6º DOM.TP-B

6º DOMINGO DA PÁSCOA- ANO B

05/05/2024

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


Primeira Leitura: Atos 10,25-26.34-35.44-48

Salmo Responsorial: 97(98)-R- O Senhor fez conhecer a salvação e revelou sua justiça às nações

Segunda Leitura: 1 João  4,7-10

Evangelho: João 15,9-17 (ou 17,11b-19)

9        Como meu Pai me ama, assim também eu vos amo. Permanecei no meu amor. 10        Se observardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor, assim como eu observei o que mandou meu Pai e permaneço no seu amor. 11          Eu vos disse isso, para que a minha alegria esteja em vós, e a vossa alegria seja completa. 12          Este é o meu mandamento: amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei. 13      Ninguém tem amor maior do que aquele que dá a vida por seus amigos. 14      Vós sois meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando. 15          Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu Senhor. Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai. 16      Não fostes vós que me escolhestes; fui eu que vos escolhi e vos designei, para dardes fruto e para que o vosso fruto permaneça. Assim, tudo o que pedirdes ao Pai, em meu nome, ele vos dará. 17      O que eu vos mando é que vos ameis uns aos outros. 

DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, ARCEBISPO DE SOROCABA SP

Jo 15,9-17

Jesus proferiu as palavras que acabamos de ouvir no cenáculo, poucas horas antes de sua morte na cruz. 

“Como o Pai me amou, assim também eu vos amei. Permanecei no meu amor (...) Este é o meu mandamento: Amai-vos uns aos outros assim como eu vos amei.”

Gostaria de aprofundar esse “amar como Jesus nos ama”. 

O amor é descrito em três planos, ou melhor, em três movimentos: o Pai ama o Filho Jesus; Jesus ama os discípulos; os discípulos se amam uns aos outros. 

O amor humano, natural, passional é governado por uma lei: “Você deve me amar como eu amo você”. Esse é um amor de reciprocidade: amar e ser amado. A reciprocidade está como que ameaçada de fechamento: “amo você para ser amado da mesma forma e na mesma medida em que amo você”. Esse amor de pura reciprocidade pode se fechar em si mesmo e se tornar egoísmo a dois. 

Jesus introduz no amor uma outra dinâmica, uma lei nova: Este é o meu mandamento: Amai-vos uns aos outros assim como eu vos amei. Como eu amei você, assim você deve amar o outro. O amor não se fecha no egoísmo, porque não obriga o amado a corresponder ao amante. Pelo contrário, o amor do amante lança o amor do amado para um terceiro: um condileto: amado pelos dois. Assim o amor faz circular a vida e a felicidade de amar. O amor de Jesus não nos obriga a amá-lo, mas a nos amar uns aos outros como Ele nos amou. 

Esse amor de Jesus não proíbe a reciprocidade nem a gratidão: amar Jesus porque sou amado por Ele. Mas essa reciprocidade e gratidão se expressam exatamente quando doamos o amor recebido de Jesus ao outro: amar Jesus (reciprocidade) é o mesmo que amar o irmão (condileto); amar o irmão é transmitir a ele o que recebi de Jesus: o amor que dá a vida pelo amigo. Ninguém tem amor maior do que aquele que dá a vida pelos amigos.

Outra dinâmica própria do amor de Jesus é que para amar como Jesus é preciso primeiro ser amado por Ele. Amamos porque Deus nos amou por primeiro (1Jo 4,19). “Primeiro” não significa dizer uma vez só, no início, mas receber sempre, a cada momento, porque Deus em cada instante ama para que eu possa amar o outro. 

Essa dinâmica mostra qual é a fonte do amor de Jesus por nós. Jesus não se revela como a fonte do amor. Ele sabe que a origem do seu amor é o Pai. Sendo amado, Jesus ama e é a perfeita expressão humana do amor do Pai por nós. Jesus recebe continuamente o amor que provém do Pai e vive o amor de modo perfeitíssimo nos amando e dando a sua vida por nós. 

Você quer amar de verdade? Ame como Jesus! Para amar como Jesus é preciso receber continuamente, a todo momento o amor de Jesus. Ora, essa experiência de receber o amor para amar, nós a temos de maneira originária no batismo, de maneira cotidiana na Eucaristia e de modo atual na Confirmação. No batismo o amor de Jesus é derramado como virtude para se desenvolver e se tornar consciente. Na eucaristia, o amor de Jesus nos é dado como alimento e como memorial do amor que dá a vida pelos amigos. Na Confirmação recebemos o Espírito Santo, que é o Condileto: Ele é o amado pelo Pai e pelo Filho (Condileto) que nos configura ao Amado-Filho do Pai.

Amizade cristificada - Adroaldo Palaoro


“Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que olvi de meu Pai” (Jo. 15,15)


Continuamos vivendo o percurso pascal; no relato do evangelho deste domingo, a Páscoa se expressa como o tempo dos três “as”: Amor, Amizade e Alegria.

O evangelista João põe na boca de Jesus um longo discurso de despedida, no qual recolhe aquilo que será a marca distintiva dos seus seguidores, para serem fiéis à Sua pessoa e ao Seu projeto. E a identidade original de quem O segue será a vivência do amor. Fomos criados à imagem do Deus que é amor; por isso, trazemos, no mais profundo do nosso ser, a “chama do amor divino”.

O amor que Jesus nos pede tem de surgir a partir de dentro; trata-se de manifestar o que é Deus no mais profundo de nosso ser. Quando amamos não é preciso dizer que Deus está em nosso coração porque, de uma maneira melhor, estamos no coração de Deus, participamos do próprio dom de seu amor. Encontramo-nos, assim, envolvidos pelo amor de Deus. 


Indecifrável como a obra de arte, o Amor nem se define nem se enquadra: é cada vez outro, novo, surpreendente, desconcertante..., embora tão antigo.

S. João nos diz que “Deus é Amor (Ágape) e aquele que habita no Amor, habita em Deus e Deus habita nele” (1Jo. 4,16). Portanto, é proposto ao ser humano uma experiência. Ele é chamado para exercitar sua capacidade de gratuidade e graça. Em um mundo onde tudo se paga, onde nada é gratuito, ele é chamado a ser presença gratuita, a viver a graça e a gratidão.

O amor que Deus tem por nós é absolutamente desinteressado, ativo e criativo, gratuito e livre. Ama aqueles que não são valorizados, aqueles que são desprezados e excluídos. O seu Amor é que valoriza o outro. A criatura não é amada porque tem valor por si mesma, mas tem valor porque é amada por Deus, que lhe comunica generosamente a sua própria riqueza. Nisso consiste a Criação: Deus, num transborda-mento do seu amor intra-trinitário, deu o ser ao que não era nada.

Criados à imagem e semelhança do Deus Amor, somos capazes de Amor-Ágape, de amar aquele que não nos ama e não devemos nos privar dessa liberdade.

Não é porque as pessoas são amáveis que devemos amá-las; é na medida em que as amamos que são (para nós) amáveis.  A caridade é esse amor que não espera ser merecido, esse amor primeiro, gratuito, espontâneo e que, de fato, é a verdade do amor. Uma liberdade de amar o outro em sua diferença, de amar o divino no outro, de amar o outro como a nós mesmos, reconhecendo-nos nele.

Para aprender a amar é preciso sair de nossos hábitos, sair do conhecido; aprender a amar é sempre uma aventura. Se entrarmos nessa aventura, nossa vida será virada pelo avesso e completamente questionada.


Esse amor, ativo e primeiro, suscita em nós a gratidão que nos leva a corresponder com um amor-serviço; o amor sempre se faz serviço, assim como todo serviço é inspirado e sustentado pelo amor. Trata-se da mística do “serviço por puro amor”. Por isso, esse amor é fonte de alegria, ou seja, um estado permanente de plenitude e bem-estar. Sem amor não é possível dar passos em direção a um cristianismo mais aberto, cordial, alegre, simples e amável, onde possamos viver como “amigos” de Jesus.

Da mensagem de Jesus ressoa a surpreendente frase de sua despedida: “Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai”.

Quem vive o mandamento do amor é, por isso mesmo, “amigo de Jesus”; e a amizade se mostra em ser introduzidos na intimidade de Jesus com seu Abbá, em ser confidente de Jesus. Jesus não pede a seus discípulos que sejam perfeitos em tudo: só no amor e na misericórdia.

“...se fizerdes o que vos mando”; tradução empobrecida, pois entre amigos não há quem manda, mas acolhida mútua. É como se Jesus dissesse: “sereis meus amigos se entrardes no circuito do amor que flui do Pai, passa por mim e circula entre vocês”; “sereis meus amigos se entrardes em sintonia com o amor ágape que brota do meu coração”. O amor é movimento, circula reforçando os laços, acolhendo... O amor é expansivo e contagiante. O amor une corações.


Quando falamos de amizade estamos falando de gratuidade, de lealdade, de igualdade, de não pedir nada em troca, de partilhar sem passar recibo... A amizade seja talvez a melhor relação humana que existe; é gratuita, livre, simbiótica. Dizer de alguém amigo é um tesouro. Os amigos se conhecem bem, há sinceridade entre eles, desejam sempre o bem do outro, sabem acompanhar as diversas situações da vida, aprendem a escutar e a dizer livremente para o bem do outro. A amizade é um lugar de acolhida contínua, de sentido do humor e de ajuda mútua.

Por isso, um(a) amigo(a) é um tesouro, e aquele(a) que tem um(a) amigo(a) tem uma conexão direta com as mais autênticas essências da vida.

A amizade é caminho compartilhado. Ninguém faz caminho sozinho, fazem juntos, e assim são amigos. A amizade implica neste plano com-corrência (correr juntos, para assim ajudar-se uns aos outros). Amizade é co-laboração (trabalho compartilhado). Frente àqueles que entendem a vida como luta ou competição, frente àqueles que procuram combater ou silenciar-se no processo da vida, frente àqueles que oprimem e dominam os outros, os amigos cooperam, se respeitam e trabalham juntos. Os amigos verdadeiros deixam de lado as opções partidaristas, os egoísmos particulares, e integram-se na busca comum, com a alegria de entar unidos, compartilhando os desafios e as perdas. Quem não sabe ou não quer colaborar na obra comum nunca será verdadeiro amigo.

Amigos são aqueles que se querem por querer-se, sem buscar a amizade por outros interesses. Mas a mesma amizade faz comque eles se ajudem em gesto de benevolência ativa: acolhem-se, perdoam-se, potenciam-se uns aos outros.

Desprovida de interesses mesquinhos, a amizade vale por si mesma, não pelo que faz. Mesmo assim, a autêntica amizade é a mais eficaz, pois sempre se expressa em gestos concretos de ajuda mútua. O que importa mais é uma existência compartilhada: ideais e busca, êxitos, fracassos, vida.  

Por isso, a amizade com a marca cristã se inspira n’Aquele que se revelou Amigo de todos, sobretudo dos mais pobres e excluídos


De uma comunidade cristã que deixa transparecer o Amor e prolonga a Amizade de Jesus, nasce a alegria. Só o amor profundo e a amizade sincera é fonte de alegria, de prazer completo. Assim desejava Jesus para sua comunidade: alegre, mensageira, aberta ao diferente... O amor e a amizade fazem de cada cristão um(a) irmão(ã) universal.

Alegria que brota do interior e é um dom do Espírito. “O fruto do Espírito é: amor, alegria” (Gal 5,22). Este dom nos faz filhos(as) de Deus, capazes de viver e saborear sua bondade e misericórdia. 

O vocábulo “alegria” está carregado de emoções, sentimentos e aspirações nobres. Vincula-se ao estado de plenitude humana, à criatividade, ao entusiasmo, ao prazer, ao contentamento, à satisfação, ao regozijo, à felicidade. “Bem-aventurados os que sabem rir de si mesmos: nunca cessarão de se divertir”.

Ao nosso cristianismo lhes falta, com frequência, a alegria daquilo que se faz e se vive com amor. Ao nosso seguimento de Jesus Cristo nos falta o entusiasmo da inovação e nos sobra a tristeza daquilo que se repete sem a convicção de estar prolongando o que Jesus queria de nós; predomina, muitas vezes, uma vivência cristã marcada pelo medo, pelo legalismo, pelo ritualismo... e não pelo entusi-asmo de sentir-nos colaboradores do Mestre da Galiléia.

Não é correto que os cristãos associem com tanta frequência a fé à dor, à renúncia, à mortificação, mas à alegria, à vida em plenitude. 

A “perfeita alegria”, como dizia S. Francisco de Assis, é o horizonte da Páscoa que, desde agora, dá sentido e plenifica nossa existência cotidiana. Não fomos destinados a viver em “vale de lágrimas”.


Texto bíblico:  Jo. 15,9-17


Na oração: 

- Faça uma leitura das “marcas” do Amor de Deus em sua vida; crie um clima de ação de graças.

- Faça memória dos(as) amigos(as) que foram ou são verdadeiros tesouros para você.

- Sua amizade com os outros está iluminada pela amizade de Jesus: gratuita, com-passiva, aberta, acolhedora...?



No estilo de Jesus - José Antonio Pagola

 

Jesus está despedindo-se dos seus discípulos. Amou-os apaixonadamente. Amou-os com o mesmo amor com que o Pai O amou. Agora tem que os deixar. Conhece o seu egoísmo. Não sabem como se amar. Vê-os discutir entre si para conseguirem os primeiros lugares. O que será deles?

As palavras de Jesus adquirem um tom solene. Devem ficar bem gravadas em todos: «Este é o meu mandato: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei». Jesus não quer que seu estilo de amar se perca entre os seus. Se um dia o esquecem, ninguém os poderá reconhecer como discípulos seus.

De Jesus ficou uma recordação inesquecível. As primeiras gerações resumiam assim sua vida: «Passou por todo o lado fazendo o bem». Era bom encontrar-se com Ele. Procurava sempre o bem das pessoas. Ajudava a viver. A sua vida foi uma Boa Nova. Podia-se descobrir nele a proximidade boa de Deus.

Jesus tem um estilo de amar inconfundível. É muito sensível ao sofrimento das pessoas. Não pode passar ao largo de quem está sofrendo. Ao entrar um dia na pequena aldeia de Naim, encontra com um enterro: uma viúva dirige-se a enterrar o seu único filho. A Jesus sai-lhe de dentro o seu amor por aquela desconhecida: «Mulher, não chores». Quem ama como Jesus, vive aliviando o sofrimento e secando lágrimas.

Os Evangelhos recordam em várias ocasiões como Jesus captava com seu olhar o sofrimento das pessoas. Olhava-os e comovia-se: via-os sofrendo ou abatidos, como ovelhas sem pastor. Rapidamente se punha a curar os mais doentes ou a alimentá-los com suas palavras. Quem ama como Jesus aprende a olhar para os rostos das pessoas com compaixão.

É admirável a disponibilidade de Jesus para fazer o bem. Não pensa em si mesmo. Está atento a qualquer chamada, disposto sempre a fazer o que puder. A um mendigo cego que lhe pede compaixão enquanto está a caminho acolhe-o com estas palavras: «Que queres que faça por ti? ». Com esta atitude anda pela vida quem ama como Jesus.

Jesus sabe estar junto aos mais indefesos. Não é preciso que o peçam. Faz o que pode para curar as suas doenças, libertar as suas consciências, ou contagiar a sua confiança em Deus. Mas não pode resolver todos os problemas daquelas pessoas.

Então dedica-se a fazer gestos de bondade: abraça as crianças da rua: não quer que ninguém se sinta órfão; abençoa os doentes: não quer que se sintam esquecidos por Deus; acaricia a pele dos leprosos: não quer que se vejam excluídos. Assim são os gestos de quem ama como Jesus.

 

  “Assim como o meu Pai me ama, eu amo vocês” - João 15:9-17 - Carlos Mesters, Mercedes Lopes e Francisco Orofino.

 

Comentando

Os capítulos 15 até 17 de João trazem vários ensinamentos muito bonitos, fruto da catequese nas comunidades do Discípulo Amado. O evangelista os juntou e colocou aqui no ambiente amigo do último encontro de confraternização de Jesus com os discípulos. Acompanhe.

João 15,9-11: Permanecer no amor, fonte da perfeita alegria

Jesus permanece no amor do Pai observando os mandamentos que dele recebeu. Nós permanecemos no amor de Jesus observando os mandamentos do Pai que ele nos deixou. E devemos observá-los com a mesma medida com que ele os observou: “Se vocês obedecem aos meus mandamentos, permanecerão no meu amor, assim como eu obedeci aos mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor”. É nesta união de amor do Pai e de Jesus que está a fonte da verdadeira alegria: “Eu disse isso a vocês para que minha alegria esteja em vocês, e a alegria de vocês seja completa”.

João 15,12-13: Amar como ele nos amou

O mandamento de Jesus é um só: “amar-nos uns aos outros como ele nos amou!” (Jo 15,12; 13,34). Jesus ultrapassa o Antigo Testamento. O critério antigo era: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lv 18,19). O novo critério é: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. Aqui ele disse aquela frase que cantamos até hoje: “Prova de amor maior não há que doar a vida pelo irmão!”

João 15,14-15 Amigos e não empregados

“Vocês serão meus amigos se praticarem o que eu mando”, a saber, praticar o amor até a doação total de si! Em seguida, Jesus coloca um ideal altíssimo para a vida de quem o segue no caminho. Ele diz: “Não chamo vocês de empregados, mas de amigos. Pois o empregado não sabe o que faz o seu patrão. Chamo vocês de amigos, porque contei para vocês tudo que ouvi do meu Pai!” Jesus não tinha mais segredos para os suas discípulas e seus discípulos. Tudo que ouviu do Pai contou para nós! Este é o ideal bonito da vida em comunidade: chegarmos à total transparência, ao ponto de não haver mais segredos entre nós e de podermos confiar totalmente nas pessoas, de podermos partilhar a experiência que temos de Deus e da vida e, assim, enriquecer-nos mutuamente. Os primeiros cristãos conseguiram realizar este ideal durante alguns anos. Eles “eram um só coração e uma só alma” (At 4,32; 1,14; 2,42.46).

João 15,16-17: Foi Jesus que nos escolheu

Não fomos nós que escolhemos Jesus. Foi ele quem nos encontrou, nos chamou e nos deu a missão de ir e dar fruto, fruto que permaneça. Nós precisamos dele, mas ele também quer precisar de nós e do nosso trabalho para poder continuar fazendo hoje o que fez para o povo na Galileia. A última recomendação: “Isto vos mando: amai-vos uns aos outros!”

Alargando a reflexão

Jesus é a sabedoria de Deus

Para as primeiras comunidades, Jesus é a manifestação da multiforme Sabedoria de Deus (Ef 3,10). Ele é a Sabedoria de Deus (1Cor 1,24). Mas esta ligação entre Jesus e a Sabedoria de Deus aparece com maior evidência no Evangelho de João. Desde o prólogo, podemos perceber como as comunidades do Discípulo Amado gostavam de contemplar Jesus como a Sabedoria que existia em Deus antes da criação do mundo (Jo 1,2-5; Sb 6,22). Tal como a Sabedoria, também Jesus conhece os mistérios de Deus e os revela à humanidade (Jo 3,11-12; Sb 9,9-18).

Há várias outras características da Sabedoria de Deus, acentuadas no Antigo Testamento, que são usadas no Evangelho segundo João para dizer quem é Jesus para nós.

  

O amor verdadeiro - Ana Maria Casarotti

 

O evangelho continua o texto do domingo passado. Desde o começo desta narrativa, Jesus apresenta o amor expressado em diferentes situações. O amor do Pai para com ele, o amor de Jesus para com os discípulos, e a primeira frase da narrativa sintetiza tudo, manifestando a necessidade de permanecer no amor.

Apresenta-se como um descenso do amor: do Pai, de Jesus para os e as que estão com ele, e a importância de permanecer no amor.

Na segunda frase parece que tem um movimento ascendente: “Se vocês obedecem aos meus mandamentos, permanecerão no meu amor, assim como eu obedeci aos mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor”.

Os discípulos devem obedecer aos mandamentos de Jesus porque assim permanecem no amor. Da mesma forma Jesus obedeceu aos mandamentos de seu Pai e por isso permanece no seu amor. Qual é o mandamento a que eles devem corresponder?

Jesus disse “O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros, assim como eu amei vocês”. Jesus não pede que o amem. Ele fala do amor de uns aos outros da mesma forma que ele nos amou. Por isso ainda agrega: “Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos”.

Neste trecho João usa a palavra “ágape”, que é o amor puro, sem procurar nenhum interesse pessoal. Por isso é um amor de entrega aos outros que manifesta sua expressão mais autêntica e até possível em Deus. Jesus não fala de caridade, ou do amor de uma mãe ou pai para com seus filhos ou filhas. Por seu amor ele deposita em nós a capacidade de amar como Ele, amando-nos uns aos outros, como ele nos amou.

O Pai é amor! Continuamente está amando e não precisa de demonstrações do seu amor. Jesus manifesta esse amor incomensurável com o dom de si mesmo. Com a entrega total de sua vida na cruz por amor ao Pai e a cada um e cada uma de nós, entra na mesma dinâmica do amor do Pai. Ele nos ama como se sente amado, e nos convida a fazer o mesmo.

Jesus não nos pede: “amai-me como eu vos amo”. Possivelmente assim é nosso pensamento, mas Jesus fala de amor aos outros como ele nos ama. Ser portadores do seu amor, comunicar seu amor e criar vínculos expandindo o amor que recebemos e do qual somos partícipes. Ele não atua com nossa lógica. (A lógica inexplicável do amor: é morrendo que se vive...) O mandamento é “amar-nos uns aos outros como ele nos amou”. E ainda agrega: “Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos”.

Ele nos chama amigos porque somos partícipes do seu amor, fomos introduzidos nele para alumbrar com a Luz que não pode ser ocultada. Nele somos convidados a ser fonte de água para todos os que procuram saciar sua sede, ser caminho para todos os que estão desorientados, sem rumo. Ser portadores de Sua Misericórdia e sua paz, desconsiderando nosso possível desejo oculto de vingança ou luta.

“Eu chamo vocês de amigos, porque eu comuniquei a vocês tudo o que ouvi de meu Pai.” Jesus nos faz partícipes da sua relação de intimidade com o Pai. Nada é reservado para si mesmo.

Como seriam os sentimentos dos discípulos que escutam estas palavras de Jesus? É um momento difícil, Jesus é procurado para ser morto, e suas palavras têm uma força especial. Ele está revelando o mais próprio do seu coração e do seu sentir: “Não foram vocês que me escolheram, fui eu que escolhi vocês”.

Ele convida-nos a uma amizade profunda e sincera. Desde a experiência do sua entrega de amor por cada um e cada uma se entende que tantos homens e mulheres ao longo da história entregaram e continuem entregando sua vida em fidelidade ao Deus da vida e à vida de seus irmãos e irmãs.

Se olharmos com atenção ao nosso redor, descobriremos que são muitos/as os/as que levam a sério este testamento de Jesus. Às vezes uma vida escondida, gastada no amor ao próximo, está colaborando no processo lento mais esperançoso de ressurreição de nossos povos sofridos.

Oração

Sempre tu

Se nos afundamos,

na dor humana,

mais fundo estás tu

integrando as feridas.

Se subimos no êxtase,

ali te encontramos

abrindo o instante

a novas plenitudes.

Se nos sentimos criadores

com o calor da estréia,

nos inquietas desde o futuro

antes que nos congelemos.

Se a situação nos cerca

como uma cápsula blindada,

nos abres a imensidão

para criar tua palavra.

Sempre te encontramos

mais acima e mais abaixo,

mais dentro e mais fora,

amor sempre maior,

amor sempre menor,

tu infinito e solidário.

Benjamin González Buelta SJ


Atos 10,25-26.34-35.44-48 – Reflexão Thomas McGrath

INTRODUÇÃO

A salvação oferecida por Deus através de Jesus Cristo se destina a todos, sem exceção. Para Deus, o que é decisivo não é a pertença a um grupo religioso ou a um rupo social, mas sim a disponibilidade para acolher a oferta que Ele nos faz.

A trecho do livro dos Atos na Leitura Orante de hoje, vem de uma parte maior do livro (At 9,32-11,18) onde o protagonista é Pedro, e o tema central destes capítulos é a chegada da mensagem de Jesus aos pagãos.

SITUANDO

A cena situa-nos em Cesareia, uma cidade grande, onde residia o procurador romano da Judeia. No centro da cena está Cornélio– que era um não-judeu -, um centurião romano, que era "piedoso e temente a Deus". O episódio refere-se à visita que Pedro faz a Cornélio, durante a qual ele anuncia Jesus. Como resultado desse anúncio, dá-se a conversão de Cornélio e de toda a sua família.

Este episódio tem uma especial importância no esquema imaginado por Lucas para a expansão da Igreja... Cornélio é o primeiro pagão oficialmente admitido na comunidade de Jesus. A conversão dele marca uma mudança de visão decisiva na proclamação da mensagem de Jesus. A partir de agora a Comunidade dos seguidores de Jesus se abre também aos pagãos.

Nos primeiros tempos, após a morte e Ressurreição de Jesus, não era claro para os membros do Movimento de Jesus se os pagãos pudessem entrar no grupo deles o não. Para o Judeu o não judeu era um ser impuro, em casa de quem o bom judeu estava proibido de entrar, a fim de não se contaminar.

Aos poucos, e principalmente por meio de São Paulo, vai se clareando que Deus também quer oferecer a salvação à eles. Para não haver dúvida, nestes capitulo Lucas põe Deus dirigindo todo o procedimento. É Deus que pede a Cornélio que mande chamar Pedro (cf. At 10,1-8). São Lucas está interessado em deixar bem claro que Deus quer que a sua mensagem chegue a todos, sem exceção.

MENSAGEM

Depois de descrever a recepção de Pedro na casa de Cornélio, Lucas põe na boca de Pedro um discurso (do qual, no entanto, a leitura que nos é proposta só apresenta um pequeno trecho) onde ecoa a mensagem kerigmática primitivo. Nesse discurso, Pedro anuncia Jesus e a sua atividade ("andou de lugar em lugar fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo diabo, porque Deus estava com Ele" (v 38). Pedro no seu discurso anuncia também a morte de Jesus (v 39), a sua ressurreição (v 40) e a dimensão salvífica da ação de Jesus (v 43). É esta a mensagem que Jesus encarregou os seus discípulos a anunciar ao mundo inteiro.

O nosso texto acentua, especialmente, o fato de a mensagem da salvação se destinar a todas as nações. Logo no início do discurso, Pedro reconhece que "Agora eu sei que, de fato, Deus trata a todos de modo igual, pois ele aceita todos os que o temem e fazem o que é direito, seja qual for a sua raça (vers. 34-35). Portanto, o anúncio sobre Jesus deve chegar a todos.

Depois do anúncio feito por Pedro, há a efusão do Espírito "sobre todos os que estavam ouvindo a mensagem" (vers. 44), sem distinção de judeus ou pagãos (vers. 45). Pedro é o primeiro a tirar daí as devidas conclusões e batizou Cornélio e toda a sua família.

CONCLUSÃO

Em nosso querido brasil de hoje encontramos muitos grupos de crentes (dentro e fora das religiões oficiais) com a mentalidade que o caminho da salvação é propriedade exclusiva daquele grupo. Os demais podem eventualmente ter acesso à salvação, desde que adotem a mentalidade e modo de praticar a fé daquele grupo. Como se a salvação fosse património ou monopólio deles.

As consequências disso é divisão, conflito, ódio, (tudo menos descobrir o que Deus quer de nós, e como agir), e o uso da religião para promover grupos ou visões políticas – manipulação do nome de Deus para justificar a dominação, a fome e a miséria. Culpar Deus pelos mazelas do ser humano é divulgado por setores de todas as religiões, sem exceção (o vírus é castigo de Deus, causado pelo comunismo, vindo de outros países, e aceito por determinados grupos aqui dentro do brasil). Como se Deus quisesse a morte de quase 450 mil conterrâneos nossos; como se o acesso ao bens da terra nas mãos de cada vez menos brasileiros fosse a vontade de Deus; como se fome e miséria fossem culpa do pobre e vontade de Deus; como se o não trabalhar fosse falta de iniciativa ou vontade de melhorar – “preguiça”.

A leitura bíblica na luz da vida de Jesus – a sua maneira de comportar precisa ser redescoberta. As pessoas com quem Jesus andava; a pregação dele; a inauguração da vida pública de Jesus, com as reflexões de Jesus sobre as palavras do profeta Isaias (Lucas 4); o Sermão da Montanha (Mt 5); o Juízo Final (Mt  25), são  substituídos por outras leituras e são lembradas outras personalidades Bíblicas, para servir de orientação básica da vida Cristã. Parece que tem hora que queremos adaptar a mensagem de Jesus à nossa maneira de pensar e viver, e não o contrário. Não é a nossa vida que deve se encaixar na Bíblia, e sim a Bíblia que deve seencaixar dentro da nossa vida. A tendência é escolher para leitura as partes da Bíblia que não mexe com a nossa mentalidade.

Baseado na reflexão

Dehonianos 6º Domingo da Pascoa

 

TEXTO De Dom Damian Nannini, Argentina

(TRADUÇÃO AUTOMÁTICA DO GOOGLE SEM NOSSA CORREÇÃO)

SEXTO DOMINGO DO CICLO DE PÁSCOA “B”


Primeira leitura (Hb 10,25-26,34-36,43-48):


O texto oferecido pela liturgia de hoje é uma seleção de versículos extraídos da seção incluída em Hb 10,1-11,18, que narra o batismo de Cornélio, o primeiro pagão, pelo Apóstolo São Pedro. A história completa começa com a introdução de Cornélio dizendo que “ele era um homem piedoso e temia a Deus, assim como toda a sua família; Ele dava abundantes esmolas ao povo e orava a Deus sem cessar” (Atos 10:2). Pois bem, Cornélio tem uma visão divina onde lhe é revelado que suas orações e esmolas chegaram a Deus e que ele deve ir em busca de Simão Pedro para levá-lo para casa. Por sua vez, Pedro também tem uma visão onde é convidado a comer alimentos impuros, que ele rejeita, mas Deus o corrige dizendo que foram declarados puros por Ele.


Este contexto deixa claro que Deus “provocou” o encontro entre Cornélio e São Pedro com o qual começa o texto de hoje. Pedro encontra na casa de Cornélio um grande grupo de pessoas “pagãs” dispostas a ouvir o que Ele tem para lhes dizer da parte de Deus (cf. Hb 10, 27.33), por isso começa o seu discurso declarando que compreendeu “aquele Deus não faz acepção de pessoas, e que, em qualquer nação, todo aquele que o teme e pratica a justiça lhe é agradável” (Hb 10:34-35). A afirmação “Deus não faz acepção de pessoas” costuma aparecer no NT em contextos onde Deus é apresentado como um Juiz imparcial, portanto, sem favoritismo, e que julga cada pessoa de acordo com suas obras, independente de sua condição racial (judeu ou gentio). em Romanos 2:11); ou a sua condição social (senhor ou servo em Col 3,25 e Ef 6,9; rico ou pobre em Tg 2,1). Aqui Pedro afirma que Deus agrada a todo aquele que “pratica a justiça”, isto é, que cumpre a vontade de Deus, seja judeu ou não. E que embora a Boa Nova (evangelho) da paz tenha sido anunciada a Israel através de Jesus Cristo, ele é “Senhor de todos”. Pedro ainda não tinha terminado de falar quando o Espírito Santo foi derramado sobre os seus ouvintes, provocando um fenómeno análogo ao de Pentecostes. Então Pedro leu este sinal corretamente e batizou seus ouvintes em nome do Senhor Jesus.


Podemos dizer que Deus operou em Pedro uma autêntica conversão intelectual e pastoral. Ele abriu a mente do apóstolo à sua vontade salvífica universal, fazendo-o superar a ideia tão fortemente arraigada nos judeus de que a salvação era apenas para eles (conversão intelectual). Por sua vez, Pedro reconheceu a acção do Espírito Santo que foi antecipada e apoiou-a concedendo o baptismo, isto é, a iniciação à vida cristã, a um grupo de pagãos (conversão pastoral). Um pouco mais tarde, quando questionado pelos demais apóstolos e irmãos da Judéia por ter feito isso, Pedro responderá: “Se Deus lhes deu a mesma graça que nós, por terem crido no Senhor Jesus Cristo, como poderia eu me opor a Deus?” (Hb 11:17).


Segunda leitura (1Jo 4,7-10):



Este é um texto central em toda a carta onde o verbo amar (ἀγαπάω) aparece 5 vezes enquanto o substantivo amar (ἀγάπη) 4 vezes e uma delas para definir Deus. Sobre o significado do amor em João, J. Casabó[1] diz: “O ágape de Deus é a fonte de toda a sua atividade para com o homem: vontade desinteressada para o seu bem; o modo de ser manifestado que, segundo São João, melhor revela a sua própria natureza. Pode-se dizer que esta qualidade muito pessoal e subjetiva leva à internalização no homem? Jn não deixa dúvidas sobre isso. Em numerosos textos ele fala do amor de Deus como interior ao homem [...] Para Jn, amar a Deus ou aos homens indica uma filiação, uma pertença, uma relação anterior com Deus que só esse amor pode produzir. O 1º Ep dirá isso de forma mais explícita... (citação 1Jn 4,7-8) [...] Não pode haver verdadeira caridade se não houver no homem um novo modo de ser, de origem divina.


Desta forma, o amor do Pai é a razão do envio do Filho ao mundo dos homens; cujo propósito é comunicar-lhes vida. Para Jn trata-se de vida transcendente, vida divina, vida eterna que chega até nós através de Jesus Cristo.


Segundo o próprio J. Casabó[2], assim como o termo ágape é fundamental na teologia de João; Este versículo de 1Jo 4:10 também é chave para entender o verdadeiro significado de ágape em Jo. Portanto, o amor é algo próprio de Deus, expressão do seu próprio ser e que é dado, entregue, oferecido ao homem para que ele o receba, internalize, acredite neste amor e renasça. E graças a este acolhimento prévio posso, por sua vez, amar os outros.


Em outras palavras, para João, o amor (ἀγάπη) é a maior manifestação do ser de Deus e o que é típico de suas ações. Ora, este amor é uma realidade interiorizada no crente que recebeu um novo ser e, com ele, uma nova forma de agir. O que é característico desta ação é amar (ἀγαπάω) os outros. Assim, «para um cristão, amar nada mais é do que manifestar o que é. Precisamente, de todos os comportamentos que podem ser vividos, a caridade será para Jn o sinal por excelência da presença interna de Deus, da filiação divina, do verdadeiro discípulo de Jesus”[3].



Evangelho (Jo 15,9-17):


Este texto é a continuação daquele que lemos no domingo passado. Embora o tema da videira e dos ramos desapareça, permanece a centralidade do comando de “permanecer” (me,nein), que agora está ligado ao tema do “amor/amar”, dominante nestes versos. Portanto, a seiva, o que dá vida aos ramos ou ramos, é o amor que a videira lhe transmite e, portanto, permanecer unido à videira, a Jesus, é permanecer no seu amor.


De facto, em 15,9 Jesus declara que o amor é o vínculo que o une ao seu Pai, e que este mesmo amor é o modelo e a causa do seu amor pelos seus discípulos. Depois segue a ordem de “permanecer no meu amor”, que é o amor de Jesus pelo seu povo.


Como vimos no domingo passado, este permanecer é entendido como uma fidelidade ativa a um vínculo estável. Hoje se especifica que esta “permanência” está no amor de Jesus e implica a observância dos mandamentos de Jesus, assim como Jesus viveu a sua permanência no amor do Pai, observando os seus mandamentos.


Lembremos que, embora em 15:10 falemos de mandamentos no plural (ἐντολάς), João não se refere principalmente ao decálogo ou à Torá ou à Lei em geral, mas à caridade (ágape) como princípio e força motriz da A ação cristã e que, como tal, inclui toda a vontade de Deus manifestada em Cristo. Ou seja, como fica claro a seguir (cf. 15,12.17), Jesus faz com que os seus discípulos participem do seu amor e lhes dá o mandamento, no singular (ἡ ἐντολὴ), de amarem-se uns aos outros com este amor divino. Portanto, os cristãos permanecem no amor do Pai e de Jesus quando se amam com esse amor. Como bem observa G. Zevini[4]: “O Senhor pede-te não tanto que o ames, mas que te deixes amar, que aceites o amor do Pai que, através dos seus, chega até eles; Pede-lhes que o amem, deixando-lhe a iniciativa sem colocar obstáculos à sua vinda, pede-lhes que acolham o seu dom, que é plenitude de vida”.


A razão que Jesus tem para comunicar estas palavras é fazer com que os seus discípulos participem da sua própria alegria ou alegria (χαρὰ), que é alegria completa, alegria plena. A mesma razão aparecerá em Jo 17:13. Em Jo 16,20-24 fica claro que se trata da alegria ou alegria que Jesus ressuscitado comunicará ao seu povo como fruto do seu sacrifício pascal. Portanto, «esta alegria é aquela que provém do seu amor, da sua obediência e docilidade ao Pai, da sua “permanência” no Pai. Esta alegria, como dom messiânico, é algo que todo discípulo de Cristo deve experimentar”[5].


Em 15,13-15 esse amor é especificado com a categoria de amizade, já que Jesus chama diretamente seus discípulos de amigos (φίλοι). Além disso, este amor de amizade de Jesus é o amor maior, porque o levou a dar a vida pelos amigos. Utiliza-se a mesma expressão, dar a vida, que caracteriza o bom Pastor (cf. 10,11) e assim prova a autenticidade do amor de Jesus.


Para sermos amigos de Jesus e, portanto, destinatários deste amor maior, a condição é a observância do mandamento do amor mútuo (cf. 15,12). Agora, além desta pré-condição de amor mútuo, os versículos seguintes (15,15-16) esclarecem que a iniciativa foi de Jesus. É Ele quem os considera e os chama de amigos porque lhes revelou o que ouviu do seu Pai. Como bem assinala L. Rivas[6], o critério para diferenciar o servo/escravo (dou/loj) do amigo (fi,louj) não é o da liberdade, mas o da comunicação de confidências. Portanto, Jesus torna-se amigo dos seus discípulos porque os torna destinatários da Revelação. É uma comunicação que cria comunhão, amizade. Esta iniciativa de Jesus é reforçada com o tema da eleição, porque ao contrário do ambiente judaico onde eram os discípulos quem escolhiam o seu mestre; aqui foi Jesus quem os escolheu. Podemos ver uma referência à livre eleição de Israel por Deus no AT (cf. Dt 4:37; 7:7). E, tal como para Israel, esta escolha não é um privilégio, mas uma responsabilidade, um compromisso de produzir frutos duradouros.


A perícope termina repetindo o mandamento de 15:12: amem-se uns aos outros. Pode-se deduzir que o fruto permanente dos amigos de Jesus deve ser este amor mútuo.


Algumas reflexões: 


Um primeiro tema, comum às três leituras e também ao salmo responsorial, é o da iniciativa divina. Deus tem a iniciativa da salvação (1ª leitura); Deus é quem ama primeiro (2ª leitura); Jesus é quem nos torna seus amigos, dando a vida por nós, revelando-nos os segredos do Pai, escolhendo-nos (Evangelho). Como diz E. Leclerc[7]: “Este amor está na origem de tudo. Nada o precede, nada o motiva. É absolutamente primeiro e totalmente gratuito. Está no começo. E graças a ele há um começo. Deste amor nasceu o grande projeto do Pai. Encontramo-nos no ápice desta revelação: ao mesmo tempo que manifesta o amor original de Deus pelo homem, o dom do Filho ao mundo introduz-nos no próprio coração da vida íntima de Deus […] A vida de Deus é “ágape, comunicação de si, doação de si”.


E este é precisamente o segundo grande tema, comum à 2ª leitura e ao Evangelho: Deus é amor, é amor primeiro. Esta é a plenitude da revelação de Jesus, o cerne de todo o evangelho: Deus é amor e Deus só pode amar. Sobre este último escreveu o Pe. Roger de Taizé: ““Deus só pode amar”: esta certeza foi expressa por um pensador cristão do século VII, Santo Isaac de Nínive. Ele chegou a esta conclusão depois de ter estudado longamente o Evangelho segundo São João e meditado nas palavras “Deus é amor” (1Jo 4,8)”.

Deus é amor, Deus só pode amar, Deus nos amou primeiro, Jesus deu a sua vida por nós... Penso nestes momentos que o grande desafio, o grande desafio da vida cristã é fazer destas palavras uma realidade para nós, que eles têm significado para nossa vida. É nisso que você fundamentalmente tem que acreditar, aceitar. E permaneça nisto como o grande segredo da vida e da fecundidade do discípulo.

Este amor de amizade é causa de profunda alegria para Jesus e para nós. Sentir-se amado de forma tão plena é a fonte da alegria e da felicidade do cristão. A vida de um cristão não é mais fácil que a do resto dos humanos; e não está livre de problemas e sofrimentos; mas a alegria profunda permanece sempre pela certeza do amor de Jesus que nos abre ao eterno.

Diante da realidade de tal amor, a pessoa se sente oprimida e quase até entristecida. Sim, porque pesa sobre nós sermos amados dessa forma e não podermos retribuir. Santo Agostinho9Ele disse:  "Portanto, deixe o amor permanecer: este é o nosso fruto. E esse amor agora consiste em desejo, pois ainda não foi satisfeito”.

Segundo o evangelho de hoje, a única resposta válida a este grande amor é amar os outros desta mesma forma: gratuitamente, tomando sempre a iniciativa, dando a vida... Sobre isto disse o Papa Francisco noRainha do Céude 9 de maio de 2021: “Amarcomo Amar Jesus significa colocar-se ao serviço, ao serviço dos irmãos, como Ele fez ao lavar os pés dos discípulos. Significa também abandonar-se, desapegar-se da própria segurança humana, das comodidades mundanas, para abrir-se aos outros, especialmente aos mais necessitados. Significa estar disponível com o que somos e com o que temos. Isto significa amar não com palavras, mas com ações.

Amar como Cristo significa dizernãoa outros "amores" que o mundo nos propõe: amor ao dinheiro - quem ama o dinheiro não ama como Jesus ama -, amor ao sucesso, à vaidade, ao poder... Esses caminhos enganosos de "amor" nos distanciam do amor do Senhor e nos levam a ser cada vez mais egoístas, narcisistas e arrogantes. A arrogância leva à degeneração do amor, ao abuso dos outros, ao sofrimento da pessoa amada. Penso no amor doentio que se transforma em violência – e quantas mulheres são hoje vítimas de violência! Isto não é amor. Amar como o Senhor ama significa valorizar a pessoa que está ao nosso lado e respeitar a sua liberdade, amando-a como ela é, não como queremos que seja, como ela é, gratuitamente. Em última análise, Jesus pede-nos que permaneçamos no seu amor, que permaneçamos no seu amor, não nas nossas ideias, não na adoração de nós mesmos. Quem vive no culto de si mesmo, vive no espelho: está sempre se olhando. Jesus nos pede para abandonarmos a pretensão de dirigir e controlar os outros. Não devemos controlá-los, mas servi-los. Abra o seu coração aos outros: isto é amor, doar-se a eles.”

Este é o mandamento do amor... mas não nos vem espontaneamente amar assim. A resposta consoladora a este “beco sem saída” nos é dada pela mesma Palavra de Deus que nos ensina que “amamos porque Deus nos amou primeiro”(1Jo 4,19). E esta frase foi magistralmente explicada pelo Papa Bento XVI em “Deus é Amor”: “O “mandamento” do amor só é possível porque não é uma mera exigência: o amor pode ser “ordenado” porque é dado primeiro (n. 14) […] Ele nos amou primeiro e continua a nos amar primeiro; Portanto, também podemos nos corresponder com amor. Deus não nos impõe um sentimento que não possamos despertar em nós mesmos. Ele ama-nos e faz-nos ver e experimentar o seu amor, e deste “antes” de Deus também pode nascer em nós o amor como resposta (n. 17) […] O amor a Deus e o amor ao próximo são inseparáveis, são são um único mandamento. Mas ambos vivem do amor que vem de Deus, que nos amou primeiro. Assim, não se trata mais de um “mandamento” externo que nos impõe o impossível, mas de uma experiência de amor que nasce de dentro, um amor que pela sua própria natureza deve ser posteriormente comunicado aos outros. O amor cresce através do amor (nº 18)".

Sobre isso diz H. U. von Balthasar10: "Dom e tarefa são inseparáveis; Além disso, a tarefa é um puro dom da graça. Com isto o Evangelho já antecipa de certa forma o episódio de Pentecostes: o dom é o Espírito de Deus que nos ajuda a cumprir a tarefa, o mandamento do amor".

Portanto, a liturgia da Palavra e a própria vida guiam-nos necessariamente ao pedido sedento do DOM DO ESPÍRITO SANTO, pois só Ele pode tornar possível esta permanência no AMOR de DEUS que nos permite dar frutos de AMOR ao nosso IRMÃO.


Para oração 

(ressonâncias do evangelho em uma pessoa que ora)

Como o Pai me amou

Pela manhã em oração me entrego ao Pai com paixão

Como uma criança, corro até ele e espero seu abraço

Entro no Filho, no seu coração, na sua mente, no seu espírito

Deixo-me ser mimado e conto a ele com confiança sobre minhas lutas.

E Ele, atento, dedicou tudo a mim: ele me escuta

Lá eu entendo tudo, das palavras do Senhor eu me lembro

Permaneça em mim, cumpra meus mandamentos

Vocês são meus amigos e sua alegria será perfeita…

Não nos faltará amor porque você nos dá primeiro

Você nos escolheu e nos conheceu desde sempre

Para dar frutos de amor, abundantes, duradouros,

Amem uns aos outros como você nos amou

E peça ao Pai o que ele nunca negará

O Espírito Santo, que através de você, nos cobrirá. Amém.




[1] La teología moral en San Juan (FAX; Madrid 1970) 246-250.

[2] La teología moral en San Juan, 60.

[3] J. Casabó, La teología moral en San Juan, 317.

[4] Evangelio según san Juan (Sígueme; Salamanca 1995) 381.

[5] G. Zevini, Evangelio según san Juan (Sígueme; Salamanca 1995) 381.

[6] El evangelio de Juan (San Benito; Buenos Aires 2005) 416-417.

[7] El maestro del deseo. Una lectura del evangelio de Juan (PPC; Madrid 1999) 151-152.154

[8] In Iohannem, 86,3: PL. 35, 1852.

[9] Luz de la Palabra. Comentarios a las lecturas dominicales (Encuentro; Madrid 1994) 159.