobediência".
Para Jesus, portanto, é uma concessão provisória dada a condição de consciência endurecida de Israel, mas a ideia primeira ou original de Deus sobre o casamento não é esta. É por isso que Jesus volta a Gênesis 1,27 e 2,24 para estabelecer a indissolubilidade do casamento e para condenar como adultério quando um homem se separa de sua esposa e se casa com outra. É importante notar aqui que na época e na cultura em que a Bíblia foi escrita as coisas que tinham mais valor eram as mais antigas, até mesmo na ordem jurídica. É por isso que Jesus se refere à própria origem da criação, ao início (princípio), cuja história se encontra no primeiro livro da Bíblia (Gênesis) e, portanto, é anterior e superior à intervenção de Moisés em Deuteronômio 24.
Agora, na interpretação de Jesus, os textos citados do Gênesis expressam o projeto de Deus sobre o casamento, entendendo-o como a união de um homem com uma mulher de natureza monogâmica e indissolúvel. Portanto, na própria “natureza” do homem criado como homem e mulher, e chamado desde o início ao matrimónio, esta “lei” estabelecida por Deus está inscrita e é anterior e superior à concessão feita por Moisés.
Aparentemente, estas declarações de Jesus continham uma novidade em relação ao pensamento e à práxis habituais no judaísmo, a tal ponto que os próprios discípulos voltam ao assunto quando estão "em casa" com Jesus (cf. 10,10-12). Aqui Ele lhes diz claramente que quem se divorcia de sua esposa e se casa com outra comete adultério (eu sou adúltero); e o mesmo vale para a mulher que se separa e se casa com outro. A referência bíblica aqui é o sexto mandamento: “Não cometerás adultério” (Ex 20,13; Dt 5,17), com a novidade de que Jesus o aplica a quem rompe o primeiro casamento e eles entram em uma nova união. Este julgamento avaliativo de Jesus pressupõe o que ele afirmou anteriormente sobre a insolubilidade do casamento (que o homem não separe o que Deus uniu), e só a partir daqui o novo relacionamento do homem ou da mulher já casado é considerado adultério.
ALGUNS PENSAMENTOS:
Sem dúvida, a questão do casamento indissolúvel e do divórcio é um dos temas onde mais se nota o contraste entre o evangelho e o pensamento da sociedade e da cultura atuais. Ora, como vimos, esta era também uma questão difícil no tempo de Jesus e a posição que ele mesmo assume contradiz tanto a palavra de Moisés como a interpretação comum dela. Além disso, o facto de o tema ter surgido novamente quando Jesus e os seus discípulos estavam “em casa” reflecte claramente que estes também não tinham ficado muito convencidos pelas palavras de Jesus.
Antes de chegar à questão doutrinária em si – legalidade ou ilegalidade do divórcio – há um problema anterior que é a forma de raciocinar ou argumentar sobre este tema. Em geral, e quase espontaneamente, pensamos primeiro em casos particulares, em rupturas matrimoniais por motivos diversos, para depois justificar a partir daqui a lei geral do divórcio.
Por isso é muito importante seguir a mesma pedagogia de Jesus, que não entra na discussão a partir de casos particulares, mas remonta ao início, ao casamento segundo Deus, destacando a sua beleza e bondade quando é vivido como um presente para toda a vida.
Agora, ao fazer esta apresentação positiva do valor do matrimónio indissolúvel, de um amor comprometido e fecundo pela vida, devemos ter presente que a “dureza de coração” afecta também os homens de hoje, como afectou os homens dos apóstolos, porque foi isso que Jesus fez. chama-os por não terem acreditado no anúncio da sua ressurreição (cf. Marcos 16,14). Isto implica que É necessária a ação curativa da graça de Cristo em nossos corações e mentes para podermos compreender, aceitar e viver o evangelho do amor. E esta acção de Graça deve ser acompanhada por uma pastoral matrimonial que inclua tanto o testemunho de vida dos esposos cristãos como as diversas formas de catequese e acompanhamento do casal que se prepara para contrair matrimónio.
Peçamos ao Senhor que nos ajude a captar a beleza e o valor de um amor exclusivo, fecundo e duradouro. Em tempos de “amor líquido”, em referência à fragilidade dos vínculos, que o Senhor nos conceda a graça de apostar tudo num “amor sólido” e verdadeiro.
Em conclusão, a afirmação de Jesus sobre a indissolubilidade do matrimónio é clara, ainda mais tendo em conta que se repete nos outros evangelhos (cf. Mt 5,31-32; 19,9; Lc 16,18). Mas da realidade de hoje surge uma pergunta que os fariseus não fizeram a Jesus e que ainda é importante. Esta é uma questão pastoral: O que fazemos com casos específicos e particulares? O que acontece com as pessoas que se divorciaram e formaram uma nova união, mesmo com filhos resultantes dessa nova união? O Magistério da Igreja, com atitude de escuta e fidelidade ao espírito do Evangelho, deu indicações a este respeito. As mais recentes foram as do Papa Francisco na sua exortação apostólica “a alegria do amor”, onde nos convida a “acompanhar, discernir e integrar a fragilidade”.
A título de resumo, são válidas as palavras do Papa Francisco na audiência geral de quarta-feira, 2 de abril de 2014: “A imagem de Deus é o casal: o homem e a mulher; não apenas o homem, não apenas a mulher, mas ambos. Esta é a imagem de Deus: o amor, a aliança de Deus connosco está representada naquela aliança entre homem e mulher. E isso é lindo. Fomos criados para amar, como reflexo de Deus e do seu amor. E na união conjugal o homem e a mulher cumprem esta vocação no sinal da reciprocidade e da comunhão de vida plena e definitiva. Quando um homem e uma mulher celebram o sacramento do matrimónio, Deus, por assim dizer, «reflecte-se» neles, imprime-lhes os seus traços e o carácter indelével do seu amor [...] É verdadeiramente um projecto estupendo que é conatural no sacramento do matrimônio. E se realiza na simplicidade e também na fragilidade da condição humana. Sabemos bem quantas dificuldades e provações tem a vida de dois cônjuges... O importante é manter vivo o relacionamento com Deus, que é a base do vínculo conjugal. E o relacionamento autêntico é sempre com o Senhor. Quando a família reza, o vínculo é mantido. Quando o marido ora pela esposa e a esposa ora pelo marido, esse vínculo se torna forte; um ora pelo outro. É verdade que na vida conjugal há muitas dificuldades, muitas; que o trabalho, que o dinheiro não chega, que as crianças têm problemas. Muitas dificuldades. E muitas vezes marido e mulher ficam um pouco nervosos e brigam entre si. Eles brigam, é assim, sempre tem briga no casamento, às vezes os pratos voam. Mas não devemos ficar tristes com isso, a condição humana é assim. E o segredo é que o amor é mais forte que o momento em que briga, por isso sempre aconselho aos cônjuges: não terminem o dia em que brigaram sem fazer as pazes […] Isso é a vida, levá-la adiante assim, levá-lo adiante com a coragem de querer vivê-lo juntos. E isso é ótimo, é lindo. A vida de casado é algo lindo e devemos sempre guardá-la, guardar os filhos. Outras vezes já falei algo neste quadrado que ajuda muito na vida de casado. Há três palavras que devem ser ditas sempre, três palavras que devem estar em casa: permissão, obrigado e perdão. As três palavras mágicas […] Com estas três palavras, com a oração do marido pela esposa e vice-versa, com sempre fazer as pazes antes do fim do dia, o casamento avançará.”
PARA ORAÇÃO (RESSON NCIAS DO EVANGELHO EM ORAÇÃO):
Levamos as Boas Novas…
Jesus,
Marido da alma,
Do homem agitado
Isso busca sua calma.
Ouça as perguntas
Responder às orações,
deixe-nos saber
O que a sua Palavra diz.
Nesta peregrinação
A oração nos derrete em você
No casamento espiritual.
Abrace-nos em sua ternura
Precisamos do seu amor, Senhor
Do seu Espírito Santo!
É assim que somos profetas
E as Boas Novas que levamos
Sem desmaiar ou abaixar os braços.
Renovar nossa voz
E levante-se pela paz, pela vida
Pela Verdade. Amém.
NOTAS BIBLIOGRÁFICAS
1 Pontifícia Comissão Bíblica, “O que é o homem” (Sl 8:5). Um itinerário de antropologia bíblica; BAC, Madri, 2020, 27.
2 Cf. Os evangelhos e a cultura mediterrânea do século I. Comentário das Ciências Sociais. (Palavra Divina; Estella 1996) 186.
3 O Evangelho segundo São Marcos Vol. (Siga-me; Salamanca 1993) 83.