A análise exergética de uma unidade completa utilizada para a produção do clínquer

Túlio Anacleto, Jan 15, 2021

Imagino que a maioria de vocês, quando entrou na graduação em Engenharia Química, não sabia exatamente o que a gente estuda neste curso. Foi assim comigo também. A minha escolha de curso não foi da forma mais indicada... quando eu estava no segundo ano do ensino médio já sabia que queria fazer a graduação em algum curso de engenharia, mas ainda não tinha decidido qual. Para escolher, listei as opções de cursos de engenharia e defini quais me interessavam menos. Por meio de sucessivas exclusões, o curso restante na minha lista foi a Engenharia Química.

Após decidir cursar Engenharia Química, vi que a nota de corte era bem alta para o vestibular, mas confesso que isso mais me motivou do que desanimou. Sempre gostei de situações difíceis e desafiantes. Então, quando concluí o ensino médio, prestei o vestibular na UFMG e fui aprovado! Escolhi a UFMG por ser a universidade federal mais próxima da minha cidade e também porque eu não teria condições de arcar com as despesas de uma universidade particular.

Durante o curso, percebi que a Engenharia Química era realmente um curso bem diferente do que eu imaginava quando iniciei. Esperava algo mais próximo do que vi na Química do ensino médio, mas tive duas surpresas: a primeira foi que a Química da faculdade é muito diferente da estudada no ensino médio e a segunda foi que a Engenharia Química se descola consideravelmente da Química. Mas podem acreditar, foram as melhores surpresas que este curso poderia me proporcionar. Descobri que a Química estudada na faculdade é algo que realmente não me agrada. Por outro lado, a realidade industrial da Engenharia Química me deixou apaixonado com o curso! Dessa forma, apesar das dificuldades, cursar Engenharia Química foi durante todo o tempo algo que fez meus olhos brilharem!

Durante toda a minha vida, tive o sonho de dar aula. Assim, logo que terminei a graduação, já fiz o processo seletivo para ingressar no mestrado em Engenharia Química. A escolha do tema foi baseada em um projeto de Iniciação Científica que realizei no final da graduação com a Professora Andréa. Neste projeto, realizei a análise exergética de um forno rotativo utilizado para a produção de clínquer. Não escrevi errado, é análise exergética mesmo.

A análise exergética é um complemento à análise energética convencional. Imagine que você deseja utilizar vapor em um ciclo para geração de energia. Este vapor apresenta um conteúdo energético que será convertido em trabalho neste ciclo. Contudo, um processo real, de forma geral, ocorre de forma irreversível, acarretando geração de entropia. Dessa forma, na prática, nem todo o conteúdo energético do vapor poderá ser utilizado para a realização de trabalho, pois parte desta energia disponível não pode ser convertida em trabalho por consequência da geração de entropia. A exergia do vapor corresponde ao valor da respectiva energia que está de fato disponível para a realização de trabalho. Visto que a exergia está ligada à geração de entropia, tal propriedade também não se conserva em um processo.

Em sequência ao trabalho realizado na Iniciação Científica, o tema do meu mestrado consiste em realizar a análise exergética de uma unidade completa utilizada para a produção do clínquer (não apenas o forno mais) e, a partir desta análise, realizar uma otimização do processo. Na otimização, o objetivo é definir as características ideais do combustível utilizado no processo, considerando o uso de co-processamento (vou explicar o que este termo significa posteriormente).

O clínquer é o principal constituinte do cimento. A produção deste material consiste na parte mais importante em uma indústria de produção de cimento. Cerca de 90% da demanda de energia térmica para a produção do cimento ocorre na etapa de produção do clínquer. No processo em que estudo no mestrado, a produção de clínquer ocorre em uma taxa superior a 80 toneladas por hora! Até hoje ainda é difícil para mim mensurar tamanha quantidade! Mas esta é a realidade. O cimento é o segundo material mais consumido no mundo, perdendo apenas para a água.

A formação do clínquer é um processo extremamente endotérmico. Associando essa característica endotérmica à alta produção, não é de se assustar que a produção de cimento seja considerada uma vilã contra a natureza. Contudo, ainda não existe nenhum material que seja capaz de substituir toda a demanda de cimento. Assim, ainda iremos continuar produzindo cimento por muitos anos. Uma estratégia utilizada na maior parte dos processos para reduzir este impacto ambiental é a substituição de parte da matéria-prima ou dos combustíveis fósseis por materiais alternativos, que normalmente consistem em resíduos. Esta estratégia é denominada co-processamento. Em função das altas temperaturas envolvidas na produção do clínquer, a queima de resíduos é favorecida, pois possíveis componentes tóxicos que poderiam se formar são degradados. Consequentemente, o co-processamento contribui para a solução do problema de descarte de resíduos. Em alguns países europeus, mais de 60% dos materiais utilizados na produção de cimento correspondem a estes materiais alternativos.

Alonguei-me um pouco na explicação da minha pesquisa para poder dizer agora que escolher fazer uma pós-graduação não significa se descolar dos problemas do mundo real. Em geral, os projetos de pesquisa realizados no Departamento de Pós-Graduação em Engenharia Química têm um comprometimento total com problemas cotidianos reais enfrentados pelas indústrias. Portanto, quem decide seguir carreira acadêmica no programa deve estar preparado para propor uma solução robusta a algum problema real. Esta é uma característica muito séria. Durante o mestrado tive que ajustar a metodologia empregada no meu trabalho várias vezes, até chegar em uma que fosse capaz de simular a produção de clínquer e avaliar tal produção da forma mais real possível.

Este comprometimento em resolver problemas reais é o que mais me motivou na pesquisa em Engenharia Química. Realmente me sinto realizado com o trabalho que faço. O meu mestrado é realizado sob a orientação da Professora Andréa e meu projeto está incluso na linha de pesquisa denominada Engenharia de Sistemas em Processo. Pretendo ingressar no doutorado quando terminar o mestrado e futuramente me tornar professor de uma universidade federal, de preferência a UFMG! Contudo, não descarto a possibilidade de atuar no mercado de trabalho durante este percurso.

Túlio Anacleto, mestrando em Engenharia Química. jan 15, 2021

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