Um caminho diferente
Maria Clara Valinhas, Mai 06, 2021
Maria Clara Valinhas, Mai 06, 2021
Eu nunca tive pudores em admitir que não sei por que eu escolhi estudar engenharia química. Saber, aos 18 anos, o que se quer fazer pelo resto da vida é um privilégio raro.
Durante a faculdade, eu via que meus colegas pareciam saber exatamente o que queriam, enquanto eu me sentia cada vez mais perdida.
Muitas coisas no curso me interessavam, mas de forma geral, eu percebia que eu me cansava das coisas com muita facilidade, e depois de algum tempo, eu já estava pronta para a próxima. Comecei a achar que tinha cometido um erro enorme ao escolher aquele curso. Por outro lado, eu estava mais perdida do que nunca; não sabia o que mais eu poderia fazer se parasse com aquilo.
O tempo foi passando, eu fui ficando ali e experimentando várias coisas, até que chegou o dia da formatura, e eu pensei: “E agora?” Meio que automaticamente, eu me candidatei a incontáveis vagas de emprego. Não consegui nenhum! Na época, eu ficava muito decepcionada comigo mesma, achava que tinha que haver algum problema comigo. Foi um período muito difícil, mas de muito crescimento pessoal, até que um dia eu percebi: não havia nada de errado comigo; eu não passava nas entrevistas simplesmente porque não tinha aquele perfil.
E então eu resolvi que era hora de parar e pensar: mas se não é isso, então o que é que eu vou fazer? Eu resolvi que, até conseguir descobrir, eu ia continuar estudando. Comecei a buscar cursos de especialização em que eu pudesse me inscrever até encontrar a coisa certa para mim. Descobri, meio que por acaso, que a Faculdade de Letras da UFMG oferecia um curso de especialização em tradução. Na mesma hora, acendeu-se a luz na minha cabeça e eu pensei: é isso! Comecei a traduzir imediatamente, e não parei mais.
Hoje, quase 15 anos depois, eu vejo muito claramente que não foi por acaso que meu paraquedas me levou para a Engenharia Química. Eu aprendi muita coisa legal, conheci muita gente interessante, fiz amigos que vão ficar comigo para toda a vida. O curso me deu uma formação que já me permitiu começar uma nova carreira como tradutora técnica; me ensinou a ser mais analítica, a identificar e entender cada etapa de cada processo; me deu confiança para fazer uma mudança de vida radical; me abriu muitas portas: minha primeira oportunidade como tradutora profissional veio de uma colega de curso, uma grande amiga que hoje é professora/pesquisadora no DESA/UFMG.
A universidade pública me apresentou um novo mundo, me ensinou a ser uma cidadã mais consciente, me mostrou que sou parte de uma sociedade que está muito longe de ser justa e perfeita para todos. Eu vejo, cada vez mais, que tive uma oportunidade que a vasta maioria das pessoas não têm e que é meu dever retribuir esse investimento que toda a sociedade fez na minha educação. Acredito que ser uma boa profissional é uma forma de fazer isso.
Hoje eu sinto que estou no lugar certo; raramente eu me canso do trabalho, pois sei que em poucas semanas, vou estar com outro projeto, outros assuntos, novos desafios, aprendendo coisas diferentes. Como tradutora pública juramentada, eu tenho a oportunidade de participar, ainda que de longe, de momentos importantes da vida das pessoas, e isso também me faz muito bem.
Ao longo do caminho, conheci tradutores que eram médicos, agrônomos, psicólogos, economistas; conheci filósofos que eram matemáticos, engenheiros que eram geógrafos... Eu entendi que sentir-se perdido em um lugar jamais imaginado é muito mais comum do que se pensa, e que não há nada de errado nisso. Pelo contrário: pode ser uma grande oportunidade de se conhecer melhor, amadurecer e realmente encontrar o seu lugar.
Maria Clara Valinhas, formada em Engenharia Química na UFMG em 2006/2. Mai 06, 2021
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