Biografia de Jacó Armínio (Jacobus Arminius)

Jacó Armínio (Jacobus Arminius)

Jacó (português brasileiro) ou Jacob (português europeu) Armínio (em latim: Jacobus Arminius,[nota 1] nome latinizado de Jakob Hermanszoon; 10 de outubro de 1560 – 19 de outubro de 1609) foi um teólogo neerlandês da época da reforma protestante. Trabalhou em 1603 como professor de teologia na Universidade de Leiden, e escreveu muitos livros e tratados sobre teologia; sua visão tornou-se a base do arminianismo e do movimento neerlandês Remonstrante.

 

Após a sua morte, a sua objeção ao padrão reformado, a Confissão de Fé Belga, provocou uma ampla discussão no Sínodo de Dort, resultando nos cinco pontos do calvinismo na refutação dos ensinamentos de Armínio.

 

Juventude

Armínio, que nasceu em Oudewater, Utrecht, ficou órfão enquanto ainda era jovem. Seu pai Herman (o nome Arminius/Arminrepresenta a forma latinizada de Hermanszoon, "filho de Herman") morreu, deixando a sua mulher viúva com crianças pequenas.[3]O pastor Theodorus Aemilius adotou então Jacó e o pôs na escola de Utrecht. Contudo, esse pastor veio a falecer em 1574 e outro nativo de Oudewater, Rudolph Snellius, levou-o a estudar em Marburgo, onde Snellius era professor.[4] A família de Armínio morreu durante o massacre espanhol de Oudewater em 1575. Armínio retornou à Holanda e continuou seus estudos de teologia naUniversidade de Leiden, onde permaneceu desde 1576 até 1582.[4]

 

Estudos teológicos e ministério

Dessa forma, Armínio permaneceu em Leiden de 1576 a 1582. Entre seus professores de teologia se incluíam homens como Lambertus Danaeus[5] , Johannes Drusius[1] , Guillaume Feuguereius[6] , e Johann Kolmann. Kolmann acreditava e ensinava que o alto calvinismotornava Deus um tirano e carrasco. Sob a influência desses homens, Jacó estudou com dedicação e teve sementes plantadas que começariam a se desenvolver em uma teologia que posteriormente competiria com a dominante teologia reformada de João Calvino. Em 1582, Armínio começou a estudar com Teodoro de Beza em Genebra. Ele se viu em apuros após usar técnicas ramistas, familiar a ele de seu tempo em Marburgo, em seguida ele se mudou para Basileia.[4]

Após, ele aceitou a chamada para ser pastor em Amsterdã, sendo ordenado em 1588. Nessa condição, ganhou reputação como um bom pregador e fiel pastor. Em 1590 ele se casou com Lijsbet Reael. Em Amsterdã, Arminius através de "uma série de sermões sobre a epístola de Romanos veio a desenvolver gradualmente opiniões sobre a graça, predestinação e livre-arbítrio, as quais se mostraram incompatíveis com a doutrina dos professores reformados Calvino e Beza".[7] Em 1591, o seu colega Petrus Plancius[8] , respondendo ao desenvolvimento teológico de Armínio, começou a disputar abertamente contra ele. Os burgomestres de Amsterdã interviram num esforço para manter a paz e abafar as divisões na população.[9]

 

Professor em Leiden

Em 1603 ele foi chamado de volta a Universidade de Leiden para ensinar teologia. Isto aconteceu após as mortes quase simultâneas em 1602 de dois membros da faculdade, Franciscus Junius, O Velho e Lucas Trelcatius, O Velho (1542-1602), em um surto da peste. Lucas Trelcatius, O Jovem (1573-1607) e Armínio (apesar do protesto de Plancius) foram nomeados, a decisão coube em grande parte àFranciscus Gomarus, membro da faculdade sobrevivente.[10] Enquanto Gomarus cautelosamente aprovara Armínio, cujas opiniões já eram suspeitas de heterodoxia, a sua chegada abriu um período de debate, em vez de fechá-lo.[11] A nomeação teve também uma dimensão política, sendo apoiada por Johannes Wtenbogaert[12] , em Haia, e Johan van Oldenbarnevelt.[13]

 

Controvérsia com Gomarus

Os tipos de personalidade dos professores Gomarus e Armínio eram muito diferentes. Gomarus ("um refugiado flamengo que estava trabalhando em Leyden desde 1594") tem sido descrito como "um estudioso medíocre", mas "um forte defensor da doutrina calvinista... um homem de profunda fé."[7] Em contrapartida Armínio tem sido descrito como "um buscador, um cético."[7] Sobre a questão da predestinação Gomarus era supralapsariano e foi sobre este ponto de debate que o conflito entre os dois começou. A animosidade era ainda mais exasperada, devido ao fato de Armínio defender a revisão da Confissão Belga e do Catecismo de Heidelberg, mas se recusar de explicar o porquê disso (senão muito mais tarde, quando o debate tornou-se um conflito aberto). Abertamente, esta recusa declara a sua opinião "o fez irritantemente intangível para a oposição" e "aos olhos de Gomarus, Armínio era uma covarde insensato."[7]

A disputa entre os professores tomaram um rumo público em 07 de fevereiro de 1604, quando Willem Bastingius em sua disputa intituladaDe divina praedestinatione defendeu uma série de teses de Armínio. O próprio Armínio presidiu a disputa. Isto levou Gomarus à fazer Gruterus Samuel argumentar posições opostas a essas teses em 14 de outubro de 1604 em um evento que não foi incluído no calendário oficial. Em sua resposta Gomarus não chamou Armínio pelo nome, em vez disso atribuiu as posições ao adversário de Calvino Sebastian Castellion (um dos primeiros proponentes cristão reformado de tolerância religiosa) e ao seu seguidor, Dirck Volckertszoon Coornhert[14] . Embora Armínio apontasse para Bíblia a fim de defender as suas posições, os pontos de vista expostos pelos "patriarcas de Genebra gradualmente adquiriram força de Res judicata, de modo que a resistência contra ela não era mais tolerada.[7]

Foram os opositores de Armínio de fora da Universidade que ampliaram a controvérsia. Um órgão administrativo de pastores e anciãos (chamado de classis) em Dordrechtelaborou uma queixa (uma acusação muito pesada contra o acusado), em que "algumas diferenças" que "teriam surgido na Igreja e na Universidade de Leiden sobre a doutrina das Igrejas Reformadas" foram expostas.[7] Em resposta a três professores de teologia de Leiden (Lucas Trelcatius, o Jovem, Armínio e Gomarus) e o regente do Colégio Estadual, Johannes Cuchlinus, ele escreveu uma carta indignada, afirmando "que, tanto quanto era conhecido por eles não havia conflito entre os professores em qualquer doutrina fundamental que seja."[7]

Os detratores de Armínio não se acalmaram com tal afirmação e Gomarus foi incitado a aumentar a sua oposição à Armínio com o ministro de Leiden Festus Hommius[15] e Petrus Plancius (antigo colega e adversário de Armínio). Uma série anônima de trinta e um artigos começou a circular "em que todos os tipos de opiniões heterodoxas de Armínio foram expostas."[7] Sibrandus Lubbertus[16] , professor de teologia na Universidade de Franeker, começou a enviar cartas a fim de incitar outros teólogos a atacar Armínio com acusações de heresia. Por acidente uma das cartas de Lubbertus caiu nas mãos de Armínio alertando-o da atividade de seus adversários.

Devido aos seus adversários permaneceram no anonimato ou terem contornado procedimentos oficiais, Armínio em abril de 1608 solicitou dos Estados da Holanda permissão para expor as suas opiniões. Esperando evitar a convocação de um sínodo, em 30 de maio de 1608 Armínio e Gomarus foram autorizados pelos Estados à fazer discursos perante o Suprema Corte em Haia.

O Chefe de Justiça da Suprema Corte, Reinout van Brederode (genro de Oldenbarnevelt) concluiu que "os pontos de diferença entre os dois professores, em sua maioria relacionados com os detalhes sutis da doutrina da predestinação, eram de menor importância e poderiam co-existir... [e] ambos os senhores foram intimados a tolerar uns aos outros com amor."[7] Em direta provocação ao Tribunal, Gomarus ignorou o discurso publicado que havia feito antes dele, e Armínio seguiu publicando o seu próprio discurso.

Em resposta à determinação da Corte, Gomarus declarou que "ele não se atreveria a morrer conservando a opinião de Armínio, nem se apresentar com ela ante o tribunal de Deus."[7] Compelido a responder a este ataque, Armínio pediu para defender as suas posições em público ou em um sínodo nacional ou provincial a ser chamado para examinar o assunto. Novamente procurando evitar um sínodo, os Estados da Holanda permitiram a Armínio expor sobre a sua visão na assembleia de 30 de outubro de 1608.

Finalmente, antes da assembleia Armínio explicou o seu apelo para que a Confissão Belga e o Catecismo de Heidelberg fossem reescritos, dizendo que ele não se sentia obrigado a explicar a sua posição antes, pois "como um professor, ele se considerava sujeito apenas à autoridade dos curadores de Leiden e dos Estados, não à Igreja."[7] Logo em seguida, Armínio deu uma visão geral de todas as diferentes opiniões existentes sobre a predestinação. Ele alegou que o supralapsarianismo era contrário à Confissão e o Catecismo e que "supra e infralapsarianismo, basicamente equivalem à mesma coisa."[7] Armínio apresentou sua própria visão sobre a predestinação a qual assegurava estar em concordância com a Confissão e o Catecismo. Esta foi, e continua a ser, intrigante pois "não é fácil entender o porque precisamente um defensor da doutrina da predestinação que, de acordo com o que ele mesmo diz, está em conformidade com a Confissão e o Catecismo, deve pedir a sua revisão."[7]

Sabendo que Armínio tinha aparecido diante da assembléia dos Estados, Gomarus também pediu permissão para se dirigir, o que foi concedido. Em 12 de dezembro de 1608 Gomarus criticou Armínio, acusando "o seu colega de ser um defensor do pelagianismo e dos jesuítas, ele também atacou Johannes Wtenbogaert, a quem ele rotulou como um 'trompetista da corte'."[7] A assembléia protestou contra esse tom polêmico, que contrastava com o irenismo de Armínio, e ordenou que os discursos feitos anteriormente por ambos os homens fossem proibidos de serem publicados. Apesar da proibição dos discursos eles logo apareceram impressos.

Em 25 de julho de 1609 Jacobus Bontebal defendeu a tese De hominis ad vocatione salutem sob a presidência de Armínio. Um sacerdote católico romano (rumores de ser um jesuíta) estava na platéia e se atreveu a se opor às posições de Armínio. Embora Armínio já estando gravemente doente ele refutou os argumentos, Gomarus "que estava entre o público, ficou muito avermelhado e pálido, e depois, enquanto o papista estava ao alcance da voz, insultuosamente observou ao seu colega que agora a porta para papismo tinha sido amplamente aberto."[7]

 

Debate final e últimos dias

Armínio permaneceu como professor em Leiden, até sua morte, e foi estimado por seus alunos.[17] Ainda assim, o conflito com Gomarus se ampliou para uma cisão em larga escala dentro do calvinismo.[18] Do clero local, Adrianus Borrius[19] apoiou Armínio, enquanto Festus Hommius se opôs.[20] Os amigos mais próximos, alunos e simpatizantes de Armínio foram Johannes Drusius[1] , Conrad Vorstius (1569-1622), Antonius Thysius, O Velho[21] , Johannes Halsbergius[22] , Petrus Bertius[23] , Johannes Arnoldi Corvinus[24] , os irmãos Rembert e Simon Episcopius[2] .[25] Seu sucessor em Leiden (novamente selecionado com o apoio de Wtenbogaert e Oldenbarnevelt) foi Vorstius, que exerceu influência sobre Armínio por seus escritos.[26]

 

Pedra memorial de Arminiusem Pieterstsjerke, Leiden.

Mais uma vez os Estados tentaram neutralizar a crescente controvérsia sem chamar um sínodo. Armínio recebeu a ordem de assistir a outra conferência com Gomarus em Haia em 13 e 14 de agosto de 1609. Quando a conferência estava a ser estendida e reunida no dia 18, Armínio com a saúde debilitada teve que retornar a Leiden. Os Estados suspenderam a conferência e pediram aos dois homens uma reação por escrito ao ponto de vista do seu adversário.

Armínio em 19 de outubro de 1609 morreu em sua casa em Pieterskerkhof. Armínio foi enterrado em Pieterskerk em Leiden, onde uma pedra memorial em seu nome foi colocada em 1934.[27]

 

Teologia

Na tentativa de defender a predestinação calvinista contra os ensinamentos de Dirck Volckertszoon Coornhert[14] , Armínio começou a duvidar de aspectos do calvinismo e a modificar algumas partes de sua própria visão.[28] Ele tentou reformar o calvinismo, e emprestou seu nome a um movimento -- Arminianismo -- que resistiria a alguns dos princípios calvinistas (predestinação incondicional, expiação limitada). Os primeiros seguidores holandeses de seu ensinamento ficaram conhecidos como Remonstrantes depois de terem emitido um documento, intitulado Remonstrantiæ (1610), contendo cinco pontos de desacordo com a corrente principal do calvinismo.

Armínio ensinava sobre uma "preventiva" (ou preveniente) graça que era conferida a todos pelo Espírito Santo e esta graça seria "suficiente para crer, apesar de nossa corrupção pecaminosa, e, portanto para a salvação".[29] Armínio declarou que "a graça suficiente para a salvação é conferida ao eleito, e aos não-eleitos; que, se quiserem, podem crer ou não crer, podem ser salvos ou não ser salvos."[30] William Witt afirma que "Arminius tem uma teologia muito nobre sobre a graça. Ele insiste enfaticamente que a graça é gratuita porque é obtida através da redenção de Deus em Cristo, e não através do esforço humano."[31]

A teologia arminiana não se tornou totalmente desenvolvida durante a vida de Armínio, só após a sua morte (1609) os cinco artigos da remonstrância (1610) sistematizaram e formalizaram as suas ideias. Mas o calvinista Sínodo de Dort (1618-1619) se reuniu com o propósito de condenar a teologia de Armínio, declarou a ele e aos seus adeptosanátemas, então definiu os cinco pontos do calvinismo, e perseguiu os pastores arminianos que permaneceram na Holanda. Mas, apesar da perseguição, "os Remonstrantes continuaram na Holanda como uma igreja diferente e nova, e novamente onde o calvinismo foi ensinado o arminianismo ergueu a sua cabeça".[32]

Editores em Leiden (1629) e em Frankfurt (1631 e 1635) publicaram as obras de Armínio em latim.

John Wesley (1703-1791), fundador do movimento metodista, abraçou a teologia arminiana e se tornou o seu maior defensor.[33] Hoje , a maioria dos metodistas continuam comprometidos com a teologia arminiana, e o arminianismo em si tornou-se um dos sistemas teológicos dominantes nos Estados Unidos, graças em grande parte à influência de John e Charles Wesley.[34]