RAMOS E PAIXÃO -A

DOMINGO DE RAMOS e DA PAIXÃO DO SENHOR 

02/04/2023

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


BÊNÇÃO DOS RAMOS

ANO A

Mateus 21,1-11

LEITURAS DA MISSA

1ª Leitura: Isaías 50, 4-7

Salmo Responsorial 21(22) R- Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes? 

2ª Leitura: Filipenses 2,6-11


EVANGELHO

Mateus 26,14-27,66 (Paixão do Senhor)

(Por favor, veja o texto usando o link da CNBB mencionado acima) Mt 21,1-11

DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, SOROCABA SP

Jesus entra na cidade de Jerusalém. O que seria uma simples caravana de galileus peregrinando a Jerusalém para a celebração da Páscoa, se transformou em uma entrada alegre e festiva.

Não é uma entrada triunfal, mas uma entrada reveladora. Ela revela quem é Jesus! Ele é o filho de Davi. Ele é o Bendito que vem em nome do Senhor! Ele é o rei Messias! Jesus é recebido com rei messiânico!

E Jesus aceita essa aclamação, mas salienta no seu modo de agir e se comportar que é um rei pacífico. Ele não se apresenta com um aparato militar, não é acompanhado de cortesãos, não se cerca de serviçais. Ele vem montado num jumentinho e se apresenta desarmado e humilde. Ele não vem para conquistar pelas armas, mas deseja conquistar os corações. Nesse sentido ele é rei, e é isso que a entrada em Jerusalém revela de Jesus.

Os ramos que levamos para a celebração de hoje possam exprimir que fomos conquistados por Jesus.

Hoje também nós entramos no mistério do Senhor crucificado, morto, sepultado e ressuscitado. Entrar no mistério do Senhor consiste em padecermos com Ele para com Ele ressuscitar. É passar da morte para a vida, do pecado para a graça, do homem velho para o homem novo em comunhão com Jesus Cristo.

Ouvimos o relato da Paixão e morte de Jesus não como simples recordação. Não se trata somente de um relato. Trata-se de entrar com Jesus nos eventos da sua paixão, morte e ressurreição. A liturgia de hoje nos põe diante da seguinte alternativa: “Hosana ao Filho de Davi” ou “Crucifica-o”. São dois evangelhos: no início da procissão de ramos o povo aclamou: “hosana ao Filho de Davi”; no relato da paixão vemos a multidão pedir: “Crucifica-o”.

Cabe a nós escolhermos com que atitude nós queremos entrar na história da Paixão de Cristo: com a atitude do povo que aclamou hosana, com o gesto do Cirineu que se coloca ao lado de Jesus para ajuda-lo a carregar a cruz, com o pranto da mulheres que choram por Jesus, com a fé do centurião que bate no peito, com o arrependimento do bom ladrão, com a fidelidade de Maria que permanece ao pé da cruz? Ou podemos entrar no mistério da Paixão do Senhor com o gesto da traição de Judas e de Pedro, com a omissão de Pilatos que lavou as mãos, com a curiosidade dos que olham tudo de longe, com o escárnio e a zombaria dos que torturam Jesus, com o insulto do malfeitor crucificado ao lado e que desafia Jesus a se salvar?

Como você deseja entrar no mistério da Paixão e Morte do Senhor? 

A Paixão de Jesus não é um relato do passado. Jesus continua na prisão, continua atado à coluna, sendo torturado e ofendido, está ainda sofrendo processo injusto, sendo preterido ao criminoso; Jesus continua no sepulcro lacrado por uma pesada pedra, porque naqueles que continuam sofrendo, Jesus continua sofrendo. Enquanto durar o sofrimento da humanidade, principalmente dos mais pobres, enquanto subsistir a dor e o pecado no mundo, Jesus está ainda misteriosamente no sepulcro; não ressuscitou ainda totalmente. Mais uma vez somos colocados diante da pergunta: como você vai entrar no mistério da Paixão de Jesus que continua sofrendo e morrendo nos sofredores deste mundo?

Toda a nossa vida deve ser, em certo sentido, uma semana santa. Como vamos vivê-la? 

Possamos viver a grande semana da santa da vida com Jesus, como Jesus, e como tantos outros bons Cirineus, como Maria, como o Centurião Romano, como o bom ladrão!


Domingo de Ramos

Is 50,4-7; Sl 22; Fl 2,6-11; Mt 26,14-27,66;

A liturgia deste último domingo da Quaresma convida-nos a contemplar esse Deus que, por amor, desceu ao nosso encontro, partilhou a nossa humanidade, fez-Se servo dos homens, deixou-Se matar para que o egoísmo e o pecado fossem vencidos. A cruz (que a liturgia deste domingo coloca no horizonte próximo de Jesus) apresenta-nos a lição suprema, o último passo desse caminho de vida nova que, em Jesus, Deus nos propõe: a doação da vida por amor.

A primeira leitura apresenta-nos um profeta anónimo, chamado por Deus a testemunhar no meio das nações a Palavra da salvação. Apesar do sofrimento e da perseguição, o profeta confiou em Deus e concretizou, com teimosa fidelidade, os projetos de Deus. Os primeiros cristãos viram neste "servo" a figura de Jesus.

A segunda leitura apresenta-nos o exemplo de Cristo. Ele prescindiu do orgulho e da arrogância, para escolher a obediência ao Pai e o serviço aos homens, até ao dom da vida. É esse mesmo caminho de vida que a Palavra de Deus nos propõe.

O Evangelho convida-nos a contemplar a paixão e morte de Jesus: é o momento supremo de uma vida feita dom e serviço, a fim de libertar os homens de tudo aquilo que gera egoísmo e escravidão. Na cruz, revela-se o amor de Deus - esse amor que não guarda nada para si, mas que se faz dom total.


LEITURA I - Is 50,4-7

AMBIENTE

No livro do Deutero-Isaías (Is 40-55), encontramos quatro poemas que se destacam do resto do texto (cf. Is 42,1-9; 49,1-13; 50,4-11; 52,13-53,12). Apresentam-nos uma figura enigmática de um "servo de Jahwéh", que recebeu de Deus uma missão. Essa missão tem a ver com a Palavra de Deus e tem carácter universal; concretiza-se no sofrimento, na dor e no abandono incondicional à Palavra e aos projetos de Deus. Apesar de a missão terminar num aparente insucesso, a dor do profeta não foi em vão: ela tem um valor expiatório e redentor; do seu sofrimento resulta o perdão para o pecado do Povo. Deus aprecia o sacrifício do profeta e recompensá-lo-á, elevando-o à vista de todos, fazendo-o triunfar dos seus detratores e adversários.

Quem é este profeta? É Jeremias, o paradigma do profeta que sofre por causa da Palavra? É o próprio Deutero-Isaías, chamado a dar testemunho da Palavra no ambiente hostil do Exílio? É um profeta desconhecido? É uma figura coletiva, que representa o Povo exilado, humilhado, esmagado, mas que continua a dar testemunho de Deus, no meio das outras nações? É uma figura representativa, que une a recordação de personagens históricas (patriarcas, Moisés, David, profetas) com figuras míticas, de forma a representar o Povo de Deus na sua totalidade? Não sabemos; no entanto, a figura apresentada nesses poemas vai receber uma outra iluminação à luz de Jesus Cristo, da sua vida, do seu destino. O texto que nos é proposto é parte do terceiro cântico do "servo de Jahwéh".

LEITURA II - Fil 2,6-11

AMBIENTE

A cidade de Filipos era uma cidade próspera, com uma população constituída maioritariamente por veteranos romanos do exército. Organizada à maneira de Roma, estava fora da jurisdição dos governantes das províncias locais e dependia diretamente do imperador; gozava, por isso, dos mesmos privilégios das cidades de Itália. A comunidade cristã, fundada por Paulo, era uma comunidade entusiasta, generosa, comprometida, sempre atenta às necessidades de Paulo e do resto da Igreja (como no caso da coleta em favor da Igreja de Jerusalém - cf. 2 Cor 8,1-5), por quem Paulo nutria um afeto especial. Apesar destes sinais positivos, não era, no entanto, uma comunidade perfeita... O desprendimento, a humildade e a simplicidade não eram valores demasiado apreciados entre os altivos patrícios que compunham a comunidade.

É neste enquadramento que podemos situar o texto que esta leitura nos apresenta. Paulo convida os Filipenses a encarnar os valores que marcaram a trajetória existencial de Cristo; para isso, utiliza um hino pré-paulino, recitado nas celebrações litúrgicas cristãs: nesse hino, ele expõe aos cristãos de Filipos o exemplo de Cristo.

EVANGELHO - Mt 26,14 - 27,66

AMBIENTE

O Evangelho segundo Mateus começa por apresentar Jesus (cf. Mt 1,1-4,22). Descreve, depois, o anúncio central de Jesus: nas suas palavras e nos seus gestos, Jesus anuncia esse mundo novo a que Ele chama "o Reino dos céus" (cf. Mt 4,23-9,35). Do anúncio do "Reino" nasce a comunidade dos discípulos - isto é, nasce um grupo que assimila as propostas de Jesus (cf. Mt 9,36-12,50). Os discípulos são a "comunidade do Reino": instruídos por Jesus, formados na mentalidade do "Reino", os discípulos recebem a missão de testemunhar o "Reino", após a partida de Jesus (cf. Mt 13,1-17,27). Na parte final do seu Evangelho, Mateus descreve a ruptura final de Jesus com o judaísmo (cf. Mt 18,1-25,46) e o final do caminho de Jesus: a paixão, morte e ressurreição (cf. Mt 26,1-28,15).

A leitura que hoje nos é proposta é o relato da paixão de Jesus. Descreve como o anúncio do Reino choca com a mentalidade da opressão e, portanto, conduz à cruz e à morte; no entanto, não podemos dissociar os acontecimentos da paixão daqueles que celebraremos no próximo domingo: a ressurreição é a prova de que Jesus veio de Deus e tinha um mandato do Pai para tornar realidade no mundo o "Reino dos céus".

  

Não desças da cruz - José Antonio Pagola

 

Segundo o relato Evangélico, os que passavam diante de Jesus crucificado zombavam dele e, rindo-se do seu sofrimento, faziam duas sugestões sarcásticas: se és o Filho de Deus, “salva-te a ti mesmo” e “desce da cruz”.

Essa é exatamente a nossa reação perante o sofrimento: salvar-nos a nós mesmos, pensar apenas no nosso bem-estar e, portanto, evitar a cruz, passarmos a vida evitando tudo o que nos pode fazer sofrer. Será também Deus como nós? Alguém que só pensa em si mesmo e na sua felicidade?

Jesus não responde à provocação daqueles que zombam dele. Não pronuncia qualquer palavra. Não é o momento de dar explicações. Sua resposta é o silêncio. Um silêncio que é respeito por quem o despreza e, acima de tudo, compaixão e amor.

Jesus apenas quebra o seu silêncio para dirigir-se a Deus com um grito desgarrador: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”. Não pede que o salve baixando da cruz. Só que não se oculta nem o abandona neste momento de morte e sofrimento extremo. E Deus, seu Pai, permanece em silêncio.

Somente ouvindo a profundidade deste silêncio de Deus, descobrimos algo de seu mistério. Deus não é um ser poderoso e triunfante, calmo e feliz, alheio ao sofrimento humano, mas um Deus calado, indefeso e humilhado, que sofre conosco a dor, a escuridão e até a própria morte.

Por isso, ao contemplar o Crucificado, a nossa reação não pode ser de zombaria ou desprezo, mas de oração confiante e agradecida: “Não desças da cruz. Não nos deixes só na nossa aflição. De que nos serviria um Deus que não conhecesse o nosso sofrimento? Quem nos poderia entender?”.

A quem poderiam esperar os torturados de tantas prisões secretas? Onde poderiam colocar a sua esperança tantas mulheres humilhadas e violentadas sem qualquer defesa? A que se agarrariam tantos doentes crônicos e os moribundos? Quem poderia oferecer conforto às vítimas de tantas guerras, terrorismo, fome e miséria? Não. “Não desças da cruz; pois se não te sentirmos ‘crucificado’ junto de nós, ficaremos mais ‘perdidos’”.

 

Jerusalém: uma “praça da alimentação”- Adroaldo Palaoro

“Quando Jesus entrou em Jerusalém a cidade inteira se agitou, e diziam: ‘Quem é este homem?

Evangelho do Domingo de Ramos que corresponde ao texto de Mateus 21,1-11.


Jesus participava do sonho de todo o povo de Israel que via em Jerusalém a cidade da promessa de paz e plenitude futura, lugar da acolhida, ambiente fecundo onde ninguém passaria fome, pois todos teriam o direito de participar da “grande mesa do pão”. A tradição profética havia anunciado uma “subida” dos povos, que viriam a Jerusalém para iniciar um caminho de comunhão e justiça e adorar a Deus no Templo, que estaria aberto para todos. Toda a cidade se converteria num grande Templo, lugar da inclusão e da partilha, onde se cumpririam as esperanças dos povos.

Com sua entrada em Jerusalém, Jesus quis recuperar a cidade como lugar do encontro e da comunhão, como espaço da paz e da solidariedade..., desalojando aqueles que se fechavam a qualquer tentativa de mudança. Por isso, seu gesto provocativo e escandaloso de entrar na cidade montado num jumentinho, símbolo da simplicidade e do despojamento de qualquer pretensão de poder e força, causou violenta reação naqueles que se beneficiavam da estrutura política e religiosa da cidade.

Jesus entrou em Jerusalém rodeado pelo povo simples. Este povo, escravo e oprimido, o aclamou porque viu n’Ele uma luz de esperança, de vida, de libertação; escutou seus ensinamentos e viu seus feitos durante alguns anos; sentiu-se tocado pelas palavras de vida, de justiça, de amor, de misericórdia, de paz...

Também viu seus gestos de cura dos enfermos, de defesa dos fracos, de oferta de alimento aos famintos, de reabilitação dos desprezados, de acolhimento dos marginalizados, de denúncia dos opressores...

Jesus quis continuar anunciando e realizando na cidade de Jerusalém aquilo que fizera na região excluída da Galileia; quis também humanizar esta cidade para que ela fosse sol de justiça e paz para todos os povos.

Esta é a cidade que Deus deseja: uma praça da alimentação, uma mesa celebrativa para todos. A praça é de todos e todos podem ter acesso a ela, todos podem circular livremente, criar relações e convivência, fazendo a experiência de serem aceitos e reconhecidos como humanos.

A mesa, no centro da praça, é lugar de hospitalidade, de festa e de memória, lugar da partilha do pão e dos frutos da terra. Ali ninguém passa fome.

Compartilhar a mesa é o grande símbolo da convivialidade, da reconciliação e da inclusão. O ritual da mesa rompe as distâncias e garante a proximidade, estabelece o estreitamento dos vínculos com o diferente. Junto à mesa, cada um se coloca diante do outro, não importando as diferenças de vida, de opções. A comunhão acontece por meio de um gesto que não é de poder, mas de esvaziamento, não é de apropriação, mas de partilha, não é de fechamento, mas de abertura das mãos que acolhem, que distribuem...

A mesa da refeição se torna lugar de humanização do ser humano. Espaço de verdadeira reserva de humanidade. Muitos são aqueles que sabem abrir as mãos, partir o pão, saciar a fome do irmão.

Com o gesto do “re-partir” se estabelece uma rede de relações entre as pessoas que aceitam conspirar, co-inspirar, o mesmo ar, o mesmo sonho, a mesma causa.

E nada fica como estava... encantamento que faz ressuscitar a vida que já estava morta; refeição que transforma os desertos em mananciais de água.

Fazer memória da entrada de Jesus em Jerusalém pode ser uma ocasião privilegiada para transitarmos por nossa Jerusalém interior, um bom espaço onde encontrar a nós mesmos, identificar-nos com os diferentes personagens e sentir-nos parte daquela história. O relato da Paixão de Jesus revela ser também a história de cada um de nós. Porque, afinal de contas, é uma história que aconteceu no passado e continua acontecendo também hoje em nossa interioridade. E é a partir do hoje que nós temos de vivê-la, numa atitude contemplativa. E é a partir de nós, e não a partir daqueles personagens de então, que teremos de assumi-la.

Vamos, então, com Jesus montado num jumentinho, transitar pelas ruas de nossa Jerusalém interna, reconhecendo os diferentes personagens que ali atuam e que significam diferentes atitudes vividas por cada um de nós. Cada personagem do evangelho é um espelho onde nos vemos.

Jerusalém não é só uma cidade geográfica, situada na Palestina. Domingo de Ramos nos motiva a fazer o percurso em direção à nossa Jerusalém interior. Mas, para descer em direção a esta cidade é preciso despojar-nos da vaidade, do prestígio e do poder, montado no jumentinho da simplicidade.

Nossa Jerusalém interior é também lugar das contradições e ambiguidades; ali dentro experimentamos a trama de relações conflitivas, ali nos deparamos com as angústias, carências e dúvidas...

É preciso cuidar o coração da nossa “Jerusalém interior”, esvaziá-lo, limpá-lo, aquecê-lo, transformá-lo em humilde e acolhedor espaço, para que o Espírito do Senhor possa aí descer e habitar, transmitindo-lhe vida, luz, calor, paz, ternura...

É preciso voltar a pôr o “coração de Deus no coração de nossa Jerusalém”. Faz-se necessária uma opção corajosa, como Jesus, para entrar e estar no interior de nossa Jerusalém, para aí descobrir o verdadeiro coração de Deus, que pulsa no ritmo dos excluídos, dos sofredores, dos sedentos.

A Campanha da Fraternidade deste ano quer despertar em nós uma sensibilidade solidária com aqueles que são vítimas de uma estrutura social e política que concentra os bens nas mãos de poucos, de maneira especial os alimentos.

“Fraternidade e fome” denuncia a vergonhosa chaga social dos famintos em um país que é grande produtor de alimentos. A fome clama aos céus e ressoa em nosso coração; ela é expressão de uma profunda incoerência dos cristãos que se dizem seguidores d’Aquele que veio multiplicar os alimentos. Estamos muito distantes das primitivas comunidades cristãs que “tinham tudo em comum, partiam o pão pelas casas com alegria e simplicidade de coração” (At 2,46).

Nosso coração deve se revelar como “praça da alimentação”.

O lema da Campanha da Fraternidade deste ano – “dai-lhes vós mesmos de comer” – nos revela que nosso interior é uma reserva de “alimentos humanizadores”: compaixão, desejos nobres, dons originais, criatividade, espírito de busca... São alimentos que plenificam e dão sabor à nossa vida. É preciso extraí-los e multiplicá-los para que a fome de sentido e de esperança das pessoas seja saciada. Ninguém tem o direito de armazenar nos seus celeiros o “trigo” doado por Aquele que é fonte de todo “alimento salutar”. Afinal, alimento guardado é alimento que apodrece. Vida partilhada é vida abundante.

“Dai-lhes vós mesmos de comer”: este apelo nos inquieta, ativa nossa sensibilidade e nos faz ampliar a visão em direção à grande multidão de famintos, presentes em nossas cidades: famintos de alimento, de proximidade, de justiça, de comunhão, de afeto...

Para Jesus, uma humanidade constituída por nações, cidades, instituições ou pessoas comprometidas em alimentar os famintos, vestir os desnudos, acolher os imigrantes, atender os enfermos e visitar os presos, é o melhor reflexo do coração de Deus e a melhor concretização de seu Reino.

Esta é a utopia do Reino; tudo está reconciliado: o cosmos, com a natureza verde e em paz; os produtos do trabalho humano, da generosidade do mar e da terra; e as pessoas, numa relação harmoniosa entre elas mesmas e com Deus, sem exclusões, competições nem privilégios. Isto é possível porque todos se deixam afetar pelo dom do mesmo Reino que cresce já no coração de todos.

Na oração

Procure descobrir os sinais do Reino de Deus no meio da aparente confusão de sua Jerusalém interior: lugar da partilha? espaço aberto e acolhedor?...

- Como re-criar, no coração da cidade interior, o ícone da Nova Jerusalém, a cidade cheia de humanidade e comunhão, o lugar da justiça e fraternidade?

- Você já parou para pensar na abundância de recursos e nutrientes em seu coração e que poderia compartilhar com os outros? Em seus celeiros interiores há abundância de alimentos que humanizam.

- “Diga-me como você habita sua cidade interior e eu lhe direi como é sua presença no seu espaço urbano”.



Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?- Ana Maria Casarotti

Hoje iniciamos a Semana Santa numa situação particular. Não haverá grandes celebrações ao longo de todo o mundo, por causa da pandemia que está afetando toda a humanidade. A leitura de Ramos é o evangelho de Mateus 21,1-11. Normalmente é lido numa praça, na rua, num espaço público para logo peregrinar até a Igreja, e fazendo memória deste momento a comunidade toda caminha em procissão, louvando o Senhor e acompanhando-o com palmas de oliveiras.

Momentos de alegria, de paz, de louvor, da presença simples de Jesus que está no meio do povo. Jesus chega à cidade Santa com seus discípulos e discípulas e junto com os grandes grupos de peregrinos que iam a Jerusalém para celebrar a Páscoa. Jesus chega a Jerusalém montado num jumentinho, entra de forma pacífica e não como costumavam a fazer os grandes conquistadores, cheios de glória e poder. O poder de Jesus é a simplicidade, a paz, a alegria e a vida das pessoas. A imagem da entrada de Jesus narrada pelo evangelista está carregada de humildade, de modéstia, de paz, de harmonia.

“Este jumentinho é símbolo da vida campesina e pacífica, animal do pobre; é conhecida sua resistência na lida do cotidiano do campo: carrega peso, lavra a terra, suporta longas viagens... Não é animal para a guerra e nem para alimentar a vaidade daqueles que querem demonstrar seu poder diante dos outros. Jesus se serve de um jumentinho para dizer que não quer se impor pelas armas e pela força; seu senhorio é diferente, retomando as tradições campesinas de seu povo.”

Jesus acolhe o sentir do povo que o reconhece como o Messias que estavam aguardando. Eles estendem os mantos para que então Jesus pudesse montar com dignidade e entrar assim na cidade. Na sua própria pessoa Jesus comunica a Boa Nova da Salvação. A novidade do Evangelho manifesta-se novamente nele, na vida e na alegria que o acompanha e convida-nos uma vez mais a recebê-lo.

Esta Semana Santa será celebrada nas nossas casas, com as ruas de grandes cidades quase desertas, uma população restringida a seu lar, a sua casa. E este momento único na nossa história pode transformar-se numa ocasião privilegiada para aproximar-nos de Jesus,  do seu sentir como pediu o Papa Francisco na imponente oração na Praça São Pedro.

Como proclamou o Papa Francisco: “A tempestade – hoje, o coronavírus – desmascara nossa vulnerabilidade e deixa descobertas essas falsas e supérfluas seguranças com as quais havíamos construído nossas agendas, nossos projetos, rotinas e prioridades”. A tempestade “desvela todas as intenções de encaixotar e esquecer o que nutre a alma de nossos povos” e, com elas, “caiu a maquiagem desses estereótipos com os quais disfarçávamos nossos egos sempre pretensiosos de querer aparentar, e deixou desvelado, mais uma vez, essa bendita pertença comum da qual não podemos, nem queremos nos evadir; esse pertencimento de irmãos”.

Durante a missa deste domingo foi lida a Paixão de Jesus narrada no evangelho de Mateus. Depois de ter celebrado a Páscoa com seus discípulos, dirigem-se ao monte Getsemani onde Jesus se afasta um pouco para rezar. Pede-lhes que eles também rezem, mas o sono é mais forte neles e não conseguem permanecer despertos.

Aparece Judas com uma multidão armada de espadas e paus de parte dos sumos sacerdotes para prendê-lo. Assim Jesus é levado diante de Caifás onde estavam reunidos os doutores da Lei que procuravam um falso testemunho para condená-lo à morte. Depois de ser atado, Jesus é levado diante de Pilatos, o governador, para que ele o condene à morte.

Pilatos sabe que está enviando para a morte uma pessoa que foi trazida por inveja de parte dos sumos sacerdotes. Depois de ver que não consegue nada no diálogo com os sumos sacerdotes, e “poderia haver uma revolta”, Pilatos manda trazer água, lavou as mãos diante da multidão” e diz: “Eu não sou responsável pelo sangue desse homem”. Jesus é assim flagelado, ultrajado e crucificado.

“Desde o meio-dia até às três horas da tarde houve escuridão sobre toda a terra. Pelas três horas da tarde Jesus deu um forte grito: “Eli, Eli, lamá sabactâni?”, isto é: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”

“Houve escuridão sobre a terra”. Perguntamo-nos: é a mesma escuridão que aconteceu para os discípulos quando estavam na barca e foram pegos pela tormenta enquanto Jesus dormia? Como disse o papa Francisco, “Desde algumas semanas parece que tudo se escureceu. Densas nuvens cobriram nossas praças, ruas e cidades; foram se adonando de nossas vidas fazendo de tudo um silêncio que ensurdece e um vazio desolador que paralisa tudo por onde passa: se palpita no ar, se sente nos gestos, se diz nos olhares”.

Hoje contemplamos Jesus Crucificado e nele somos chamados e chamadas a colocar nossa confiança, nossa vida e a vida de todas as pessoas que queremos, de tantas pessoas que dia a dia entregam sua vida como Jesus para salvar os que se aproximam para serem atendidos. Em Jesus Crucificado está nossa verdadeira liberdade.

Recebemos uma vez mais as palavras do Papa Francisco, que nos convida a olhar a âncora que é a cruz. “Temos um leme: na cruz dele fomos resgatados. Temos esperança: em sua cruz, fomos curados e abraçados, para que ninguém ou nada nos separe do seu amor redentor”. Peçamos ao Senhor que no “meio do isolamento em que estamos sofrendo a falta de afetos e encontros, experimentando a falta de tantas coisas, saibamos “ouvir mais uma vez o anúncio que nos salva: ele ressuscitou e vive ao nosso lado”. Texto completo: Francisco protagoniza uma impactante oração pelo fim da pandemia em uma vazia e chuvosa praça São Pedro.

Oração

Cruz

Uma meta a longo prazo

nos exige esforço

duro e prolongado.

Mas um cálculo

nos dá a confiança de que vale a pena.

talvez a cruz

seja somente um investimento.

Por amor a outra pessoa,

sacrificamos com gosto

tempo, força e dinheiro.

A cruz se chama

solidariedade com o outro

que sinto de algum modo

parte de mim mesmo.

Um golpe repentino,

pode fulminar-nos em um instante,

e nossa existência

fica ferida sem remédio.

Perde-se a saúde,

um ser querido, ou a estima pública.

Arranca-se um galho verde,

uma parte viva do eu.

Quando esta mutilação

encontra seu repouso,

a cruz se chama aceitação

Existe a cruz livre

a que escolho

aquela da qual não fujo.

Mas uma vez nela pregado

já não posso descer quando quero.

Entregam-se os projetos aos cravos

a fantasia aos espinhos

o nome aos rumores

os lábios ao vinagre

e os bens à partilha.

Aqui a cruz se chama

fidelidade ao amor no amor,

que é canto e fortaleza

ressuscitando pela ferida.

Benjamin González Buelta

 

 

O messias pobre e desarmado (Mt 21, 1-11)- Mesters, Mercedes Lopes e Orofino

 

Introdução

Jesus termina a viagem e chega a Jerusalém, onde se darão os acontecimentos mais importantes da sua vida. Ao entrar na cidade, ele realiza três gestos simbólicos que revelam sua identidade messiânica:

1.      Entra montado num jumentinho que, conforme as profecias, era a característica do rei justo, pobre e desarmado (Mt 21,1-11; Zc 9,9-10).

2.      Entra no Templo, expulsa os vendedores e denuncia a hipocrisia do comércio dos animais para os sacrifícios (Mt 21,12-17).

3.      Amaldiçoa a figueira para expressar sua crítica contra o povo de Israel, por ele não ter produzido frutos de justiça (Mt 21,18-22). Quando Jesus entra em Jerusalém, a cidade fica agitada e se pergunta: “Quem é este?” (Mt 21,10). A multidão respondia: “É o profeta Jesus de Nazaré, da Galileia” (Mt 21,11).

A palavra usada por Mateus para descrever a reação da cidade era usada também para descrever os tremores de terra. Esta reação da cidade e da multidão nos dá uma chave para entender o que estava acontecendo nas comunidades para as quais Mateus escrevia o seu evangelho. Os fariseus e os chefes da sinagoga se agitavam, reagiam contra os seguidores de Jesus e se recusavam a aceitá-lo como Messias. No entanto, a multidão, as pessoas simples o identificavam como o profeta anunciado por Moisés (Dt 18,15.18), em total continuidade com a história e as esperanças de Israel.

Comentando o texto

1.      Mateus 21,1-5: O messias pobre e desarmado

A cena da entrada de Jesus em Jerusalém revela a sua identidade como Messias pobre e desarmado. Jesus mesmo toma as providências para entrar na cidade montado num jumentinho, o transporte dos pobres daquela época. Ao narrar este episódio, Mateus se inspira na tradição profética. Para dar à cena o sentido do cumprimento da profecia, ele cita literalmente o texto de Zacarias 9,9: “Dizei à Filha de Sião: eis que o teu rei vem a ti. Ele é manso e está montado num jumento, num jumentinho, cria de um animal de carga!”

2.      Mateus 21,6-7: Acolher Jesus tal como ele se revela e se apresenta

Os discípulos são encarregados de preparar o animal para a entrada de Jesus na cidade. Eles vão e fazem exatamente como Jesus mandou. Por trás desta narração tem um recado para as comunidades: verdadeiro discípulo é aquele que aceita Jesus do jeito que ele é e quer ser, e não do jeito que elas gostariam que ele fosse. Se Jesus se fez Messias pobre e desarmado, não podem fazer dele um messias glorioso e poderoso.

3.      Mateus 21,8-9: Eles queriam um grande rei

A multidão reage entusiasmada, estendendo seus mantos no chão para Jesus passar, e grita: “Hosana ao Filho de Davi !” Eles reconhecem em Jesus o Messias, o descendente do rei Davi. “Eles queriam um grande rei, que fosse forte e dominador!” Jesus não apreciava muito este título de “Filho de Davi” e chegou a questioná-lo (Mt 22,41-46). Pelo seu jeito de entrar na cidade sentado num jumentinho, ele estava dizendo que a sua maneira de ser rei era diferente.

4.      Mateus 21,10-11: Quem é este?

A entrada de Jesus em Jerusalém questiona a população da cidade. Ela fica abalada, agitada e se pergunta: “Afinal, quem é este que a multidão acolhe como rei messiânico? Por que ele vem como um pobre?”

 

Alargando o texto

1.      As várias imagens de Messias

A causa do desencontro entre Jesus e o povo tinha a ver com a esperança messiânica. Havia entre os judeus uma grande variedade de expectativas. De acordo com as diferentes interpretações das profecias, havia gente que esperava um Messias Rei (Mt 27,11). Outros, um Messias Santo ou Sacerdote (Mc 1,24). Outros, um Messias Guerrilheiro subversivo (Lc 23,5; Mc 15,6; 13,6-8). Outros, um Messias Doutor (Jo 4,25). Outros, um Messias Juiz (Lc 3,5-9; Mc 1,8). Outros, um Messias Profeta (Mt 21,11). Ao que parece, ninguém esperava o Messias Servo, anunciado pelo profeta Isaías (Is 42,1; 49,3; 52,13). Eles não se lembraram de valorizar a esperança messiânica como serviço do povo de Deus à humanidade. Cada um, conforme os seus próprios interesses e conforme a sua classe social, aguardava o Messias, livrinho na mão, querendo encaixá-lo na sua própria esperança. Por isso, o título Messias, dependendo da pessoa ou da posição social, podia significar coisas bem diferentes. Havia muita mistura de ideias!

2.      Os ramos na festa da entrada de Jesus

Hoje, celebramos a entrada de Jesus em Jerusalém com ramos. A origem desta aclamação vem da Festa das Tendas, que era realizada no outono, depois da colheita (Dt 16,13; Lv 23,34). Ela lembrava o tempo em que o povo israelita fazia sua caminhada pelo deserto (Lv 23,43), morando em tendas. Por isso, durante uma semana, eles recolhiam ramagens e formavam tendas por toda parte (Ne 8,14-17). O povo agitava os ramos e dizia: “Bendito o que vem em nome do Senhor” . E os sacerdotes respondiam: “Da casa de Javé nós vos abençoamos” (Sl 118,25-27). A Festa das Tendas era um momento de alegria e de louvor, que mantinha a identidade do povo e lhe dava resistência.

 

Eis que o teu rei vem a ti - Marcel Domergue

Tradução Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.

 

A celebração deste domingo, que abre a Semana Santa, tem dois momentos fortes: a procissão de entrada, com a benção dos ramos (o Rei entra em sua cidade, aclamado pelo povo); e o relato da Paixão (o Rei sai da cidade, debaixo de injúrias e impropérios, sendo posto na cruz). O Rei de Israel é um Rei.

Referências bíblicas

Evangelho (proclamado no exterior da igreja): Entrada messiânica (Mateus 21,1-11)

Missa da Paixão: 1ª leitura: Não desviei o rosto dos ultrajes... Porque sei que não serei humilhado. (Isaías 50,4-7)

Salmo: Sl. 21(22) - R/ Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?

2ª leitura: Humilhou-se a si mesmo... Por isso Deus o exaltou... (Filipenses 2,6-11)


Evangelho: Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo (Mateus 26,14-27,66)

A tomada do poder

A Paixão-Ressurreição de Jesus é a sua exaltação, sua elevação acima de tudo, sua tomada de posse do Reino. O 4º evangelho investe na imagem de Jesus «levantado da terra», na cruz, que se torna assim o trono da glória. Os outros evangelistas mostram a entrada triunfante de Jesus em Jerusalém.

Esta cena dá o sentido dos acontecimentos que se seguirão, fosse qual fosse o seu conteúdo histórico. Não está aí para nos mostrar a versatilidade da multidão, que num dia aclama e no outro condena. Não. O que ela nos quer dizer é que Jesus veio «tomar o poder», que ele é o Messias filho de Davi que era esperado e que as antigas promessas vão ser cumpridas.

Temos, pois, de superpor, temos de ler em impressão sobreposta as profecias do Reino de Deus por meio do «ungido», do Cristo, na cena dos ramos, da elevação na cruz, da Ressurreição e também do anúncio da volta do Cristo, a recapitulação final.

Obediência à Palavra

Temos o hábito de considerar o Cristo como a Palavra. De fato, as Escrituras o mostram como quem as profere como quem instrui. Mas Jesus mesmo, recebendo e acolhendo a Palavra, esta imagem nos é menos familiar. E, no entanto, ele cumpre ativa e voluntariamente as Escrituras, decifrando na Palavra o que deve ele ser e fazer.

Particularmente nas profecias do Servo, em Isaías, capítulos 42, 49, 50 (a 1ª leitura), 52 e 53. Ver também (1º domingo da Quaresma) como Jesus fez suas as palavras do Deuteronômio. A Epístola aos Hebreus retoma este tema da obediência de Cristo, primeiro em 5,7-9 e, sobretudo, em 10,7, que cita o Salmo 40,7-9: «Eis-me aqui – no rolo do livro está escrito a meu respeito – eu vim, ó Deus, para fazer tua vontade».

Por ter-se deixado instruir por Deus, por ter recebido a Palavra, é que Cristo pode tomar a palavra; mas, então, sua palavra é a Palavra de Deus. Em João, Jesus diz que não cumpre a sua vontade, mas a vontade daquele que o enviou; que as suas obras não são suas, mas do Pai; e que as suas palavras, ele não as diz de si mesmo, mas são as palavras de quem o enviou. Daí a primeira frase de nossa primeira leitura: «Deus me deu língua de discípulo (...)», ou seja, de quem se deixa instruir. Jesus “fez-se obediente até a morte, e morte de Cruz”.

Face de luz e face de trevas

Esta obediência de Jesus tem algo de luminoso. Se, com efeito, tudo o que ele faz e o que diz não é dele, mas do Pai, então, através dele o Pai se torna visível e acessível. Deus está bem aí, entre nós. Este Jesus é a sua imagem perfeita e, a justo título, é chamado de «o Filho».

Se ser Pai significa tão somente dar-se a si mesmo em alimento, a fim de que os filhos vivam; fazer-se desaparecer (deixar-se ir, passar), a fim de deixar lugar aos outros; não se subtrair à maldade e à loucura, «não proteger a sua face dos ultrajes»...

Então, o Filho, Imagem perfeita, exata, deve passar pela cruz, pois que os homens estão por todo o tempo erguendo cruzes pelas quais, ao crucificarem os seus irmãos, estão crucificando o próprio Deus. Resumindo, ser Filho consiste em despojar-se de si mesmo, porque o Pai se despojou (2ª leitura). Mas isto passa por uma libertação.

Quero dizer que Jesus teve de superar a sua vontade de viver, o seu desejo de não sofrer, para escolher e querer aquela atitude. O que não acontece por si mesmo. Ele teve de se ajustar a isso. E o Getsêmani mostra que para ele não foi tão mais fácil do que para nós.

Das trevas à luz

Na hora das trevas, só há uma coisa a fazer: «conservar o rosto impassível como pedra» (1ª leitura), quer dizer, «receber os golpes», deixar-se rolar como um seixo, num silêncio «mineral» («Jesus se calava»). Mas por trás desta espécie de passividade inabalável, uma certeza: «sei que não serei confundido».

O segredo confiado por Deus a este a quem «abriu-lhe os ouvidos» a fim de que se «deixasse instruir como um discípulo», é que, fazendo-se por sua Paixão semelhante a Deus, tornou-se realmente em tudo semelhante a Ele e, encontrando-O ali onde Ele está, recebeu o Nome que está acima de todo nome.

 

Esperança ativa -  Dom Paulo Peixoto

Quem diria que em um determinado tempo o mundo todo estaria em quarentena, provocada por um surto de um vírus tão minúsculo, mas feroz e capaz de mudar um cenário de história. É sinal de que o ser humano tem um perfil de impotência e não é dono de si mesmo. Pelo menos as pessoas têm a possibilidade de construir uma esperança ativa, de fé e de compromisso com a vida.

O medo, retrato do condicionamento humano, pode ser superado através da confiança em Deus, porque Ele é o autor da vida e aquele que pode provocar a chamada esperança ativa, de saída da imobilidade e do comodismo. A fragilidade da pessoa não significa incapacidade para construir perspectivas novas, mas é preciso agir e usar todos os meios de autodefesa, como o tempo de quarentena.

Ao chegar a Semana Santa, na evidência da paixão e morte de Cristo na cruz, toda humanidade experimenta um verdadeiro caminho de sofrimento vendo a morte de tantos entes queridos, infectados pelo coronavirus. Mais do que nunca, a realidade conduz as pessoas a olhar com confiança para a cruz do Senhor. Só ali é possível encontrar forças para enfrentar essa situação de pandemia.

O projeto de Jesus nasce no meio do sofrimento e das crises de seu tempo. Não será também diferente com o mundo e com todos os países enfrentando a fatalidade do covid-19? Todo sofrimento projeta para situações novas exigindo maior responsabilidade. Essa pandemia não está acontecendo por acaso. Devemos descobrir o que está cobrando do mundo, principalmente em relação à vida humana.

Ninguém pode “lavar as mãos” como o fez Pilatos. Ele não defendeu a vida de Jesus e jogou as responsabilidades do julgamento para o povo. Isso não passou de uma tática política em seu próprio benefício. A pena máxima romana tinha uma conotação política e o governador Pilatos não queria ficar mal visto pelo povo. Essa prática continua muito ativa entre diversos dos nossos governantes.

Falar de esperança ativa é olhar para a vida de Jesus, não simplesmente para as suas ideias e palavras, mas para as atitudes provocadoras de mudança de vida que Ele projetava. Para o Império Romano, Jesus era tumultuador da ordem. Ele não concordava com os instrumentos causadores de desrespeito para com o ser humano e de morte. Por isso tentavam de todo jeito neutralizar suas ações.

Dom Paulo Mendes Peixoto

Arcebispo de Uberaba. 


 TEXTO EM ESPANHOL-Dom Damián Nannini- Argentina


DOMINGO DE RAMOS EN LA PASIÓN DEL SEÑOR

 

Primera lectura (Is 50,4-7):            

            Este fragmento corresponde al tercero de los cuatro poemas que son conocidos como los "cánticos del siervo" por su referencia a un personaje a quien Dios llama como su siervo. Esta figura es relevante por cuanto la profecía de Isaías atribuye la gracia del rescate de la cautividad babilónica no sólo a la misericordia de Dios sino también a la obra de un mediador, el siervo sufriente, que es representado como una víctima expiatoria por los crímenes del pueblo y que obtiene el perdón para Israel en virtud de su sacrificio.

En el fragmento del cántico que leemos hoy el siervo se presentado como fiel discípulo del Señor, víctima de la maldad de los hombres. Su lengua pronuncia lo que el Señor le indica, su enseñanza procura consolar al abatido (50,4). Acepta su misión sin resistencia, conoce las dificultades que entraña, pero no se da por vencido pues tiene puesta toda su confianza en el Señor.

 Mucho se ha escrito acerca de la posible identificación de este siervo con algún personaje histórico o con el pueblo de Israel, pero no se ha alcanzado todavía un acuerdo pleno. No obstante, desde una perspectiva cristiana, es evidente que se trata de una prefiguración profética de Jesús y de su misión redentora. De hecho, en el Nuevo Testamento Jesús es identificado con el Siervo sufriente en su bautismo (Mt 3,17; Mc 1,11; Jn 1,34); en sus milagros (Mt 8,17); en su decisión de ir a Jerusalén a morir (Lc 9,51) y en su humildad (Mt 12,16-21). Según Jn 12,37-43, Jesús asume en su ministerio público las palabras del siervo sufriente de Is 53,1s. El tema del siervo también se atribuye a Jesús en los Hechos de los Apóstoles (He 3,13.26; 4,27.30; 8,32) y en los himnos de la primitiva Iglesia (Flp 2,7; 1Pe 2,21-25). Si bien no lo citan, los relatos de la pasión son una realización del tercer cántico, en especial por la referencia a los salivazos y golpes que recibe el Señor (cf. Mc 14,65).

 

Segunda Lectura (Flp 2,6-11):

 

            Este himno representa una de las más antiguas y genuinas expresiones de la fe cristiana, rica en intuiciones cristológicas y con valiosos aportes doctrinales.

            La expresión con que inicia la primera parte: ‘existiendo en condición de Dios’ (2,6a) supone ya una percepción profunda de las relaciones únicas y exclusivas de Jesús con Dios; y aunque no contiene explícitamente todavía la idea de preexistencia, da pie para una reflexión en esta dirección. Luego, al describir el proceso kenótico o de vaciamiento/abajamiento de Jesús, revela una comprensión unitaria de las opciones fundamentales realizadas por Él a lo largo de su vida terrena. Esta autohumillación de Jesús consiste en el rechazo de toda ambición y orgullo; y en la adopción de una actitud mansa y humilde (Mt 11,29; Is 42,2-3; 53,7-9). El culmen de esta humillación es hacerse ‘obediente hasta la muerte’ (8b); donde el ‘hasta la muerte’ tiene un sentido calificativo más que temporal pues se trata de una obediencia que no cede ante ningún sacrificio personal, incluso el de la propia vida. 

En breve, podemos decir que toda la vivencia de Jesús es leída sobre el trasfondo de la experiencia de Adán y, muy especialmente, del cuarto cántico del siervo de Yavé (Is 52,13-53,12). Al contrario de Adán, quien pretendió ser como Dios y así perdió su dignidad, Jesús, siendo de condición divina, no ha hecho valer su privilegio de igualdad con Dios, sino que ha asumido la condición propia del Siervo Sufriente, dando su vida como expresión de su fidelidad total al Padre.

            El movimiento de exaltación que le sigue tiene su cumbre en la donación del nombre hecha por Dios a Jesús; y este nombre de Señor (Ku,rioj) comprende el señorío universal que el AT reconocía a Yavé y, por tanto, los actos de adoración y confesión que le brindan a Jesús todas las criaturas, incluidas las celestiales, son justificados y hasta exigidos. 

 

Evangelio de la procesión y entrada solemne: Mateo 21, 1-11

 

Jesús se acerca a Jerusalén que es la ciudad de David, la ciudad mesiánica, dónde está el Templo y dónde residen las autoridades judías; en un tiempo de mucha asistencia de gente dada la proximidad de la fiesta de Pascua. Jesús se detiene al pie del Monte de los Olivos, en el poblado de Betfagé, que está justo frente a la ciudad santa hacia el este; y desde allí manda a dos de sus discípulos a buscar una burra atada en la casa de una persona de un pueblo vecino para que se lo traigan. 

A continuación, Mateo señala que con todo esto se están cumpliendo las profecías, es decir, que todo esto sucede según el plan de Dios. La introducción de la cita está tomada de Is 62,11 (“digan a la hija de Sión”); mientras que el resto es una cita literal de Zac 9,9: “¡Alégrate mucho, hija de Sión! ¡Grita de júbilo, hija de Jerusalén! Mira que tu Rey viene hacia ti; él es justo y victorioso, es humilde y está montado sobre un asno, sobre la cría de un asna.”

En el centro de la cita profética está la expresión “humilde” o “manso”, que hace referencia a una actitud pacífica, no violenta; en claro contraste al ingreso solemne de los reyes y poderosos a las ciudades donde hacían una demostración de fuerza y poder. 

Los discípulos, obedeciendo a la palabra de Jesús, le llevan la burra y el burrito, le ponen unos mantos encima y Jesús montado sobre este animal ingresa a Jerusalén. 

El gesto de la gente de poner sus mantos sobre el camino es una forma de honrarlo como rey. Cuando llegan a la bajada hacia Jerusalén y ya tienen a la vista la ciudad santa, la multitud que iba delante y los seguidores por atrás comienza a gritar: «¡Hosanna al Hijo de David; bendito el que viene en nombre del Señor; hosanna en las alturas!». 

La primera aclamación, con el Hosanna que es expresión de júbilo y salvación, confiesa a Jesús como rey; es una expresión claramente mesiánica y nos recuerda al Salmo 118,25-26: “¡Bendito el que viene en nombre del Señor! Nosotros los bendecimos desde la Casa del Señor”. La frase final sería una invitación a los que vivan en el cielo para que se unan a la alabanza.

Este ingreso de Jesús alborota toda la ciudad y despierta el interrogante sobre la persona de Jesús: “¿Quién es este?”. Y la respuesta, atribuida a la misma multitud, lo confiesa como “el profeta, Jesús de Nazareth de Galilea”, sin mayores precisiones. Para A. Rodríguez Carmona “aquí profeta equivale a Mesías, pues el judaísmo de la época esperaba que el espíritu de profecía, que se había extinguido desde Malaquías, reaparecería con la llegada del Mesías”. Para P. Bonnard podría referirse al profeta escatológico anunciado en Dt 18,18.

 

Evangelio: Pasión de Nuestro Señor Jesucristo según san Mateo[1]

 

Mateo nos ofrece un relato un relato de la Pasión con acentuaciones en lo eclesial y doctrinal, es el relato de una asamblea de creyentes. Mateo se interesa menos que Marcos en los detalles concretos, pero no pierde nunca la ocasión para insistir en el cumplimiento de las Escrituras. Cuando la Iglesia primitiva consideraba la Pasión, la contemplaba a través de la Escritura, que le revela su sentido. Sabía que existe una correspondencia perfecta entre el designio de Dios, prefigurado en el Antiguo Testamento, y los sucesos, a primera vista desconcertantes, de la semana santa. Tal correspondencia había sido revelada por Jesús mismo, quien, antes del cumplimiento de estas cosas demostró, con palabras y hechos, que las conocía perfectamente. Por otra parte, muestra el extravío del pueblo de Israel tras sus dirigentes. La narración contribuye a la formación de una intelección cristiana del misterio, por medio de una participación en la fe de la Iglesia.

La pasión es presentada por Mateo como un final lógico de la vida de Jesús. Sobre toda la vida de Jesús se proyecta la contradicción y la cruz: en su nacimiento (Mt 2,1-23), sus discípulos continuarán su cruz (Mt 10,16-39), en su actuación es rechazado (Mt11-12), la muerte de Juan Bautista sugiere su misma suerte (Mt 14,1-12). La intencionalidad de Mateo es doble: presentar a Jesús como el Hijo de Dios obediente a la voluntad del Padre hasta la muerte; y catalogar en vivo las diversas actitudes de la gente ante la pasión y muerte de Cristo.

El relato se inicia con el complot de las autoridades judías y la cooperación de Judas. Pero será Jesús quien tome la decisión que pone en marcha la tragedia; él es el protagonista por su fidelidad. En la narración del arresto de Jesús Mateo se preocupa por dar explicaciones. Y lo que él nos dice aquí tiene una importancia especial por el hecho de que se trata del impulso inicial de la Pasión: los principios que guían el comportamiento de Jesús en el momento del arresto iluminan el conjunto del misterio. 

Mateo nos muestra que Jesús elige, con pleno conocimiento de causa y con plena libertad, el camino de la humillación, porque reconoce en éste el camino que corresponde al designio de Dios. 

Jesús rehúsa oponerse a la violencia con la violencia, porque esta actitud, lejos de salvar a los hombres, los encierra en un círculo infernal (26,52). 

Rehúsa también recurrir a una intervención milagrosa del poder divino: no duda de que pueda obtener del Padre una intervención de este género (26,53), pero sabe bien que no es ésta la vía que conducirá al objetivo. Ha llegado la hora en que deben "cumplirse las Escrituras". 

En torno a Jesús se mueven cuatro grupos: los Doce, las mujeres, el Sanedrín y el pueblo responsable de su suerte.

En la pasión de Mateo se destaca:

a. La inocencia de Jesús proclamada por Judas, la mujer de Pilato y el mismo Pilato.

b. El silencio de Jesús.

c. Lo propio de Mateo: el suicidio de Judas, el sueño de la mujer de Pilato, los fenómenos extraordinarios al morir Jesús, los guardias del sepulcro.

  

Algunas reflexiones 

El domingo de ramos celebramos la entrada de Jesús en Jerusalén donde va a sufrir su pasión y su muerte en cruz. Es, por tanto, la puerta de la Semana Santa y la liturgia de este día nos invita a entrar con Jesús en la misma. En su ingreso a Jerusalén Jesús es aclamado como rey, como el hijo de David en su esplendor; pero aparece como "un rey humilde, montado en un asna" como lo había profetizado el profeta Zacarías (cf. Zac 9,9). No es, por tanto, un rey prepotente que hace alarde de su poder; sino un rey manso, humilde, pacífico y pacificador. De aquí toman sentido los ramos de olivo que recuerdan la paz que nos trae Cristo y que sólo puede darse cuando Cristo reina en nuestros corazones, en nuestra casa, en nuestra sociedad.

Se lo llama también "domingo de Pasión" por cuanto leemos la Pasión del Señor y, de este modo, nos ponemos en clima para toda esta semana anticipando los hechos para descubrir su sentido profundo e inspirarnos la actitud espiritual correspondiente.

Los liturgistas aconsejan no separar demasiado los dos momentos de esta celebración. Así, para A. Nocent el puente entre los dos momentos está en el sentido de la procesión: "En esta procesión debemos ver mucho más que un remedo y un recuerdo, la subida del pueblo de Dios, nuestra propia subida con Jesús hacia el sacrificio. Además, mientras la procesión nos recuerda el triunfo de Cristo en Jerusalén, nos lleva también ahora hacia el sacrificio de la cruz, hecho presente en el sacrificio de la misa, que va a ofrecerse"[2].

 

La primera lectura nos invita a la escucha, actitud propia del discípulo, pero incluye también la aceptación de los acontecimientos. El siervo no sólo habla y escucha, sino que también padece sin huir, confiando en la ayuda del Señor. Es una clara invitación, por tanto, a involucrarse con la pasión de Jesús prefigurada en los sufrimientos del siervo.

También la segunda lectura nos presenta el camino de Jesús, su abajamiento y su obediencia hasta la muerte, como modelo a imitar. Más puntualmente nos invita a involucrarnos con nuestro querer, pensar y sentir en la pasión de Jesús. La extrema pobreza y el extremo amor de Jesús manifestado aquí deben ser el motor de nuestra entrega al Señor en pobreza de espíritu y por amor. 

En cuanto a la lectura de la Pasión según San Mateo, me parece interesante una advertencia que hace el Cardenal C. M. Martini antes de comentar esta narración: "Pienso en el piloto de un avión que después de haber recorrido a lo largo de la pista, se da cuenta finalmente de que los motores no tienen la fuerza suficiente ni la suficiente velocidad para subir. Así nos sentimos ante las meditaciones de la pasión. Distinto es mirar al Señor, sobre todo descubriendo de allí conocimiento de nosotros mismos. En cambio cuando se trata de mirar hacia Él para obtener conocimiento de Él (y esto no se puede hacer sin entrar en el misterio trinitario del Padre que nos da al Hijo, y sobre todo en el misterio de la muerte de Dios), nos encontramos sin ninguna preparación" .

Si queremos obtener conocimiento de nosotros mismos en cuanto discípulos de Jesús podemos seguir las huellas de Pedro, analizando sus reacciones y sus actitudes ante la Pasión del Señor. Meditando sobre Pedro ante la Pasión de Jesús aprenderemos a confesar nuestros miedos ante la cruz, a sanar nuestra presunción que desconoce los propios límites, a reconocer nuestras fragilidades e infidelidades y a llorar amargamente por ellas . Al respecto decía el Papa Francisco en su homilía del 5 de abril de 2020: “Examinémonos interiormente. Si somos sinceros con nosotros mismos, nos daremos cuenta de nuestra infidelidad. Cuánta falsedad, hipocresía y doblez. Cuántas buenas intenciones traicionadas. Cuántas promesas no mantenidas. Cuántos propósitos desvanecidos. El Señor conoce nuestro corazón mejor que nosotros mismos, sabe que somos muy débiles e inconstantes, que caemos muchas veces, que nos cuesta levantarnos de nuevo y que nos resulta muy difícil curar ciertas heridas. ¿Y qué hizo para venir a nuestro encuentro, para servirnos? Lo que había dicho por medio del profeta: «Curaré su deslealtad, los amaré generosamente» (Os 14,5). Nos curó cargando sobre sí nuestra infidelidad, borrando nuestra traición. Para que nosotros, en vez de desanimarnos por el miedo al fracaso, seamos capaces de levantar la mirada hacia el Crucificado, recibir su abrazo y decir: “Mira, mi infidelidad está ahí, Tú la cargaste, Jesús. Me abres tus brazos, me sirves con tu amor, continúas sosteniéndome... Por eso, ¡sigo adelante!”.


La otra opción es fijar nuestros ojos en Jesús para contemplarlo y dejarse cuestionar y transformar por su ejemplo de entrega al Padre. Son muy llamativos los silencios de Jesús, su negativa a defenderse, su pasividad ante la agresividad de los hombres. También lo es su aceptación de su fracaso, pues el mismo pueblo a quien enseñó y por quien da la vida pide la liberación de Barrabás y la crucifixión de Jesús. Y una vez crucificado llegar a sentir el abandono del Padre en ese momento tan dramático. 

Sobre esto nos dice el Papa Francisco: “En el Evangelio de hoy, Jesús en la cruz dice una frase, sólo una: «Dios mío, Dios mío, ¿por qué me has abandonado?» (Mt 27,46). Es una frase dura. Jesús sufrió el abandono de los suyos, que habían huido. Pero le quedaba el Padre. Ahora, en el abismo de la soledad, por primera vez lo llama con el nombre genérico de “Dios”. Y le grita «con voz potente» el “¿por qué?”, el por qué más lacerante: “¿Por qué, también Tú, me has abandonado?”. En realidad, son las palabras de un salmo (cf. 22,2) que nos dicen que Jesús llevó a la oración incluso la desolación extrema, pero el hecho es que en verdad la experimentó. Comprobó el abandono más grande, que los Evangelios testimonian recogiendo sus palabras originales.

¿Y todo esto para qué? Una vez más por nosotros, para servirnos. Para que cuando nos sintamos entre la espada y la pared, cuando nos encontremos en un callejón sin salida, sin luz y sin escapatoria, cuando parezca que ni siquiera Dios responde, recordemos que no estamos solos. Jesús experimentó el abandono total, la situación más ajena a Él, para ser solidario con nosotros en todo. Lo hizo por mí, por ti, por todos nosotros, lo ha hecho para decirnos: “No temas, no estás solo. Experimenté toda tu desolación para estar siempre a tu lado”. He aquí hasta dónde Jesús fue capaz de servirnos: descendiendo hasta el abismo de nuestros sufrimientos más atroces, hasta la traición y el abandono. Hoy, en el drama de la pandemia, ante tantas certezas que se desmoronan, frente a tantas expectativas traicionadas, con el sentimiento de abandono que nos oprime el corazón, Jesús nos dice a cada uno: “Ánimo, abre el corazón a mi amor. Sentirás el consuelo de Dios, que te sostiene”.

Meditando sobre la pasión de Jesús podemos retener dos actitudes fundamentales suyas: su docilidad filial a la voluntad del Padre y su solidaridad fraterna. 

Su docilidad filial la reconocemos en la aceptación por parte de Jesús de su pasión y muerte como obediencia a la Voluntad del Padre que nos la resalta Mateo con las referencias al cumplimiento de las Escrituras. Y de modo especial, la escena del huerto de Getsemaní es un claro testimonio de la lucha de Jesús por anteponer la Voluntad del Padre a la natural angustia ante la muerte cercana.

La solidaridad fraterna, en consonancia con la primera lectura,  queda de manifiesto en la institución de la Eucaristía donde Jesús anticipa y revela el sentido su pasión y su muerte como donación y entrega de su vida por la salvación de todos los hombres. Muere por nosotros.

En conclusión, se trata de apropiarse, en cierto modo, de este misterio de la pasión del Señor, de encontrarle su sentido profundo y desde allí vincularlo a nuestra vida presente. Por eso, pidamos al Señor que el misterio de la cruz nos ayude a descubrir el sentido de nuestras cruces y nos de la fuerza para perseverar en su seguimiento. Pidamos también la aceptación filial de nuestros sufrimientos y el poder ofrecerlos por el bien de los demás. Pero, por encima de todo, pidamos que el misterio de la cruz nos enseñe la verdad sobre el amor y nos comunique la fuerza para poder amar de verdad a Dios y los hermanos.



PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):


Desfigurados nuestros rostros

 

Va mostrando su rostro

La humanidad perdida entre las tinieblas

La confusión y la mentira, reinan.

 

Así pasan los días

Y tú señor, te haces leyenda

Desdibujada tu figura, solo sangre y piedra

 

En medio del llanto materno

Injustamente juzgado, abusado y condenado

Te elevas para entregarte

 

Brazos abiertos para abrazar a todos

Y en aquel día, a nadie

La soledad se te hizo carne

 

Cuánto murmuraban los poderosos

Rumores de muerte se oían por las calles

Confusión y espectáculo inolvidable

 

La tumba nueva dejaba atrás el huerto.

La muerte ignominiosa y él porque

Abrigarán por fin tu cuerpo

 

Y se quedará aguardando

Sobrevendrá el esperado momento

Cuando esté vivo el que está muerto. Amén.



[1] Extraemos lo propio de Mateo del artículo de A. Vanhoye, "Las diversas perspectivas de los cuatro relatos evangélicos de la Pasión", cuya versión digital se encuentra en clerus.org.

[2] A. Nocent, Celebrar a Jesucristo III. Cuaresma, 195.

[3] C. M. Martini, Las Narraciones de la Pasión, San Pablo, Bogotá 1995, 12.

[4] Esto es justamente lo que hace C. M. Martini en su primera meditación sobre la pasión según san Mateo; cf. Las Narraciones de la Pasión, San Pablo, Bogotá 1995, 15-29.

[5] Testigos de la Esperanza (Ciudad Nueva; 2000)105 y 108.

[6] Echad las redes. Reflexiones sobre los Evangelios. Ciclo A (EDICEP; Valencia 2003) 115.